segunda-feira, 12 de junho de 2017

Memórias de uma viagem. De Dourados a Paranavaí.

Estando em Cascavel, aproveitei a oportunidade para ir até Dourados. Lá mora um dos meus grandes amigos, o Giovani Scholz. Ele tinha dois motivos especiais para comemorar., que eu queria compartilhar. A sua esposa, a Jayne, acabara de se formar no curso de pedagogia e o filho, Caio, terminara de defender a sua dissertação de mestrado na Unioeste, em Cascavel. A nossa amizade vem dos tempos de Umuarana, especialmente construída no CTG Querência da Amizade.

O reencontro foi maravilhoso e devidamente celebrado. A viagem entre Cascavel e Dourados foi num ônibus extremamente confortável, da linha Cascavel a Rio Branco. Três dias de viagem para quem cumpre o roteiro completo. Mas eu quero me reportar a viagem de volta. Uma viagem que percorreu alguns lugares do chamado Brasil profundo. A rota seria Durados a Paranavaí, onde me aguardava um outro compromisso. O ônibus saiu de Dourados as 7h30 e chegou ao destino as 18h00.  Pelo caminho havia um percurso de mais de cem quilômetros de estrada de chão e uma balsa para a travessia no rio Paraná. Me lembrei muito dos idos de 1969, quando eu chegava em Umuarama.
Travessia do rio Paraná.


A estrada de chão se situava entre as cidades de Naviraí (MS) e Querência do Norte (PR). As dez horas, em Naviraí, houve uma parada de 30 minutos para almoço, que eu não fiz. Me sobrou comer um pedaço de peixe frito, por ocasião da travessia de balsa, no rio Paraná, que por sinal, estava delicioso. Um incidente pitoresco pelo caminho. Um cervo à frente do ônibus. Por três vezes ele tentou sair da estrada pela direita, voltando para a pista para finalmente sair à esquerda, onde certamente estava o seu chão ou a sua morada. Correu enormes riscos, mas o motorista foi muito camarada. Todos merecem um chão para se sentirem seguros.

Mas a grande emoção da viagem estava reservada para Querência do Norte. Ali, em 1990 eu e o Osni Santana, de Umuarama fomos convidados para celebrar, no acampamento dos Sem Terra, a sua primeira festa da colheita. Foi um acontecimento único em minha vida. As lembranças desta festa se avivaram, aflorando à memória, especialmente o sermão que o padre fez, passando-lhes um verdadeiro "sermão". Vou tentar reproduzi-lo.

Hoje estamos em festa e temos o que celebrar e temos convidados especiais. Mas isso não me impede de fazer uma grave advertência. Eu conheci vocês, quando vocês estavam acampados em beira de estrada. Quando vocês tinham coragem de repartir a comida guardada para amanhã, com aqueles que não tinham o que comer no dia de hoje, confiando na Providência. Hoje vocês já estão assentados e fazendo a primeira colheita e em breve terão o pedaço de terra de vocês e isto já se torna motivo para brigas. Nunca esquecerei este sermão.
O majestoso rio Paraná.

Voltei outras vezes a este acampamento e reencontrei alguns dos assentados em movimentos em Curitiba. Depois perdi o contato. Me lembro especialmente de uma visita em que haveria um protesto na cidade contra uma juíza da comarca, que na ocasião estava sediada em Loanda. Ela era uma implacável perseguidora do movimento. Lembro também que os trabalhos eram organizados em cooperativa, que inclusive providenciava para que a agricultura praticada seguisse modernas técnicas para garantir a produtividade. O assentamento reaqueceu o comércio da cidade. E em meio a estas lembranças cheguei ao destino.

Em Paranavaí chovia e fazia frio. Uma rodoviária aberta. Foi difícil encontrar um canto para me abrigar, enquanto aguardava a chegada dos companheiros desta viagem. Uma menina muito linda e gentil me acolheu, inclusive não me vendendo um salgado, de duvidosa qualidade.  Para fazer um tempo li. Li Agamben. Estado de exceção. Fui abordado por um bêbado. O senhor deve ser uma pessoa muito distinta por estar lendo na rodoviária. Assim o tempo passou rápido. O Grêmio começou a fazer gols contra a Chapecoense e os companheiros logo chegaram. Um dia absolutamente fora da rotina do cotidiano.

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