terça-feira, 18 de julho de 2017

ABC de José Lins do Rego. Bernardo Borges Buarque de Holanda.


Que livro maravilhoso. Confesso que superou todas as minhas expectativas. Este é mais um dos livros de feira de ponta de estoque. O autor demonstra profundo conhecimento da obra de José Lins do Rego e o situa muito bem dentro do contexto da literatura brasileira. Estou falando de ABC de José Lins do Rego, escrito pelo professor da FGV, Rio de Janeiro, Bernardo Borges Buarque de Holanda. O livro é da Editora José Olympio, a editora responsável pela obra do grande escritor paraibano e brasileiro.
De A a Z, a vida do grande escritor. Um trabalho criterioso.

No nordeste os ABCs são bastante conhecidos, especialmente, através da literatura de cordel. Talvez seja a razão do autor ter escolhido esta forma para apresentar o intrigante escritor, que somou em sua literatura o cronista, o memorialista e o romancista de tamanha envergadura. Este monumental escrito passou pelos ciclos da cana de açúcar (do engenho às usinas), pelo misticismo, pelo cangaço e pela seca.  O autor escreveu, de cada uma das 26 letras do alfabeto, uma palavra para destacar a vida e a obra do autor de Fogo Morto, sua obra prima. Vou dar as palavras.

O A somente se poderia referir ao açúcar, a grande razão de ser de toda a obra. O B remete a Babu, o avô do Menino do Engenho. O C se refere a Corredor, nome do engenho onde o menino passou os seus oito primeiros anos de vida. O D lembra o Colégio Diocesano, onde aos oito o Doidinho foi estudar. Considerou o colégio como um reformatório. Doidinho é um dos grandes romances de formação da literatura brasileira. Isto foi em Itabaiana e logo depois na capital.

O E remete à escola de Recife, de onde sai como bacharel em Direito. O F manda para o seu grande livro Fogo Morto e a uma bela descrição de seus personagens. O G o relaciona com Gilberto Freyre, seu grande amigo, influenciador e com o qual estabelece uma visão positiva de interpretação de Brasil. O H lembra as Histórias da velha Totônia, que tanto lhe incendiaram a imaginação em sua infância. São os contos das criadas da casa que tanto bem fizeram ao menino. O I é de Ita, a embarcação que fez o escritor andar pelas capitais literárias do nordeste, Recife, João Pessoa e Maceió e depois o levou ao Rio de Janeiro. Era o principal instrumento de locomoção no litoral brasileiro.

O J é do importante livreiro e amigo José Olympio. Um dos homens a quem mais a literatura brasileira deve, pelos seus estímulos e pela edição de seus livros. Era um lugar de fervo cultural, pois, junto a editora havia também a livraria. O K é de Keynes. Sim, o economista inglês a favor da intervenção no mercado o influenciou e o ajudou a compreender os cenários das crises decorrentes de 1929. O L é de Leônidas, o craque brasileiro que o levou ao fanatismo no futebol e a promoção da beleza da mistura das raças. O M é de Memória e imaginação. De novo somos levadas à infância do menino e ao que se avivou em sua memória e o que foi a ela acrescido pela imaginação. O N é de Naná, Philemena Massa, a companheira de toda a sua vida. 

O O é de opulência e o seu trágico fim com a decadência. É o tema de sua literatura, o açúcar. Dos engenhos às usinas e as transmutações que foram provocadas, econômicas e sociais. O P volta ao futebol, a imensa Paixão pelo Flamengo, de quem foi até dirigente. O Q é de Quixote, o famoso terceiro personagem de Fogo Morto, o Capitão Vitorino Carneiro da Cunha, o Papa-Rabo. O R é de Região e tradição, ou seja, do romance regional ao homem universal. O S remete ao Sertanejo forte, o tema de sua obra que remete inclusive para a questão dos cangaceiros. O T é de Tradução e adaptação, onde é mostrada a abrangência mundial da obra do escritor.

O U é de Usinas e engenhos, de novo, a razão maior de ser de toda a obra. Este tópico é entremeado com um belo álbum de fotografias. A letra V remete ao Viandante. Ele viajou basicamente pelo por três razões. Por questões diplomáticas, como dirigente de futebol e a turismo. Deixou tudo registrado. O W remete a Western Raylroad Company, ou ao trem que esteve sempre presente em sua vida, especialmente nos anos de sua infância. O X remete às xilogravuras que ilustram a sua obra. O Y, ou ipsilone, nos remete à liberdade de criação, com uma beleza de frase: "Os grandes escritores têm a sua língua; os medíocres a sua gramática. Já o Z final nos remete as Zelinianas, onde é mostrado o seu ingresso na Academia Brasileira de Letras, quando em discurso fora de praxe  desancou as qualidade de seus antecessor.

Ao final, um pequeno lamento. Depois de 292 páginas acabaram as letras do ABC de José Lins do Rego. Uma obra simplesmente magistral.

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