quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Histórias da gente brasileira. 4. República. Testemunhos (1951-2000). Mary del Priore.

História, memória ou lembranças? Ou tudo isso! Creio que sim. Esse é o belo quarto livro da coleção Histórias da gente brasileira. República. Testemunhos (1951-2000). Foi muito boa essa intuição da Mary del Priore, de contar a história recente desse nosso país através de testemunhas de historiadores, jornalistas, economistas, sociólogos e antropólogos, entre outros. As datas limítrofes dos anos de 1951 a 2000 nos mostram que foram anos de profundas mudanças, sob todos os aspectos da vida humana. Enquanto lia o livro, um filme/memória acompanhava a minha leitura, de um tempo, que com certeza, acompanhei de muito perto.
Completando a coleção: 4. República: 1951 - 2000.

Na orelha do livro lemos uma especie de síntese: "... O golpe que destituiu Jango foi mesmo um golpe? Ou, como preferem alguns, revolução? E como ficou o Brasil nas duas décadas de regime militar - ou ditadura? Os anos de chumbo foram mesmo tão pesados? Ou as condições econômicas favoráveis do período aplacaram o que, para muitos, era privação de liberdade e tortura?

O filme da vida é cheio de percalços, mas também de novidades e surpresas! Há embates com as sempre rígidas posições da Igreja: pílulas, não! Sexo é para procriação. As mulheres vão deixar passar essa chance de libertação? Para casar, tem de ser virgem? A família brasileira perde sua organização tradicional. O corpo 'pecado', aos poucos, começa a buscar os ventos da moda, a atender aos apelos do sol e do ar livre até virar corpo 'prazer'..."

Por essa pequena sínteses já dá para perceber a amplitude da obra. Ela é dividida em três grandes partes: I. Anos de chumbo e anos de ouro, seguidos de treze capítulos; II. Morar, comer, brincar, viver e sobreviver, com mais oito capítulos e III. O filme da vida: começo, meio e fim. Além disso tem prefácio, grandeza e pequenez da vida humana e conclusão, pontos de vista, pontos de vida. E ainda, preciosas referências bibliográficas. Tudo isso ao longo de 450 páginas, fartamente ilustradas.

A primeira parte cuida dos fatos políticos: Os capítulos tem os seguintes títulos: 1. "Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais"?; 2. O passado tão presente; 3. O vermelho e o medo; 4. A luta contra o mapa vermelho; 5. A revolução ou o golpe: duas faces da mesma moeda; 6. Marchas, orações e credos: "vermelho bom, só o batom; 7. Reações&resistência; 8. Repressão à "guerra suja"; 9. Os anos de chumbo e os anos de ouro; 10. Em transição...; 11.Diretas já; 12. A redemocratização; 13. A primeira crise "a gente não esquece". Em outras palavras, tudo o que se refere à modernização conservadora, ocorrida no Brasil nesse período.

A segunda parte foca nas grandes mudanças: na urbanização, na industrialização e nos hábitos. Vejamos os oito títulos: 1. Urbanização e seus novos atores: condomínios, apartamentos, favelas e shopping centers; 2. Paisagismo: verde que te quero verde; 3. Uma odisseia no espaço doméstico; 4. "Como, logo existo"... Mudanças nas panelas; 5. Em toda parte e em todo lugar (a televisão); 6. O apelo do sol e do ar livre; 7. Jovens, belos e saudáveis: do corpo "pecado" ao corpo "prazer" e 8. Os ventos da moda ou as modas ao ventos. 

A terceira parte enfoca a própria vida em suas diferentes fases e as modificações sofridas ao longo desse tão pouco tempo, sobre os costumes. Vejamos os seis títulos finais: 1. A guerra das pílulas; 2. Meu filho, meu tesouro; 3. De teenagers e "aborrecentes"; 4. Casamentos: começo, meio e fim...; 5. Nas margens: "mulé pelada", bichas, travestis, "pisteiras" e outros e 6. O fim do filme..., que obviamente trata da morte.

A conclusão é um tanto pessimista. Houve realmente uma metabolização dessas transformações todas, ou prevalece a frase de Millôr Fernandes, lembrada pela autora na conclusões: "O Brasil tem um enorme passado pela frente".E o que dizer, se estendêssemos a data de análise até o presente ano de 2019, passando pelo golpe jurídico, midiático e parlamentar de 2016. Quantos fantasmas do passado não retornaram com surpreendente vitalidade.  Deixo a frase final do livro: "Sem conhecer essa história, que me perdoem economistas, jornalistas e institutos de pesquisa que gostam de fazer previsões, o presente segue embaçado e o futuro será mera adivinhação".

Esse passado pela frente, de que nos fala Millôr, é analisado no magnífico livro de Lilia Moritz Schwarcz, Sobre o autoritarismo brasileiro, onde busca as raízes de nossos problemas, a saber: escravidão e racismo; mandonismo; patrimonialismo; corrupção; desigualdade social; violência; raça e gênero; intolerância.

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