terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Missões Jesuíticas no Brasil. São Miguel Arcanjo.


As atividades missionárias dos padres jesuítas foram chamadas de reduções ou missões. A redução, segundo Eduardo Neumann, em seu livro O Trabalho Guarani Missioneiro no Rio da Prata Colonial, tem o significado de "reduzir, diminuir - ou ainda no sentido missionário de reconduzir a um local era facilmente compreendida de modo pejorativo. Sem dúvida o princípio geral da redução foi o de congregar em povoados várias parcialidades indígenas. A redução foi a maneira (método) de empreender a Missão". Estes 'aldeamentos' ou 'redutos' tinham em média, entre três e sete mil habitantes.
Um por de sol em São Borja, a primeira redução dos sete povos das missões.

Na redução se formavam os chamados cabildos, que nos dão a ideia atual do município. Sua organização era a mais autônoma possível. Dois ou três padres orientavam e supervisionavam os trabalhos. As missões representaram um salto cultural e organizacional extraordinário. Além da conquista espiritual a defesa contra o ataque dos bandeirantes era o outro grande motivo deste empreendimento que somou fé, socialismo e utopia. Pode-se dizer que havia respeito às diferenças culturais, o que proporcionou grande enriquecimento cultural. Os guaranis eram muito habilidosos e dotados de extrema musicalidade. A região, ainda hoje é terra de músicos.
As imponentes ruína de São Miguel. Patrimônio da Humanidade.

No Brasil, e especificamente no Rio Grande do Sul, houve sete povos, ou sete reduções. A saber: São Nicolau do Piratini, São Francisco de Borja, São Luiz Gonzaga, São Miguel Arcanjo, São Lourenço Mártir, São João Batista e Santo Ângelo Custódio. Ruínas conservadas existem apenas em São Miguel. Elas integram o Patrimônio da Humanidade. São Miguel é também a que tem melhor infraestrutura turística, entre todas as missões, incluindo as do Paraguai e da Argentina.

A preocupação com a preservação começou nos anos 1940 e contou com os trabalhos do arquiteto Lúcio Costa. Na entrada você é convidado a assistir um vídeo que foi muito bem produzido. Logo na entrada da praça está o museu que tem um belo acervo de imagens barrocas, extremamente bem conservadas, como também diferentes utensílios, que nos dão uma mostra da habilidade dos artesãos guaranis. A praça e a igreja são enormes e impressionam. Encontramos aí também o campanário mais bem conservado. Chama atenção a sua imponência. À noite é oferecido um espetáculo de som e de luzes. Não permanecemos para assisti-lo.
A cruz de Lorena. Dois braços. Fé em dobro.

Também chama a atenção, tanto em São Miguel, quanto em toda a região missioneira a existência da cruz de Lorena, que tem como principal característica os seus dois braços, que simbolizam a fé em dobro. Existem lojas de artesanato, retratando as ruínas e a famosa cruz. Numa das lojas existe também uma livraria temática, que creio eu, possui para a venda algo em torno de 20 diferentes títulos. Você encontra aí livros que dificilmente são encontrados nas livrarias tradicionais. Também os descendentes guaranis estão por aí para vender o seu artesanato. E para revigorar os ânimos, você também encontra a Seiva Missioneira, uma cachaça produzida na cidade que leva o nome da maior das batalhas da guerra guaranítica, Caibaté.
Ainda a imponência das ruínas de São Miguel.


O sonho foi grande. Um dos maiores já sonhados. Mas veio a decadência. Vários são os fatores. Aqui no Brasil o grande motivo foi o Tratado de Madri de 1750, quando se trocou a portuguesa colônia do Sacramento pelos espanhois sete povos das missões. As populações guaranis se rebelaram, originando as guerras guaraníticas com direito a heroi e meio santo, Sepé Tiaraju, ou simplesmente São Sepé. No caso das missões na Argentina e no Paraguai, o principal fator foi a expulsão dos jesuítas. Eles e as suas experiências foram como que amaldiçoadas por todos. Os jesuítas foram expulsos dos territórios portugueses em 1759 e dos espanhois em 1767. Em 1773 a ordem foi extinta pelo papa e refundada em 1814. Muita história a ser investigada. teria sido em função de um projeto socialista de poder?

O projeto de economia coletiva e de relativa autonomia política foi destruído. Franciscanos e beneditinos substituíram os jesuítas. A lógica da dominação colonialista total foi restabelecida e os índios não se submeteram. O avanço do latifúndio os desquerenciou. Foram trabalhar como peões e por meio de cantos e pajeadas lamentam o seu triste, porém, altivo destino. O orgulho guarani missioneiro persiste. As desventuras da posse da terra e da exclusão social estão nos cantos de Cenair Maicá e de Noel Guarany e nas pajeadas de Jayme Caetano Braun, que já se foram e presentes também, nas vozes que ainda ecoam fortes, e que, em tudo o que cantam ecoam as vozes das missões, como as de Pedro Ortaça e de Jorge Guedes.
Pedro Ortaça. De guerreiro guarani a payador missioneiro.


O canto é um lamento daquilo que já existiu e que poderia continuar existindo, mas o ser humano continua um especialista em provocar sofrimentos para todos, indistintamente. Termino com uma frase do meu amigo Valdemar: Com as reduções ampliamos os nossos conhecimentos. Acrescentaria que também aumentou o desejo de uma maior justiça social e de maior sentimento de humanidade. Ainda aproveito para registrar o agradecimento ao Adilson e ao Valdemar, grandes companheiros desta magnífica empreitada. A sede de saber foi a melhor companhia que tivemos nesta viagem.

Deixo ainda a mensagem de um folheto do Ministério do Turismo: "Conheça a Rota das Missões. Aqui você encontra o local da realização da utopia do Cristianismo - A Terra sem Males. São atrativos ligados a história, a religião, a antropologia, a arqueologia, a culinária, aos espetáculos, as caminhadas e muito mais. Tudo em perfeita harmonia com a natureza e a cultura dos diversos povos que compõe o espaço, como os Guarani, os alemães, os poloneses e italianos compondo o tradicional gaúcho missioneiro". Segue o link da música missioneira de Pedro Ortaça.

https://www.youtube.com/watch?v=DnLtgOcBxIU





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