Conheço o frei Betto de longo tempo. Desde a formação de quadros políticos em Cajamar (S.P.). Tenho por ele profunda admiração. Inclusive li o Livro da vida, de Santa Tereza D'Ávila, livro ao qual, ele dizia para nós, sempre recorria em momentos de dúvida, de angústias existenciais ao longo de sua vida. Há um ano, mais ou menos comprei o seu Jesus militante - Evangelho e projeto político do REINO DE DEUS. Não o li de imediato. Deixei-o numa lista de espera.
Jesus militante. Frei Betto. Vozes. Petrópolis. 2022.
Na semana passada terminei de ler Zelota - a vida e a época de Jesus de Nazaré, de Reza Aslan. Aslan é historiador e com o seu livro nos pretende mostrar o Jesus histórico, o Jesus que viveu na Palestina, sob o duplo domínio do Império Romano e dos Sacerdotes do Templo de Jerusalém. O livro, numa indicação de seu conteúdo, tem uma epígrafe bem ilustrativa: "Não pense que eu vim trazer paz sobre a terra. Eu não vim trazer paz, mas a espada". Ele fala muito do projeto do Reino de Deus. Creio que já perceberam porque eu emendei a leitura de Zelota, com o livro de frei Betto. Não precisa nem abrir o livro para encontrar a resposta. Basta ver o título e o sub título. Jesus militante - Evangelho e projeto político do REINO DE DEUS.
Na contracapa de Jesus militante encontramos a síntese do teor e da finalidade do livro: "Frei Betto escreveu este livro àqueles que se queixam de não compreender os evangelhos e não entender o caráter militante da missão de Jesus. Daí a escolha do Evangelho de Marcos, o primeiro dos quatro, e a base dos relatos de Mateus e Lucas.
Jesus não veio fundar o cristianismo ou a Igreja. Veio nos propor um novo projeto político, condensado na expressão REINO DE DEUS - uma sociedade apoiada em dois pilares: nas relações pessoais, o amor; nas sociais a partilha dos bens da Terra e dos frutos do trabalho humano". Nas orelhas encontramos mais:
"Escrevi Jesus militante a partir de minhas convicções sobre a missão do Filho do Homem. Os evangelhos sempre me intrigaram. Não são relatos históricos. Foram escritos para animar a fé das primeiras comunidades cristãs. Mas se baseiam em fatos reais. Embora contenham 'adaptações' de episódios do Primeiro Testamento.
A vida de Jesus foi marcada pelo conflito. Seus pais Maria e José - sofreram perseguição do Rei Herodes e se viram obrigados a se exilar no Egito. Seu primo e precursor, João Batista, morreu assassinado por ordem do governador da Galileia, Herodes Antipas. Jesus rompeu com o poder religioso do Templo de Jerusalém. Foi um dissidente. Criticou o Império Romano por ocupar a Palestina. Considerado subversivo, o prenderam, torturaram, submeteram ao julgamento de dois poderes políticos e o condenaram à morte na cruz. Ousou, dentro do reino de César, anunciar um novo projeto civilizatório: o Reino de Deus.
Escolhi o Evangelho de Marcos por ser o relato mais próximo do Jesus histórico. E o que melhor descreve o Jesus humano. Em anos de pesquisas, convenci-me de que Jesus não veio fundar uma religião (o cristianismo) nem uma Igreja (a cristã). Veio resgatar o projeto original de Deus para toda a humanidade, fundado no amor e na partilha. E o fez a partir do que, séculos depois, inspiraria a pedagogia libertadora de Paulo Freire: o protagonismo dos pobres e oprimidos.
A atuação militante de Jesus ecoou como uma boa-nova. Suscitou Comunidades Eclesiais de Base por toda a orla do Mediterrâneo. E, três séculos depois, pôs abaixo o Império Romano.
A institucionalização do movimento de Jesus em uma Igreja vinculada ao poder e apegada a seu vasto e rico patrimônio arrefeceu o impacto da militância de Jesus. Fora da massa, o fermento perdeu parte de sua força revitalizadora.
Ora, não é nos sacrários, que Jesus quer ser preferencialmente encontrado. E sim naqueles que, como Ele, são marginalizados, excluídos, injuriados e injustamente condenados. São eles os artífices do projeto libertador condensado na expressão Reino de Deus.
Espero que este livro suscite nos leitores e nas leitoras a mesma esperança e o mesmo vigor do Jesus militante". Algumas coisas para sublinhar: O Jesus como uma figura histórica; o duplo domínio sobre os judeus, pelo Império Romano, em aliança com os sacerdotes do Templo; o Templo como uma forte organização econômica; os constantes conflitos e tentativas de libertação dos judeus do jugo romano; e o projeto do reino de Deus, com libertação do jugo da dominação, seja de quem for. E os dois fundamentos: o amor nas relações pessoais e nas sociais a partilha dos bens originários do trabalho, para o estabelecimento de uma sociedade justa e de igualdade. Frei Betto destaca também a emancipação feminina do jugo patriarcal para o estabelecimento do Reino.
Como já foi enunciado, a base para apresentar o Jesus militante é o Evangelho de Marcos, escrito em Roma, por volta do ano 70 d.C. Nesse tempo o Templo foi destruído pelo Império, para conter uma rebelião popular. E como diz frei Betto, a finalidade da escrita era para animar a fé das comunidades cristãs que estavam se formando entre os gentios. Foi o primeiro Evangelho escrito, sendo assim o mais próximo do tempo de Jesus.
Jesus militante ao seguir o relato de Marcos, de 16 capítulos, tem ele também os mesmos16, como verifiquei na Bíblia que tenho aqui em casa, da Editora Ave Maria, que adquiri, ainda nos meus tempos de seminário. Ao todo são 201 páginas. O livro também ajuda a compreender o porquê de nem todos os cristãos aceitarem essa mensagem do Reino. Ela serve para as mais diversas interpretações, como destaca o frei, na Introdução:
"Ninguém é mais controverso na história humana do que Jesus de Nazaré. nele se apoiam os fundamentalistas cristãos dos EUA, que defendem a índole imperialista da Casa Branca, e os militantes das Comunidades Eclesiais de Base da América Latina, de cuja prática brotou a Teologia da Libertação. Jesus é evocado por pastores neopentecostais que atribuem ao diabo mais poder do que a Deus, e por sacerdotes católicos que, em nome dele, condenam o capitalismo como intrinsecamente injusto". Ao longo do Livro, Betto também relata momentos de sua militância política e as condenações que sofreu em consequência.
Apresento também a resenha do livro de Reza Aslan, sobre o Jesus histórico que ele nos apresenta em Zelota. Ressalto porém a diferença entre os dois livros. Jesus militante nos é apresentado por uma pessoa religiosa e Zelota, por um historiador. Segue a resenha:
http://www.blogdopedroeloi.com.br/2024/07/zelota-vida-e-epoca-de-jesus-de-nazare.html