segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

LINCOLN - Um Gigante nas Telas.

Este filme eu fui ver no dia de seu lançamento nacional. O filme retrata os bastidores do poder, na votação da emenda 13 da Constituição Americana e as dificuldades em sua aprovação. Me lembrei de Maquiavel, da realpolitik e, ao mesmo tempo, da superação desta realpolitik, pelo efetivo exercício do poder que Lincoln usou, praticamente sem nenhum escrúpulo, para impor o seu objetivo maior e que o consagrou como o grande presidente da unidade americana: a aprovação, contra quase tudo e todos, da emeda número 13.
Lincoln : poster
Poster do filme Lincoln. Adorocinema.

Também me lembrei do mensalão. Lincoln deu fortes motivos para sofrer um processo de empeachment, em suas ações em favor da aprovação da emenda. Isso daria uma belíssima discussão política, não daria? Certamente que elementos não faltariam. Existe uma espécie de eu não sabia presidencial, ocorrido no dia da sua aprovação.

O roteiro do filme é adaptado do livro Team of Rivals: The Political genius of Abraham Lincoln, de Doris Kearns  Goodwin, lançado no Brasil, simultaneamente com o filme (25.01.2013), em edição resumida autorizada, em audiolivro, pela editora Record. O título é uma referência aos principais auxiliares do presidente, recrutados entres os seus políticos rivais. A adaptação tem indicação para o Oscar.

Lincoln, interpretado pelo premiado ator Daniel Day Lewis, é um filme lento e detalhista, mas não arrastado. Retrata os últimos dias do presidente, já reeleito, em sua bela obstinação, por uma tarefa tida como impossível: a aprovação da emenda treze. Esta emenda já tinha aprovação no Senado, mas não tinha condições objetivas para acontecer o mesmo na Câmara. Precisaria de todos os votos de seu partido, o republicano, além de avançar sobre alguns votos dos democratas, para entre eles, obter os que faltavam. Os esforços para isso foram para além do imaginável: pura obstinação. As cenas em que ocorre o debate no Congresso são uma página impecável, tanto para mostrar a história, quanto a sordidez humana, na defesa de seus interesses materiais.

Lincoln era um homem solitário. A sua convivência praticamente se limitava aos seus principais assessores. Era extremamente exigente com eles. É notável a atuação destes, nos bastidores da política. A autora da biografia diz que Lincoln procurava se livrar da melancolia (este termo é forte) contando histórias e piadas e insistia com o roteirista para que isso aparecesse no filme, como de fato aparece. Em momentos tensos, está aí o Lincoln a contar histórias, ou piadinhas. Uma piada é notável, envolvendo um herói da guerra da independência, usando um banheiro em Londres, onde está pendurado um quadro de George Washington, -  como provocação. Moral da história: "Nada como um retrato de George Washington para fazer os ingleses se cagarem todos". Esta era uma de suas piadas preferidas, nos conta a biógrafa. Acertos e desacertos com a sua esposa também aparecem bem. Ela também tem indicação ao Oscar.
Lincoln : foto Daniel Day-Lewis
Uma foto impressionante do presidente Linclon. Seria um retrato da melancolia? Adorocinema.

Por falar em Oscar, o filme é o que mais indicações tem, vamos ver as suas doze indicações:
1) melhor filme - deverá levá-lo. A academia dificilmente deixará de premiar o seu herói, e com méritos.
2) melhor direção: Steven Spielberg. Um diretor consagrado para apresentar o herói. Forte candidato.
3) melhor ator: Daniel Day Lewis. Candidatíssimo.
4) melhor ator coadjuvante: Tommy Lee Jones, como Thadeus Stevens, líder dos republicanos na Câmara.
5) melhor atriz coadjuvante: Sally Field, como Mary Tood, a esposa do presidente.
6) melhor roteiro adaptado: Tony Kushner, do livro de Doris Kearns Goodwin.
7) melhor trilha sonora: John Williams. A música é uma imperceptível extensão das tuas emoções.
8) melhor fotografia.
9) melhor figurino.
10) melhor edição.
11) melhor direção de arte.
12) melhor mixagem de som.

Embora o filme se ocupe já da parte final da Guerra da Secessão, a guerra pela libertação dos escravos, merece uma contextualização para uma melhor compreensão do filme. Para conter o avanço dos estados do norte, onde a emancipação já ocorrera, 11 estados do sul se unem, na defesa de sua economia - monoculturas, latifúndio e escravidão, - e impedir que esta onda também chegue aos seus estados. A guerra se inicia com o ataque sulista ao Fort Sumpter, na Carolina do Sul. A guerra se inicia em 1860 e só terminará em 1865, com a morte de 970.000 seres humanos. A correlação de forças era totalmente favorável aos estados do norte. Em termos de população, eram 20 milhões contra 11 milhões, do sul e, entre eles, a população escrava. Economicamente, a desproporção era ainda maior. Claramente se dá a luta do mais fraco contra o mais forte e com derrota à vista. Mas a obstinação em torno de seus interesses injustificáveis, de sua arrogância e preconceitos os leva à guerra e a ações posteriores que deixaram marcas negativas até hoje. Alabama e Mississipi concorrem com histórias como as narradas em A Resposta, livro do qual se originou o filme Histórias Cruzadas.

Pela importância histórica transcrevo esta emenda treze, de seis de dezembro de 1865:

Seção 1. Não haverá nos Estados Unidos ou em qualquer lugar sujeito a sua jurisdição, nem escravidão, nem trabalhos forçados, salvo como punição por um crime pelo qual o réu tenha sido devidamente condenado.
Seção 2. O Congresso terá competência para fazer executar este artigo por meio das leis necessárias.

Em 9 de abril de 1865, os estados confederados do sul assinam a sua rendição, mas já no dia 14 de abril, numa sexta feira santa, no Teatro Ford, em Washington, o Presidente Lincoln será assassinado e passará a viver para a história.

Um gigante nas telas. Não somente pelos 1,89 metros de Daniel Day Lewis, mas pelo esforço, grandeza e empenho com que uma grande equipe, levou a vida deste grande presidente, às telas do cinema. Em menos de quatro meses ocorrem estes fatos históricos significativos retratados no filme: a votação da emenda; a rendição sulista e o assassinato do presidente no Teatro Ford.

Depois da abolição os Estados Unidos seguiram o seu caminho. Assim caminha a humanidade... O sul continuou em muito com a sua arrogância e prepotência. Ali surgiram instituições, seguramente entre as mais horrorosas da história mundial e que refletem toda a maldade de que o ser humano é capaz, como a Ku Klux Klan, tão bem ironizada no outro grande filme - também indicado ao prêmio de melhor filme, - Django Livre, na cena dos encapuzados.

E por falar em Django Livre, certamente se cometerá uma grande injustiça nesta premiação para o melhor filme: Não dá para premiar Django Livre e Lincoln ao mesmo tempo, e nenhum dos dois merece perder. É nisso que dá a formação de rankings. Uma certeza, no entanto, eu tenho: Nós já fomos premiados com a possibilidade de assistir a esses dois maravilhosos espetáculos: Lincoln pela sua grandeza e majestade e Django Livre, pela ousadia, irreverência e sutileza de suas ironias.

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