quinta-feira, 11 de maio de 2023

Um enigma chamado Brasil. 29 intérpretes e um país. 19. Antônio Cândido.

Continuo hoje mais um trabalho referente aos intérpretes do Brasil. Desta vez o livro referência é Um enigma chamado Brasil - 29 intérpretes e um país. O livro é organizado por André Botelho e Lilia Moritz Schwarcz. É um lançamento da Companhia das Letras do ano de 2009. A edição que usarei é de 2013. Quem são os personagem trabalhados? Os organizadores respondem: "Os teóricos do racismo científico e seus críticos na Primeira República; modernistas de 1920 e ensaístas clássicos dos anos 1930; a geração pioneira dos cientistas sociais profissionais e seus primeiros discípulos". A abordagem sempre será feita por algum especialista. O livro tem uma frase em epígrafe/advertência. O Brasil não é para principiantes, de Antônio Carlos Jobim.

Um enigma chamado Brasil. 29 intérpretes e um país.

A décima nona resenha do livro sob análise nos põe em contato com o pensamento e a obra de Antônio Cândido. Ele nos é apresentado por Luiz Carlos Jackson, professor do Departamento de Sociologia da Universidade de São Pulo (USP), num trabalho sob o título Antônio Cândido: crítica e sociologia da literatura. Inicialmente vamos à pequena biografia, contida ao final do livro:

"Nasce no Rio de Janeiro em 1918. Gradua-se em ciências sociais (1941), torna-se livre-docente em literatura brasileira (1945) e doutor em ciências (1954) pela Universidade de São Paulo (USP). É um dos fundadores e redator-chefe da revista Clima (1941). Torna-se assistente da cátedra de Sociologia II da USP (1942-58). Leciona na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Assis (1958-61), na Universidade de Paris (1964-6) e na Universidade de Yale (1968). É nomeado professor da área de Teoria Literária e Literatura Comparada da USP (1960). Em 1974, torna-se professor titular. Coordena o Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas (1976-8). É um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (1980). Assina, entre outros, Formação da literatura brasileira (1959) e Os parceiros do Rio Bonito (1964)".

Jackson inicia a resenha, falando do autor e dos múltiplos temas abordados para, posteriormente, se concentrar nos dois universos presentes em seus dois principais livros: a sociologia em Os parceiros do Rio Bonito (1964) e a Literatura em Formação da literatura brasileira - momentos decisivos (1959). Como outros sociólogos, também se distanciou da teoria para, da sociologia, obter fins práticos. Queria a transformação da sociedade. No primeiro livro fala do pequeno proprietário de terras, o nosso caboclo, para ver sua realidade e a vê com um certo pessimismo. O livro resultou de seu doutoramento. 

Formação da Literatura brasileira tem uma outra história. Ele é a reação a uma não aprovação para uma cátedra na USP e uma encomenda do editor. A segunda parte do título dá a essência do livro, os momentos decisivos: o início com o arcadismo, no século XVIII, no período do ouro em Minas Gerais e a sua transição para o romantismo. O grande foco é a constituição de uma literatura que se distancia do colonialismo para adquirir autonomia, voos próprios. Isso ocorre com o romantismo, movimento que se atem a temas nacionais muito próprios. A autonomia vem, de fato, com Machado de Assis, que marca outro movimento fundamental, a passagem dos temas nacionais para a abordagem do universal. 

Outro fator notável presente em seu livro é a dimensão histórica e social de nossa literatura. Vejamos uma parte da resenha: "A literatura é definida nesse momento como 'um sistema de obras ligadas a denominadores comuns'. A configuração progressiva do sistema dependeria ainda da existência de uma tradição intelectual lentamente constituída e continuamente alterada. Em seu esquema, as obras figuram em primeiro plano, completando os vértices do triângulo, os 'denominadores comuns', autores e público".

À sua entrada na USP, como professor de Teoria Literária e Literatura Comparada, em 1961, se deve um aprimoramento intelectual intenso, pelo contato mantido com os professores franceses que ainda atuavam na Universidade. Fez da Universidade um dos locais de encontro da intelectualidade paulista. É desse período o início de uma militância política maior e o seu casamento com Gilda de Mello e Souza, que irá unir dois intelectuais de primeira grandeza. Em 1956 ele cria o Suplemento Literário do jornal O Estado de São Paulo.

A literatura brasileira ganhou um impacto positivo com os estímulos do mercado editorial, que tanto promoveu a literatura do romance, quanto o do ensaio político. O romance, que crescia em nível mundial, com autores como Dumas, Balzac, Stendhal, entre outros, também aqui teve grande desenvolvimento com a publicação de uma literatura mais acessível. As transformações do século XIX passaram a ser o cenário onde os autores e seus personagens atuavam. Entre os grandes nomes nossos são citados, Joaquim Manuel de Macedo, Manuel Antônio de Almeida, José de Alencar e Machado de Assis.

Vejamos, na palavra do resenhista, o teor da parte final de seu livro: "O último capítulo da Formação avalia o desenvolvimento da crítica literária no romantismo, tanto para explicitar a direção assumida pela literatura brasileira do século XIX, como para examinar mais uma direção aberta pelo processo de diferenciação de nossa vida intelectual. Não por acaso, os dois parágrafos finais do livro citam e comentam o artigo 'Instinto de nacionalidade', de Machado de Assis, deixando entrever duas convicções de Antônio Cândido, ambas relacionadas a esse autor. O escritor e também a sua superação. Em outros termos, seria o melhor argumento contra o nacionalismo literário que o construíra, aproximando-se de uma visão universalista a respeito da literatura".

Antônio Cândido mantém intensa atividade intelectual e militância política, até o final de sua longa vida. Em 1980 participa da fundação do Partido dos Trabalhadores e jamais irá abdicar de suas convicções em torno do socialismo democrático. Veio a falecer, em São Paulo, no ano de 2017. Noventa e nove anos de uma vida extremamente intensa. Devo confessar a minha grande admiração a ele devotada.

Deixo um trabalho anterior, a partir de Um banquete no trópico.

http://www.blogdopedroeloi.com.br/2022/07/um-banquete-no-tropico17-formacao-da.html

E como de hábito, o trabalho anterior, sobre Oracy Nogueira.

http://www.blogdopedroeloi.com.br/2023/05/um-enigma-chamado-brasil-29-interpretes_10.html


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