quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Trumbo. Lista Negra. Hollywood e o Macarthismo no Cinema.

O Século XX foi o século das grandes guerras. Guerras imperialistas, diga-se logo. Guerras sangrentas, acrescente-se. Capacidade de destruição levada à perfeição com o uso da bomba atômica, quando a guerra já estava definida. Crueldade humana inimaginável e inacreditável nos campos de concentração nazistas. E depois disso, o mundo melhorou?  Sempre lembro e relembro de Adorno em seu clássico texto Educação após Auschwitz: "A exigência que Auschwitz não se repita é a primeira de todas para a educação". O que efetivamente aconteceu?


A aliança nazi-fascista protagonizou o impossível. A união entre capitalistas e comunistas para a derrubada de um monstro. Esta união nunca foi assimilada ou metabolizada pela extrema direita americana. No entanto, ela foi extremamente necessária para a derrota de Hitler. Se as chamadas forças ocidentais não estivessem totalmente exauridas a guerra teria tido continuidade, pois, o inimigo maior ainda precisaria ser derrotado: o comunismo soviético.

O fim da guerra marcou o início de outra, talvez pior do que a real; a chamada guerra fria, marcada pela bipolaridade do mundo. Duas potências econômicas dividiriam entre si o mundo e sobre ele manteriam uma vigilância sem precedentes, tanto em seus territórios, quanto sobre os do adversário. Vigilância ou espionagem? Ou intervenções diretas mesmo? Afinal de contas, quem não se lembra dos tempos da Ideologia da Segurança Nacional? Nenhuma ideologia triunfa se não tiver um inimigo forte a combater. 


E na terra das proclamadas liberdades, o que acontecia? Uma verdadeira caça às bruxas. Esta caça às bruxas ganhou um nome. Macarthismo. O Macarthismo via tantos inimigos comunistas, quanto os cristãos veem demônios. No Congresso americano foi criado um Comitê de Atividades Antiamericanas. Este comitê foi um tormento para toda a inteligência do país. Liberdade de criação, imaginação fecunda e o uso da inteligência, eram atividades não toleradas. Toda a efervescência  cultural era suspeita. Universidades, o mundo da literatura e do jornalismo e, em especial, o cinema eram os moinhos propagadores dos ventos da agitação e da subversão comunista. Em Hollywood se formou uma lista negra, a lista que dá título ao filme. Os roteiristas eram os alvos preferidos. Entre eles, um da lista dos dez, era Dalton Trumbo. Chaplin, por ser inglês, foi expulso do país.


Na época era muito comum os intelectuais serem comunistas. As guerras imperialistas desgastavam o capitalismo e a participação decisiva do socialismo soviético na derrota de Hitler só fizeram por crescer a convicção de que o comunismo representava uma alternativa para o mundo. As decepções vieram mais tarde, especialmente, a partir de 1956, com a realização do XXº PCUs. Dalton Trumbo era um desses intelectuais. Trumbo era um dos mais renomados roteiristas de Hollywood. Entrou na lista proibida, por não entregar os companheiros para o tal do Comitê do Congresso. Seu crime? Nunca delatou ninguém, além de ser comunista, é óbvio. Dois crimes bárbaros.

As perseguições logo se fizeram sentir. Nenhum diretor poderia contratá-lo. Boicote total. Como só sobraram os roteiristas de segunda linha, o cinema começou a decair. A solução foi contratá-los sob o artifício do uso de nomes falsos. Mas vieram as premiações e o problema da entrega dos troféus. Nessas condições Trumbo recebeu prêmios por A Princesa e o Plebeu e por Arenas Sangrentas. Mas as dificuldades foram crescendo. Dramas familiares, relação com a mulher e os filhos, além da questão financeira e da própria prisão.

Como não há mal que dure para sempre, também os Estados Unidos superaram este seu mundo de trevas, pela atenuação das perseguições e, talvez mais, pela ação decisiva de diretores e produtores em favor do restabelecimento da liberdade de criação no mundo do cinema. Assim Otto Preminger não o escondeu como o roteirista de Exodus, um monumental sucesso de bilheteria. e o mesmo aconteceu com Spartacus, filme que teve a atuação e a produção executiva de Kirk Douglas e a direção de Stanley Kubrick. Kirk Douglas ignorou protestos e proibições e, assim, muito contribuiu para o sepultamento da tal da lista negra..


O filme também dá destaque a uma homenagem que ele recebeu em 1970, do sindicato dos roteiristas, numa espécie de desagravo. Nesta homenagem faz um belo discurso, mostrado ao final do filme, destacando que "Quando você olha para trás, com curiosidade em relação àquele período sombrio, não é bom procurar vilões, herois, santos ou demônios, porque não há; há apenas vítimas". Efetivamente, há apenas vítimas. O grande mérito do filme está, no entanto, em mostrar este período nebuloso e nos fazer ver, que sob o domínio do capital, a liberdade é uma espécie de recreio vigiado das crianças. Se cometerem deslizes, haverá castigo.

O filme também recebeu muitas críticas, entre elas a de ser propaganda comunista. Em tempos de ódios acirrados estas coisas acontecem. Isso pode ser visto, agora, na campanha presidencial dos Estados Unidos. Os republicanos estão na disputa para ver quem é o mais conservador para disputar o posto de presidente da República. Conservador é um termo muito generoso. O mesmo fenômeno de ódio pode ser visto também aqui no Brasil, quando Bolsonaros se transformam em opção eleitoral. Pasmem! A história de ódio está se repetindo. O filme é importante contribuição para que isso não se repita. O filme tem uma indicação a Oscar. Bryan  Cranston concorre ao prêmio de melhor ator. Simplesmente imperdível.






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