segunda-feira, 14 de junho de 2021

Os Subterrâneos do Vaticano. André Gide. Nobel de Literatura - 1947.

Continuo na empreitada de ler os romances da coleção Os Imortais da Literatura Universal, da Abril Cultural, publicada ao longo os anos 1971-1972, anos em que eu iniciava as minhas atividades na profissão de professor. Na verdade, formado em filosofia no ano de 1968, em Viamão - RS, vim ao Paraná, para a cidade de Umuarama, onde iniciei os meus trabalhos no magistério, no ano de 1969. O dinheiro sempre fora escasso, mas não me impediu a compra desta maravilhosa coleção. Lia os livros, na medida das possibilidades do tempo. Sobraram muitos.

Os Subterrâneos do Vaticano. Abril. 1971. Tradução: Miroel Silveira e Isa Leal.

Agora foi a vez de ler André Gide, Nobel de Literatura, do ano de 1947. O livro foi Os Subterrâneos do Vaticano. O livro é interessante e mostra um narrador que te prende a atenção, mas, não creio que este livro esteja entre as principais obras do escritor. Ele é do ano de 1914. André Gide nasceu em Paris no ano de 1869 e, morreu, na mesma cidade, no ano de 1951. A sua vida foi sempre de angústias profundas e ela, a sua biografia, esta sim, daria uma bela obra prima. Em seu diário confessava: "Foi minha infância solitária e mal humorada que me fez o que sou". Mãe protestante e autoritária se complementaram com um colégio, igualmente protestante e autoritário. Ah! Os rigores da moral. Hipocrisia à vista.

Aos nove anos, lemos no livro de biografias que acompanha a coleção, foi flagrado num ato de masturbação e, mãe e educandário zelosos, lhe buscavam a "cura". Passou, continuamos lendo, pela experiência do casamento, com direito à impotência na noite de núpcias e, também, por experiências homossexuais. Temia o mesmo julgamento de Oscar Wilde. No mesmo livro ainda lemos: "Voltado pra si próprio, como Narciso, nascia um escritor". Ao final de sua vida, escritor já consagrado e laureado, partiu do individual para o social e do psicológico para o campo político. Foi então movido por preocupações existenciais e com um mundo de injustiças, provocadas pelo colonialismo francês.

O romance tem uma estrutura complexa e pouco linear na narrativa. Quem se dispuser a lê-lo pela temática apontada no título, Os subterrâneos do Vaticano, pode desistir. Quanto ao Vaticano e à temática religiosa, encontraremos uma quadrilha de "mil patas" que explora a boa fé de católicos fervorosos, empenhados na salvação do verdadeiro papa, que se encontraria preso no Vaticano, ou no Castelo Sant'Ângelo, construções que estariam interligados subterraneamente. Daí, provavelmente, o título. A quadrilha extorquia dinheiro dos fiéis para o empreendimento de uma cruzada libertadora do verdadeiro papa. Dá para perceber que se trata de uma obra de ficção. As intrigas teriam se dado entre os maçons e os padres jesuítas. Famílias nobres (Baraglioul) e um filho bastardo (Lafcádio) fazem parte da trama. Aliás, Lafcádio Wluiki, o filho bastardo do conde de Baraglioul, é o personagem principal do romance.

Da Wikipédia tomo uma síntese da trama: "Este livro, deliberadamente caótico cruza e opõe intrigas e personagens. Há desde o início as discussões de Julius de Baraglioul, ultra católico, e de seu cunhado, Anthime-Armand Dubois, pensador liberal, que sofrem uma cruzada, antes de retomar subitamente as suas opções originais. Há o grupo de terroristas, com seu chefe, o assustador Protos, que espalha o rumor segundo o qual o papa havia sido sequestrado e era mantido nos subterrâneos do Vaticano. E, sobretudo, há o jovem Lafcádio o qual, prisioneiro de sua mística do ato gratuito, com a mesma indiferença salva num dia a vida de uma jovem criança e, num outro, mata o pobre Amédée Fleurissoire sem qualquer motivo. Esta farsa satírica ilustra a loucura de alguns enfoques intelectuais, e o remorso final de Lafcádio, torturado pela  consciência de seu crime, mostra as consequências de seu ato".

No livro de biografias lemos o seguinte sobre este livro: "Lafcádio Wluiki é a personagem central de um novo Gide, cansado de um eterno vaivém dos sentimentos e angústias pessoais que até então marcara sua obra. Antítese dos indivíduos 'condicionados' pelo meio e pela educação, Lafcádio é completamente livre, desvinculado de laços familiares ou sociais. Filho bastardo de um conde diplomata e de uma prostituta, ele é um nobre entre os plebeus e um plebeu entre os nobres. A herança de seu pai garante-lhe uma vida sem profissão e sem classe. Lafcádio não tem religião, nem moral, nem compromisso definitivo com qualquer um dos sexos. Pode permitir-se aquilo que poucos - ou ninguém - ousariam levar a cabo: o ato gratuito. Assim sem motivo e sem interessar-se pelos efeitos, ele salva vidas, ele mata.

Por trás de uma elaborada intriga romanesca, o autor procura mostrar as possíveis consequências, na vida prática, de certos ideais sumários de liberdade. O 'ato gratuito', seja ele realizado sobre um indivíduo ou contra a autoridade constituída não leva à nada.

Num gênero literário que o próprio Gide classifica de sotie (relato satírico medieval), as personagens são loucas, ilógicas ou 'livres', segundo se queira. A Igreja católica e a Franco-Maçonaria aparecem envolvidas em fantásticas conspirações, onde predominam a imaginação e a ironia. Não se trata de uma crítica severa. O estilo é leve, despreocupado, quase casual, como a estória".

Outros livros do autor mereceriam certamente maior atenção, como A Sinfonia Pastoral, que relata a amizade entre o pedagogo e seu aluno, um relato biográfico e Teseu, uma obra impregnada pelo existencialismo. Por essas obras ele é mais reconhecido e, inclusive, laureado com um Nobel de Literatura..

2 comentários:

  1. Para mim o melhor livro do Gide é, O Imoralista

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  2. Muito obrigado, amigo, pela indicação. Já está devidamente anotado para a compra.

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