quarta-feira, 1 de maio de 2024

Solo de clarineta. vol. 2. Memórias. Érico Veríssimo.

Vamos começar o nosso post, mais uma vez, com a contracapa do livro: "O segundo volume de Solo de clarineta foi publicado postumamente, em 1976. Aos textos deixados por Érico Veríssimo, Flávio Loureiro Chaves reuniu outros, esboçados pelo escritor em seu roteiro para memórias.

Solo de clarineta. memórias. vol. 2. Érico Veríssimo. Companhia das Letras.

Depois de evocar a fase final da criação de O tempo e o vento, Érico relembra as viagens marcantes de sua vida: Grécia, Portugal e Espanha. Nada parece escapar a seu olhar atento e à pena elegante do debate com estudantes politizados em Coimbra à recepção onde conhece um descendente de Eça de Queirós; do mar Egeu e da colina da Acrópole a uma busca quase obsessiva pelo local onde teria sido assassinado Federico Garcia Lorca.

A segunda parte dessas memórias, embora inconclusa, ilumina de forma inesquecível o extraordinário cidadão do mundo que foi Érico Veríssimo".

Diria mais. Um cidadão que se empenhou na defesa da democracia e dos direitos fundamentais do ser humano e que, com a mesma obstinação e riscos, combatia todas as formas de ditaduras, sejam elas de direita ou de esquerda.

O segundo volume está dividido em duas partes: Vejamos os títulos: Parte I: 1. O arquipélago das tormentas; 2. Sol e mel; 3. Entra o senhor embaixador; 4. Mundo velho sem porteira. Parte II: 1. Nota do organizador; 2. Espanha; 3. Caminho de Sevilha; 4. Granada: em busca do menino Federico; 5. Holanda; 6. O escritor e o espelho. É nesta segunda parte que entra mais a mente e a mão do organizador.

No item de número 1 da primeira parte, - O arquipélago das tormentas, Érico expõe uma parte conturbada de sua vida. As tormentas são uma referência aos seus graves problemas cardíacos, que quase lhe ceifaram a vida. Mas, em meio as tormentas, também há as bonanças, como o casamento de Clarissa, os netos e o começo da escrita de O arquipélago. Em 1962 dará este trabalho como encerrado.

No item de número 2 - Sol e mel, ele relata a sua viagem para a Grécia, onde aprofunda o seu legado humanista. De Péricles acentua uma frase: "Escravo é aquele que não pode dizer o que pensa". Neste sentido, Érico nunca foi um escravo. Mesmo nas condições mais adversas sempre disse o que pensava, especialmente em Portugal, onde dava caneladas na ditadura de Salazar. Da Grécia vai em viagem de cruzeiro até Istambul. Em Creta presta uma reverência a Níkos Kozantzakis, aquele do Zorba, o grego. (Também de O Cristo recrucificado). E, em Atenas, entre as suas belezas naturais, culturais e históricas, faz também uma bela referência ao Grêmio, que tinha andado por lá.

No item de número 3 - Entra o senhor embaixador, temos mais cenas de sua vida, como a morte da mãe, o namoro e o casamento de Luís Fernando, o primeiro neto oriundo deste casamento e, de maneira toda especial, a gênese de O senhor embaixador.

No item de número 4 - Mundo velho sem porteira, Érico se solta pelo mundo, sem antes falar do belo significado de - um mundo sem porteiras. Portugal  é o seu primeiro destino. Trata-se de um belo e culto guia turístico e cultural. Primeiro ele viaja para o norte e depois para o sul. Em Portugal, segue uma rotina meio oficial, junto com o seu editor, entre conferências, autógrafos, almoços festivos e homenagens e furtivas caminhadas por becos recônditos de rara beleza. Essa viagem tem forte teor político, de defesa da democracia. E, um dado fundamental da estrutura histórica do país: os minifúndios, ao norte e os latifúndios, ao sul. Coimbra, Porto, Braga, Guimarães e Évora são as cidades que ganham um destaque maior. É a parte mais longa do livro (No plano original de Érico, Solo de clarineta teria um terceiro volume. Creio que os demais países europeus seriam descritos à semelhança com esta descrição de Portugal). Este capítulo vale o livro. Um hino à liberdade, à democracia e aos direitos fundamentais e um anátema às ditaduras.

A segunda parte é bem mais breve, começando com as explicações do organizador. No tópico - Espanha, temos o relato de uma divergência familiar. Érico queria visitar oito países e Mafalda queria concentrar mais em torno de Roma e de Paris. Ao todo, o casal Veríssimo fez quatro viagens para a Europa, além da de 1959. 

Os títulos - Caminho de Sevilha e - Granada: em busca do menino Federico -, estão escritos, praticamente de maneira definitiva. De Sevilha o grande destaque vai para a descrição dos festejos da semana santa, que os desalojou do hotel. Uma grande festa em que as confrarias disputam a sua real grandeza. Outro destaque vai para as danças flamencas. De Granada, o destaque também vai para a religiosidade da cidade, mas a obsessão maior é Lorca e o seu assassinato pela cruel ditadura de Franco. De Granada tomo uma frase que foi decisiva, ao menos na primeira fase de minha vida. Se eu fosse escrever as minhas memórias, ela seria uma bela introdução e começo. Trata-se, nos conta Érico, da prece de uma mãe católica: Dios, dame un hijo sacerdote.

O título - Holanda, vai para muito além de suas tulipas. Tem uma bela comparação entre a pintura italiana e a holandesa. A Holanda é calvinista, é burguesa. Uma civilização que exalta as coisas e não a alma. Ah, a prosperidade!. Uma reconfiguração religiosa completa de muitas e profundas consequências.

E o escritor e o espelho, o título final do livro, também vale o livro. É uma preciosidade rara. Dela vou retirar três posts específicos, que definem Érico Veríssimo em toda a sua profundidade. Tenho, mais ou menos delineados os posts: É Érico Veríssimo um escritor pornográfico? Sua visão religiosa e sobre Deus e uma definição de princípios sobre sociedade - liberdade - socialismo.

Deixo ainda mais dois posts. Sobre o primeiro volume de Solo de clarineta:

http://www.blogdopedroeloi.com.br/2024/04/solo-de-clarineta-vol-i-erico-verissimo.html

E outro - com a resenha de cada um dos sete volumes de O tempo e o vento:

http://www.blogdopedroeloi.com.br/2024/04/os-sete-volumes-de-o-tempo-e-o-vento.html


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