segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Casa de Pensão. Aluísio Azevedo.

Em 1938 a Revista Acadêmica solicitou a Graciliano Ramos a indicação dos dez melhores romances brasileiros. Entre eles figurava Casa de Pensão de Aluísio Azevedo. Evidentemente que esta indicação me deu motivação para a sua leitura. Do autor já tinha lido O Cortiço, do qual eu gostei muito. Então, retomar o autor, foi tarefa fácil. E para  satisfazer a curiosidade seguem as nove outras indicações: Inocência: Visconde de Taunay; Dom Casmurro: Machado de Assis; Jubiabá: Jorge Amado; Os Corumbas: Armando Fontes; Doidinho: José Lins do Rego; As Três Marias: Rachel de Queiroz; Amanhecer: Lúcia Miguel Pereira; O Amanuense Belmiro: Cyro dos Anjos e Os Caminhos da Vida: Octávio de Faria. A fonte está na biografia de Graciliano O Velho Graça, de autoria de Dênis Moraes.

Antes de falar de Casa de Pensão, vamos falar um pouco de seu autor, Aluísio Azevedo. Ele nasceu em 1857 em São Luís e veio a falecer em La Plata, no exercício de função diplomática em 1913. Casa de Pensão foi publicado sob forma de folhetim em 1883 e, no ano seguinte, sob a forma de livro. Em 1876 ocorrera no Rio de Janeiro um rumoroso caso criminal em que um jovem paranaense, que fora estudar na cidade, foi morto na pensão onde se hospedava, por ter se envolvido com a irmã do dono da referida pensão. O caso teve muita repercussão. Muito jornal foi vendido.
A bela edição da Ateliê Editorial.


Este caso serviu de mote para Aluísio construir o seu romance.  Antes ainda, é importante lembrar que o escritor, que começara a escrever sob o romantismo, já havia feito a sua transição para o realismo, na sua vertente mais forte, que foi o naturalismo. É sob esta escola que os fatos passam a ser vistos. O escritor gosta de ajuntamentos humanos mais permanentes para fazer a caricatura de seus personagens. Isso ocorre agora com Casa de Pensão e depois em O Cortiço.

Então vamos lá. No romance, o estudante já será um maranhense. Certamente o narrador puxou a história para mais próximo da realidade por ele conhecida. Seu nome é Amâncio Vasconcelos. Quando ele chega ao Rio de Janeiro irá se hospedar na casa de um próspero comerciante, o sr. Campos, que devia favores ao pai do rapaz. Um gesto de gratidão o faz ser recebido como alguém da família. Dona Hortênsia, sua esposa, oferece alguma resistência. Amâncio quer mais liberdade para viver plenamente o espírito da cidade que abriga a corte. Busca um lugar mais privado.


Amâncio, após se encontrar com um colega do Liceu de São Luís é apresentado a um outro estudante que é dono de uma pensão. É o senhor João Coqueiro. Este, percebendo que Amâncio tem grande poder aquisitivo, praticamente o arrasta para morar na sua pensão. Coqueiro era casado com Madame Brizard, uma francesa bem mais velha do que ele. Tem também uma bela irmã, que ganhará maior importância ao longo do romance. Trata-se de Amélia, ou Amelinha.

Os personagens, à medida que são revelados, mostram a enorme descrença do escritor na humanidade. Nos três grandes focos narrativos, apenas a família Campos é organizada economicamente e aparenta certa estabilidade emocional afetiva, mas nada que não abale a firmeza de Hortênsia, vacilante e meio arrependida de não ter dado mais atenção ao menino vindo da Atenas brasileira. Uma carta a ela endereçada pelo Amâncio dará muito pano para manga. Campos tem a virtude da gratidão e do reconhecimento. Padece de certa ingenuidade.

O jovem Amâncio é um típico jovem de classe abastada, que pensa apenas em usufruir as benesses da cidade da corte. Benesses significam gastos perdulários em festas e com as mulheres. Estudar lhe é uma tarefa extremamente dolorida. Alimenta bons sentimentos com relação a mãe, fonte de sua fortuna e tem muitos amigos porque era um bom pagador de contas. Se enfiou em questões amorosas, revelando-se extremamente ingênuo.

Mas um horror de família mesmo é a do Coqueiro. É puramente interesseira. Para eles tudo é mercadoria passível de troca. Nesse sentido, a melhor mercadoria de que dispunha era a sua irmã, que rendeu o pagamento de todas as despesas da pensão, sua reforma, mobílias, além de uma casa em Laranjeiras. A situação foi se agravando na exata dimensão da ambição de Amélia e de Coqueiro. Enquanto isso, madame Brizard ficava na retaguarda, articulando tudo.
Dados biográficos de Aluísio Azevedo.


Amâncio consegue passar nos exames do primeiro ano de seus estudos e resolve visitar a mãe, que enviuvara, na sua cidade natal. Amélia não o permite e Coqueiro trama para que ela não ocorra. Coqueiro, através de um advogado chicaneiro consegue reter o estudante no Rio de Janeiro, mas ao final de três meses ele será absolvido. O crime de que é acusado foi o de ter seduzido a irmã do Coqueiro. O caso ganha repercussão e, especialmente, o mundo estudantil toma o partido de Amâncio, que passa a ser celebrado em rumorosas  festas.

Coqueiro se arma do revólver, herdado do pai, e, após a fonte de seus pagamentos ter secado, hesita entre o suicídio e o homicídio, optando pelo segundo. Mata o jovem estudante no hotel em que este estava hospedado. Coqueiro irá a julgamento e mais uma vez o povo e a mídia tomam partido. Só que desta vez, cada vez mais, em favor do assassino. O romance termina com Dona Ângela vindo ao Rio de Janeiro, quando fica sabendo da morte do dileto filho.

Eu li a edição da Ateliê Editorial. Esta edição tem apresentação e notas de Marcelo Bulhões. O que o livro tem de especial é uma nota do próprio escritor - Antes de principiar -. É interessante ver, porque houve uma interrupção na publicação dos capítulos finais, enquanto ainda era um romance de folhetim. Teriam sido mudanças de posicionamento? O texto de introdução, com o título Jornalismo,Crime e Ficção Naturalista: A Escrita de Casa de Pensão, traça um belo paralelo entre o jornalismo e a literatura. O romance fazia esta trajetória do jornal ao livro. E que livro!


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