terça-feira, 5 de novembro de 2013

Manoel Bomfim define o que significa ser um conservador.


As críticas que Manoel Bomfim faz ao conservadorismo são profundamente contundentes e implacáveis. A sua tese fundamental sobre os males de origem da América Latina se fundamentam na teoria do parasitismo. Pelo parasitismo, tanto o ser parasita quanto o parasitado sucumbem em questão de tempo. O ser parasitado sucumbe por ver exauridas todas as suas forças, enquanto que o parasita, por não desenvolver os seus órgãos de sobrevivência, os atrofia até sucumbir no decorrer de apenas algumas gerações.
O livro de Manoel Bomfim. Um libelo contra o conservadorismo.

Os conservadores são os grandes defensores da teoria do parasitismo, uma vez que tendem para a permanência deste sistema, impedindo que as mudanças ocorram. As suas teorias são bem fundamentas e o mais interessante é verificar a data em que foram anunciadas. O livro de Manoel Bomfim foi publicado em 1905, quando as teorias de determinismos biológicos estavam plenamente em voga, para justificar o atraso brasileiro, por teorias raciais e por suas misturas. Manoel Bomfim também fundamenta  a sua teoria num biologismo, mas as suas conclusões são bem diversas.

Ele fundamenta que todo o progresso da humanidade deriva da relação estabelecida com a natureza, da qual os humanos tiram as suas formas de subsistência. A evolução desta relação com a natureza marca a evolução da própria condição humana. Na medida em que nesta relação ele enfrenta obstáculos, ele os vai superando e, no sentido oposto, quando ele não caminha no sentido da superação, ele avança no sentido do atrofiamento de suas capacidades evolutivas.

Ele fala do conservadorismo, quando ele aborda o tema "da expressão desses efeitos (do parasitismo) na vida econômica, política, intelectual e moral" e mais precisamente num tópico intitulado por "efeitos da hereditariedade e da educação" (página 179). A sua principal crítica se relaciona com o imobilismo gerado pelo conservadorismo que conduz para a estagnação universal. Vejamos algumas de suas frases a este respeito. A primeira comparação que faz é com uma árvore, que estende suas raízes para todos os lados, sugando tudo para si e impedindo que as transformações ocorram ao seu redor.

"Não se contentam em estar imóveis; pretendem que todo o mundo se petrifique e que a vida deixe de ser evolução para ser uma repetição apenas, a fim de que vejam amanhã o que vêem hoje, e o que viram ontem - a estagnação universal. É o egoísmo arvorado em programa: coíba-se o progresso, perpetuem-se os abusos, amontoem-se as crises, contanto que ao misoneísta (tendência de espírito ou atitude sistemática de hostilidade à inovação, à mudança) sejam respeitadas todas as ideias preconcebidas, e os sentimentos que trouxe de outra época, e os hábitos ligados a necessidades passadas". E continua, elevando o tom de sua crítica: 

"Que não lhe firam um privilégio, que lhe respeitem a situação cômoda, em que vive a engordar sobre o labor alheio... É sem dúvida o sentimento que arrasta os políticos a essa aberração e obsessão conservadora. Os sentimentos, e os costumes, que neles se inspiram, estão sempre retardados, relativamente à inteligência". E explica: "Conservar não pode constituir função especial, ativa, de ninguém; é uma função passiva. A sociedade conserva-se, independentemente de qualquer esforço; conserva-se , pelo simples fato de que existe, por uma função inconsciente, reflexa, necessária a tudo que é". E continua, para apontar que toda a ação humana inteligente tem a marca da mudança, o sentido de progredir: "Não, os seus esforços (para falar, andar...) se fazem no sentido de alterar esta forma, melhorando-a, corrigindo-lhe os defeitos - aperfeiçoando o andar, apurando a linguagem. Os esforços são todos para transformar e alterar, no sentido de progredir".

Como então se explica a tendência ao conservadorismo? Bomfim esclarece: "A sociedade não carece de ninguém com o encargo especial de conservar isto ou aquilo; não há progresso, não há evoluções capazes de destruir o que é essencial à conservação das sociedades". No entanto, por que existe tanto conservadorismo e até partidos políticos conservadores? Ele explica: "Explica-se pelo excesso de egoísmo de uns, pela incapacidade adaptativa de outros" e continua mais adiante: "... mas de conservar para uma classe, para certos grupos, umas tantas vantagens, ligadas a abusos e iniquidades". E, de novo, subindo o tom: "Onde quer que surja a oposição conservadora, há um privilégio (uma lei privada e não universal) que se quer manter".

Depois os comentários vão na direção das suas consequências perniciosas afirmando que "ou leva a nação à decadência e degradação ou provoca revoluções. Sociedade parada, cristalizada é sinônimo de acabada e esgotada. A sociedade é um organismo em evolução, um corpo em movimento, total, contínuo, integral - como o de um rio no seu declive; os conservadores põem-lhe diques, suspendem o progresso normal: as águas, as injustiças acumulam-se, e, um dia, o seu peso rompe o dique - é a revolução social".

Creio que mais claro e mais atual é absolutamente impossível. E Bomfim continua exortando que: "o dever é procurar o caminho, facilitar o trajeto, achar o melhor meio de satisfazer as necessidades novas que se apresentem e de realizar as reformas reclamadas; e nunca opor-se a elas, em atenção a interesses de retardatários, blocos plantados de través à civilização".

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