Por duas vezes já estive nas cidades de Recife e Olinda. A curiosidade sempre fora muito grande. Em Recife andei muito pelo Marco Zero e arredores, pela rua dos judeus, sinagoga, observatório astronômico e por todo o centro histórico. Por óbvio, passei também pelas pontes e fiz passeio fluvial pela cidade. Por Olinda, andei em todas as igrejas, mosteiros e ruas centrais. Fiz uma visita toda especial a Dom Hélder Câmara, por quem nutro uma devoção toda especial, que descansa na catedral.
O Brasil holandês. Evaldo Cabral de Mello (organizador). Penguin & Companhia das Letras. 2016.
Há poucos dias terminei de ler o o mais recente livro do Lira Neto, Arrancados da terra. Perseguidos pela Inquisição na Península Ibérica, refugiaram-se na Holanda, ocuparam o Brasil e fizeram Nova York. A leitura deste maravilhoso livro me aguçou por demais a curiosidade e comprei, de Evaldo Cabral de Mello o livro O Brasil holandês. Devo dizer que Evaldo é o organizador e comentador do livro. O seu trabalho é de primeira grandeza. Ele recolheu e comenta as crônicas e textos que formam a historiografia desse período de 24 anos, de 1630 a 1654, que foi o tempo de O Brasil Holandês. O livro teve a sua publicação no ano de 2010, pela Penguin & Companhia das Letras.
O livro tem ao todo 527 páginas e é dividido em três grandes partes, precedidas de uma apresentação e, após o corpo do trabalho, as notas em que são indicadas as fontes originais dos documentos citados, um glossário, uma rica cronologia e as referências bibliográficas. As três partes levam os seguintes títulos: Parte I. A guerra de resistência; Parte II. O interregno nassoviano (Maurício de Nassau) e a parte III. A guerra de restauração.
Ao todo são apresentados 19 capítulos. Vou apresentá-los junto às respectivas partes do livro. Na parte I temos seis capítulos, a saber: 1. Por que o Brasil? Por que o Nordeste?; 2. A conquista de Olinda e do Recife; 3. O impasse militar, 1630-2; 4. A ruptura do impasse, 1632-4; 5. A ofensiva final, 1635-6 e 6. Entradas e excursões. Essa parte nos dá uma visão da geografia da ocupação e das formas de resistência espanhola, já que Portugal era dominado nesse período pela Espanha (1580-1640). Adotavam as terríveis táticas de guerrilha, sem enfrentamentos decisivos. Um horror! Impedia-se a produção.
A segunda parte é ocupada por oito capítulos. Vamos a eles. 7. Nassau assume o governo do Brasil holandês; 8. Do sítio da Bahia (1638) à restauração de Portugal (1640). 9. Governar o Brasil holandês; 10. Os amigos portugueses de Nassau; 11. Nassau urbanista e arquiteto; 12. As populações do Brasil holandês; 13. A economia do Brasil holandês e 14. Os últimos tempos de Nassau no Brasil. Em sete anos de governo viveu-se o período de ouro do Brasil holandês. Mas, mesmo um bom governo enfrenta grandes desgastes e dificuldades. É o grande período da Companhia das Índias Ocidentais, uma gigantesca empresa da época. A Holanda é considerada como a primeira grande economia moderna do mundo.
O local da famosa ponte e o seu pedágio.
Na terceira parte temos mais cinco capítulos: 15. A conjura luso-brasileira; 16. A insurreição; 17. A rotina do cerco do Recife; 18. Rumo aos Guararapes e 19. A capitulação do Recife. Mostra a restauração portuguesa e o problema de lidar com a ocupação holandesa e as dificuldades que isso representou. As hostilidades em muito se deram por conta dos conflitos religiosos entre os portugueses católicos e os holandeses calvinistas e os judeus, temendo a restauração portuguesa e a volta dos Tribunais da Inquisição. Também foi um tempo de surgimento de muitos quilombolas, que se aproveitaram da situação dos conflitos entre lusos e holandeses. Faço um post em separado sobre o Quilombo dos Palmares, o maior de todos, que surgiu nesse período.
Na contracapa do livro temos três parágrafos que dão uma ideia mais precisa do livro. Vamos a eles: "Este volume dá voz aos trechos mais importantes dos livros, crônicas, documentos e cartas do domínio holandês no Brasil (1630-1654), desde as primeiras invasões até a derrota e expulsão dos batavos. Fontes primárias para o entendimento de um dos mais ricos períodos da história brasileira, os textos foram selecionados e comentados pelo historiador Evaldo Cabral de Mello, uma autoridade no período.
Como se estivesse fazendo um documentário, Evaldo Cabral de Mello optou por uma narrativa clara e bem escrita, que conduz o leitor pelos mais importantes escritos da época - com os quais goza de uma rara familiaridade. Com este procedimento, além de produzir uma obra fundamental para historiadores e pesquisadores, Cabral de Mello criou um livro de fácil leitura e de grande interesse geral.
E como pano de fundo, acompanhamos a radical modernização do Recife - que se torna a cidade mais desenvolvida do Brasil -, com a sua nova arquitetura, seus novos costumes e sua nova diversidade populacional, que incluía os calvinistas e os judeus de origem portuguesa vindos para os Países Baixos". Este desenvolvimento custou à cidade de Olinda ser totalmente preterida.
Uma paisagem revitalizada do Brasil holandês.
Como uma espécie de frase em epígrafe, o autor traz a apresentação do Recife, feita por Gilberto Freyre: "Com o domínio holandês e a presença, no Brasil, do conde Maurício de Nassau [...] o Recife, simples povoado de pescadores em volta de uma igrejinha, e com toda a sombra feudal e eclesiástica de Olinda para abafá-lo, se desenvolvera na melhor cidade da colônia e talvez do continente. Sobrados de quatro andares. Palácios de rei. Pontes. Canais. Jardim botânico. Jardim Zoológico. Observatório. Igrejas da religião de Calvino, Sinagoga. Muito judeu. Estrangeiros das procedências mais diversas. Prostitutas. Lojas, armazéns, oficinas. Indústrias urbanas. Todas as condições para uma urbanização intensamente vertical. Fora esta a primeira grande aventura de liberdade, o primeiro grande contato com o mundo, com a Europa nova - burguesa e industrial - que tivera a colônia portuguesa da América, até então conservada em virgindade quase absoluta. Uma virgindade agreste, apenas arranhada pelos ataques de piratas franceses e ingleses e pelos atritos de vizinhança e de parentesco, nem sempre cordial, com os espanhóis".
Deixo ainda o link da resenha do livro do Lira Neto, Arrancados da terra.
http://www.blogdopedroeloi.com.br/2021/06/arrancados-da-terra-lira-neto.html
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