sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

Democracia em vertigem. Petra Costa. Indicado ao Oscar de melhor documentário.

A proximidade da solenidade de premiação do Oscar 2020 me fez ver  um dos indicados, no caso, o de melhor documentário de longa metragem, Democracia em vertigem, de Petra Costa. A sua indicação já foi uma surpresa que será, ainda maior, caso receba a indicação do prêmio maior. Na abertura do documentário tem uma nota, registrando que o tema será o da ascensão e queda do PT e a polarização do Brasil que se estabeleceu, especialmente, após os movimentos de extrema direita, iniciados nos protestos de 2013.

Democracia em vertigem é um documentário para a história, um verdadeiro arquivo dos fatos,  todos devidamente registrados pela mídia. É também inegável, que é um documentário de autoria, com forte posicionamento de Petra, que é também a roteirista do documentário. Esse posicionamento é absolutamente legítimo, a exemplo dos grandes documentaristas.

Para quem acompanhou mais de perto a política desse período, não há grandes novidades. A novidade maior foi para o público internacional, que teve os fatos catalogados e reunidos nesse documentário. São duas horas de duração. Certamente foi este o motivo maior para a sua indicação ao Oscar.

O documentário inicia com uma espécie de apresentação de Petra, de sua origem familiar. Seus pais se posicionaram contra a ditadura militar de 1964, atuando na clandestinidade. O seu nome, Petra, é uma homenagem a um personagem forte e influente do período, Pedro Pomar. Petra também não esconde a ligação de sua família com uma das maiores construtoras do país: A Andrade Gutierrez.  São retomadas cenas da ditadura, da repressão, violência e tortura. Entram em cena também as reações. Lula aparece como líder sindical e fundador de um partido político, vinculado aos trabalhadores, o PT. Lula concorre às eleições de 1989, 1994, 1998 e vence em 2002, com um discurso de conciliação.

Após mostrar a euforia da posse e a obsessão de Lula para acabar com a fome no país, as dificuldades começam a ser mostradas. A governabilidade e a aliança com o PMDB, o maior partido político brasileiro. Surge o mensalão. Lula sai ileso mas dois importantes nomes do PT, importantes na linha sucessória, são defenestrados: José Dirceu e Antônio Palocci. Lula se reelege em 2006. Amplia o leque de alianças, mas elas tem um preço. O país descobre o pré-sal. Lula, com 87% de aprovação popular, elege Dilma Rousseff, como sua sucessora. Ela começa bem, mas vem os significativos protestos de 2013.

Os grupos de extrema direita começam a atuar fortemente. Dilma tem dificuldades em governar. Falta-lhe a habilidade política. Adere à austeridade e cria mecanismos de combate à corrupção, entre eles, o mecanismo da delação premiada. Apesar de tudo, Dilma se reelege. Aécio Neves, seu principal oponente e com quem Petra tem vínculos familiares, não reconhece os resultados e começa a tramar. Cada dia mais, até chegar ao impeachment. Entram em cena outros personagens decisivos, Cunha e Temer. O impeachment é marcado e aprovado pela Câmara e o julgamento vai para o Senado. O golpe se confirma em 31 de agosto de 2016.

São marcantes os votos dados pelos deputados a favor do impeachment e os seus discursos em favor de Deus, da família e, notórios corruptos, pelo combate à corrupção. Mas o voto mais marcante, nesse processo é dado por Jair Bolsonaro, que homenageia o notório torturador Carlos Brilhante Ustra. Lança-se candidato, tendo nesse momento 2% das intenções de voto. Aos poucos, o mercado e a elite conservadora o transformam em Messias e mito.

Esse voto com a homenagem a um torturador me fez lembrar uma fala de Adolfo Pérez Esquivel, o argentino detentor de um Nobel pela Paz, no curso de Direito da UFPR: "Sobre a impunidade não se constrói a democracia". Tivesse sido Jair Bolsonaro preso nesse momento, por exaltação à tortura, a nossa frágil democracia talvez tivesse tido maiores chances de sobrevivência. 

Tem também a famosa frase de Romero Jucá: Com Supremo e com tudo, quando Dilma anunciou mais fortes mecanismos de combate à corrupção. Mas o golpe não estava consumado. Lula precisaria ser afastado do processo sucessório de 2018. Ele aparecia em primeiro lugar em todas as pesquisas de intenção de voto. A força tarefa da Lava-Jato se encarregou disso. O conluio entre o Poder Judiciário e a mídia fez o pré-julgamento do ex-presidente, condenado por Moro e com a pena ampliada pelo TRF-4, em tempo de uma velocidade nunca vista. Aí sim o golpe estava consumado. Bolsonaro será eleito presidente e Sérgio Moro será o seu ministro da justiça.

O documentário receberá o Oscar? A crônica especializada aponta que não. Mas o mais importante já se realizou. Um registro para a história e uma denúncia perante o mundo. Por parte da direita, sempre raivosa, muita indignação. É acusada de traidora e contrária aos interesses do país. Nenhuma novidade. Os seus concorrentes são: American Factory, The Cave, For Sana e Honeyland. Vamos aguardar o dia 9 de fevereiro e, para o Brasil, a volta da democracia e o funcionamento pleno das instituições.










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