segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Diário de uma Viagem. Peníscola e Valência.

Antes de prosseguir viagem, ainda preciso contar a história de São Jorge, o padroeiro da Catalunha e que tem, na cidade de Barcelona, um de seus mais belos e ricos rituais. No dia 23 de abril, o dia de seus festejos, a Rambla se torna extremamente colorida e cheia de tendas de flores e de livrarias. Neste dia, a população, tem por tradição presentear as pessoas amadas, com uma rosa, se for mulher ou com um livro, no caso de ser homem. A tradição é tão forte, que a partir do ano de 1995, a UNESCO decretou o dia 23 de abril, ou o dia de São Jorge, ou Saint Jordi, como o dia internacional do Livro. Mas vejamos brevemente a história do santo.
Barcelona não é apenas A Sagrada Família. Ela tem uma das mais belas e significativas tradições do mundo. No dia 23 de abril se presenteiam as pessoas amadas com rosas e com livros.

São Jorge é uma santo guerreiro, um santo de origem militar. Por esta razão ele é muito estimado pelo mundo católico, pois a difusão da religião sempre teve um forte componente militar. A sua devoção está espalhada pelo mundo afora, transcendendo, inclusive, as fronteiras cristãs, para transformar-se em Ogum, nas religiões afro, de grande devoção na nossa querida Bahia. Existem também inúmeras e diferentes histórias deste santo. Uma das mais famosas e em voga na Catalunha é a que conta da existência de um  terrível dragão, que poderia vitimar uma cidade inteira com o veneno de seu hálito. A sua força era enorme e, em sua pele não penetravam nem a espada, nem a lança. Mas se contentava com o oferecimento de uma bela donzela a cada dia. Quando sobrou apenas a princesa, a filha do rei, o Guerreiro se posicionou em frente ao monstro, e enterrou-lhe a lança em sua garganta.
No dia 23 de abril La Rambla se enche de quiosques de flores e livrarias. As pessoas amadas são presenteadas com livros e com rosas.

Quando o guerreiro foi levar para a princesa o sangue do dragão morto, o sangue se transformou numa bela rosa vermelha. A festa ganhou como símbolos, a fertilidade e, para a Catalunha em particular, a defesa de seus valores culturais e de sua língua própria. Existem pessoas, que a partir desta data já colecionam mais de cinquenta livros. Uma tradição destas, bem que poderia também vingar por aqui. Fica aqui a sugestão para os donos de livrarias e para as secretarias de cultura de cidades e estados. Ainda um lembrete. São Jorge é também o padroeiro do clube da cidade, o Fútbol Club Barcelona.

Mas o ônibus já está de partida. Vamos continuar viajando pela costa mediterrânea, ouvindo histórias da região, contadas pela guia, Macarena, uma menina muito divertida e grande contadora de piadas. Aprendi que a maioria das piadas soa, apenas, em língua nacional. Além da conversa, vimos parte do filme El Cid, obviamente, os que não dormiam.  O filme, um dos grandes épicos do cinema ítalo americano, data de 1961 e tem em Sophia Loren e Charlton Heston,os seus protagonistas. Mas qual é causa de estarmos vendo este filme agora? É que estamos indo para Peníscola, onde existe um castelo, cercado de muralha por um lado e pelo mar do outro. Este castelo foi o grande cenário deste filme. EL Cid é um herói espanhol do século XI, que se destacou nas guerras entre cristãos e contra os mouros.
O castelo de Peníscola foi fortaleza contra os mouros, propriedade dos templários e cenário do filme El Cid.

O castelo também foi palco de muita história. Ele foi construído no século XIII, em cima de antigas fortificações mouras. Foi ocupado pelos templários, que na região se dedicavam a extração do sal. Durante o cisma do Ocidente, também serviu de sede do papado, de dois anti-papas. O cardeal Pedro Luna, que tomou o nome de Bento XIII, ficando conhecido, porém, como o Papa Luna (1411-1423) e de Clemente VIII, que abdicou em 1429. Que tempos complicados. Hoje Peníscola é uma pequena e paradisíaca praia do Mediterrâneo e que conta com algo em torno de dez mil habitantes.
O papa Luna, ou anti-papa Bento XIII, que fez do castelo de Peníscola a sede de seu papado.

Em Valência fizemos a nossa parada para o almoço. Não podia ser diferente. Comemos uma paella valenciana e tomamos o vinho regional, o moscatel. A cidade é a terceira maior da Espanha e também dotada de toda a infraestrutura necessária. Cenário de muita história, de lutas e de guerras. Ali se desenvolveu a Batalha de Sagunto, na segunda guerra púnica, bem como inúmeras batalhas entre cristãos e mouros. O seu desenvolvimento é relativamente recente, posterior a ditadura franquista, e ligada a uma série de eventos internacionais, inclusive a corrida de fórmula um, por sinal, em crise. É a terceira cidade espanhola, contando com uma população superior a 800.000 habitantes e em torno de dois milhões na sua região metropolitana.
A bela catedral da cidade Valência.

É conhecida como a cidade das ciências e das artes, a terra da laranja e dos produtos horti-fruti-granjeiros. Me lembro de minha infância em Harmonia, onde cultivávamos um tipo de laranja, que tinha o nome de valência. Creio que este detalhe ajuda a identificar a cidade de Valência com a cultura da laranja. Ela era colhida em outubro/novembro e que nós empapelávamos, para vendê-la mais tarde e, assim pegar preços melhores. O seu rio, o Túria, foi deslocado da cidade, por causa de suas enchentes e o seu antigo leito foi transformado num jardim. Os valencianos também cultivam uma forte identidade, inclusive a sua língua própria, o valenciano. A sua catedral e o Palau de la Generalitat, são as suas grandes atrações turísticas. A sua festa mais popular é a das Fallas, no dia de São José, quando são queimados enormes bonecos, com os quais representam a classe política. Aliás, Valência tem forte tradição de vida política. Foi a capital da Espanha republicana e democrática, entre 1937 e 1939, durante a Guerra Civil Espanhola. A cidade está ligada a Madrid por um trem de alta velocidade.

Em Valência paramos por muito pouco tempo para conhecer mais de sua história e visitar todos os seus lugares turísticos mais importantes. Neste dia andamos demais e paramos pouco. Viajamos mais de 700 quilômetros e o destino final seria a cidade de Madrid e ainda com translado para a Plaza Mayor. Nos acomodamos no hotel, no Praga, o mesmo do ano passado, preferindo um merecido descanso, sem antes uma boa cerveja, acompanhada de tapas.

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