quarta-feira, 25 de março de 2020

Escravidão. Volume 1. Laurentino Gomes.

Devo inicialmente dizer que aprecio bastante os livros do Laurentino Gomes. Comprei, li e resenhei os seus livros 1808, 1822 e 1889. Por isso não tive dúvidas agora, em também comprar o seu livro Escravidão, Volume 1. - Do primeiro leilão de cativos em Portugal até a morte de Zumbi dos Palmares. O projeto prevê o lançamento de mais dois volumes, um em 2020 e outro 2021. Foram, como relata Laurentino, seis anos de pesquisas, incluindo viagens aos locais da escravidão, visita às bibliotecas e conversas com muitos historiadores.
O primeiro dos três livros de Laurentino Gomes sobre a escravidão.

O sub-título nos indica a delimitação deste primeiro volume. Das origens da escravidão feita pelos portugueses, até a morte de Zumbi dos Palmares. Aliás, se o livro for suscitar polêmica, será exatamente em função dos dois capítulos, um sobre Palmares e outro sobre Zumbi. São os capítulos 28 e 29.  Como percebem, o livro é volumoso, por conter tantos capítulos. Na verdade, são 30 ao todo. Este volume contém 479 páginas. Laurentino promete em torno de 1500 páginas para nos apresentar esta verdadeira chaga, possivelmente a maior da humanidade.

O livro entra em muitos detalhes, especialmente sobre a questão da captura dos negros na África, sobre os dois grandes entrepostos do comércio de cativos na África, a cidade de Luanda e a ilha de São Tomé, hoje São Tomé e Príncipe, sobre a captura e o transporte e também os maiores portos negreiros de recepção aqui na América. E também muitos números, números totalizadores, de mortos já no transporte inicial, na travessia e até a venda nos grandes leilões. Eu particularmente gostei mais dos capítulos que envolvem a questão dos holandeses, os de número 23 e 24. A invasão holandesa não envolveu apenas Pernambuco, mas também as colônias no Oriente (especiarias) e a África (pelo domínio do tráfico).

Mas vamos a uma sistematização da resenha. Os trinta capítulos. Antes ele dá uma linha do tempo, com as principais datas e fatos e uma introdução, um tanto longa, mostrando um panorama geral da escravidão ao longo de todos os tempos. Vamos aos capítulos. 1. A grande agonia: é um relato sobre a captura do escravo e a travessia do Atlântico. O capítulo tem uma epígrafe, retirada do Coração das trevas, de Joseph Conrad, "O horror! O horror!" 2. O leilão: É o relato do primeiro leilão em Lagos e versa também sobre as formas de comercialização dos cativos na Europa. 3. As origens. Versa sobre as origens e as finalidades da escravidão e a presença dela em todas as grandes obras do mundo.

4. Em nome de Alá. o relato é sobre a enorme expansão da escravidão sob os muçulmanos e sobre as suas práticas, como as contra os eunucos. 5. O Patrono. O patrono da escravidão é o infante Dom Henrique, o da escola de Sagres, sobre a qual existem dúvidas se de fato existiu. Mostra as primeiras navegações e os primeiros navegadores, todos cavaleiros de Cristo, os sucessores dos templários. 6. Mar infinito. Continua descrevendo as navegações e os conhecimentos náuticos que as tornaram possíveis. Entra também na história de Portugal, cristãos novos, inquisição e financiamento das expedições.

7. Terra dos papagaios. Os descobrimentos e o caráter secreto dos conhecimentos náuticos. A terra dos papagaios é uma referência ao descobrimento do Brasil. 8. O massacre. Um capítulo extraordinário, onde mostra os massacres indígenas praticados pelos bandeirantes. Aqui mais uma vez caberia a expressão de Conrad: "O horror!Oh horror" 9. A África. São mostrados os países e os povos africanos, rivalidades tribais e a grande fragmentação. 10. A cicatriz. Esta cicatriz é universal. Foi praticada por todos os povos. Trata da questão da participação dos africanos na captura para a escravização.Aborda também a questão atual da dívida social.

11. Reconciliação. Um chefe africano pede perdão pelo fato de que eles próprios contribuíram com a escravidão. 12. O laboratório. Trata das ilhas de Cabo Verde e de São Tomé, os grandes entrepostos, ou depósitos africanos do tráfico. 13. Ruínas de um sonho. Trata do desejo frustrado da europeização e cristianização do Congo. 14. Angola. O maior país fornecedor de escravos e a rota Luanda - Salvador, descrita pelo padre Antônio Viera, como uma rota de salvação. 15. O negócio. Tudo sobre o tráfico. Captura, venda, valores e moedas. 16. Os lucros do tráfico. Fala dos riscos e dos lucros auferidos com o negócio.

17. Os números. É um aprofundamento do capítulo anterior. Mostra os estudiosos do tema e os números. Tudo sobre a questão dos números. 18. O navio negreiro. Tudo sobre os embarques e as viagens e o tratamento dado. O navio era simultaneamente uma máquina de guerra, prisão móvel e uma fábrica. 19. A chegada. Mostra a transformação dos seres humanos em mercadorias atraentes, nos grandes portos de chegada e os castigos físicos, sempre aplicados. 20. O Brasil. É um relato sobre o trabalho no canavial e nos engenhos. 21. Visão do inferno. Uma referência às caldeiras, na descrição de Antonil.

22. A cruz e o chicote. Por óbvio, aborda a questão moral cristã diante da escravidão. A epígrafe sintetiza bem o tema: "Nunca consideramos este tráfico ilícito. Na América, todo escrúpulo é fora de propósito". A frase é de um padre jesuíta, reitor de um seminário em Luanda. 23. O Atlântico holandês. Já fiz referência. Trata da guerra que a Holanda declarou a Portugal, em Pernambuco, na África e no oriente. 24. A guerra pelos cativos. Ainda a guerra da Holanda pelo domínio africano, na busca pelos cativos. Aborda também os resultados desses conflitos.

25. O padre eterno. Trata-se do maior dos navios negreiros. 26. O destino de Catarina. Foi considerada a rainha da escravidão, rainha de Portugal e da Inglaterra. 27. O destino de Jinga. Esta já foi exaltada pelo seu poder e coragem posta a serviço da causa negra. 28. Palmares. É uma descrição do quilombo e as investidas de holandeses e portugueses, até a sua destruição pelo facínora  Domingos Jorge Velho. 29. Zumbi. Um capítulo bem polêmico. Fala do pouco conhecimento que se tem do personagem e de sua mistificação pelos historiadores Décio Freitas e Joel Rufino dos Santos e ainda o fato de ter sido apresentado como gay, por Luiz Mott. 30. Ouro! Ouro! Ouro!. É uma chamada para os dois próximos livros. Ainda falta a questão da mineração e da lavoura cafeeira.

Termino com uma frase do padre Antônio Vieira, que é mostrada na contracapa do livro: "O Brasil tem o seu corpo na América e sua alma na África".

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