sexta-feira, 12 de agosto de 2022

Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito!

Não poderia deixar de fazer a minha parte diante deste importante documento documento para a história brasileira. Contribuir com a sua divulgação. Tomei a carta diretamente do site da Universidade de São Paulo. Por óbvio, o documento não precisa de comentários. Hoje é 12 de agosto e gostaria apenas de destacar a enorme repercussão que ele teve no dia de ontem, 11 de agosto, um dia especial para o direito, com a criação dos primeiros cursos no Brasil. A carta já tem mais de um milhão de assinaturas. Um documento que fará história. Parabéns a todos os democratas envolvidos.

Atenas. Cidade símbolo da democracia. Foto de minha autoria.

Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos Cursos Jurídicos no País, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

 

A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o estado democrático de direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.

 

Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.

 

Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.

 

A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

 

Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.

 

Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.

 

Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.

 

Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.

 

Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.

 

Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.

 

Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.

 

Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.

 

No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.

 

Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:

 

Estado Democrático de Direito Sempre!!!!

 

Faça parte dessa história. Assine a Carta.

 

sexta-feira, 5 de agosto de 2022

Porto Feliz - Mondaí. O centenário da colonização (1922-2022).

Esta é a segunda vez que a cidade de Mondaí comparece no meu blog. A primeira, foi com o livro Um novo lar na imensidão da mata, que relata as memórias da família Ramminger, que chegava em Porto Feliz, o nome de então, da hoje cidade de Mondaí, no ano de 1922. O livro, da editora Oikos, publicado no ano 2020, é organizado pelo historiador Leandro Mayer. O livro é simplesmente a saga de uma família pioneira. Deixo o link da resenha. http://www.blogdopedroeloi.com.br/2021/07/um-novo-lar-na-imensidao-da-mata.html

Agora é a vez de outro livro, Porto Feliz - Mondaí. O centenário da colonização (1922-2022). O livro, da editora Schreiben é organizado também por um historiador, Douglas Orestes Franzen. Mas, poderiam me perguntar, por que eu alimento esse interesse por esta cidade? A resposta é simples. Dois motivos me movem para isso. Em primeiro lugar, eu tenho um irmão que mora na cidade e que mandou esses livros e, em segundo lugar, porque a nossa família tem muito a ver com toda a história relatada nesse maravilhoso livro. A nossa família é de origem alemã. E Porto Feliz- Mondaí é uma cidade de origem alemã. Basicamente ela foi colonizada pelos colonos pioneiros, que aportaram em São Leopoldo, há quase 200 anos, no já longínquo ano de 1824, na cidade gaúcha de São Leopoldo.


Porto Feliz - Mondaí. O centenário da colonização (1922-2022). Ed. Schreiben. 2022. Livro organizado por Douglas Orestes Franzen.

O meu irmão Hédio José Rech, de certa forma também é um pioneiro nesse extremo oeste catarinense, para onde foi nos idos da década de 1960. Foi para ser professor e se estabeleceu, depois de algumas andanças, na comunidade de Catres. Hoje mora na cidade. Ele foi recrutado para ser professor e também passou por inúmeras dificuldades até ser formalmente contratado como professor pelo estado de Santa Catarina. A nossa família é natural de Harmonia, que na época era o terceiro distrito de Montenegro. Já visitei o meu irmão em várias oportunidades. Eis a minha relação com a cidade. Também me move a satisfação de colaborar, por mínimo que seja, com a divulgação desse valioso livro. 

O livro tem um valor inestimável. Livro de preservação de memória. Ele deve ter dado um bom
trabalho ao seu organizador, pois diferentes pesquisadores fazem as mais diferentes abordagens relativas ao histórico desenvolvido ao longo dos cem anos da história de Mondaí. Ao longo de 361 páginas são desenvolvidos os principais fatos históricos e culturais do município, junto com um rico acervo bibliográfico acompanhado de fotografias históricas coletadas junto às famílias dos pioneiros ou retiradas ou de um museu existente na cidade, o  Museu Pastor Karl Ramminger.

Donde vieram os pioneiros? A maioria veio das antigas colônias alemãs do Rio Grande do Sul, das colônias originárias de São Leopoldo e São José do Hortêncio, da década de 1820. As terras ao longo dos vales dos rios Sinos, Caí, Taquari, começam a ficar escassas, para os numerosos filhos que as famílias geralmente tinham. Novas fronteiras precisavam ser buscadas. É nesse contexto que é ocupada a fronteira oeste do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e do Paraná. Trago bem presente na memória esse fenômeno que eu vivi na minha infância nos anos 1950. Sempre havia vizinhos de partida.

Especificamente a colonização de Porto Feliz-Mondaí se deu a partir da cidade de Panambi (Neu-Wittemberg). Ali tinha sede a companhia colonizadora Chapecó-Peperi, que estendeu os seus laços comerciais para além do rio Uruguai, nas terras catarinenses. A cidade de Panambi, historicamente tem a ver com a religião protestante, influência que foi levada para a nova colônia do então Porto Feliz. Isso tudo é bem contado ao longo do livro. Lá em Harmonia, onde só havia católicos, junto com Bom Princípio e Tupandi, lembro que se falava mais de Porto Novo, atual Itapiranga, para onde foram direcionados as famílias dos católicos. Coisas da colonização. Hoje o espírito ecumênico prevalece. O tempo aproximou os credos e todos convivem harmoniosamente.

Outros pioneiros vieram diretamente da Europa e de maneira toda especial, da Alemanha, que vivia os problemas do pós Primeira Guerra. Um fato interessante é que vários migrantes também vieram da Bessarábia (Romênia), país do qual não temos tantos imigrantes. O rio Uruguai foi fundamental nessa nova frente de colonização. Era a grande via desses tempos de pioneirismo. 

A ocupação como demarcação de fronteiras também teve importância nessa história de povoação do extremo oeste catarinense. Chapecó era até então a última fronteira e o município mãe de toda essa região. As fronteiras que deveriam ser demarcadas eram as que dividiam o Paraná com Santa Catarina (Pós guerra do Contestado - 1912-1916) e  entre o Brasil e a Argentina. 

Três fatos históricos mereceram de minha parte maior atenção. O primeiro deles foi a passagem por ali, no ano de 1925, da Coluna Prestes, que gerou grande pânico entre os colonos. O outro fato foi a crise sanitária decorrente dos animais mortos pela passagem da Coluna e a contaminação provocada, que resultou numa grave epidemia de tifo, que vitimou muitos colonos. Creio que dá perfeitamente para imaginar o tamanho da tragédia, agravada pela total falta de recursos, em todos os sentidos. Mas, com certeza o fato mais significativo, foi o que aconteceu nos anos 1930 e agravada ao longo do Estado Novo (1937-1945), com a ditadura de Getúlio Vargas. O Brasil entra na Segunda Guerra, declarando guerra a Alemanha. O alemão passa a ser língua proibida. É inimaginável a violência que se estabeleceu na região por causa desse problema. Muitas prisões e torturas aconteceram nesses pacatos locais. Quem minimamente conhece essas  colônias alemãs sabe, que ainda hoje, a língua mais falada e preferida continua sendo o alemão. Esse período recebeu a denominação de nacionalização.

Outro fato que me  chamou bastante atenção foi o do interesse da cidade com a preservação de sua memória e de seus marcos culturais. Creio que as universidades das grandes cidades mais próximas, como Chapecó e Passo Fundo tem bastante a ver com isso, e isso é muito bom.

Por tudo isso eu mais do que recomendo a leitura e, para dar um melhor panorama do livro ainda deixo a síntese  apresentada na orelha da capa e contracapa. Vejamos: A fundação de Porto Feliz. "Pode-se considerar como data de fundação de Porto Feliz o dia 20 de maio de 1922 que ao mesmo tempo marca o início da colonização do extremo oeste de Santa Catarina.

Nesse dia, Faulhaber, na qualidade de diretor da Empresa Chapecó-Peperi Ltda., pisou as terras da nova colônia para determinar o local de sua sede.

O diretor Faulhaber partiu de Nonoai na pequena lancha a motor de Camilo Picou. Seguiu Uruguai abaixo acompanhado por seus homens de confiança, os colonos Jacob Schüler e Friedrich Forbrig, de Neu-Württemberg, assim como o agrimensor Victor Alberto Webering e o comerciante Francisco Martins, de Palmeira. 

Na foz do primeiro ribeirão, abaixo do rio das Antas, havia, no alto do barranco, um rancho abandonado por balseiros. Em frente, ao lado riograndense, vivia um único morador, Ernesto Scherer. Era apaixonado caçador e já havia percorrido as matas de ambas as margens do Uruguai. Podia assim, fornecer informações preciosas.

O diretor Faulhaber decidiu-se, após dois dias de minuciosas verificações, pelo amplo vale localizado, às margens do ribeirão Capivara, fixando juntamente com o agrimensor Webering, os limites da futura povoação: desde a foz do rio das Antas no Uruguai até a embocadura do ribeirão Laju e, seguindo pela margem do rio, em direção ao sul, até a foz do riacho que deságua no Uruguai diante da ilha do Pão de Açúcar.

Juntamente com Jacob Schüler, o mestre carpinteiro, foi determinado o local para a construção do primeiro prédio da administração, situado próximo ao porto. Uma pequena elevação rio abaixo, foi escolhida para a edificação do primeiro barracão de imigrantes.

Faulhaber sugeriu que a futura sede fosse denominada "Porto Feliz", sugestão que, alguns dias depois, foi aprovada em Carazinho em reunião dos demais sócios da empresa colonizadora". (Koelln, 1980, p.20). Trata-se portanto de uma citação do livro de KOELLN, Arno. Porto Feliz: a história de uma colonização as margens do rio Uruguai. Mondaí. Improeste. 1980.