quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Os fundadores do pensamento liberal. 4. John Stuart Mill.

Com este post termino a série de quatro, sobre os fundadores do pensamento liberal. A referência mais uma vez é John Dewey e o seu livro Liberalismo, liberdade e cultura, em seu primeiro capítulo que versa sobre a história do liberalismo. Lembrando que nos posts anteriores abordamos John Locke, Adam Smith e Jeremy Bentham. O que John Stuart Mill efetivamente acrescentou ao pensamento liberal para ser incluído entre os seus fundadores?
O clássico de 1935, de John Dewey.

Mill já pertence a um outro cenário histórico que o de seus antecessores. O seu nascimento ocorre em 1806 e a sua morte em 1873. Neste cenário ele observará o alastramento das revoluções burguesas, a evolução da produção industrial e o surgimento de novas visões de mundo sobre a realidade e os resultados provocados pela nova ordem mundial. Já em meados do século XIX, o seu século, o capitalismo sofre as suas grandes críticas e as suas mazelas ganham vivas cores em sua descrição. A filosofia e a literatura romântica observam a insuficiência da racionalidade e de sua fria lógica utilitária e instrumental. Os românticos o influenciam profundamente. Vejamos Dewey falando a respeito.

"A carreira intelectual de John Stuart Mill foi uma luta valente, embora insucedida, para reconciliar as doutrinas, que recebera quase desde a infância de seu pai, e o sentimento de vazio que elas lhe davam, quando comparadas com os valores da poesia, das instituições históricas duradouras e da vida interior retratada pelos românticos". Isso o tornou um homem sensível ante a realidade, que assim via e descrevia. "Agudamente sensível à brutalidade da vida em torno dele e ao seu baixo nível intelectual, percebia a coincidência entre esses dois traços". Assim chegou a preconizar a chegada de um tempo, é Mill falando,"em que a divisão do trabalho (...) seria feita de acordo com um reconhecido princípio de justiça". Antes, o mérito individual se sobrepunha à justiça.
John Stuart Mill. Grandes modificações no pensamento liberal.

Como podem observar, uma profunda mudança no interior do pensamento liberal. Vejamos mais. "Afirmou que as instituições existentes eram apenas provisórias, e que as 'leis' que governam a distribuição da riqueza não eram sociais, mas arranjos do homem, que ao homem cabia alterar". Uma guinada muito forte. Para a política cabe a tarefa de: - 'ao homem cabe alterar' -, que marca a precedência do político sobre o econômico. As leis já não seriam naturais. Passaria a ser uma construção humana e histórica e com finalidades determinadas pelo humano e pelo social. Vejamos: "O único fim pelo qual a humanidade, individual e coletivamente considerada, tem o direito de interferir na liberdade de ação de qualquer pessoa é o da própria proteção". Observem a presença da palavra interferir - para proteger

Mill e outros pensadores já defendem explicitamente que o todo social é a condição primordial para o desenvolvimento de todas as capacidades dos indivíduos. Também a ideia do bem comum começa a aparecer fortemente. "Somente pela participação comum e partilhando do propósito comum em seu trabalho para o bem comum, podem os seres humanos individuais realizar suas próprias individualidades e se tornarem verdadeiramente livres. O Estado é apenas um órgão entre muitos do Espírito e da Vontade que mantém todas as coisas unidas e torna os seres humanos membros um do outro". É a força de valores éticos e morais se impondo aos princípios do mercado.
Este livro fez parte de meus estudos de mestrado na PUC/SP.

Estes novos liberais ampliam o leque das funções do Estado. "Negativamente, sua tarefa é a de remover os obstáculos que estão no caminho dos indivíduos em busca da consciência de si mesmos e do que são; positivamente, é a de promover a causa da educação pública". Dewey continua a caracterizar este novo Estado em suas funções positivas. "Esses novos liberais nutriam a ideia de que o Estado tem a responsabilidade da criação de instituições, pelas quais os indivíduos possam efetivamente realizar as potencialidades de que são portadores". E isso é inimaginável sem a educação e sem a saúde públicas.

Dewey aponta para as contradições entre os pensadores fundadores, e agora os novos, provocaram no interior do liberalismo. "Devido a essa divisão interna do liberalismo, a sua recente história é hesitante e confusa". Lembramos que o livro foi escrito em 1935. O autor termina o capítulo afirmando que diante das crises desse período o liberalismo do primeiro período ressurgirá como "uma compacta força agressiva". O que são os tempos do chamado neoliberalismo? Dewey não viu esta realidade mas parecia antevê-la em sua violência.
Frase de extrema atualidade. Mill foi um inovador.

Stuart Mill é considerado o precursor do que se chamou de neo capitalismo, social democracia ou ainda, o Estado de bem-estar social. Este movimento ganhou teóricos e práticos. Entre os práticos deve ser estudada a unificação alemã, sob o governo de Bismarck, e entre os teóricos se destacarão John Maynard Keynes e o Lord Beveridge. A social democracia terá grande força após a Segunda Grande Guerra e os neoliberais, ao final dos anos 1970 e, especialmente ao longo dos anos 1980. Atingem a América latina nos anos 1990 e sofrerão uma reversão na entrada do novo século, especialmente na América latina. Mas isso já é outra história. Isso é todo um programa de ciência política.

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