sábado, 31 de agosto de 2013

1988 -2013. 25 anos do 30 de agosto. Algumas Reflexões.

A primeira coisa que fiz para participar da comemoração dos 25 anos do 30 de agosto foi me reinserir no seu contexto e na sua história. Revi o material produzido pelo sindicato. Fui dirigente da APP-Sindicato por três gestões, na qualidade de presidente do Núcleo Sindical de Umuarama e depois, membro da diretoria estadual por duas gestões. Também integrei várias comissões de negociação, inclusive aquela que gerou os acordos com o governo, que o novo governante descumpriu e que motivou a greve que levou ao lamentável desfecho provocado pelo ato intempestivo do então governador, qual seja, o do uso da violência do Estado.
Um registro de época. 30 de agosto de 1988. A violência contra a reivindicação. Inauguração no Paraná do uso da violência contra os professores. Fez escola.

O principal acordo que tínhamos celebrado com o governo anterior, com o João Elísio Ferraz de Campos, era o do pagamento de um piso salarial no valor de 3 salários mínimos e com um avanço para 3,2 no decurso de mais alguns meses. Quando Dias assumiu o governo ele até cumpriu alguns itens do acordo, fato que mereceu, inclusive, alguns elogios. O tempo era de inflação elevada. Álvaro usou um estratagema do governo federal, do então presidente Sarney, que na época criou dois salários mínimos: um de referência e outro real. Álvaro passou então a corrigir os salários dos professores, não mais pelo salário mínimo real, mas pelo de referência, que não era reajustado. Esse estratagema anulou todas as negociações salarias feitas com o governo anterior, que representaram bons avanços. Este foi o primeiro ato de violência cometido pelo então governador. O resto foi extensão e aprofundamento desta violência.

O rompimento dos acordos levou ao movimento de nova greve, legitimamente construída pela categoria, através de assembleias. As negociações não andavam e a greve estava para completar já um mês. Não havia nenhum sinal de esmorecimento da greve, como o então governador costuma maldosamente insinuar. O sindicato conduzia o movimento com firmeza e jamais houve infiltrações vindas de São Paulo, como também insinua o ex governador, com maldade sem par, inclusive, ainda no dia de hoje (30 de agosto de 2013 - página 8 da  Gazeta do Povo). A condução da greve continua merecendo elogios da categoria até os dias de hoje e, a então presidenta, professora Isolde, recebe toda a veneração da categoria. As aleivosidades contra ela proferidas, jamais afetaram o seu reconhecimento e a sua imagem.

A manhã de hoje, apesar de fria, começou bonita. O calor tomou conta, sob todos os aspectos. A praça Santos Andrade foi tomada de gente, que chegava por todos os lados. A passeata foi linda e extremamente ordeira, como são as manifestações da classe trabalhadora. Quando existe violência em passeatas de trabalhadores ela não é provocada por eles. Aí sim existem infiltrados, quando ela não é praticada pelos próprios contingentes policiais. A estas alturas conclamo Brecht, para junto com ele fazer uma pequena reflexão sobre a violência, com uma pergunta instigante: "É violenta a água revolta e agitada das corredeiras de um rio, ou é violenta a calma e tranquila margem que comprime as águas". É uma questão de ação e reação. Quanto ao transtorno no trânsito, pedimos aos que se sentiram prejudicados, que debitem os transtornos, ao hoje senador, ou ao então governador. Se ele não tivesse soltado os cavalos em cima dos professores há vinte e cinco anos, nada teria acontecido hoje.

A passeata chegou ao palco da violência da época. Ela foi reproduzida em encenação. Imagens de cavalos foram postados contra professores e os cavalos foram derrotados, ou simbolicamente, a violência foi derrotada. E uma palavra sobre o significado do trinta de agosto e, especialmente, a sua comemoração anual como dia de luta e de luto. A repetição do ato, a cada ano, tem a finalidade para que tal ato jamais se repita. E creio que está nisso, uma das maiores contribuições que os professores do Paraná deram para o povo do Paraná. A violência não mais se repetiu. Podem ter existido atos violentos, de exacerbação, cometidos individualmente, mas nunca mais pela ordem intempestiva de um governante, ou então atos sorrateiros, na calada da noite ou em madrugadas, longe das vistas da população. Este é o nosso orgulho. Isso move a nossa autoestima e é isto que faz com que repitamos todos anos, com tanto entusiasmo e galhardia este ato, para manter viva a memória de que não mais sejam cometidos atos de violência de um governante contra os seus governados. É impressionante também, o quanto aquele ato de violência real se transformou em violência simbólica e é assimilado pelas novas gerações de professores. Aquele ato continua repercutindo e doendo em todas as professoras e professores.

Uma mensagem final a quem interessar possa. A tomo de jorge Amado, que dá voz a Tieta do Agreste, que lembra as palavras de seu marido Felipe, recentemente falecido:"Felipe costumava dizer que para se viver feliz era preciso antes de tudo abolir a consciência" (pág. 555), para logo depois voltar ao tema: "Para se viver bem, repetia Felipe, homem sábio, é necessário antes de tudo abolir a consciência. A merda é que nem sempre se consegue" (pág.568). Felicidades. Aquele ato do dia 30 de agosto de 1988 não foi uma brincadeira.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Diário de uma viagem. Mosteiro da Rábida - Museu das Caravelas - Mértola - Évora - Lisboa.

Hoje é o último dia de nosso Giro Ibérico. Saímos de Sevilha e o destino final seria Lisboa. Uma distância de 500 quilômetros a ser percorrida. O primeiro destino seria Palos de la Frontera, mas antes passamos pelas marismas do rio Guadalquivir. Confesso que recorri ao dicionário - o Aurélio - para ver uma definição bem simples do que seria um marisma. "Terreno alagadiço à beira de mar ou  rio". Isso não seria nada se não se tratasse de estar aí o Parque Nacional Doñana, um santuário ecológico, o mais importante entre a Europa e a África, onde hibernam mais de 300 espécies de aves, algumas delas em fase de extinção. É o último presente do rio, já no seu trajeto final, junto ao oceano Atlântico.
O rio Guadalquivir em Sevilha. Na sua foz ele ainda presenteia o mundo com suas marismas.

Em Palos de la Frontera se situa o Mosteiro de La Rábida, um mosteiro franciscano, que foi de suma importância para as navegações. Era um centro de estudos náuticos. Foi neste mosteiro que Colombo dormiu na noite anterior ao início de sua viagem. Como teria passado esta noite? A importância deste mosteiro para as navegações também se deve à grande amizade existente entre os monges e Colombo. Foram os monges, especialmente um deles, que era o confessor de Isabel, a rainha católica, que convenceu a rainha para que ela recebesse o navegador. Depois de algumas tratativas, tudo foi acertado. Um similar do contrato firmado, pelo qual Colombo receberia 10% de todas as riquezas encontradas, está lá. O original está em Sevilha, no Arquivo das Índias.
Vista do mosteiro de La Rábida em Palos de la Frontera, de fundamental importância para as navegações.

O museu tem as caravelas em miniatura. A Santa Maria, a pinta e a Niña. Cada nau recebeu, respectivamente, 40, 30 e 20 marinheiros. Colombo foi na Santa Maria e voltou na Niña, uma vez que a Santa Maria, naufragou. Uma das tarefas mais difíceis de Colombo foi arrumar tripulação, pois, o seu projeto era considerado inviável. Certos estariam os portugueses, em encontrarem o caminho das Índias costeando a África. Colombo fez um total de quatro viagens e nunca acreditou ter descoberto um novo continente, convencido que estava, de ter chegado às Índias.
Mostra das caravelas no museu do Mosteiro de La Rábida.

De Colombo não se sabe, nem onde nasceu e nem onde está enterrado. Dizem que está na catedral de Sevilha. Lá está a sua tumba. O pouco que lá está, algo em torno de 150 gramas, foi submetido a testes de DNA e se comprovou, que se não são dele, são de parentes próximos. O que está enterrado em Santo Domingo, nunca foi submetido a provas porque as autoridades não o permitem. Ele morreu em Valladolid, amparado pelos seus dois filhos e transladado para Sevilha. A visita a este mosteiro é uma magnífica aula de história. Você está diante de fatos efetivamente ocorridos e comprovados. Do que eu gostei bastante dentro do museu foi uma placa de aviso, condenando por antecipação, a penalidade de excomunhão, àqueles que não devolvessem um livro, tomado junto a sua biblioteca.

Nas proximidades do mosteiro está o museu das caravelas, junto ao local de onde estas efetivamente tinham partido. Lá estão reproduzidas as caravelas em seu tamanho original. As vimos sob todos os ângulos e na loja do museu comprei uma miniatura da Santa Maria. Ao redor do lago onde estão as caravelas existem imagens de índios e produtos que representam o que se comercializava à época. A aula que começara no mosteiro, estava continuando agora, ao ar livre. Foi tudo muito interessante.
Junto ao mosteiro de La Rábida o museu das caravelas. A reprodução das caravelas em seu estado original.

A nossa guia, de Madrid a Sevilha foi a Olga e, de Sevilha a Lisboa. foi a Esther. No começo ela estressou um pouco, por causa de um não acerto com os ponteiros dos relógios. Impôs o dela. Depois ela desestressou. Já no caminho ela nos contava de Portugal e de seu desânimo com relação à crise. Disse que estão cansados e já nem sequer protestam mais. Quanto aos espanhóis, estes são um pouco mais brabos. Os dois países, além da crise econômica, também vivem crises políticas. Portugal quer a antecipação de eleições gerais e a Espanha está envolvida com o seu mensalão. O El País trazia a seguinte manchete: Financiamento de Campanha: O Câncer da Democracia.
No museu das caravelas, uma mostra de produtos comercializados na época.

Atravessamos a fronteira, entrando em Portugal pelo Algarve, continuando pelo Alentejo. Ao final da tarde chegamos em Lisboa. Passamos novamente por Mértola e Évora. Para compensar tudo, nos hospedaram em um hotel cinco estrelas. O nosso voo para Paris saía cedo. O transfer para o aeroporto seria as 6:00 horas e isto não falhou. Os serviços da EuropaMundo são impecáveis. Depois, em outros posts, eu escrevo sobre Paris. 

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Diário de Uma Viagem. Sevilha.

O ano de 1992 foi um dos anos mais marcantes na história da Espanha. O ano marcaria os 500 anos do descobrimento da América. Os festejos foram especialmente significativos para a cidade de Sevilha, a grande cidade espanhola, voltada para o Oceano Atlântico. Ela já está fora da área do Mediterrâneo. Foi a cidade donde se impulsionaram as navegações espanholas e, na época, a sua maior cidade. No próximo post falaremos de La Rábida, o local específico da saída das caravelas de Colombo.
Uma das maravilhas de Sevilha é a Praça da Espanha. Ela homenageou as cidades espanholas na exposição ibero americana de 1929.

Sevilha é a quarta cidade espanhola. Perde apenas para Madrid, Barcelona e Valência. Possui mais de 700.000 habitantes e mais de 1.500.000 na região metropolitana. O grande feito por ocasião da celebração dos 500 anos foi receber o trem de alta velocidade que ligaria a cidade com Córdoba e com Madrid. Este trem marcou a entrada da Espanha nos chamados trens de alta velocidade.A distância percorrida gira em torno de 500 quilômetros. As principais cidades espanholas, especialmente as ligadas com o Mediterrâneo estão ligadas a Madrid por este trem. Ele tem a preferência sobre os aviões, em função da distância dos aeroportos. A grande central de trens, por exemplo, em Madrid, se situa na Porta de Atocha. Outro feito ligado ao quinto centenário dos descobrimentos, foi a chamada Expo-92, iniciada em abril e encerrada no dia 12 de outubro e da qual sobrou para a cidade um parque tecnológico e um parque temático, a chamada Isla Mágica. 
La Giralda. É a torre mourisca da catedral de Sevilha. É o seu campanário. Dá para subir por rampas internas. São mais de trinta, mas a vista compensa.

As principais rodovias espanholas são as carreteras do Estado. São as rodovias estratégicas, otimamente conservadas e gratuitas. Paralelas a estas rodovias existem as privadas, que cobram pedágio.O país está assim otimamente servido de autoestradas. As pequenas cidades estão ligadas a estas autoestradas, por rodovias de pistas simples, mas sempre em bom estado de conservação. Um fato interessante que pude constatar e que também a guia nos alertou, é que não existem placas de publicidade ao longo das rodovias. Como isto poderia distrair os motoristas, isto é terminantemente proibido.

Ainda sobre a Andaluzia, a guia nos falava da pobreza da região. Esta pobreza não é por falta de riqueza, mas pela sua má distribuição. É terra de latifúndios. É terra de muitos olivais, onde se empregava mão de obra em troca de comida, praticamente. Hoje a legislação ampara os que vareiam os olivais. Varear faz alusão às varas com que são colhidas as azeitonas, ou melhor, derrubadas.
O portal da catedral de Sevilha. Nela estão enterrados restos mortais de Colombo. Há controvérsias. É uma das mais belas catedrais do mundo. Toda misturada de estilos e culturas.

Visitamos a cidade em tour panorâmico e a pé. A primeira parada foi na Praça da Espanha. Esta praça é bonita de tirar o fôlego. Ela foi construída para a Exposição Ibero-americana de 1929. Nas suas proximidades estão os pavilhões dos países participantes da exposição. A praça rende homenagem a todas as grandes cidades espanholas, apresentando o que elas tem mais característico. Hoje esta praça e seus pavilhões abrigam a universidade da cidade.

Depois o passeio continuou a pé. Toda a visita foi acompanhada de guia local. Passamos pelas ruas do bairro de Santa Cruz, local do antigo gueto judaico. Logo, logo fomos acompanhados por guitarristas, a espera de levar alguns trocados. O local também está repleto de restaurantes e de lojas de souvenir. Nele está também o famoso balcão onde apareceu Rosina, da ópera O Barbeiro de Sevilha, de onde ela jogou um bilhete para o seu galanteador. Nas proximidades deste bairro estão também outras atrações, como a igreja Catedral da Giralda, o Real Alcazar, o palácio árabe, parecido com o de Granada, em grandeza e majestade e o Archivo das Índias, a antiga Casa de Contratión. Muito próximo está também o rio Guadalquivir, o grande rio. Ao longo deste rio estão as outras grandes atrações como a Torre del Oro, a Plaza de Toros, a segunda mais antiga e El Patio Sevillano.
Às margens do rio Guadalquivir, a torre do Ouro.

Entramos na catedral, a terceira maior igreja do mundo. Roma e Santa Sofia são maiores. Ela ocupa o lugar de uma grande mesquita e la Giralda, o seu campanário, são o claro exemplo do que era a arte mourisca. Subimos a torre, até a altura dos sinos. Quando subi as torres da igreja da cidade de Colônia, jurei nunca mais fazer isso em lugar nenhum, mas na Giralda não se sobem degraus, se sobem rampas. Fiz o teste e fui aprovado. Os sacrifícios da subida são altamente compensados pelas belas vistas que se tem da cidade. Pelo meio da tarde subimos pelas margens do Guadalquivir, passando pelas suas atrações, no rumo do hotel, pois ao final da tarde tínhamos um show de dança flamenca pela frente.
Sevilha tem dança flamenca e tem touradas. A sua casa de touros é a segunda mais antiga da Espanha. Na Catalunha as touradas são proibidas.

Falar de calor em Sevilha dá até medo de que tudo vá pegar fogo. O ânimo fica bastante reduzido. Mas para o show de flamenco, o ônibus nos levaria. O show foi extraordinário. Certamente é daquelas coisas de se por na agenda, como daquelas coisas que valem a pena de serem vistas. A dança flamenca tem tudo a ver com os ciganos, que já estavam na Andaluzia durante a Idade Média, vindos da Índia, da Hungria e da Romênia. A dança é um dos símbolos da cultura espanhola e é Patrimônio Imaterial da Humanidade. O show teve na dança de Carmen (Bizet) e uma dança de uma mulher no auge de fúria, os seus pontos máximos. Na saída do espetáculo, as 21:00 horas, um termômetro sobre o rio assinalava 42° de temperatura. Até as brisas do rio são altamente comemoradas. No dia seguinte, encerraríamos o nosso giro ibérico, voltando a Lisboa, o nosso ponto de origem, mas no próximo post ainda tem muito a contar, especialmente sobre o mosteiro de La Rábida.


quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Diário de uma Viagem. Málaga, Marbela e La Ronda.

De Granada seguimos em direção ao mar para costear o litoral e chegar até Málaga, a segunda cidade da Andaluzia, com cerca de 600.000 habitantes. A cidade é portuária, sendo o grande centro de comércio com o continente africano. Está próximo ao Estreito de Gibraltar e do Marrocos. Seu porto natural sempre foi muito disputado por fenícios, romanos e mouros. São famosas as montanhas de Málaga, imensas minas de prata e de cobre. Em seu território foram travados os mais violentos combates, por ocasião da expulsão dos árabes. Foram as batalhas decisivas, em função do porto e das proximidades da África. A rendição final de Granada, em 1492, já foi fruto de negociações.
O teatro romano na cidade de Málaga.

Málaga também sofreu muito durante a Guerra Civil Espanhola, tendo sido bombardeada tanto pelos franquistas, quanto pelos fascistas italianos de Mussolini. Foi um dos baluartes da resistência republicana. Pelo envolvimento do rei Juan Carlos nas negociações que ditaram o fim a ditadura franquista, ele é uma figura muito querida em Málaga, bem como em toda a Andaluzia. O grande desenvolvimento da região só ocorreu a partir de 1975, com a morte de Franco e o fim da longa ditadura. Málaga se internacionalizou, especialmente os seus empreendimentos imobiliários na Costa do Sol. A Costa do Sol possui mais de 160 quilômetros de praias, onde o sol e o clima são atrações maiores do que a própria praia de areias escuras. O seu aeroporto é um dos mais movimentados, recebendo uma imensidão de turistas.É uma cidade voltada para serviços e férias.
A beleza da categral da cidade de Málaga.

A cidade também é conhecida pelo seu centro histórico. Ali existe um belo teatro romano, datado de dois séculos antes de Cristo e totalmente restaurado. Junto ao teatro se situa um enorme palácio mouro, a fortaleza de Alcazaba. A sua catedral, é carinhosamente chamada de manquita, a manca, por ser inacabada. O dinheiro de uma de suas torres foi destinada a ajudas humanitárias. Mesmo assim ela foi construída ao longo de duzentos anos, recebendo as influências estilísticas, destes diferentes anos. A cidade também se tornou famosa a partir de um vinho regional, doce. O filho mais ilustre da cidade é Pablo Picasso e a casa em que se deu o seu nascimento, abriga hoje um museu a ele dedicado. Passamos uma manhã nesta cidade.
A casa em que nasceu Pablo Picasso, em Málaga foi transformada em Museu Picasso.

É costume tomar um café por volta das10:00 horas da manhã, que a hora do almoço se dará por volta das 14:00 horas. Depois ainda vem a hora sexta, de descanso sagrado, para as atividades econômicas serem retomadas, apenas, após  as 16:00. O sol se põem depois das 22:00 horas. Isto é no verão. A maior festa popular é a semana santa. Neste quesito Málaga disputa a primazia com Sevilha. São procissões que se celebram e existe uma verdadeira disputa entre as confrarias, para ver quem apresenta as maiores ornamentações, as roupas mais coloridas, as peças de arte sacra mais valiosas, como sacrários e custódias, além dos mais belos pálios e andores. Durante as procissões são cantadas as saetas, cantos que mostram simultaneamente a tristeza e a esperança.
A fortaleza árabe de Alcazaba em Málaga.

A viagem seguia pela costa mediterrânea, que na região ganha o nome de Costa do Sol. Entre as suas praias mais famosas está Marbela, com a famosa marina de Porto Banus. Marbela abriga famílias reais da Europa, os artistas de cinema e os cantores populares. Depois de ganhar fama internacional, os ricos de toda a Europa sonharam em ali se estabelecer, sendo a região muito apreciada pelos novos ricos da Rússia e dos países do leste europeu, após a dissolução da economia estatal destes países. Nos contava a guia, que as máfias do mundo inteiro procuraram aí construir suas mansões. Lamentava também profundamente todas a destruição ecológica que acompanhou esta especulação imobiliária. Hoje existem leis ambientais rigorosas.

A Costa do Sol é uma das alavancas do turismo espanhol, que recebe mais de 55.000.000 de turistas, anualmente. Entre os demais balneários famosos, são citados Sotogrande, Estepona, Torremolinos e Fuengirola. O esporte mais praticado é o golf.  Não aprecio este tipo de turismo e me limitei a um lauto almoço, acompanhado de cerveja na pressão, como é chamado o chopp, para seguir viagem.
As enormes fendas na histórica cidade de La Ronda.

E a viagem prosseguiu, tomando agora a direção da montanha. Saímos do nível do mar para, em questão de uns 60 quilômetros subir para mais de 1.500 metros de altitude, onde encontramos a cidade histórica de Ronda, com seus 35.000 habitantes. Ronda foi um dos últimos centros de resistência dos mouros, que se rendeu aos cristãos, apenas em 1485. Ali moram os chamados pueblos blancos, pela tradição herdada dos árabes de pintarem as suas casas de branco. Na cidade existem fendas rochosas enormes, que inclusive dividem a cidade. A cidade possui a mais antiga Casa de Touros de toda a Espanha, junto com um museu taurino. A casa data de 1785. As touradas são esporte nacional e estão proibidas, apenas, em toda a Catalunha.   

Continuamos a viagem até chegarmos em Sevilha, outra terra extremamente encantadora, desde que você suporte o seu calor. Num termômetro nas proximidades do hotel, ele marcava 42 graus as 9:00 da noite. É de endoidar. Haja água, ou produtos similares. Mas isso eu conto amanhã.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Diário de uma Viagem. Madrid, Puerto Lápica e Granada.

Não vou me demorar em Madrid desta vez. Já escrevi sobre ela, sobre a visita que fizemos a esta cidade, no ano passado, junto com o El Escorial e a cidade de Toledo. Desta vez passamos o domingo em Madrid e por parte da EuropaMundo a visita se limitou a um tour panorâmico, com rápida visita às principais atrações turísticas da cidade. O Palácio Real sempre impressiona. O visitamos da outra vez. Passamos ainda pela Plaza Mayor, pela Puerta del Sol pela Gran Via e tivemos no Museu do Prado o nosso ponto final. Visitamos este museu. Ele contem o grande acervo dos pintores espanhóis Goya e Velásquez. Fabuloso e imperdível.
O grande destaque do museu do Prado são as pinturas dos espanhóis Goya e Velásquez.

Quero aqui também registrar a minha experiência com relação a visita a grandes museus. A presença de um guia é imprescindível, caso contrário, você fica perdido em meio a sua imensidão. Você corre o risco de não ver o essencial. Se você optar por fazer isso individualmente, é necessário preparar-se para a realização desta visita. É necessário fazer escolhas. Almoçamos na Plaza Mayor. Quanta história, inclusive com os horrores da inquisição, na velha Espanha católica, a filha predileta da igreja católica.

Segunda cedo partimos no rumo de Granada. Viajamos pelas áridas e secas terras da Mancha, a grande região produtora de cerais e do famoso açafrão, uma cultura difícil, totalmente manual, mas absolutamente imprescindível na elaboração do mais típico prato espanhol, a paella. A guia nos contava sobre Toledo, sobre o rio Tejo, sobre o sistema de transportes da Espanha e, como estávamos passando pela Mancha, obviamente de D. Quixote. O Quixote foi, inclusive, o motivo de nossa primeira parada. A cidadezinha onde paramos chama-se Puerto Lápica, um povoado manchego. Nela tudo lembra D. Quixote, pois teria sido este o lugar onde o famoso cavaleiro realizou as suas aventuras. Você, inclusive, vê muitos moinhos, daqueles contra os quais o cavaleiro investia furiosamente. Ali você pode reconstituir os caminhos de D. Quixote, explorados turisticamente e comprar inúmeros souvenir relacionados ao Quixote, ao Sancho e ao seu autor. Valeu muito a pena.
Na Mancha paramos em Puerto Lápica, onde tudo lembra Cervantes e o D. Quixote.

O destino do dia seria a cidade de Granada. A cidade foi sede do governo árabe na Península, entre os anos de 1238 a 1492, o ano de sua expulsão. Na época, Granada era uma das mais importantes cidades da Europa e era considerada como a segunda Bizâncio. Era um grande centro irradiador da cultura árabe, onde se dedicavam aos estudos da álgebra, da astronomia, e da medicina. Antes de Granada, os árabes estavam centrados em Córdoba, cidade, infelizmente, não contemplada neste nosso giro. Do ponto de vista cultural, a presença árabe na Península foi extremamente benfazeja. 

A escolha de Granada como sede do governo árabe deveu-se a múltiplos fatores. Os geográficos não podem ser menosprezados. Granada se situa numa fértil planície, encravada entre as montanhas da Serra Nevada e o mar. A Serra Nevada é responsável pelas mais altas montanhas da Península, e sempre cobertas de neve, uma garantia de água para a região. A proximidade do mar também deve ter influenciado. A Serra Nevada é hoje grande atração turística, pela prática dos esportes de inverno.
Em Granada encontra-se o famoso Palácio de Alhambra, a última sede do governo árabe na Península.

A principal atração turística da cidade é o famoso Palácio de Alhambra, que já sofreu saques e abandono. A passagem por ele das tropas de Napoleão foi desastrosa.O princípio de Napoleão era o saque das riquezas. Levar tudo para Paris. O que não conseguisse levar, deveria ser destruído. Consta que ele teria mandado dinamitar o palácio, mas a ordem não teria sido cumprida. Ainda bem. O palácio foi uma construção majestosa e tinha entre as suas finalidades mostrar que os árabes não estavam em declínio na Península. Muito gesso, madeira e azulejos foram aí trabalhados. Hoje ele está totalmente restaurado e é Patrimônio Cultural da Humanidade, a partir de 1984. A parte interna é ricamente ornada e na parte externa se destacam os seus belos jardins. Um encanto. Uma visita deslumbrante. É desses lugares que você anota como os lugares que valem a pena de serem visitados.

Em Granada se deu a parte derradeira da presença árabe na Península Ibérica. Dali foram expulsos em 1492, pela ação dos reis católicos, Fernando e Isabel. Ato contínuo à expulsão árabe, a Espanha se lança na aventura das navegações. Ali mesmo em Granada, Isabel recebe Colombo para ouvir os seus planos relativos ao novo caminho para as Índias. A negociação entre Colombo e Isabel foi mediada pelos monges do mosteiro de La Rábida, especialmente, pelo padre confessor da rainha. Mais adiante falaremos de La Rábida. 
Um pouco da maravilhosa decoração interna do palácio de Alhambra.

A cidade tem aproximadamente 250.000 habitantes. A sua universidade é das maiores da Espanha, em número de alunos. Seus cursos mais procurados são os de direito e medicina. É uma das mais procuradas para se fazer intercâmbio. Durante o almoço, no hotel, se apresentaram músicos do curso de direito, angariando fundos para a sua continuidade nos estudos. Comprei-lhes o CD de músicas espanholas. Outro monumento da cidade é a sua catedral, do século XVI, dominantemente gótica. Nas proximidades fica a Capela Real, onde estão enterrados os corpos dos reis católicos Fernando e Isabel. Outra atração da cidade é o Sacromonte, onde vivem ciganos, que apresentam espetáculos de dança flamenca original e espontânea, não clássica. Deixamos a dança flamenca para Sevilha.

Mais uma vista da decoração interna de Alhambra.

Granada é também a terra de Federico Garcia Lorca. O aeroporto da cidade homenageia o poeta, dando-lhe o seu nome. Ele nasceu nas proximidades e é um dos formados na sua universidade, no curso de direito. O poeta foi uma das primeiras vítimas da Guerra Civil Espanhola. Foi fuzilado, sem nenhum julgamento e de costas, numa alusão a sua homossexualidade. Dou este detalhe apenas para identificar um perfil dos homofóbicos. Foi executado, por ser considerado mais perigoso com a caneta, do que os soldados com as suas armas. Jorge Amado era seu amigo e, lembrando-lhe a morte, indaga sobre o mundo em que vivemos, em que os poetas são os primeiros a serem executados. Mais um dia absolutamente inesquecível. Amanhã continuaríamos a viagem pela costa do sol e os seus milionários, para chegar até Sevilha, passando antes por Marbela, o famoso balneário.

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Diário de uma Viagem. Peníscola e Valência.

Antes de prosseguir viagem, ainda preciso contar a história de São Jorge, o padroeiro da Catalunha e que tem, na cidade de Barcelona, um de seus mais belos e ricos rituais. No dia 23 de abril, o dia de seus festejos, a Rambla se torna extremamente colorida e cheia de tendas de flores e de livrarias. Neste dia, a população, tem por tradição presentear as pessoas amadas, com uma rosa, se for mulher ou com um livro, no caso de ser homem. A tradição é tão forte, que a partir do ano de 1995, a UNESCO decretou o dia 23 de abril, ou o dia de São Jorge, ou Saint Jordi, como o dia internacional do Livro. Mas vejamos brevemente a história do santo.
Barcelona não é apenas A Sagrada Família. Ela tem uma das mais belas e significativas tradições do mundo. No dia 23 de abril se presenteiam as pessoas amadas com rosas e com livros.

São Jorge é uma santo guerreiro, um santo de origem militar. Por esta razão ele é muito estimado pelo mundo católico, pois a difusão da religião sempre teve um forte componente militar. A sua devoção está espalhada pelo mundo afora, transcendendo, inclusive, as fronteiras cristãs, para transformar-se em Ogum, nas religiões afro, de grande devoção na nossa querida Bahia. Existem também inúmeras e diferentes histórias deste santo. Uma das mais famosas e em voga na Catalunha é a que conta da existência de um  terrível dragão, que poderia vitimar uma cidade inteira com o veneno de seu hálito. A sua força era enorme e, em sua pele não penetravam nem a espada, nem a lança. Mas se contentava com o oferecimento de uma bela donzela a cada dia. Quando sobrou apenas a princesa, a filha do rei, o Guerreiro se posicionou em frente ao monstro, e enterrou-lhe a lança em sua garganta.
No dia 23 de abril La Rambla se enche de quiosques de flores e livrarias. As pessoas amadas são presenteadas com livros e com rosas.

Quando o guerreiro foi levar para a princesa o sangue do dragão morto, o sangue se transformou numa bela rosa vermelha. A festa ganhou como símbolos, a fertilidade e, para a Catalunha em particular, a defesa de seus valores culturais e de sua língua própria. Existem pessoas, que a partir desta data já colecionam mais de cinquenta livros. Uma tradição destas, bem que poderia também vingar por aqui. Fica aqui a sugestão para os donos de livrarias e para as secretarias de cultura de cidades e estados. Ainda um lembrete. São Jorge é também o padroeiro do clube da cidade, o Fútbol Club Barcelona.

Mas o ônibus já está de partida. Vamos continuar viajando pela costa mediterrânea, ouvindo histórias da região, contadas pela guia, Macarena, uma menina muito divertida e grande contadora de piadas. Aprendi que a maioria das piadas soa, apenas, em língua nacional. Além da conversa, vimos parte do filme El Cid, obviamente, os que não dormiam.  O filme, um dos grandes épicos do cinema ítalo americano, data de 1961 e tem em Sophia Loren e Charlton Heston,os seus protagonistas. Mas qual é causa de estarmos vendo este filme agora? É que estamos indo para Peníscola, onde existe um castelo, cercado de muralha por um lado e pelo mar do outro. Este castelo foi o grande cenário deste filme. EL Cid é um herói espanhol do século XI, que se destacou nas guerras entre cristãos e contra os mouros.
O castelo de Peníscola foi fortaleza contra os mouros, propriedade dos templários e cenário do filme El Cid.

O castelo também foi palco de muita história. Ele foi construído no século XIII, em cima de antigas fortificações mouras. Foi ocupado pelos templários, que na região se dedicavam a extração do sal. Durante o cisma do Ocidente, também serviu de sede do papado, de dois anti-papas. O cardeal Pedro Luna, que tomou o nome de Bento XIII, ficando conhecido, porém, como o Papa Luna (1411-1423) e de Clemente VIII, que abdicou em 1429. Que tempos complicados. Hoje Peníscola é uma pequena e paradisíaca praia do Mediterrâneo e que conta com algo em torno de dez mil habitantes.
O papa Luna, ou anti-papa Bento XIII, que fez do castelo de Peníscola a sede de seu papado.

Em Valência fizemos a nossa parada para o almoço. Não podia ser diferente. Comemos uma paella valenciana e tomamos o vinho regional, o moscatel. A cidade é a terceira maior da Espanha e também dotada de toda a infraestrutura necessária. Cenário de muita história, de lutas e de guerras. Ali se desenvolveu a Batalha de Sagunto, na segunda guerra púnica, bem como inúmeras batalhas entre cristãos e mouros. O seu desenvolvimento é relativamente recente, posterior a ditadura franquista, e ligada a uma série de eventos internacionais, inclusive a corrida de fórmula um, por sinal, em crise. É a terceira cidade espanhola, contando com uma população superior a 800.000 habitantes e em torno de dois milhões na sua região metropolitana.
A bela catedral da cidade Valência.

É conhecida como a cidade das ciências e das artes, a terra da laranja e dos produtos horti-fruti-granjeiros. Me lembro de minha infância em Harmonia, onde cultivávamos um tipo de laranja, que tinha o nome de valência. Creio que este detalhe ajuda a identificar a cidade de Valência com a cultura da laranja. Ela era colhida em outubro/novembro e que nós empapelávamos, para vendê-la mais tarde e, assim pegar preços melhores. O seu rio, o Túria, foi deslocado da cidade, por causa de suas enchentes e o seu antigo leito foi transformado num jardim. Os valencianos também cultivam uma forte identidade, inclusive a sua língua própria, o valenciano. A sua catedral e o Palau de la Generalitat, são as suas grandes atrações turísticas. A sua festa mais popular é a das Fallas, no dia de São José, quando são queimados enormes bonecos, com os quais representam a classe política. Aliás, Valência tem forte tradição de vida política. Foi a capital da Espanha republicana e democrática, entre 1937 e 1939, durante a Guerra Civil Espanhola. A cidade está ligada a Madrid por um trem de alta velocidade.

Em Valência paramos por muito pouco tempo para conhecer mais de sua história e visitar todos os seus lugares turísticos mais importantes. Neste dia andamos demais e paramos pouco. Viajamos mais de 700 quilômetros e o destino final seria a cidade de Madrid e ainda com translado para a Plaza Mayor. Nos acomodamos no hotel, no Praga, o mesmo do ano passado, preferindo um merecido descanso, sem antes uma boa cerveja, acompanhada de tapas.

sábado, 24 de agosto de 2013

A Carta Testamento de Getúlio Vargas.

Estou quase ao final da leitura do segundo volume da biografia de Getúlio Vargas, escrita  pelo Lira Neto. O primeiro volume registra os acontecimentos entre 1882 e 1930 e que recebe do biógrafo o seguinte subtítulo: Dos anos de formação à conquista do poder. O segundo volume, que vai de 1930 a 1945, tem por subtítulo o seguinte: Do governo provisório à ditadura do Estado Novo. O terceiro volume ainda está por sair. É uma biografia densa e que realmente fazia falta.
Getúlio, quase 20 anos de poder. Junto com o tiro no coração, nos deixou a Carta Testamento, o mais importante documento da história deste país, ao menos, no meu modesto entendimento.

Mas não quero hoje fazer a análise destes dois volumes e nem comentar sobre o Governo Vargas. Apenas quero, por ser hoje o dia 24 de agosto, publicar a sua Carta Testamento. Creio ser este o mais importante documento da história do Brasil e ainda, de uma atualidade impressionante, ainda mais em tempos de neoliberalismo e de economia globalizada. Getúlio tinha uma enorme preocupação para que este documento efetivamente chegasse ao povo. Creio que o texto também explica o tanto de ódio que muitos alimentam contra Getúlio, como o ex presidente Fernando Henrique Cardoso, que disse que tudo faria para destruir a sua memória. Este texto não precisa de explicações, é mais do que auto-explicativo. Mas vamos ao texto:
A Carta Testamento de Getúlio Vargas em seu mausoléu, em São Borja.

"Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se novamente e se desencadeiam sobre mim.

Não me acusam; não me combatem, caluniam e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes. Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive que renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário-mínimo se desencadearam os ódios. Quis criar a liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente.

Assumi o governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançava até 500% ao ano. Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de cem milhões de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se o nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa economia a ponto de sermos obrigados a ceder.

Tenho lutado mês a mês, dia a dia, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para defender o povo que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida. Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no meu pensamento a força para a reação. Meu sacrifício nos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com o perdão. E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue terá o preço do seu resgate.

Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia, não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na história".
Em frente a casa de Getúlio Vargas em São Borja. Hoje é museu.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Diário de uma Viagem. Barcelona.


Barcelona é uma cidade moderna e grande, a segunda da Espanha. Também é uma cidade modernista. Já em Lisboa, Pedro, o nosso guia de então, nos falava do poder econômico de Barcelona e da Catalunha. Nos contava que a Catalunha representava 30% da riqueza da Península Ibérica, que era maior do que a economia de Portugal e de qualquer país do leste europeu. Também possui forte identidade cultural, falando língua própria, o catalão e alimenta forte desejo de independência, desejo este, aprofundado pela crise econômica espanhola. Isto deverá ser decidido, proximamente, por um plebiscito.
Barcelona é Gaudí e Gaudí e o Templo Expiatório da Sagrada Família. O templo deverá estar concluído apenas em 2026, ano do centenário da morte do gênio. Este é o Portal da Natividade.

As rivalidades regionais são muito fortes em toda a Espanha. Conta-se, que a primeira coisa que os espanhois perguntam a um desconhecido, nunca é o seu nome, mas sempre a região de sua procedência. Barcelona é a maior cidade do Mediterrâneo e também o seu maior porto. O porto, além de mercadorias, recebe também, o maior número de navios de cruzeiros. Estes turistas podem ser vistos com facilidade na famosa Rambla, a avenida que une a Praça da Catalunha com o porto da cidade, numa extensão de uns dois quilômetros. A cidade possui algo em torno de 1.700.000 habitantes e a região, mais de cinco milhões.

A sua localização fez com que sempre fosse uma região muito disputada. A sua história registra a presença de fenícios, que lhe teria dado o nome, numa alusão aos barcos, dos romanos, dos cartagineses e assim por diante, como conta a história, de árabes e  dos cruzados. A cidade sofreu muito na Guerra Civil Espanhola, quando foi o grande baluarte da democracia republicana. Foi a última a se render às tropas falangistas do ditador Franco, em 1939. A sua estrutura moderna veio especialmente com a realização dos jogos olímpicos de 1992 e com o Fórum Universal das Culturas em 2004.
A catedral gótica no centro da cidade. Nas proximidades está também o bairro gótico e medieval.

Visitamos a cidade, acompanhados de guia local, em tour panorâmico. A primeira parada, desta vez bastante generosa e, não poderia deixar de ser, foi para visitar o Templo Expiatório da Sagrada Família, a monumental obra de Gaudí. Iniciamos a visita pelo Pórtico da Natividade, onde, obviamente está representada a Sagrada Família. Continuamos pelo Pórtico da Paixão e terminamos pelo da Glória, totalmente inacabado. É absolutamente indescritível a sensação que você sente diante de um templo tão majestoso. Êxtase total. A lamentar, o não ingresso em seu interior. As filas são quilométricas e aliviam apenas ao final da tarde.

Não obstante toda esta majestade do templo, ele é apenas a segunda atração mais visitada. Em primeiro lugar figura o campo de futebol do Barcelona, o Camp Nou. Vejam o que não faz o marketing deste clube. A Sagrada família é a segunda atração, recebendo mais de três milhões de turistas por ano, que pagam um ingresso de 14 euros. Com a arrecadação deste dinheiro se pretende terminar a sua construção, prevista para 2026, ano do centenário da morte de Gaudí. Com relação a sua conclusão, nos contava o guia, que dificilmente o projeto original de sua construção poderá ser executado, uma vez que o Pórtico da Glória, não poderá ter a sua triunfal entrada, por uma praça, já que a exploração imobiliária se apoderou de toda a área a ela destinada. Ao estar concluída, a igreja terá um total de 18 torres. Para completar, o terceiro lugar mais visitado é o museu Picasso, que concentra as obras de sua juventude.
O controvertido supositório, o prédio da companhia de águas da cidade, visto do alto da colina de Montjuic. A noite ele fica iluminado com as cores do Barcelona futebol clube.

Gaudí dedicou 40 anos de sua existência à Sagrada Família, dos quais os últimos 15, com exclusividade. As obras foram iniciadas em 1882 e assumidas por Gaudí em 1883. Gaudí modificou o projeto, que de neogótico passou a ser modernista. Gaudí morreu atropelado numa das ruas de Barcelona, quando ia a uma igreja para rezar, não sendo sequer reconhecido imediatamente. Distrações de gênio, certamente. As obras da Sagrada Família continuaram com discípulos seus. De Gaudí se conta a história, de que o reitor da universidade, ao lhe conferir o diploma de graduação, teria dito, não saber se estava formando um gênio ou um louco. Hoje, à distância, podemos afirmar, com certeza, que foram os dois.

O nosso tour continuou. O ônibus nos levou para a colina de Montjuic, o maior parque de lazer da cidade e donde se tem vistas panorâmicas maravilhosas. O parque foi criado a partir da Exposição Internacional de 1929 e, especialmente para os jogos olímpicos de 1992. Prosseguimos o passeio pela área portuária, também totalmente reformada para o evento das olimpíadas. No porto tem um enorme monumento que cultua a memória de Colombo. A volta de Colombo de sua viagem à América, se deu nesta cidade de Barcelona. O tour terminou no centro da cidade, em frente a bela catedral, em estilo gótico. Nas proximidades se situa o chamado bairro gótico, a área medieval e histórica da cidade.
Monumento dedicado a Colombo na área portuária da cidade.

Almoçamos em plena La Rambla, observando todo o seu movimento e ainda tivemos toda a tarde para, livremente, nos movimentarmos pela cidade. Calor e cansaço dificultaram a empreitada. Parece imperdoável não termos visitado o Parc Guell, a mais colorida das obras de Gaudí. OParc Guell é Patrimônio da Humanidade. O nosso hotel situava-se em Poblenou, bairro bastante populoso da cidade. Nas proximidades está localizado, o que foi o centro de comunicações da olimpíada de 1992 e o controvertido prédio da companhia de águas da cidade, a Torre Agbar. Ela recebe diferentes denominações populares, como a ogiva nuclear, o pepino ou ainda o supositório. Só não citam o nome daquilo que é coberto pelo supositório. A noite, a sua iluminação reflete as cores do clube de futebol da cidade.
Mais uma vista da Sagrada Família, desta vez o Portal da Paixão.

O poder econômico da cidade também tem um outro símbolo famoso, o Gaudí Hotel Barcelona, em formato de vela. Situa-se entre os hotéis mais luxuosos e caros do mundo. Com um profundo sentimento, de saudade antecipada, deixamos a cidade no rumo de Peníscola, Valência e Madrid.  

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Diário de uma Viagem. Zaragoza, Mosteiro de Poblet e Montserrat.

Falar de Zaragoza é falar da Cesar Augusta cidade. Com o nome decifrado fica fácil constatar a sua origem romana. O rio Ebro abriu todos os flancos para a sua colonização. A cidade também teve a forte presença árabe, o que é atestado pelo Palácio Alfajeria. Zaragoza é a capital de Aragón, território fortemente relacionado com a expulsão árabe. A catedral da cidade está construída em cima das fundações de uma mesquita. A localização de Zaragoza é muito privilegiada. Está equidistante, a uns trezentos quilômetros de Madrid, de Valência, de Barcelona e de Bilbao. É a quinta cidade espanhola, contando com mais de 700.000 habitantes. São maiores, pela ordem, Madrid, Barcelona, Valência e Sevilha.
A Basílica do Pilar domina o cenário de Zaragoza. É a maior igreja do mundo, dedicada a Nossa Senhora. 

Andamos por esta cidade, primeiramente numa visita panorâmica e depois a pé, no seu centro e no interior da Basílica de Nossa Senhora do Pilar. Com o ônibus andamos pela parte nova da cidade, toda ela construída em função de seu grande evento, Água e Desenvolvimento Sustentável, realizado entre junho e setembro de 2008, significativamente, às margens do rio Ebro. Mais de cinco milhões de pessoas, de cem países participaram dos debates deste evento. Nesta ocasião, o rio Ebro ganhou quatro novas pontes. É uma cidade eminentemente industrial, sendo a indústria automobilística o seu ponto mais forte. É igualmente forte a presença militar na cidade. Ela foi duramente castigada por ocasião das guerras napoleônicas.
Zaragoza também tem forte presença árabe. Um exemplo disto é o palácio Aljafareria.

O grande orgulho da cidade é a sua Basílica de Nossa Senhora do Pilar, a maior igreja do mundo, dedicada à Nossa Senhora. A Virgem do Pilar é uma das mais antigas tradições católicas, oriunda do primeiro século, quando Ela teria aparecido em cima de um Pilar. A sua comemoração, no dia 12 de outubro se constitui na grande festa popular da cidade. Também é lindíssima a catedral da cidade, construída sobre as fundações de uma mesquita. Outro ponto majestoso é o Palácio mouro de Aljafareria. A Basílica de Nossa Senhora do Pilar é enriquecida por muitos quadros pintados por Goya, inclusive parte de sua cúpula. Não pintou esta cúpula por inteiro, por desentendimentos relativos a questões pecuniárias e, elas estão sem pintura até hoje. Nesta basílica são rezadas missas de hora em hora, obviamente interrompidas durante a hora sexta, a pausa depois do almoço.
A catedral de Zaragoza, construída em cima de mesquita árabe. Mistura o românico, o gótico e o mudéjar.

Conta-se também que Goya teria levado um cano, na pintura da Basílica do Pilar, razão pela qual a teria abandonado. Goya é nascido em Aragón, nas proximidades de Zaragoza, mas veio morar nesta cidade muito cedo. A cidade lhe rende muitos tributos, através de monumentos. O povo da cidade também está profundamente magoado com os políticos e por isso, em suas conversas falam de futebol, de touros e de mulheres, mas nunca de política, pois isto os aborrece.

A próxima parada já seria na Catalunha, numa região de muitas fontes e de álamos. Neste local, já no século XII,os monges cistercienses ergueram um mosteiro e a sua igreja se tornou cemitério de reis. Ali estão enterrados os reis de Aragão. O mosteiro sofreu com as incertezas da política espanhola, chegando inclusive a ser abandonado. A sua restauração completa começou a partir de 1930. Hoje ele é habitado por monges e, você inclusive, pode facilmente cruzar com vários deles.
O monastério de Poblet, onde estão os túmulos da dinastia dos reis de Aragón.

O mosteiro é cercado de muralhas, otimamente conservadas. Os monges se dedicam à produção de vinho, que é vendido em uma loja, no próprio mosteiro. Eles mantém também uma hospedaria e você pode fazer, com eles, um retiro espiritual. Isto está reservado apenas para a população masculina. As disposições internas do mosteiro me fizeram lembrar dos seminários em que eu estudei, o de Gravataí e o de Viamão, ambos no Rio Grande do Sul. Poblet é um pequeno lugarejo em que dominantemente se fala o catalão, uma língua muito próxima do francês. A sua acentuação, ao menos é muito parecida.
Nas proximidades de Barcelona, os montes serrados e o seu mosteiro beneditino.

Já no caminho de Barcelona vimos um dos grandes fenômenos da natureza. Literalmente, as montanhas serradas, ou como falam os espanhóis, Montserrat. Neste local, para variar, também foi construído um mosteiro. Mas o impressionante deste local é a natureza e o engenho humano, de se fazer muito próximo a esta natureza um mosteiro de enormes proporções, não ignorando as dificuldades em sua construção. O seu pico mais elevado está a 1.236 metros de altura. Subimos por um trem, a cremalheira. Lá em cima o ônibus já nos esperava para a descida. Além do mosteiro, do século XI, existem as cavernas, que foram habitadas a partir do século IX por eremitas. Hoje o mosteiro é ocupado pelos monges beneditinos. No mosteiro se ouve um belo canto gregoriano.
Mais uma cena dos majestosos picos de Montserrat. A virgem de Montserrat é a padroeira da Catalunha.

Montserrat, além da natureza também foi revestida com belas histórias religiosas.Ali é venerada a Virgem Negra ou a Morenita, ou ainda a Virgem de Montserrat, a padroeira da Catalunha. Conta-se que a sua estatueta fora trabalhada por São Lucas e levada ao alto por S. Pedro e, por muito tempo, teria sido escondida dos mouros em uma das covas ali abundantemente existentes. Também é famosa a via sacra rezada em meio a beleza desta paisagem. Este pequeno paraíso fica distante de Barcelona, uns 50 quilômetros, sendo local de visita, mais do que obrigatório. A noite chegaríamos a Barcelona, mas a visita ficaria para o dia seguinte.


quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Diário de uma Viagem. Bilbao, La Rioja e Santo Domingo da Calçada.

A cada dia, nesta viagem, você se depara com novidades. Agora mesmo, você não vai ouvir falar nem de romanos e nem de mouros, mas de uma população mais ou menos autóctone e com muita identidade cultural. Estou falando de Bilbao, na província de Vizcaya. Para começar, a cidade é bilíngue, assim como também o é, o seu sistema educacional. A região preserva a língua euskera, de tempos pré-romanos. O seu isolamento, por milhares de anos, se deve aos vales cercados de montanhas por todos os lados.
Museu Guggenheim, de arte moderna e contemporânea em Bilbao, do arquiteto Frank Gheri.

A cidade de mais de 350.000 habitantes e, em torno de um milhão, na região, conheceu forte desenvolvimento nos últimos anos. Há trinta anos vem ganhando os prêmios europeus de modelo em gestão e, ultimamente, também levou o prêmio por terem o melhor alcaide, o melhor prefeito. Os nossos administradores públicos poderiam vir aí para fazer algum estágio. A sua origem histórica está ligada ao porto, ao comércio de lã com os ingleses, à construção naval  e à siderurgia, em função das minas de ferro, abundantes na região. O aço produzido em Bilbao é conhecido como o melhor aço produzido em toda a Europa.  O desenvolvimento mais recente se deve a presença do museu Guggenheim, de arte moderna e contemporânea na cidade e a exposição internacional de 2004, que revolucionaram a cidade, dotando-a da mais moderna infraestrutura. Para isso, em muito contribuiu a canalização do rio Nérvion, com o que foram evitadas as suas enchentes. Também a presença de fortes grupos econômicos espanhóis alavancaram o desenvolvimento da cidade, como o complexo financeiro Bilbao-Vizcaya e o grupo energético Iberdrola.
Os hábitos culturais começam cedo. Crianças visitando o Museu de Belas Artes, em Bilbao.

A cidade respira cultura. Ela está repleta de obras de arte em metais, a riqueza econômica da cidade. Seus museus são renomados, destacando-se o de Belas Artes, que visitamos e o recentemente inaugurado Museu de Arte Moderna e Contemporânea Guggenheim, que atrai turistas até pela sua parte externa. O prédio foi projetado pelo arquiteto Frank Gheri. A sua forte identidade fez com que sofressem muito nos tempos da ditadura franquista, preocupada com a uniformização do país. A sua universidade, fundada pelos salesianos, é muito bem conceituada.

Lamentando deixar a cidade seguimos adiante, para uma atração imperdível. Não iríamos a Pamplona, cidade da qual estávamos nas próximidades e no auge dos festejos de São Firmino, mas para Briones, na província de La Rioja, visitar o museu Cultura do Vinho, da vinícola Vivanco. O museu é fantástico. Para terem uma pequena ideia de sua importância, basta dizer, que por ocasião de sua inauguração, o próprio rei espanhol, D. Juan de Bourbon se fez presente. La Rioja é a grande produtora de vinhos de qualidade na Espanha. A sua história está ligada às pragas que existiram nos vinhedos franceses, de Bordeux, que fez muitos destes produtores migrarem para se estabelecerem em La Rioja. A região é banhada pelas águas do rio Ebro, um dos mais importantes rios da Península, atravessando-a de norte a sul. Nasce na Cantábria e deságua no Mediterrâneo, em Valência. O seu percurso sofreu enormes transposições.
Uma obra de arte no Museu Cultura do Vinho.

Tivemos uma impressionante aula da cultura do vinho ao longo da visita. Quem, minimamente quiser entender de vinhos de qualidade, precisa se dar um tempo para estudar o significado dos diferentes tipos de controle de origem e qualidade  que estes vinhos recebem. Isto começa com o estudo do solo, sobre o tipo de uva adaptável para aquele solo, sobre a quantidade de cachos que podem ser deixados, passando pelo processo de produção e envelhecimento. É uma burocracia enorme, não sei se o termo é correto, a que os produtores tem que se submeter. A uva mais cultivada em La Rioja é a Tempranilho. A cantina visitada foi a Vivanco. Os produtores estão muito satisfeitos com os serviços ligados aos controles de origem e qualidade.
No museu tem de tudo. O processo de produção do vinho, o artesanato da fabricação dos tonéis de carvalho, a produção das rolhas a partir da casca do sobreiro, de quadros artísticos ligados a Baco e até uma impressionante coleção de sacarrolhas.
Entre os inúmeros sacarrolhas desta coleção, achei este bem interessante e prático.

Passamos também por um show de informações sobre sabores e odores do vinho e terminamos com o mais interessante, uma degustação. Na loja da vinícola, um vinho reserva era vendido a 13,00 euros.

Antes de chegar a Zaragoza, ainda tínhamos na agenda uma passagem por Santo Domingo da Calçada, um povoado de menos de dez mil habitantes. O que dá razão a sua existência é estar nos Caminhos de Santiago, num de seus importantes pontos de apoio. Outra coisa que chama a atenção é que na sua igreja são mantidos animais vivos. Esta tradição existe em função da história do galo, que não é só famosa em Barcelos e em Portugal, mas em toda a Península Ibérica.
A igreja de Santo Domingo da Calçada. Importante ponto de apoio no Caminho de Santiago

Como passei por Portugal sem contá-la, conto-a agora, de forma bem simples, mas com um acréscimo espanhol, relativo a beleza do rapaz e a feiura da velha. A história é a de que um belo jovem, ao se hospedar numa pousada, a encontrara lotada. A proprietária, que longe estava de ser bela, lhe falou que só havia vaga se dormisse ao lado dela, o que ele prontamente recusou. A proprietária o seguiu e lhe pôs no bolso umas moedas de prata e, depois o acusou, de tê-las roubado. O juiz o condenou à morte. Antes da execução o jovem jurara ao juiz a sua inocência e apresentou tanta certeza disso, que apresentou ao juiz o seguinte argumento. Como prova de minha inocência, quando o senhor estiver comendo um galo, ele se levantará vivo do prato. Isto de fato aconteceu e o juiz correu ao local onde o jovem estava sendo executado, ainda em tempo de salvá-lo. Esta é a história do famoso Galo de Barcelos e é um dos souvenir mais vendidos em Portugal. É este também o motivo pelo qual, em Santo Domingo da Calçada existem animais vivos na igreja.
Quem disse que só em Faro, em Portugal, tem docinho em forma de bichinho? Em Santo Domingo da Calçada também tem.

O galo é, além de um símbolo de fé, o é também de justiça. A viagem continuou até chegarmos em Zaragoza, a Cesar Augusta romana, onde começaríamos a maratona do dia seguinte, já no rumo de Barcelona. Isso eu conto amanhã.
  

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Diário de uma Viagem. Covadonga, Covas de Altamira, Santilhana e Santander.

Estamos simplesmente viajando pelos Picos de Europa. Não hesito em afirmar que deve se tratar de paisagens, entre as mais belas do mundo. Além das paisagens, também está cheia de história. Uma das maiores atrações destes Picos, está em Covadonga, onde os árabes sofreram o seu primeiro revés, já em 722. A derrota lhes foi aplicada pelo rei Visigodo Pelayo. Este fato é profundamente simbólico. Ele mostrava aos cristãos que seria possível derrotar o inimigo infiel. Os árabes se encarregaram de movimentar a história da Península Ibérica por um longo tempo. Ali chegaram em 711 e só foram definitivamente expulsos em 1492. Vejam que esta luta em Covadonga, aconteceu apenas 11 anos após a sua chegada.
Entre os Picos da Europa, nas Astúrias, esta maravilha que é a Basílica de Covadonga.

A Península Ibérica foi um lugar fantástico de fusões, de raça, de cultura e de troca de saberes. Os cristãos europeus, os mouros e os judeus foram os que mais se misturaram, gerando o que poderíamos chamar de cosmopolitismo. As guerras não ocorreram apenas entre cristãos e árabes, ocorreram também entre os reinos cristãos. As guerras fundamentalmente são movidas por motivos econômicos. Mas as guerras entre cristãos e mouros encheram os livros de história e as telas dos cinemas, além das de pintura. E para nós, do lado ocidental, do ponto de vista do senso comum, sempre com um viés cristão. O olhar é direcionado por aquele que olha e o olhar nunca é algo mecânico. Um olhar sempre é contaminado pela cultura e pela história. Em suma, poderia aqui dizer, que não enxergamos o mundo com os olhos ou, para por um termo nisto, enxergamos o mundo com os olhos contaminados pela cultura.
A gruta de Covadonga. Pelayo em sua luta contra os mouros, levava uma imagem de Nossa Semhora. consigo. Esta é a origem da gruta.

Voltando a Covadonga, o lugar me impressionou demais. Fundamentalmente pela sua beleza e pela visão, de que o simbólico do poder, é construído, fundamentalmente, por sinais visíveis, de ostentação concreta deste mesmo poder. Construir uma igreja, desta magnitude e beleza em meio a esta paisagem é uma demonstração de muito poder. Os cristãos nunca economizaram na construção do imaginário. Sempre falei aos meus alunos do curso de Publicidade e Propaganda que eles deveriam estudar o cristianismo e a sua expansão. Construir uma religião que atinge dimensões universais não é uma questão apenas de poder e de fé. Esta região das Astúrias é banhada pelo rio Sella, onde a canoagem é muito praticada. O turismo se complementa com o turismo rural, com cavalos selvagens e comidas caseiras regionais. Aqui também existe o fenômeno da neblina que cobre a área e em que o sol toma a aparência de lua.
Monumento a D. Pelayo, em memória da primeira batalha e da primeira vitória contra os mouros em Covadonga. Pelayo é mártir e santo católico.

Creio que já perceberam os efeitos que este lugar me proporcionou. Mas contrastando profundamente com o espírito religioso, a próxima parada nos daria um choque de ciência e de racionalidade. A visita ao museu das Covas de Altamira. São especialmente famosas as suas pinturas rupestres. Estas pinturas teriam influenciado fortemente a Picasso, que assim teria se referido a este lugar: "Aqui está tudo, em termos de realidade, de representação e de ciência". São 18.500 anos de história. Na visita ao museu é mostrado um vídeo e é feita uma caminhada, numa área em que o original da caverna foi reproduzido.
Negócios à vista. Quem se interessar, agradeça a sugestão ao povo de Santilhana del Mar.

As Covas de Altamira se situam nas proximidades de Santilhana del Mar, uma pequena cidade de encher os olhos. Possui menos de cinco mil habitantes. É um povoado tipicamente medieval. Situa-se já na região da Cantábria. Existem flores por toda a parte. Ali almoçamos. Comi Calamares, acompanhados de um bom vinho regional. A pequena cidade está cheia de lojas de souvenir, alguns muito criativos por sinal. Tem uns que propõe negociações nada convencionais, como vou mostrar numa foto. 

Ao meio da tarde chegamos em Santander, a capital da Cantábria. Santander situa-se no litoral, no mar Cantábrico, denominação que o Oceano Atlântico recebe nesta região. É uma cidade eminentemente turística, tanto como balneário, quanto como montanha. Cantábria, na linguagem celta, significaria habitante da montanha. Santander tem exatamente esta característica. Situa-se junto ao mar e junto aos Picos da Europa. A sua praia mais famosa é El Sardinero, onde fica o Palácio de La Magdalena, palácio da realeza espanhola, erguido por Afonso XIII, no início do século XX. Ele tem uma agitada história. A sua localização também transformou a cidade em importante porto. Tem algo em torno de 200.000 habitantes.
O Palácio de La Magdalena, na praia de El Sardinero, na cidade de Santander.

Fizemos um interessante passeio com um pequeno trem por El Sardinero, rodeando o Palácio de La Magdalena. Paramos no seu aquário, com os seus fabulosos bichos aquáticos. Tivemos tempo para fazer uma caminhada junto ao mar. Deu para experimentar as suas águas, gélidas, uma barbaridade. Nos hospedamos nas proximidades de um luxuoso cassino. A cidade também é marcada por inúmeros palacetes. Nos contou a guia, que eles foram construídos durante a Segunda Guerra, em função da neutralidade espanhola. Ricos dos dois lados abandonaram suas pátrias em guerra, abrigando-se neste paradisíaco local. Na cidade também se encontram, por toda parte, enormes canteiros de flores.
Belos canteiros de roseiras, em Santander.

Nesta cidade mora a família Botin, dona do banco Santander, a família mais poderosa da Espanha. A guia nos contou, que esta família tinha adquirido, recentemente, um banco público no Brasil, no início do século. Assim todos podem ver que a privataria tucana deste período, fez fortunas mundo afora. Creio desnecessário dizer que o banco adquirido foi o banco do Estado de São Paulo, o Banespa. Para o dia seguinte a agenda marcava Bilbao, La Rioja e Zaragoza.