sexta-feira, 3 de maio de 2013

Higiene e Fisiologia no casamento. Um manual para relações sexuais.

Ler bons livros sempre é uma ato muito prazeroso. Não consigo compreender como ele é tão pouco praticado no Brasil. Pelo ato da leitura ampliamos a nossa visão de mundo, construindo e reconstruindo esta visão, de acordo com a diversidade de contatos que vamos estabelecendo. Além de ato prazeroso, é, muitas vezes, muito divertido.
O livro de Mary del Priore. O Castelo de Papel. Uma história de Isabel de Bragança, princesa imperial do Brasil e Gastão de Orleans, conde d'Eu. Da Rocco.

Terminei de ler O Castelo de papel - uma história de Isabel de Bragança, princesa imperial do Brasil e Gastão de Orleans, conde d'Eu, de Mary del Priore, da Rocco. Comprei o livro para ter uma contextualização da época. Mais precisamente a segunda metade do século XIX. Um período extremamente agitado na conjuntura mundial. Queda de monarquias, avanço de regimes republicanos e, sob pressão dos trabalhadores, já sob a luz das teorias marxistas, o avanço na afirmação dos direitos sociais. Enquanto isso, por aqui, guerreávamos com o Paraguai, insistíamos na manutenção de um regime escravista e, finalmente, se apeou do poder uma dinastia familiar pouco afeita ao ato de governar.

"Dou graças a Deus", dizia Isabel, "que meu pai se sinta com forças para governar e arrede de mim essa grande responsabilidade". A disputa entre D. Pedro II e a filha Isabel era a de quem permaneceria por mais tempo na Europa e não a de governar, ficando por aqui. Enquanto D. Pedro II morria lentamente, Isabel se ocupava basicamente da religião, em que "fé e histeria andavam lado a lado", como afirma Priore. Enquanto isso, os problemas brasileiros simplesmente eram, sistematicamente, adiados. Como é triste ter pessoas arraigadas ao poder, mas sem a mínima vontade de governar. Isabel queria resolver todos os problemas, especialmente o da escravidão pela caridade, promovendo festas e bailes para arrecadar fundos para a compra da liberdade de alguns escravos, enquanto que por lei poderia libertar a todos. Como é interessante refletir sobre esta tal da caridade!

Isabel e Gastão viveram bem, segundo as pesquisas de Priore. O mesmo já não se podia dizer da relação entre Gastão e o sogro. Gastão não era café pequeno pela sua origem, mas a sua família estava em queda livre, com os episódios de 1848. Luís Felipe, o rei destituído da França, era o seu avô. Não havia mais espaço para ele na Europa. Aqui no Brasil, recebeu a missão de finalizar a guerra contra o Paraguai, depois que o duque de Caxias abdicou desta missão. Depois disso D. Pedro II, não lhe deu maiores chances.

O maior tempo do casal era dedicado à religião. Isabel simplesmente era considerada uma beata. A igreja católica, por sua vez, também enfrentava graves problemas com a chamada modernidade. Pio IX decretou, inclusive, a infalibilidade do papa, ou melhor, a sua auto infalibilidade, para melhor enfrentar a crise. Surgiram doutrinas que se afrontavam com o catolicismo. Aqui houve a chamada questão religiosa, um confronto da monarquia católica com a maçonaria, que tinha muita presença no poder. Abrem-se fendas no poder.

Mas, como falei acima, as leituras também nos oferecem coisas divertidas. Até nem sei se são tão divertidas, pois, coisas reprimidas tornam-se perigosas. Mary del Priore, que dedica muitos de seus estudos às questões femininas nos dá um panorama das relações sexuais da época. A igreja exercia influência sobre elas, até dentro do casamento, e, para isso, tinha a medicina como aliada. É sabido que Isabel e Gastão tiveram problemas de fertilidade. Não gerarem herdeiro gerava um problema de Estado. E dê-lhe tratamentos na Europa, até o problema ser resolvido. Mas vamos a parte divertida.
Isabel de Bragança. Uma beata.

Numa das viagens para a Europa o casal consultou especialistas e receberam, como tratamento, a prescrição de irem a Bagnères-de-Luchon, nos Pirineus, onde brotavam 48 fontes de águas sulfúreas, quando exames mais íntimos eram vistos como indecorosos, especialmente no Brasil. Mas... havia evoluções. Havia, segundo Priore, "A Pequena Bíblia dos jovens esposos, a ser lida depois de rezar algumas ave-marias". Esta pequena bíblia era pródiga em conselhos proposições e prescrições. Vejamos algumas:

"O alvo do casamento era a perpetuação da espécie, que deveria realizar-se evitando ao máximo o prazer dos sentidos. Os cristãos tinham que se adaptar à lei da Igreja: casar-se era adestrar a castidade. A esposa estéril era considerada um ser incompleto que jamais deveria provar o gosto da conjugalidade. Mas havia outros detalhes. Nada de aparecer de boné na hora de deitar: isso podia ridicularizar o homem. Tampouco, encher a cabeça com ideias que levassem à "excitação cerebral". Quanto ás mulheres, era sempre bom combinar o papel de parede do quarto com a cor dos cabelos. Para os maridos "exaustos", dietas à base de quinino, vinho Madeira e leite de cabra fresco. Para elas, banhos, águas e tudo o mais que remetesse à umidade do útero. O que acontecia na cama? Carícias eram permitidas? Em que posições fazia-se amor? Fazia-se muito ou pouco"? Mas as recomendações maiores eram para o momento da concepção, pois, dele dependia o futuro da criança, seu sexo, sua força e a sua inteligência. Por isso nada poderia ser deixado ao acaso. Vejamos as recomendações:

"O coito deveria ser rápido, limpo, eficaz. Acabado, a esposa devia manter-se em more canino - posição do cão - por vinte minutos. Depois deitar-se lentamente, contraindo as nádegas, recomendava o best-seller
Higiene e fisiologia do casamento". Ao que parece a ciência e a religião caminhavam juntas!

Bem, sem comentários. Isto se encontra à página 146 do livro. Só espero que eu não tenha inspirado fantasias com esta leitura divertidíssima.




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