sábado, 25 de junho de 2016

Plenos Pecados. Luxúria. A casa dos Budas Ditosos. João Ubaldo Ribeiro.

Se existe um livro na coleção Plenos Pecados que efetivamente se ocupa do pecado proposto, este livro é o de João Ubaldo Ribeiro, A Casa dos Budas Ditosos que, também com muita propriedade, segundo o autor, poderia se chamar de Memórias de uma Libertina. Opa, uma primeira observação extremamente importante. João Ubaldo não é o autor deste livro, conforme nos conta na abertura do livro.
Este realmente é um livro de um pecado pleno: A luxúria.


João Ubaldo meramente fez a transcrição das memórias de CLB, uma senhora de 68 anos, que ao saber que uma editora iria lançar os Plenos Pecados, deixou as gravações com o porteiro do prédio onde ele morava. Assim o escritor se exime de qualquer responsabilidade quanto ao conteúdo e aos possíveis excessos ou exageros que constam nestas memórias, que, vejam bem, são as memórias de uma libertina. E haja libertinagem!

Esta senhora, CLB, no primeiro capítulo nos conta de sua formação. Se considera uma senhora católica politeísta. Tem uma veneração especial por são Gonçalo, a quem é atribuído um falo grande. Lamenta profundamente o legado imbeciloide repressivo de sua formação mas que, no entanto, não teve grandes dificuldades de superar. CLB teve uma grande amiga que muito a ajudou neste processo de superação libertadora, Norma Lúcia.

O cenário da libertinagem começa por Salvador, com passagens pela ilha de Itaparica e que terminam na cidade do Rio de Janeiro. Ignoro as razões da inclusão de Itaparica neste cenário. Itaparica é..., deixa prá lá. As libertinagens de CLB não são apenas nacionais. O mundo inteiro era cenário de suas aventuras. Creio que ela não enrubesceu nenhuma vez ao descrevê-las.

Todas as formas de fazer sexo são descritas. Poucas linhas são dedicadas ao sexo romântico e ingênuo, pelo contrário, capítulos inteiros são dedicados ao sexo sacanagem ou ao pan-sexualismo do qual se confessa fiel seguidora. É sexo hetero, homo, grupal, este conhecido no Brasil como suruba, para a qual, lamenta, os americanos nem sequer tem uma palavra apropriada para expressá-la, mas não por falta de sua prática. Também considera os americanos ruins no quesito da sexualidade, pela sua excessiva preocupação com números, estatísticas e rankings. Coisas da quantidade e não da qualidade. Até técnicas de controle da ejaculação precoce ela fornece, já quase ao final do livro.

O relato de CLB também tem a preocupação em desmontar todos os preconceitos relativos ao comportamento sexual como a questão das relações incestuosas. Elas estão na Bíblia e os religiosos são especialistas na ocultação destas passagens. Conta que seu irmão foi o mais perfeito parceiro em todas as suas aventuras. Sexo com  religiosas e religiosos também faziam parte de suas aventuras. Estas ocorriam mais nos Estados Unidos. Como vimos ela tinha sérias restrições a este povo em função de sua herança cultural, uma broxura calvinista ou veadagem anglicana enrustida, nos conta ela, quando fala das restrições destas culturas à naturalidade da relação homoafetiva feminina. Ela também ataca a linguagem do, tão em moda, politicamente correto.

Enfim, o livro é um convite à liberação. CLB é extremamente presunçosa. Ela se considera uma das vozes de Deus, tão abafada pelos meios religiosos. Achei estranho ela se referir muito pouco à excessiva preocupação dos religiosos com a vida sexual dos outros, especialmente na questão das relações de gênero. Ou a ideologia de gênero é mais uma destas invencionices das auto frustrações das imbecilidades do legado cultural. Tenho uma sugestão a fazer. Que tal dar este livro de presente, ao menos aos principais pastores midiáticos, que indevidamente ocupam os espaços dos nossos meios de comunicação. 

Aos 68 anos CLB anuncia que está próxima da morte. Mas tem absoluta certeza que não será de câncer. Nunca reprimiu nenhuma célula de seu corpo para que elas queiram agora se expandir. Também não teme a ira divina e não carrega nenhuma culpa, como podemos ver no encerramento de sua narrativa: "Faço tudo que me dá na cabeça, não quero saber de limitações. Eu não pequei contra a luxúria. Quem peca é aquele que não faz o que foi criado para fazer. Não quero entender nada. Quero acreditar, mas não posso ter certeza, não se pode ter certeza de nada, que Deus me terá em Sua Glória e sei que Ele agora está rindo".

Vamos ainda ao Aurélio. Luxúria é "Viço ou exuberância das plantas. Incontinência, lascívia, sensualidade. Dissolução, corrupção, libertinagem. E uma certeza final. João Ubaldo Ribeiro é um escritor luxurioso, sensual e libertino. Maravilhoso.





quarta-feira, 22 de junho de 2016

Plenos Pecados. A Inveja. Mal secreto. Zuenir Ventura.

Zuenir ventura é um velho conhecido. De tanto apreço, o deixei para ler quase ao final. Só não o deixei por último, por causa de João Ubaldo Ribeiro, que apresenta o pecado da luxúria, que eu li quando do lançamento da coleção. Mas já amanhã começo a sua releitura. Zuenir Ventura, pelo que tudo indica, foi o primeiro a escolher tema e confessa um certo arrependimento quando se deparou com toda a complexidade do mais horrível dos pecados, a inconfessável inveja.

"A inveja não goza de boa reputação", afirma o psicanalista Renato Mezan. Este deve ser o motivo pelo qual Zuenir escolheu o título - Mal secreto, retirado de um soneto de Pedro Corrêa, que tem exatamente este título. É o pecado que todo mundo esconde. Ninguém o confessa. É também um pecado difícil de definir, sendo facilmente confundido com a ambição e a inveja.  Zuenir Ventura também o considera como o primeiro de todos os pecados. O pecado de Adão. A sua ambição foi precedida pela inveja quando se quis igualar a Deus.
Um livro trabalhado com muita seriedade. A complexidade do ser humano.


O tema foi longamente estudado pelo autor. Primeiro fez uma ampla pesquisa bibliográfica. Ao final do livro ele, num belo gesto, nos dá uma listinha preciosa, uma relação dos principais livros que abordam o tema. Depois faz uma pesquisa, através do Ibope, medindo o sentimento brasileiro com relação a este odiado pecado. Este trabalho foi depois complementado com questionários e entrevistas com os profissionais que mais diretamente lidam com este sentimento, digo, pecado. Os pais e mães de santo dos terreiros, os padres e os seus segredos de confessionário e os psicanalistas e os seus divãs.

No parágrafo acima eu ia falando do sentimento da inveja, mas imediatamente eu corrigi - o pecado da inveja. Dante deve ter cometido este mesmo engano mas não o corrigiu. Os invejosos que precederam a Dante, e não foram poucos, foram colocados no purgatório e não no inferno. No entanto, é um pecado gravíssimo, especialmente, porque ele sempre vem junto com seus agregados: a ganância, a avareza, a voracidade o ciúme e o ódio. É também diretamente responsável pelo primeiro crime, por assassinato, cometido na Bíblia. Caim mata o seu irmão Abel, por inveja.

Quem menos colaborou com Zuenir em sua pesquisa foram os padres. Alegavam segredos de confissão. Psicanalistas e pais e mães de santo foram bem mais colaborativos. Inclusive, a mãe de santo Lucinda, a mãe adotiva da invejável Kátia, fornecerá o principal fio condutor de toda a narrativa, junto com o seu namorado Fernando, mais Ivan o grande amigo, desde a infância. Seria mesmo seu amigo? Opa, perceberam que eu usei a palavra invejável e me parece que num sentido amplamente positivo. Existe inveja boa, assim como existe também um câncer bom?

O psicanalista Mezan categoricamente nega a possibilidade da existência de um inveja boa. Inveja boa é admiração. Mezan também dá uma definição muito precisa deste pleno pecado. O prazer do invejoso não é exatamente querer o que o invejado tem mas "é acabar com o prazer do outro, é não querer que o outro tenha". Tristitia de alienis bonis, diria santo Tomás de Aquino.

Mas voltemos a invejável Kátia, uma moça de 23 anos, amadrinhada de Lucinda. Zuenir as conheceu através de um antropólogo amigo. Primeiramente ela se esquiva o máximo possível, mas aos poucos não fará mais segredo de seus casos, ou de seu caso que envolve diretamente a inveja. Ela namora Fernando mas também tem casos com Ivan. Ivan tem comportamentos absolutamente estranhos e o caso parece que não irá acabar bem. Ivan convence Katia a usar uma poção mágica, preparada por Lucinda, para  reaproximá-la de Fernando, numa crise no relacionamento. Funcionou bem e deu ótimos resultados mas  após uma dose de reforço, Fernando tem um fulminante ataque cardíaco.

Zuenir também faz um relato paralelo à trama principal, contando a sua própria história. Enquanto trabalhou no projeto do livro, foi acometido de um câncer e a sua humana luta contra o mesmo. Pólipos, ou seriam polipos, na bexiga. O romance tem data de 1998 e Zuenir ainda está bem vivo. O seu mal secreto, embora maligno - não benigno, foi contido.

O final do livro é bastante surpreendente. Ivan deve ter sido um caso raro de inveja e o seu destino final não nos é revelado mas o autor nos dá um precioso indicativo na frase final: "Kátia continuava um mistério para mim, mas, pelo que conheci dela, eu não queria estar no lugar de Ivan daqui para a frente".

Embora a inveja tenha sido o pecado mais bem trabalhado e mais bem definido entre os diferentes livros da coleção, vamos ainda à definição do Aurélio: "desgosto ou pesar pelo bem ou pela felicidade de outrem. Desejo violento de possuir o bem alheio". 

segunda-feira, 20 de junho de 2016

Plenos Pecados. Soberba. O voo da rainha. Tomás Eloy Martínez.

Este é o meu segundo encontro com o escritor argentino Tomás Eloy Martínez. O primeiro contato ocorreu em 2012, com o livro O cantor de Tango. Fiquei maravilhado. O tema era a ditadura militar argentina. Agora um novo contato. A admiração só fez crescer. Trata-se de um grande escritor. Desta vez o livro foi O voo da rainha, da coleção Plenos Pecados e o pecado abordado é o da soberba, o primeiro pecado cometido e do qual todos os outros derivam. Será?
O maravilhoso livro do grande escritor argentino.


A trama do romance é cativante. É daqueles livros que você não para de ler enquanto não o termina. O mote para a abordagem da soberba é o jornalismo, ou mais precisamente, a redação de um jornal. Ali tem de tudo. Desde o máximo de soberba bem como o seu contrário, a servidão total, ou numa linguagem mais clara, o puxa-saquismo e a rendição total à soberba do chefe.

O personagem central é o excêntrico Dr. Camargo e uma mulher, que começa a crescer ao longo do romance, Reina Remis, a moça que ele observa a partir de sua janela. Camargo tem poderes ilimitados e Reina faz de tudo para crescer profissionalmente. O jornalismo praticado pelo Diário era o jornalismo investigativo, com foco na cobertura da corrupção do governo da Argentina no final dos anos 1990. Camargo era amigo do jornalista brasileiro Antônio Pimenta Neves, que lhe passa preciosas informações sobre a corrupção do filho do presidente argentino.

Pimenta Neves é o jornalista que se tornou famoso por um crime passional, quando ele (63) mata Sandra Gomide (32) com quem viveu um rumoroso caso de amor por três anos, quando a assassina por questões de ciúmes. É nesse período que Reina chega ao jornal e chama a atenção de Camargo com um texto sobre a morte de Robert Mitchun. O seu artigo sobre o ator remete a um filme em que existem referências a Jesus e a um possível irmão gêmeo seu, Simão, que aparece nos evangelhos apócrifos. 

Reina se torna famosa quando as notícias que envolvem a corrupção do presidente argentino ganham notoriedade. Num jogo midiático ele se retira a um convento de monges beneditinos, anunciando a todos que tivera uma aparição de Jesus Cristo. Ele voltara à terra. Reina, que sempre mostrou interesse em estudos de teologia, prova biblicamente que Ele só voltaria à terra em total triunfo e nunca em aparições individuais. A farsa se desvela junto com a indignação do abade que abrigara o presidente. Reina ganha primeira página.

Este parágrafo pretende ser um entre parêntesis à resenha. A invenção desta história para provocar o desvio do foco da corrupção é simplesmente memorável. Fica aí a sugestão para os marqueteiros do governo Temer. O problema é que envolve bastante gente. Como pode ser tão atual este livro. Ele foi escrito em 2002.

Reina provoca profunda admiração em Camargo e um relacionamento afetivo começa a ocorrer. Viajam o mundo. Camargo esquece de tudo na vida por causa dela e, também para o êxito do jornal, onde pratica os atos de soberba. Questão de competição. Esquece de Brenda, a esposa, esquece as filhas gêmeas, sendo que uma delas está sendo vitimada pelo câncer. A relação sempre fora tempestuosa mas se sustentava.

Até que um dia Reina se apaixona e aí começa a sua destruição. A sua paixão é um jornalista colombiano que fere profundamente o sentido de posse de Camargo. A sua vingança é quase inimaginável e não adianto nada de sua vingança para não comprometer a expectativa da narrativa do leitor. Adianto apenas uma frase: "Não foi só com doenças venéreas que ela foi contaminada duas noites atrás: também com uma paranoia maligna, um instinto de fragilidade do qual ela não sabe como se proteger". Lembrando que a paranoia é formada por medos insuperáveis e insuportáveis.

A destruição também atinge a sua vida profissional. Não há mais trabalho no meio jornalístico de Buenos Aires para ela. Mas esta menina destruída ainda é a paixão doentia de Camargo, que não se sentindo correspondido, repete a história de Pimenta Neves. O seu processo de absolvição foi muito fácil. Nenhuma culpa. Na contracapa do livro se lê: "A soberba é o mais prolífico dos vícios capitais. Como um desejo desordenado de glória e superioridade, a soberba também é considerada a forma básica do pecado - foi ela a responsável pela desobediência primeira, a de Adão, que provou do fruto proibido com a ambição de tornar-se Deus". Até uma origem histórica dos pecados capitais cabe no livro.

E mais uma frase, já da parte final do livro, quando Camargo é agraciado com um mel especial que as abelhas reservam apenas para a abelha rainha: "Porque o senhor não experimenta o mel com a cera Dr. Camargo. - Se as rainhas tiram daí toda a força que precisam para voar tão alto, imagine o efeito que isso pode fazer no senhor, que é um príncipe". Ainda recomendo uma atenção especial em todas as incursões teológicas que o narrador faz, especialmente, quando usa de Reina para expressá-las.

Ainda o Aurélio: Soberba é: "Elevação ou altura de uma coisa em relação a outra. Orgulho excessivo; altivez, arrogância, presunção, sobraçaria, sobranceira". O próximo livro do autor a ser lido será será uma biografia de Evita.

sábado, 18 de junho de 2016

Plenos pecados. A ira. Xadrez, truco e outras guerras. José Roberto Torero.

Muito pouco eu conhecia da vida de José Roberto Torero. Coisas do esporte e de roteiros para o cinema. Na literatura, apesar de já ter ganho o prêmio Jabuti com O chalaça (1995), este foi  o meu primeiro contato com sua obra. E foi muito bom. Gostei demais de ler, da coleção Plenos Pecados, o livro Xadrez, truco e outros jogos, sobre o pecado da ira. Acima de tudo muita ironia.
O pecado da ira pode até ser compartilhado com deus.


A ira talvez seja o único pecado que é cometido por Deus ou pelos deuses, mais em tempos antigos do que nos tempos atuais, dizem. Acho que não. Ou estaria profundamente enganado? Os deuses o cometem constantemente e devem se alegrar muito quando os humanos o cometem em seu nome. Ele sempre se justifica quando é para combater o mal. Como o mal nunca foi derrotado, a sua prática continua a assombrar o nosso cotidiano. A ira é um estado permanente e benfazejo no eterno combate ao mal. A ira fará a pessoa ser merecedora de muitas glórias.

Torero me fez lembrar de Saramago. O Saramago que faz uma prestação de contas com Deus, em O Evangelho segundo Jesus Cristo, com o Deus do Novo Testamento e de Caim, quando a prestação de contas se dá com o irado Deus do Antigo Testamento. Mas é evidente que nem todos tem o mesmo olhar. Raul Seixas nos confessa que, já aos onze anos, não acreditava na verdade absoluta. E quando a verdade não é absoluta, tudo é relativo e os olhares passam a ser diferentes.

Olhares diferentes. Assim é que começa a construção do belo romance. O rei e o diplomata em seus jogos de xadrez, para os inteligentes, e o truco, para o qual "não é necessário raciocínio, mas esperteza, dissimulação e sorte", veem a guerra com os seus espertos e calculados olhares, assim o general, o coronel, o capitão, o tenente, o sargento e o soldado. O rei quer que os seus aliados vençam as próximas eleições, o diplomata vender suas armas, o general ganhar títulos e medalhas, o coronel as suas promoções o capitão fazendo cálculos, o tenente e o sargento com suas maldições e o soldado com a disposição de matar o ditador do país vizinho.

Todos cometem o pecado da ira e procuram dela se alimentar. Ela sempre vem acompanhada de outros pecados, especialmente com o da ambição. A narrativa foi extremamente bem construída. O grande palco para a ira foi armado através da guerra do Paraguai, ou de forma menos explícita ao país situado a oeste. O capelão acompanha o exército, sempre fazendo sermões para manter a ira em alta temperatura contra os covardes soldados do povo vizinho.

Belas tramas vão formando o enredo e, segundo a orelha do livro "uma guerra, no entanto, não se constroi apenas com atos corajosos. Há paixões mesquinhas. Gestos infames. Feitos inglórios. Há covardia, medo, mortes. Há até mesmo amor". E a história de amor é muito bonita. É de uma timidez comovedora. A declaração de amor, por sinal plenamente correspondida, é de uma invenção criativa maravilhosa.  Merece uma cópia na vida real. Um belíssimo jogo de sedução. O soldado e a mulher das cartas.

Além da ironia há jocosidade. Ou os dois estados de ânimo sempre caminham juntos. Quanto de mediocridade não existe numa guerra e quanto desprezo por vidas humanas. A guerra do Paraguai deve ter sido uma trapalhada só. Me deu vontade de ler A retirada da Laguna, não sei exatamente o por quê.

Mas o livro termina com os mesmos personagens com os quais o autor começou o livro. Uns não voltaram, outros estavam bastante mutilados, com sinais das batalhas, com promoções, condecorações e títulos por receber. Mas os mais felizes eram o rei e o diplomata, que ao longo da guerra nunca abandonaram o seu jogo de xadrez ou truco e nem a vontade de novamente se sentirem tão irados, a tal ponto, se os interesses o ditarem, promoverem outra e nova guerra, agora contra os povos do leste. A guerra sempre é um momento de grandeza nacional.

Para não cometer injustiça com as outras obras, a definição de ira retirada do Aurélio: "Cólera, raiva, indignação. Desejo de vingança". Apenas isso.Também me lembrei dos constantes jogos de truco nas cantinas de nossas universidades. Exercícios ou jogos do que mesmo?

terça-feira, 14 de junho de 2016

FHC e Lula: Uma continuidade. PT e PSDB iguais. O Olhar de Francisco de Oliveira.



Um texto meu de 2006 para a revista Ciência e Opinião da Universidade Positivo.


FHC e Lula. Uma Continuidade. PT e PSDB  iguais. O olhar de Francisco de Oliveira.

Estranho! Estranho! Que disparate é este? Vejo dois reis – e somente um burro.
(Nietzsche, no quarto livro do Zaratustra, referindo-se ao encontro com dois reis: o da esquerda e o da direita e que carregam no mesmo burro os seus sonhos).

Pedro Elói Rech. Mestre em História e Filosofia da educação. PUC-SP.- Professor de Teoria Política e Filosofia no UNICENP.

Apresentação:

            Entre o tão rico quadro de debates sobre a realidade brasileira e nas exigências formais para este texto, optamos por fazer um acompanhamento do pensamento do eminente sociólogo da USP, o professor Francisco Oliveira, um dos fundadores do PT e agora contundente crítico do mesmo. Dividimos o texto em duas partes: primeiramente acompanhamos as críticas de Oliveira feitas em pronunciamentos e pela imprensa e na segunda acompanhamos um ensaio seu intitulado “O Ornitorrinco”. Concluímos com algumas críticas que complementam as visões relativas ao governo Lula.

O Pensamento de Francisco Oliveira na imprensa e no - O Ornitorrinco.

            Um dos seus primeiros artigos foi publicado pela Folha de S.Paulo no dia 18 de maio de 2003. O seu título é uma interrogação: O enigma de Lula: ruptura ou continuidade? E a sua conclusão é uma espécie de absolvição. In dúbio pro reo.
            O artigo, meticulosamente trabalhado, examina o processo eleitoral de 2002, que conferiu a vitória a Lula, passando pela análise da derrota do grupo de FHC. O tom inicial é até certo ponto eufórico, com a expressiva vitória de Lula e a eleição de uma forte bancada do PT para o Congresso, que poderia significar, além do fim da era FHC, também o de um longo ciclo da “via passiva” brasileira, uma vez que os votos dados a Lula, foram dados para a promoção de mudanças.
            A vitória de Lula se deu fundamentalmente em função do fracasso do segundo governo FHC e representou, nas palavras do sociólogo “um caleidoscópio de protestos, promessas, possibilidades, frustrações, insegurança, falta de horizontes. É uma soma negativa, como na álgebra, onde menos com menos dá mais” (Folha de S.Paulo. 18.05.03). Este caleidoscópio não se desfez com a eleição. Ele permanece no governo Lula e exige constantes acordos ad hoc, numa administração de problemas diversos e divergentes, reduzindo os espaços políticos dos horizontes amplos e das possibilidades, para uma mera e difícil administração do cotidiano.
            Oliveira afirma que o enigma Lula começou a ser decifrado com as primeiras nomeações para os cargos mais importantes de seu governo, como o Ministério da Fazenda e para a presidência do Banco Central (Palocci e Meirelles). Já acidamente percebe que “aquela soma negativa não se constituiu em hegemonia, mas apenas em vitória eleitoral” (Ibidem).
            O artigo segue analisando o que foi o governo FHC, as dificuldades do governo Lula em construir um projeto de hegemonia e que se isto não se concretizasse, ao menos no curto prazo o novo governo seria “a continuação da política econômica de FHC, enfeitada com uma política social tipo Fome Zero” (Ibidem). O que dava ainda certas esperanças para o articulista eram as bases sociais de apoio a Lula, como a Igreja católica, ONGs. cívico-republicanas, as centrais sindicais, os movimentos sociais e o MST em particular. Estas forças seriam a expressão de um movimento ético político sobre o qual se poderia ainda construir uma hegemonia. Daí a conclusão: in dúbio pro reo.
            Pouco tempo depois, no entanto, as dúvidas já tinham se dissipado. Em solenidade promovida pela Câmara Municipal de São Paulo e realizada no auditório de história da USP., o sociólogo recebeu o título de cidadão honorário paulistano. Em seu discurso na solenidade já foi contundente ao inverter o famoso slogan de campanha, envolvendo as palavras medo e esperança, ao afirmar que esta fora efetivamente vencida pelo medo. É o que nos relata a reportagem da Folha de S.Paulo do dia 14 de junho de 2003. A reportagem mostra o tom já desprovido da esperança no seu discurso porque o governo Lula já reforçara a porta fechada para o crescimento com inclusão social (em alusão a continuidade da política econômica de FHC). Vejamos a reprodução de uma parte deste discurso: “A vontade política, na qual se colocou o acento da mudança, está sendo enquadrada pelos rigores da nova forma do capital. Com a financeirização desaparece a porta. Ela está fechada com o cadeado dos juros, com a exportação de 9% do PIB como serviço da dívida externa” (Folha de S.Paulo. 14.06.03).
            A reportagem destaca outros momentos do discurso em que critica o crescimento ocorrido entre as décadas de 50 e 70, por ter promovido concentração de renda em vez de sua distribuição. Critica ainda as políticas sociais do governo, classificando-as como políticas de exceção, de compensação daquilo que o Estado não pode dar, em virtude da diminuição da sua capacidade de ação e de sua subordinação aos interesses da economia, já no estágio da sua financeirização.
            A próxima entrada de Oliveira na crítica ao cenário nacional irá ocorrer quando Lula inicia o seu programa de reforma previdenciária, contra a qual jogou pesadamente. Participando de um fórum de debates, organizado pelo ANDES (o sindicato dos professores das universidades públicas) lança a questão que permanecerá no centro de todas as suas críticas que desenvolverá posteriormente, a do surgimento de uma nova classe social, a dos administradores dos fundos de pensão, a quem acusa como os maiores interessados nesta reforma. Neste fórum afirma que esta reforma não atende aos interesses republicanos, mas sim aos dos fundos de pensão. Destaca a importância da seguridade social na reconstrução das economias do pós-guerra, dizendo que elas são “parte da política econômica de qualquer país. Se não tiver, quem vai para o brejo é a economia” (Folha de S.Paulo. 17.07.03). A frase se relaciona, obviamente, ao caráter distributivista destas medidas.
            Afirmou ainda, que toparia esta reforma se o dinheiro economizado se destinasse diretamente aos milhões de miseráveis do país, mas não com o programa Fome Zero, que considera ridículo. A parte certamente mais polêmica desta sua fala é quando considera que as ações do governo se constituem numa traição ao povo: “Uma sociedade que busca anular-se indo para a incerteza do mercado não merece esse nome. Nem esse partido (o PT) merece esse nome” (Ibidem).
            Quando foi lançado o seu ensaio sobre o Ornitorrinco, o sociólogo concedeu uma entrevista de página inteira para a Folha de S.Paulo. Desta vou aproveitar inicialmente as duas manchetes dadas para a mesma. A primeira: - Elite do sindicalismo nacional provocou a aproximação entre o PT e o PSDB e levou ao continuísmo – e a segunda: - Nova classe social comanda governo Lula, diz sociólogo (Folha de S. Paulo.2003. 22.09.2003). Recorro a elas por serem bem ilustrativas. A entrevista se refere a este ensaio, que passaremos a analisar.
            Em 1972, na revista – Estudos do CEBRAP – número 2, Oliveira publica um ensaio sob o nome de “A economia brasileira: crítica a razão dualista”, que em 1981 foi transformado em livro. Em 2003 foi novamente publicado, desta vez junto com “O Ornitorrinco. Sobre o primeiro ensaio o próprio autor nos conta que ele procura dar respostas a perguntas formuladas pelo CEBRAP (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento) “acerca do processo de expansão socioeconômica do capitalismo no Brasil” (Oliveira, 2003. p.27).
            Quanto ao segundo ensaio “O Ornitorrinco”, este nos chama particular atenção já em virtude de seu título. O motivo desta escolha se deve a uma comparação deste animal com a economia brasileira e os seus resultados sociais, desenvolvida nos últimos anos, envolvendo inclusive o governo Lula, agora já claramente definido como continuidade de FHC. O ensaio inicia com a definição de ornitorrinco, retirada de uma enciclopédia.

 Mamífero monotremo, da subclasse dos prototérios, adaptado à vida aquática. Alcança 40cm. de comprimento, tem bico córneo, semelhante ao bico de pato, pés espalmados e rabo chato. É ovíparo. Ocorre na Austrália e na Tasmânia. Encicl. O ornitorrinco vive em lagos e rios, na margem dos quais escava tocas que se abrem dentro d’água. Os filhotes alimentam-se lambendo o leite que escorre nos pêlos peitorais da mãe, pois esta não apresenta mamas. O macho tem um esporão venenoso nas patas posteriores. Este animal conserva certas características reptilinas, principalmente uma homeotermia imperfeita. Grande Enciclopédia Larousse Cultural (Oliveira. 2003. p. 123).

O Aurélio nos dá um acréscimo. “...São ovíparos, constituindo uma forma de transição entre reptis e mamíferos” (Ferreira, 2004. p.1451). Convenhamos, um estranho animal. Oliveira, em nota de rodapé, explica que  em 2001, quando participava da banca de doutorado de um amigo, lhe veio o estalo. “A sociedade e a economia brasileira que ele (o doutorando) descrevia, em seus impasses e combinações esdrúxulas, só podiam ser um ornitorrinco” (Oliveira, 2003. p. 125). Um animal travado em seu processo evolutivo.
O ensaio tem dois subtítulos: o primeiro: “De Darwin a Raul Prebisch e Celso Furtado” e o segundo: “Sob o signo de Darwin: o ornitorrinco”. Não vamos aqui entrar no mérito do ensaio, mas nas suas enormes repercussões políticas. Pelos subtítulos fica claro que se trata de uma análise da evolução da economia e da sociedade brasileira. As principais categorias de interpretação são de Marx e as dos economistas ligados à CEPAL (órgão de cooperação econômica da ONU para a América Latina e o Caribe), de Prebisch e Furtado, e outros pensadores do CEBRAP, com quem Oliveira estabelece as suas interlocuções.
Já vimos a descrição deste ornitorrinco bicho. Vamos agora vê-lo na economia e depois na sociedade brasileira. Oliveira o descreve respondendo a pergunta: como é o ornitorrinco?

Altamente urbanizado, pouca força de trabalho no campo, dunque nenhum resíduo pré- capitalista; ao contrário, um forte agrobussines. Um setor industrial da Segunda Revolução Industrial completo, avançando titibate, pela Terceira Revolução, a molecular-digital, ou informática. Uma estrutura de serviços muito diversificada numa ponta, quando ligada aos estratos de altas rendas, a rigor, mais ostensivamente perdulários que sofisticados; noutra, extremamente primitiva, ligada exatamente ao consumo dos estratos pobres. Um sistema financeiro ainda atrofiado, mas que, justamente pela financeirização e elevação da dívida interna, acapara uma alta parte do PIB... (Ibidem. P.132-3).

                Onde estaria exatamente o estranho animal? Ele é absolutamente moderno, e simultaneamente, extremamente atrofiado. Moderno porque é urbanizado e por já ter alcançado, na linguagem do sociólogo, a revolução molecular-digital e que dispõe de uma gama de serviços altamente sofisticados, tendo como contrapartida o extremo atraso dos setores mais pobres da população, ou seja, a absoluta maioria. É o seu lado ainda primata.
            A análise continua, procurando as causas que produziram este bicho, encontrando-as, entre outras, à subordinação financeira externa, ao ingresso dos capitais especulativos, ou aquilo que, em síntese se chamaria de financeirização da economia. Isto será acompanhado por enormes mudanças nas relações de trabalho, em que diminuem enormemente as suas relações formais, com a sua precarização e o seu desaparecimento, devido a revolução molecular-digital e pelo aumento da produtividade do próprio trabalho. Isto nos conduz de novo ao estranho animal, agora em sua fisionomia, ou melhor, em seu corpo inteiro, no aspecto social. O lado moderno deste bicho nos é agora mostrado no luxo dos teatros municipais de São Paulo e do Rio de Janeiro e o seu aspecto primata, pelo que ocorre no lado externo destes mesmos espaços. Em suma, neste quadro os trabalhadores perderam o seu trabalho e arrumaram ocupações. Vejamos a descrição.

Grupos de jovens nos cruzamentos vendendo qualquer coisa, entregando propaganda de novos apartamentos, lavando-sujando vidros de carros, ambulantes por todos os lugares; os leitos das tradicionais e bancárias e banqueiras ruas Quinze de Novembro e Boa Vista em São Paulo transformaram-se em tapetes de quinquilharias; o entorno do formoso e iluminadíssimo Teatro Municipal de São Paulo – não mais formoso que o Municipal do Rio de Janeiro, anote-se – exibe o teatro de uma sociedade derrotada, um bazar multiforme onde a cópia pobre do bem de consumo de alto nível é horrivelmente kitsch, milhares de vendedores de coca-cola, guaraná, cerveja, água mineral, nas portas dos estádios duas vezes por semana (Ibidem. p. 142-3).

            Bem, mas vamos à parte polêmica do texto, que é a que alcançou maiores repercussões. Ela está nas duas manchetes que já apresentamos e que são as de que uma nova classe social comanda o governo Lula e que o PSDB e o PT são partidos idênticos e que por isso mesmo Lula é uma continuidade do governo FHC. Vamos à análise.
            Oliveira busca as origens do PT nos movimentos sindicais da década de 70, nos chamados sindicatos “autênticos”, ou oposições sindicais e que à moda européia reivindicavam conseguir melhorar as suas rendas, via salário, benefícios indiretos e seguridade social. Os sindicatos do ABC em São Paulo e os dos bancários e petroleiros no resto do país se integram nestas categorias. Muitos destes sindicatos são os de empresas estatais e estas, entre as concessões de benefícios, criaram os chamados fundos de pensão. Ao longo da década de 80 houve um enorme refluxo na situação dos trabalhadores, o mesmo ocorrendo no governo FHC, como já vimos. Este refluxo trouxe uma grande mudança na representação dos trabalhadores. Que mudanças são estas?  As elites dos antigos trabalhadores, seus dirigentes sindicais passam a ser os administradores dos fundos de previdência, como o PREVI, dos funcionários do Banco do Brasil, o maior de todos. Vejamos a sua nova posição.

Fazem parte de conselhos de administração, como o do BNDES, a título de representantes dos trabalhadores. A última floração do Welfare brasileiro (o estado de bem-estar da social democracia) que se organizou basicamente nas estatais, produziu tais fundos e a Constituição de 1988 instituiu o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) – o maior financiador de capital de longo prazo no país. (...) Trabalhadores que ascendem a essas funções estão preocupados com a rentabilidade de tais fundos, que ao mesmo tempo financiam a reestruturação produtiva que produz o desemprego (Ibidem. p. 146).

Em nota de rodapé o sociólogo diz que em recente festa de aniversário do dirigente financeiro da campanha presidencial do PT (trata-se de Delúbio Soares) a imprensa contou entre 15 e 18 aviões executivos, inclusive pequenos jatinhos, presentes no evento. Como os trabalhadores não costumam ter jatinhos somos obrigados a interrogar sobre os motivos da presença dos empresários nesta festa. A resposta parece óbvia. Aproximar-se dos controladores, ou dos operários operadores dos fundos de pensão, principais agentes da financeirização da economia.
A pergunta que necessariamente decorre desta nova situação e que não pode calar será esta. Pode este partido, com os seus dirigentes que, conforme Oliveira nos alerta, apoiado numa expressão de Robert Kurz, transformaram-se em “sujeitos monetários”, podem estes dirigentes ainda buscar horizontes socialistas ou mesmo ideais distributivistas da social democracia? Não. Eles optarão pelos caminhos do mercado. E será esta palavra – mercado – que abrigará tanto os dirigentes do PT, quanto os do PSDB sob a mesma visão econômica e ideológica. São idênticos no exercício de suas funções e na sua visão política. Vejamos:

É isso que explica recentes convergências pragmáticas entre o PT e o PSDB, o aparente paradoxo de que o governo Lula realiza o programa de FHC, radicalizando-o: não se trata de um equívoco, nem de tomada de empréstimo de programa, mas de uma verdadeira nova classe social, que se estrutura sobre, de um lado, técnicos e economistas doublés de banqueiros, núcleo duro do PSDB, e trabalhadores transformados em operadores de fundos de previdência, núcleo duro do PT. A identidade dos dois casos reside no controle do acesso aos fundos públicos, no conhecimento do “mapa da mina”. Há uma rigorosa simetria entre os núcleos dirigentes do PT e do PSDB no arco político, e o conjunto dos dois lados simétricos é a nova classe (Ibidem. p.147-8).

Oliveira continua sua análise dizendo que a mesma simetria ocorre também quando se trata da questão ideológica e isto se deve a origem de suas matrizes. Assim o núcleo de formulação de políticas de governo de FHC se originou na PUC- Rio, classificado por Oliveira, como o templo do neoliberalismo. Malan é o seu grande representante. O PT por sua vez encontra o seu núcleo formulador destas políticas na Escola de Administração da FGV em São Paulo. O maior representante teria sido Celso Daniel, que fora o primeiro coordenador do programa de Lula. Ali se formaram também Gushiken e Berzoini. Mântega foi professor da instituição. Apenas Palocci por aí não passou. Em cima destas questões Oliveira conclui que “a nova classe tem unidade de objetivos, formou-se no consenso ideológico sobre as novas funções do Estado, trabalha no interior dos controles de fundos estatais e semiestatais e está no lugar que faz a ponte com o sistema financeiro” (Ibidem. p. 148). Oliveira ainda afirma que não está fazendo nenhum julgamento ético desta realidade, mas apenas a sua constatação.
            Sem pretender fazer inferências nas análises do sociólogo, queremos apenas apontar algumas indicações para melhor compreender o neoliberalismo, que é apontado como a grande matriz ideológica das novas concepções de economia e de Estado, que identificam estes governos e partidos. O neoliberalismo tem os seus fundamentos no liberalismo clássico de John Locke e Adam Smith e a sua reafirmação histórica no século XX, com o livro de Friedrich Hayek, O Caminho da Servidão, lançado em 1944 e o de Milton Friedman, lançado em 1962, Capitalismo e Liberdade e posteriormente relançado em 1979, em parceria com Rose Friedama e, nestes novos tempos, transformado em grande bestseller, sob o nome de Free to Choose Liberdade de Escolher. O novo liberalismo econômico. A escola monetarista de Chicago seria o seu centro irradiador e a sua aplicação em práticas de governo ocorreria ao final dos anos 70 e início dos 80, com a eleição dos governos de Thatcher (1979), de Reagan (1980) e de Khol em 1982. O seu impulso maior ocorre com o fim do império soviético em 1991, quando com o fim da bipolaridade é anunciado o fim da história e a implantação do pensamento único. Os seus dogmas seriam impostos através do FMI e do Banco Mundial, e afirmados, no caso específico para a América Latina, no Consenso de Washington (Que apropriação semântica!?).
            Em suma, o que afirma Oliveira, que já havia teorizado sobre as razões do subdesenvolvimento brasileiro, agora, em seu O Ornitorrinco? Que o nosso subdesenvolvimento adquiriu uma nova forma sob a terceira revolução tecnológica e a financeirização da economia e que estas entravam de vez o crescimento econômico com distribuição de renda, que deveria ser o processo evolutivo normal e que impede o processo de evolução social, definitivamente truncado, produzindo este pequeno monstrinho e desautorizando a teoria evolucionista de Darwin. Este processo se iniciou com o governo do PSDB, de HFC e continua no governo do PT, de Lula, em virtude de que as suas políticas procedem da mesma matriz ideológica. Esta matriz  gera uma visão macro econômica que tem na fixação de metas inflacionárias baixas, na desvalorização cambial, na alta taxa de juros, na obtenção de elevado superávit primário, somente atingível por um forte contingenciamento de verbas públicas (responsabilidade fiscal), as suas metas básicas, que impedem os investimentos públicos e que encilham o crescimento. Esta era foi inaugurada por FHC e que agora, o governo Lula, por sua continuidade, teria fechado de vez as suas portas, por não ter promovido mudanças.   
        
            Como conclusão, trazemos apenas mais algumas afirmações que apontam para a mesma direção deste impeditivo de crescimento. A primeira é sobre as convicções de Lula sobre a sua política econômica. Quem nos fala será outro fundador do PT e assessor especial da Presidência até 2004, Frei Betto. Ressalte-se que Frei Betto não considera os governos FHC e Lula, como iguais. Ele continua na defesa de Lula, mesmo discordando da política econômica. A fala de frei Betto está contida na revista Fórum, quando responde a indagação sobre a sua saída do Governo.

Ao longo de 2003, oral ou por escrito, comuniquei ao presidente minha crítica à política econômica. Muitas vezes ele se mostrava inquieto, dando a entender que era uma fase de ajuste e que depois haveria uma mudança de rumo, uma flexibilização. Quando comuniquei, em maio de 2004, minha saída, ele já tinha uma postura de defesa da política econômica. Eu é que não estava entendendo quão benéfica era ela e mais tarde entenderia os resultados (Frei Betto, 2006. p.12).

            A outra afirmação é de Carlos Lessa, que foi afastado por Lula do cargo que lhe dera de presidente do BNDES e que segue na mesma direção da de Chico Oliveira, sobre os entraves ao crescimento provocados pelo tucanopetismo. Vejamos Lessa, em artigo publicado na Folha de S.Paulo.

A economia precisa crescer e romper com a estagnação cruel da última década. A opção tucana e petista não foi com o povo. Comprometeram o Brasil com o pagamento de juros da dívida pública, que em 2006 beneficiará os donos da dívida com R$ 180 bilhões. Estima-se que 70% desse pagamento vão para 20.000 famílias. Em contraste com o bolsa-família em 2006, serão gastos pouco mais de 7 bilhões para mais de 11 milhões de famílias. Isso é possível com a taxa de juros escandalosamente elevada pelo Banco Central para a felicidade do “mercado financeiro”. O Brasil não cresce e o desemprego é brutal (Lessa. Folha de S.Paulo.27.04.06).

                Vê-se claramente que o crescimento evolutivo deste ornitorrinco continua truncado. A última afirmação, a retiro também de um dos fundadores do PT, há muito com ele rompido e que se constitui num de seus mais agudos críticos, não só do governo Lula, mas também do próprio Lula. Retiro estas afirmações de uma entrevista concedida ao O Estado de São Paulo. Nela ele aponta dez pontos que seriam fundamentais para uma mudança radical de rumos para a Nação brasileira, usando este termo Nação, já em contrapartida ao mercado em que diz nos ter-mos transformado. Na questão econômica chama a atenção para a imobilização do Estado como agente de desenvolvimento, uma vez que 40% dos recursos da União são gastos com os encargos da dívida financeira, restando 5% para os investimentos. Os restantes 55% seriam despesas correntes fixas. Benjamin traça um interessante quadro comparativo sobre o significado deste comprometimento.

A desproporção com os gastos do serviço da dívida, em relação aos demais gastos do Estado é chocante. Dois meses d pagamento de juros correspondem ao dispêndio anual do SUS. Um mês corresponde ao gasto anual com educação. Quinze dias, aos recursos alocados no Programa Bolsa-família. (...)  Um dia de pagamento de juros ultrapassa com sobras o gasto,no ano, destinado a construção de habitações populares. Um minuto corresponde a alocação anual de recursos com a defesa dos direitos humanos. É um descalabro (Benjamin. O Estado de S. Paulo.07.05.06).
           
César Benjamin desenvolve excelentes reflexões sobre a relação existente entre a responsabilidade fiscal e a responsabilidade social, tema que precisa urgentemente constar na pauta das discussões econômicas e sociais brasileiras. Como final, mesmo, apresento a epígrafe da introdução ao livro de Oliveira, escrita por Roberto Schwartz. Ele recorre a Oswald de Andrade, que já em 1946 apresentou o ornitorrinco da seguinte forma:
“Venceu o sistema de Babilônia
E o garção de costeleta” (Oliveira. 2003. p. 11).

P.S. Já no limite para a entrega deste texto, me deparo com um debate realizado no CEBRAP, no dia 26 de maio de 2006, em que compareceram o cardeal tucano Bresser Pereira e o cardeal petista, ministro Tarso Genro. O tema do debate era: “Brasil: desafios para os próximos 10 -15 anos”.
Vejamos algumas afirmações de Genro: “redução drástica de despesas da União, com corte de salários, pensões e aposentadorias como medida exemplar” e “remover o conceito arcaico de direito adquirido”. Por outro lado vejamos uma afirmação de Bresser Pereira: “o novo desenvolvimentismo, é fortemente a favor do ajuste fiscal. É mais rígido que a ortodoxia”. Se isto não confirma a identidade destes partidos, vejamos esta outra afirmação de Genro. “A relação PT – PSDB em cima de um pacto de governabilidade não só não é impossível como é necessária”.
Os dois afirmaram que somente com estes ajustes seria possível o início de um novo ciclo de crescimento no Brasil (Dados extraídos da Folha de S.Paulo de 27.05.06).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

FERREIRA. Aurélio. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Curitiba: Positivo. 2004.
OLIVEIRA. Francisco. Crítica à Razão Dualista. O Ornitorrinco. São Paulo: Boitempo Editorial. 2003.

JORNAIS E REVISTAS:

BENJAMIN, César. Uma receita para superar o lulismo. In: O Estado de S. Paulo. 07.05.06.
BETTO. Frei. Se não for com Lula, não será sem ele. In: FÓRUM. Ano 4. Número 35. Fevereiro de 2006. pp. 8-13.
LESSA. Carlos. Povo e Nação. In: Folha de S. Paulo. 27. 04.06.
OLIVEIRA. Francisco. O enigma de Lula: ruptura ou continuidade? In: Folha de S.Paulo. 18.05.03.
_________, Medo venceu a esperança, diz Oliveira. In: Folha de S.Paulo. 14.06.03.
_________, Sociólogo aponta interesse privado na reforma. In: Folha de S. Paulo. 17.07.03.
_________, Nova Classe Social comanda Governo Lula, diz sociólogo. In: Folha de S.Paulo. 22.09.03.


           





segunda-feira, 13 de junho de 2016

Plenos Pecados. A Gula. O Clube dos anjos. Luis Fernando Veríssimo.

Haja imaginação! O clube dos anjos é o clube do picadinho. O picadinho de carne que a meninada comia no bar do Alberi. Eram dez meninos bem nascidos. Os pais afortunados permitiam que eles vivessem sem grandes esforços na vida e pudessem se dedicar ao que bem entendessem. O convidado para falar sobre o pecado da gula, na coleção Plenos Pecados, foi Luis Fernando Veríssimo. A gula recebeu o título de O clube dos anjos.
O maravilhoso livro de Luis Fernando Veríssimo sobre o pecado da GULA.

O clube foi formado por jovens voluntariosos que em seus horizontes vislumbravam o mundo como limite, mas que nem a famosos municipais conseguiram chegar. Como fracassados foram todos muito bem sucedidos. O clube do picadinho se reunia já há 21 anos, mas o tesão acabara. O clube estava por ser desfeito, apesar da sofisticação, dos incrementos culinários e da qualidade dos vinhos. Houve quem atribuiu a culpa da possível separação às mulheres.
Mas um dia, Daniel, o narrador, se encontra com Lucídio numa loja de vinhos. Lucídio é um dos 117 nomes do demônio. Era exímio cozinheiro. Da conversa entre os dois, o clube ressurge. A partir dessa data os jantares do clube passaram a ser realizados no enorme apartamento vazio de Daniel e preparados por Lucídio. Em termos de sabor nunca houve algo parecido. Só que um estranho ritual se estabelece. A cada jantar, um integrante morre. Sempre aquele que come o último prato, o prato que sempre sobrava e que também sempre era o prato da sua preferência.

O primeiro a morrer, assim como na bíblia, foi Abel. A rotina se repetia. A cada reunião do clube, o ritual da morte se repetia. Havia suspeitas sobre envenenamento, mas ninguém ousava denunciar e nem mesmo concordava com a interrupção dos jantares. Não seria justo com os que já morreram, ponderavam. Para não ter suspense, o narrador, já nas primeiras frases, anuncia quem é o assassino. Seu nome está na capa. É um direito dos autores.

Invariavelmente, a cada jantar realizado, um velório era celebrado. A qualidade dos jantares se superava a cada encontro. Nada mais lembrava o picadinho que originara o clube, apesar de toda a ociosidade de seus membros. Os pais sustentavam os custos dos mesmos com eternas mesadas. Os membros do clube, que a cada reunião se encolhia passou a ser objeto das mais diversas observações, inclusive policiais. Um estranho se aproxima e passa chamar mais atenção. Era o senhor Spector, que não era um inspetor, como o nome poderia sugerir.

Spector tinha proposta para oferecer a Daniel e a Lucídio. Formar novos clubes, com novos participantes. Havia várias sugestões para os seus nomes: Clube das execuções misericordiosas, das mortes clementes, dos prazeres terminais. Um conceito marcaria os clubes: eutanásia festiva, retirada orgiástica, estouro final, apoteose compadecida. Spector se propunha a trazer muitos sócios para o clube e todos dispostos a pagar um bom dinheiro. Grandes negócios à vista.

Vejamos a parte final do livro: "Com o sr. Spector nos agenciando, trazendo clientes para as nossas apoteoses compadecidas, poderemos pensar em expandir o negócio e aproximá-lo da mentira que o João inventou para o seu médico, do exagero do nosso contador de anedotas.

 Nos vejo não apenas matando doentes terminais com grandes jantares nos meus salões vazios mas organizando cruzeiros de moribundos pelo Caribe, excursões milionárias de casos perdidos pelas capitais da Europa, pelos antros de perdição da Ásia, pelos prazeres definitivos do mundo, proporcionando aventuras mortais, êxtases finais, extremos fatais, orgasmos zenitais, congestões monumentais a quem quer mais, sempre mais, e mais, mais, mais, mais, mais, mais, mais, mais, mais, mais, mais... Daniel chega"!

Como nos livros anteriores eu dei a definição do pecado, também dou a definição de gula: "Excesso na cozinha e na bebida. Apego excessivo a boas iguarias". Com relação ao Veríssimo volto a dizer: Haja imaginação! Ainda em tempo. O livro tem uma possível epígrafe, de uma provável máxima japonesa: "Todo desejo é um desejo de morte".

Plenos Pecados. A preguiça. Canoas e Marolas. João Gilberto Noll.

"Era preciso aceitar a tarefa mais ingrata: essa de se deixar ficar enquanto fosse possível a reedição diária das horas. Se me impregnasse todo do fluxo invisível da minha manutenção, me deixaria ficar ali na praia, torrando debaixo do sol, dormindo por ali mesmo, saciado muito mais do que carente, pronto para ser abatido, é certo, mas sentindo também, é certo, um surdo regozijo sem o poder de me levar a parte alguma, a nenhum lugar. Eu estaria bem se assim se desse, juro".
O livro de João Gilberto Noll sobre a preguiça. Canoas e marolas.


Este é o meu segundo livro, da coleção Plenos pecados. O pecado tratado é a preguiça. O nome do livro é Canoas e marolas. O autor é João Gilberto Noll. É o meu primeiro contato com este autor, nascido em Porto Alegre no ano de 1946. Julgo até possível que algum dia a gente tenha se cruzado em alguma rua da cidade de Porto Alegre.

O primeiro livro da coleção que eu li foi Terapia, de Ariel Dorfman, que versava sobre a avareza. O livro não tocou diretamente no pecado da avareza. Entrou pelo mundo dos mercados globalizados. Canoas e marolas também ficou um tanto distante do pecado da preguiça. Busco uma aproximação com o tema com o que está escrito na contracapa do livro e com a frase de abertura deste post. Vamos à contracapa:

"Na ilha, há um rio caudaloso e encorpado. Há um menino com jeito de índio, a vagar pelas ruas. E há um homem em busca de Marta - a filha desconhecida. São estes os elementos que o talento de João Gilberto Noll combina para construir sua narrativa sobre a preguiça. No seu texto de incomparável poesia, Noll dá um novo tratamento ao tema, mostrando o mais indolente dos pecados capitais como uma grande metáfora do desalento e apatia do homem contemporâneo".

Considero a construção da narrativa um tanto complexa. Por isso dou mais um trecho do próprio livro, agora de sua orelha.

"Nesta ilha, ancora um homem e sua busca. Nesta ilha ele chega procurando Marta - a filha de um amor fugidio que nunca chegou a conhecer. Sabe que é estudante de medicina. Ouviu dizer que trabalha no projeto de Ablação de Mentes, uma tentativa de auxiliar doentes terminais. Marta é a dama de companhia dos que vivem o olho no olho da morte, tentando fazer ressurgir uma réstia que seja de ilusão na vida que se esvai. Num texto denso, João Gilberto Noll vai, pouco a pouco, construindo uma melancólica imagem do homem e seus sonhos. Quinto volume da coleção Plenos Pecados, Canoas e marolas é uma visão original do pecado da preguiça. Na poética linguagem de Noll, este pecado surge como uma metáfora do desalento do homem contemporâneo".

Acho que com este roteiro indicado no próprio livro, não preciso entrar em maiores detalhes. Volto a falar da complexidade de sua construção.  Como busquei no Aurélio, uma definição de avareza, passo a fazer o mesmo com relação à preguiça. Vejamos:

Preguiça: aversão ao trabalho; negligência, indolência, mandriice. Morosidade, lentidão, pachorra, moleza. Seria então a preguiça a moleza diante da própria vida? Bom assim. Gosto de terminar com interrogações.

quarta-feira, 8 de junho de 2016

Plenos Pecados: A Avareza - Terapia. Ariel Dorfman.

Há algum tempo estou com o projeto de falar sobre os pecados capitais, trabalhados pela coleção -  Plenos Pecados - da Editora Objetiva. Fiquei um tempo sem comprar livros para forçar o começo dessas leituras. Comecei com o livro de Ariel Dorfman que versa sobre a avareza. O seu livro tem como título simplesmente a palavra - Terapia.

Conhecia o autor pelo maravilhoso livrinho, escrito em parceria com Armando Mattelart, Para ler o Pato Donald - Comunicação de massa e colonialismo. Esta obra foi escrita no Chile, nos tempos do governo de Salvador Allende e o complemento do título define bem o caráter da obra. Em Terapia encontro a informação de que Dorfman foi morar nos Estados Unidos, com o golpe que colocou no poder o ditador Pinochet, dedicando-se ao teatro e ao romance.
O título insinua uma terapia contra a avareza.

Terapia tem uma estrutura bastante complexa. O tema - pecado da avareza não é tocado diretamente. Na terapia existe um jogo muito sutil separando realidade e ficção ou representação. É neste jogo que Graham Blake, o personagem central da obra vai se autoconhecendo, como nos revela um dos parágrafos finais, quando Blake pergunta sobre as razões do método de seu tratamento: "Por que o tratamento é organizado dessa maneira? Porque o senhor precisava disso. Porque o senhor precisava passar por tudo isso para se defrontar consigo".

Mas quem era Graham Blake e os outros personagens centrais. Ele era um rico industrial, dono da empresa Terra Limpa. Ele era casado mas divorciou-se da Dra. Jéssica Owen, uma bio engenheira. Os produtos da Terra Limpa estavam ligados à saúde, a saúde física e mental de uma clientela em fabulosa expansão. A fábrica fora uma herança de família e se situava na Filadélfia e possuía várias filiais. Blake comandava o império.

O divórcio não atrapalhava os bons negócios. Blake, sempre sorridente, era um grande estrategista de marketing e vendas e Jéssica produzia fórmulas cada vez mais milagrosas. Este ramo de negócio era extremamente competitivo, dentro de um mercado globalizado. Blake tinha uma amante que aparentemente satisfazia o seu mundo de fantasias e desejos. Tinha dois filhos e era tido como um bom pai. Como homem de negócios tinha que tomar decisões, mas nada do que fez, nos revela o narrador "abalou sua alegria, sua crença no sonho americano, na bondade do homem e na sanidade de Deus e na benevolência  do universo".

Mas os problemas apareceram: insônia, dores, está à beira de colapsos nervosos, sente delírios e descolagens da realidade. Aí entra em cena a terapia que lhe foi aconselhada. Ela é feita na Clínica de Terapia Vital S.A., onde é atendido pelo Dr. Tolgate. Aí é que começam as cenas das simulações. Blake pode tudo. Tudo o que pede será imediatamente atendido. Neste enredar de situações é que se passa a maior parte do livro. No fundo as encenações, as simulações são a sua própria vida real. As decisões que ele toma vão provocando dores e sofrimentos sobre os outros.

No enredo ainda está presente um outro personagem importante, o senhor Granger, o homem da globalização dos mercados. Atendendo os imperativos da eficiência do mercado, condena as decisões sentimentais e combina com Jéssica o fechamento da fábrica herdada pelo pai, onde os empregados são demitidos e a fábrica está prestes a ser transferida para o México ou para a Tailândia.

Aí o sr. Blake, sai da clínica e retoma a frente dos negócios. Vai à fábrica de Filadélfia, onde os empregados estavam organizando uma greve e lhes comunica as suas decisões sentimentais de não fechar a fábrica e manter os empregos. É que nas simulações da clínica ele percebia fortemente as dores que ele causava com os seus mandos. Num comentário sobre o livro, achei extremamente pertinente esta frase: "o livro revela o duelo insano do homem - com os seus pecados mais íntimos".

Vejamos ainda a parte final do livro: "Quando ele desaparece ao entrar na Torre Leste que pertence à empresa Terra Limpa S.A. E, como Jonas, se você me permite ser bíblico pelo menos uma vez, ser engolido pela baleia. O que ele fez a seguir você já sabe". Um tanto enigmático, não?

Como o livro não aborda diretamente a avareza deixo uma definição dela. A busquei no Aurélio: "Excessivo e sórdido apego ao dinheiro, esganação; falta de generosidade, mesquinhez". Como vi comentários afirmando que o autor não chegou ao tema, deixo a minha singela opinião. O sistema obriga à avareza. Blake seguia o sistema. E o sistema engole a quem não se adapta. Seria isso?

terça-feira, 7 de junho de 2016

Após cem anos - A atualidade de Joaquim Nabuco. O Patrono da raça negra.


Este texto é de 2009. Vésperas do ano do centenário da morte de Joaquim Nabuco. Nada modifiquei no texto. Tirei alguns acentos e tremas, apenas. Quanto ao título de patrono - ele é assim considerado. Não existe uma lei específica que assim o considere. Ele foi publicado na revista do curso de jornalismo da Universidade Positivo. Comunicação: Reflexões, experiências e ensino, nº 3, do segundo semestre de 2009. Páginas 65 a 78.

APÓS CEM ANOS - A ATUALIDADE DE JOAQUIM NABUCO. O PATRONO DA RAÇA NEGRA.
Pedro Eloi Rech


Não nos basta acabar com a escravidão; é preciso destruir com a obra da escravidão.”
Joaquim Nabuco.

“O negro prolonga, assim, o destino do escravo.”
Florestan Fernandes.

RESUMO:

            Este texto marca uma retomada do pensamento de Joaquim Nabuco por ocasião do centenário de sua morte. Monarquista e liberal, de formação europeia, Nabuco centra a sua ação teórica e política na abolição da escravidão. Considerava o sistema escravocrata como a fonte de corrupção de tudo e de todos, homens e instituições. Para a inserção do Brasil na modernidade afirmava que, além da abolição também seria necessário acabar com a obra da escravidão, com a integração dos ex- escravos no mercado de trabalho. O texto passa também por uma análise do Brasil pós- escravidão com o pensamento de Florestan Fernandes e de Francisco de Oliveira.

PALAVRAS CHAVE: Escravidão, abolição, corrupção, inclusão, pensamento liberal.

ABSTRACT:

This text marks a recapture of  Jaquim Nabuco's thoughts in commemoration of his death. Monarchist and liberal with European education, Nabuco focuses his theoretical and political action in the abolition of slavery. He considered the slave system as the source of corruption of everything and everyone, both men and institutions. To place Brazil into modern times, Nabuco stated that beyond the abolition it would be necessary to destroy the work of slavery, by the integration of ex-slaves into the labor market. The text also deals with an analysis of the post-slavery period in Brazil, with the opinions of Florestan Fernandes and Francisco de Oliveira's.


KAYWORDS: Slavery, abolition, corruption, inclusion, liberal thinking
A monumental obra de Joaquim Nabuco.


UMA PROPOSTA DE TRABALHO:

            Em 2009 retomamos um contato maior com o Brasil, ao ministrar a disciplina de Realidade Brasileira, no curso de jornalismo da Universidade Positivo. Não nos  ocupávamos especificamente do Brasil, em nossas atividades de sala de aula, pelo menos há uns dez anos.
            Nesta retomada nos chamou muita atenção um autor, ou um ator, protagonista em nossa história, que viveu a transição do Brasil monárquico para o republicano e, em consequência, a explosiva questão da abolição da escravidão. Envolveu-se profundamente nesta realidade que, moldou de forma ímpar, a nossa maneira de ser Brasil. Chamou-nos profunda atenção a frase contida em O abolicionismo: “Não nos basta acabar com a escravidão; é preciso destruir com a obra da escravidão”, e as decorrências da mesma, através da preocupação com a integração do negro na sociedade, especialmente a necessidade de sua absorção econômica, como forma de resgatar as instituições deste país, corrompidas estruturalmente com as marcas deixadas pela escravidão. Além de uma preocupação ética e humana, havia em seu pensamento e em sua ação, uma visão liberal que contrastava com o espírito conservador e xenófobo com relação ao negro, que lamentavelmente prevaleceu no processo abolicionista, ao não integrá-lo ao processo econômico subsequente. Pelo contrário, os atos políticos em torno da abolição foram como que um ato de vingança contra a pseudo emancipação, fato que fez Florestan Fernandes bradar, em A integração do negro na sociedade de classes, de que “o negro prolonga, assim, o destino do escravo” e que existe assim, a necessidade urgente de um novo processo de abolição. Para este novo processo bastaria retomar o próprio projeto de Nabuco, contido em O abolicionismo, publicado em 1884, uma vez que aí estão contidas as ideias para se acabar também, com a obra da escravidão.
            Em função da atualidade do tema e, ainda mais, em função do fato de 2010 ser o ano do centenário da morte de Nabuco e da decretação do ano, como o Ano Nacional Joaquim Nabuco, optamos por trazer ao presente algumas de suas reflexões e projeções que possam nos  ajudar na interpretação da complexa formação da realidade brasileira.
Ocuparemo-nos com breves traços biográficos para situar Nabuco no processo histórico brasileiro, contextualizando o autor. Ma o objetivo maior é a análise de sua obra, e de modo especial O abolicionismo, não só no que ele tem de propaganda anti- abolicionista, mas também na sua atualidade, na apresentação de soluções, uma vez que ainda estamos repletos de preconceitos e de problemas sociais não resolvidos. Cremos que se Nabuco tivesse tido, em sua época, uma voz mais ativa, muitos destes  preconceitos e problemas, não se apresentariam hoje, com tamanha intensidade. Existe uma interligação profunda com a não integração do negro na realidade agrária/rural  da época, com a atual estrutura urbana, ou mais precisamente suburbana, nas favelas de nossas grandes cidades e de todas as suas consequências. Por estes caminhos pretendemos conduzir as análises deste nosso texto.

UM PERNAMBUCANO, UM ABOLICIONISTA E UM LIBERAL:

            Buscaremos no livro publicado pela Fundação Joaquim Nabuco, de autoria de Amaro Quintas O sentido social da revolução Praieira uma primeira contextualização histórica de Joaquim Nabuco. No prefácio deste livro, escrito por Fernando Freyre, ele apresenta a dominação do estado de Pernambuco no início do século XIX pelas famílias Rego-Barros e dos Cavalcanti como a causa maior da deflagração da Praieira, uma das raízes históricas maiores da formação do espírito pernambucano. O próprio Nabuco destacava o caráter social desta revolução, que tinha à sua frente pensadores liberais e socialistas utópicos. Estes chegaram a lançar um “Manifesto ao Mundo”, no qual defendiam o voto livre e universal, a liberdade de imprensa, o direito ao trabalho, o comércio (dominado pelos portugueses) em mão de brasileiros, entre outras reivindicações. Para ilustrar o espírito da época reproduzimos a quadra de um poeta anônimo:

                        “Quem viver em Pernambuco
                        Deve estar desenganado,
                        Que ou há de ser Cavalcanti,
                        Ou há de ser cavalgado.”  Freyre, 1982. P.10.

            Fazemos esta introdução para dizer que Joaquim Aurélio Barreto Nabuco de Araújo nasceu no dia 19 de agosto de 1849, na cidade de Recife, em plena Revolução Praieira, herdeiro, portanto de seu espírito. Não pertencia aos Rego- Barros, nem aos Cavalcanti, mas com certeza também não foi cavalgado, uma vez que nasceu dentro de uma das mais tradicionais famílias pernambucanas, ligadas à economia açucareira. O número de sobrenomes, dos quais nenhum podia ser suprimido, nos dá uma ideia de suas origens.
            Seu pai – José Tomás Nabuco de Araújo foi senador, conselheiro de Estado e ministro do Império. A mãe – Ana Benigna de Sá Barreto provinha da família Paes Barreto, família já com mais de duzentos anos de influência em Pernambuco. Os pais se transferiram para a Corte, no Rio de Janeiro e deixaram o menino com os padrinhos Joaquim Aurélio Pereira de Carvalho e Ana Rosa Falcão de Carvalho, proprietários do engenho Massangana. Ali passou seus primeiros oito anos de vida. Com o falecimento da madrinha o menino é transferido para o Rio de Janeiro. Estes oito anos marcam profundamente a sua formação. Foram plantadas ali, no seu mais profundo íntimo, as sementes contra a escravidão, com a qual conviveu em proximidade.
            No Rio de Janeiro inicia a sua formação escolar em Friburgo, seguindo depois para a cidade do Rio de Janeiro. Conforme relatos de Jean Carvalho França, de quem tomamos a maioria dos apontamentos para estes traços biográficos, (França. 2000. Págs.175-180)            Nabuco segue o caminho dos bem nascidos no Brasil da época, ingressando no Colégio Pedro II. Não precisou trilhar os caminhos de outros não tão bem nascidos, a exemplo de Machado de Assis, autodidatas e sobreviventes com o exercício do funcionalismo público.
            Do Rio segue para São Paulo, ingressando na faculdade de direito, curso que irá concluir em 1870, em Recife. Com um de seus primeiros atos como advogado escandaliza os recifenses de sua classe, assumindo a defesa de um escravo acusado de duplo homicídio. Nesta defesa antecipa as ideias que o acompanharão ao longo de sua vida política, e que se tornarão mais amadurecidas e explícitas em O Abolicionismo. São as ideias de que a escravidão deformava todas as instituições do país, e que degradava tanto aos brancos, quanto aos negros.
            Logo após formar-se retorna ao Rio de Janeiro, onde inicia a sua atividade literária. Viaja para a Europa, em busca de melhor formação, com o dinheiro da venda de uma propriedade rural que herdara. Sente-se mal, distante do país, pois, de acordo com o espírito da época, como integrante da elite, julga-se incumbido de uma espécie de missão civilizatória para com o  país. Romantismo e nacionalismo são sentimentos que cultivava na época. Não conseguia conciliar o permanecer na Europa, onde a cultura se constituía e onde queria permanecer, com o voltar para a terra, para aqui lançar os alicerces culturais da Nação em construção. Optou pela volta. A respeito desta sua dúvida, vejamos a observação de França: “De um lado do mar sente-se a ausência do mundo; do outro, a ausência do país” (2000: 177).
            Em 1878 inicia a sua carreira política. Elege-se deputado geral por Pernambuco. Sua grande bandeira, como não poderia deixar de ser, em função de seus antecedentes, será a luta pela abolição. Passa a ser mal visto em sua classe e em seu partido (O liberal) e também pelos abolicionistas mais radicais, que defendiam uma abolição sem direitos indenizatórios aos proprietários de escravos. Sente-se mal em meio a este fogo cruzado e em razão destas posições assumidas, não consegue a sua reeleição.
            Desgostoso, parte para um exílio voluntário em Londres. Lá confortavelmente instalado e contando com a amizade das autoridades brasileiras escreve, em 1883, a sua obra prima – O abolicionismo, que será publicada no Brasil no ano seguinte, junto com o seu retorno. São reflexões amadurecidas e o alvo principal da nossa análise. Aqui, retoma a atividade política, elegendo-se deputado por três mandatos consecutivos, em 1885, 1887 e 1889.
            Nesta volta à atividade política, vê concretizado o seu sonho maior; a abolição da escravidão. Por outro lado também sofre uma de suas maiores decepções: a queda da monarquia e a implantação da – para ele, impossível República. Em função desta sua frustração resolve abandonar definitivamente a política. Com esta sua atitude, perde o Brasil uma de suas consciências mais lúcidas na implantação do processo constituinte do qual resultará a nossa primeira Constituição republicana, a de 1891.
            Distante da política volta para a literatura. Relata então os seus posicionamentos políticos em Por que sou monarquista. Escreve ainda uma espécie de autobiografia intelectual intitulada Minha Formação e o livro Um estadista do império: Nabuco de Araújo, em que relata as memórias relativas a seu pai. Estas duas obras são consideradas fundamentais e as melhores fontes historiográficas para se estudar o século XVIII brasileiro e que junto com O abolicionismo forma a sua grande trilogia.
            Em 1900 rompe com a sua decisão de abandono definitivo da política ao fazer as pazes com a República e assumir um cargo na embaixada brasileira em Londres. Esta  fase será marcada por sua participação nas negociações para o estabelecimento das fronteiras entre o Brasil e a Guiana Inglesa. Posteriormente segue para Washington, onde já combalido por doença, dedica-se a dois novos temas, os últimos em sua vida: a construção das bases do federalismo no Brasil para viabilizar  o emergente sistema republicano e a busca de uma aproximação entre as diversas nações americanas com a doutrina do pan-americanismo. As doenças que o vitimaram foram a arteriosclerose e a policitemia.
            Participou ainda ativamente da fundação da Academia Brasileira de Letras, que teve em Machado de Assis o seu primeiro presidente e em Joaquim Nabuco o seu primeiro secretário. Ocupou a cadeira de número 27. Na academia a sua grande preocupação foi com a língua como instrumento da construção da unidade nacional e com a afirmação literária e política de uma nação que se constroi autônoma, a partir de seus próprios recursos e de seu próprio gênio.

O ABOLICIONISMO:

            O ano de 2000, ano em que comemoramos os 500 anos do “descobrimento”, ou 500 anos de colonização, foi um ano muito rico em seu aspecto cultural. Queremos destacar duas iniciativas de grande importância na tentativa de se ter a possibilidade de uma compreensão maior da complexa formação deste país. Referimo-nos primeiramente a uma iniciativa da Folha de S.Paulo, que publicou uma série de livros (12 no total), agrupados sob o título de Grandes Nomes do Pensamento Brasileiro. Esta iniciativa propiciou aos brasileiros um mais fácil acesso a interpretes do Brasil, como: José Bonifácio, Capistrano de Abreu, Euclides da Cunha, Raimundo Faoro, Darcy Ribeiro, Oliveira Lima, Antônio Cândido, Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado Júnior, Celso Furtado e, Joaquim Nabuco. Deste autor foi publicado O Abolicionismo, livro cuja edição,  utilizaremos para estas análises.
            A segunda iniciativa atendeu a uma convocação de Lourenço Dantas Mota,  organizador de uma coletânea de textos, agrupados em dois livros, com o título de Introdução ao Brasil – Um Banquete no Trópico. Vol. 1 e 2 e publicados pela Editora do SENAC. Dantas Mota convocou os mais expressivos especialistas (geralmente sínteses de teses de doutoramento) para a análise das mais importantes obras sobre as nossas raízes históricas. Todos os autores acima referidos também estão contemplados nestas análises e a lista é engrossada por outros autores como: Padre Antônio Vieira, Antonil, Eduardo e Paulo Prado, Mauá, Vítor Nunes Leal, Gilberto Freyre, Florestan Fernandes, entre outros. No total são 36 obras analisadas, 17 no primeiro volume, e 19 no segundo, junto com uma introdução do organizador em cada um dos volumes. São duas referências preciosas e que também serão utilizadas em nossas análises.
            Especificamente sobre Joaquim Nabuco, no vol. 1 encontramos uma análise de Um estadista o império, feita por Luiz Felipe Alencastro e no vol. 2, Marco Aurélio Nogueira interpreta O Abolicionismo.
            Para situar bem  O Abolicionismo relembramos, da trajetória política de Nabuco, o fato de sua não reeleição para deputado em 1881. A sua derrota encontra explicação na força que os escravocratas ainda possuíam. O Brasil também vivia o marasmo provocado pela Lei do Ventre Livre (1871), da qual deveria brotar uma abolição natural e espontânea. Seria apenas uma questão de tempo. Este fenômeno já havia sido registrado em 1850, com a Lei Eusébio de Queirós, que proibiu o tráfico. O Abolicionismo é uma poderosa obra contra este marasmo e isto fica bem claro, já em seu prefácio. Neste prefácio afirma que a abolição representa uma “mancha de Caim” em nossa história, prevê que o seu livro não terá a devida acolhida e que terá toda a coragem necessária para aceitar todas as suas consequências.  Acusa também os que não enxergam o seu custo ruinoso e que desejam os efeitos de sua continuação indefinida. Reafirma ainda os seus compromissos de lançar sementes de liberdade, direito e justiça e a crença de que se sentirá recompensado “se este livro concorrer, unindo em uma só legião aos abolicionistas brasileiros, para apressar, ainda que seja de uma hora, o dia em que vejamos a independência completada pela abolição” (2000: XXII).
            Neste mesmo prefácio já aparece também a ideia central, que perpassa toda a obra, de que a escravidão degrada a natureza humana e em consequência, todas as instituições da sociedade.
            Para Nabuco o Brasil vivia um momento decisivo e sem postergação. Considerava a escravidão não apenas injusta, cruel e repulsiva, mas também, um entrave para o crescimento econômico e o desenvolvimento social. Além de um atentado à humanidade, uma ilegalidade flagrante aos padrões do mundo moderno, comparável a legislações sobre a aprovação do infanticídio, em países europeus. A escravidão, dizia, “pertence ao número das instituições fósseis, e só existe em nosso período social numa porção retardatária do globo” (IBIDEM: 79). Estávamos diante de um dilema: Ou nos candidataríamos à modernidade, seguindo os modelos liberais europeus, de sociedades de mercado abertas, alicerçadas nos direitos naturais individuais do jus-naturalismo, ou nos empedraríamos nas sociedades fechadas das instituições fósseis, fundadas no imobilismo social provocado pela escravidão. Segundo suas palavras:
A escravidão, assim como arruína economicamente o país, impossibilita o seu progresso material, corrompe-lhe o caráter, desmoraliza-lhe os elementos constitutivos, tira-lhe a energia e a resolução, rebaixa a política, habitua-se ao servilismo, impede a imigração, desonra o trabalho manual, retarda a aparição das indústrias, promove a bancarrota, desvia os capitães (sic) do seu curso natural, afasta as máquinas, excita o ódio entre as classes, produz uma aparência ilusória de ordem, bem-estar e riqueza (IBIDEM: 81)

O livro é uma propaganda abolicionista, um chamado às elites brasileiras para as suas responsabilidades e, acima de tudo, uma profunda argumentação teórica em torno da necessidade urgente da erradicação da escravidão e de todas as suas funestas consequências.
O livro é composto de 17 capítulos. Os primeiros são dedicados a explicitar e situar o movimento abolicionista, o seu partido e a enunciação do que seria o exercício de um mandato da raça negra. Passa depois, por uma análise histórica das leis que antecederam a emancipação e o seu caráter protelatório da emancipação total, até chegar num dos mais belos, o de número XI,  Fundamentos gerais do abolicionismo. Atinge porém,  o seu clímax com os três capítulos onde analisa as influências da escravidão sobre a nacionalidade (XIII), sobre o território e a população do interior (XIV) e as suas influências sociais e políticas (XV). O capítulo XVI é dedicado à necessidade da abolição e dos perigos da demora e termina com os receios e consequências, apresentando ainda suas conclusões. Nesta conclusão define e conclama a todos os abolicionistas:
            Abolicionistas são todos os que confiam num Brasil sem escravos; os que predizem os milagres de um trabalho livre, os que sofrem a escravidão como uma vassalagem odiosa imposta por alguns, e no interesse de alguns, à nação toda; os que já sufocam nesse ar mefítico, que escravos e senhores respiram livremente... Os que vão ao encontro dos supremos interesses da nossa pátria, da sua civilização, do futuro a que ela tem direito, da missão que a chama o seu lugar na América (Ibidem:172).
           
Nabuco assistiu e participou euforicamente da lei da emancipação, uma das mais lacônicas já vistas. Ela teve 85 votos favoráveis e 8 contrários na Câmara Geral e apenas um voto contrário no Senado do Império e a assinatura da Regente, princesa Isabel. Certamente que O Abolicionismo de Nabuco teve grande mérito para que este fato realmente acontecesse, embora tão tardiamente e de forma tão incompleta. Nada ainda fora feito para abolir os males estruturais da obra da escravidão. Permaneciam ainda as proibições do acesso à escola aos escravos, por força de dispositivo constitucional de 1824 e à terra, por força da Lei da Terra, de 1850, que definia a compra como a única possibilidade de acesso à terra, vetando-o assim aos escravos libertos.
Com o advento da República, nenhuma lei em favor dos emancipados de 1888. A única preocupação foi a sua substituição com a força de trabalho de imigrantes europeus.
Nabuco, na sua visão de totalidade já vislumbrava, em suas pregações políticas no Recife de 1884, visando retomar uma cadeira na Câmara Geral, que a questão da emancipação dos escravos estava intimamente interligada com a questão da terra: “Não separarei mais as duas questões – a da emancipação dos escravos e a da democratização do solo. Uma é complemento da outra. Acabar com a escravidão não nos basta; é preciso destruir a obra da escravidão” (SILVA, In: NABUCO 2000: XVII). Também um programa de alfabetização geral fazia parte de seus projetos.
Marco Aurélio Nogueira, em seu artigo sobre O Abolicionismo, contido em Introdução ao Brasil (MOTTA: 2002), divide a obra em três grandes temas, não em ordem de sequência: No primeiro seleciona os textos relativos a apresentação indignada dos estragos causados pela escravidão (páginas 172-176); no segundo os que sustentam os estragos causados por ela e que haviam despojado o país de povo e atrofiado a política (176-179) e no terceiro está a sustentação teórica do movimento abolicionista, com a definição de táticas e estratégias (179-184).
No primeiro tema, Nogueira inclui os três capítulos (XIII, XIV e XV), em que Nabuco descreve os males da escravidão sobre a nacionalidade, o território, a população, a sociedade e a política, males que como já afirmamos, permeiam a obra em sua totalidade. Especialmente nestes capítulos é que aparecerá o liberal que vê, na escravidão, a causa maior do atraso do Brasil, com relação a outros países sul-americanos, fazendo também comparações explícitas com o Canadá e com a Austrália (XIII). Vê na escravidão uma influência negativa em todos os sentidos e que em vez de progresso e riqueza só nos trará devastação. Vejamos a sua afirmação: “Onde ela chega queima as florestas, minera e esgota o solo e quando levanta as suas tendas deixa após si um país devastado em que consegue vegetar uma população miserável de proletários nômades (2000: 105).
O pensador liberal aparece explicitamente ao denunciar que o regime escravo sugava a energia e tolhia a iniciativa das forças vivas do país. Impedia-se qualquer avanço na cidadania e o Estado se tornaria o pai de todos, com os seus empregos, benesses e prebendas e oferecendo a falsa sensação de que tudo podia. Assim tudo ficaria comprometido: as eleições, os partidos e o parlamento. E, como tudo se esperava do Estado, as iniciativas eram tolhidas e as fortunas acumuladas com a escravidão eram desbaratadas e os arruinados se abrigavam no asilo comum do Estado. Este também era o destino das jovens inteligências.
Na segunda parte os seus vitupérios se dirigem aos resultados da escravidão. Considera que um povo, por ela atrofiada,  está impossibilitado de dar qualquer valor à liberdade, de alimentar qualquer utopia e, em consequência, deve abdicar de qualquer sonho de cidadania, uma vez que a escravidão se torna uma instituição mais poderosa do que o próprio Estado. A escravidão impediria  qualquer constituição de sociedade civil a dialogar ou se contrapor ao Estado. Como resultado, teríamos a total apatia, a inanição, a passividade, a ignorância e a resignação.
Nogueira nos apresenta a terceira parte, voltando para as duas primeiras, da seguinte forma: “reconstituída essa dupla face da escravidão – a de ter contaminado toda a sociedade e a de ter esvaziado a política de substância e ânimo reformador” (2002: 179) ele definirá as táticas e as estratégias para o movimento. Sustentava que a escravidão comprometia a própria Coroa e que a intimidava em sua ação, pois a sua sustentação política provinha do latifúndio escravocrata. Advogava a necessidade de que a Coroa deveria tomar a frente  do movimento, uma vez que já não mais se poderia sustentar o insustentável. O trabalho escravo se veria cercado de inimigos por todos os lados, ou seja, o modelo de economia liberal, com o chamado trabalho livre, pressionaria por todos os lados, nacional e internacionalmente. A principal estratégia era por fim ao marasmo provocado pelas leis parciais (Lei do Ventre Livre – Lei dos sexagenários), em favor da libertação total. Essa libertação total receberá todas as energias de sua argumentação.
Via, no entanto, na abolição apenas o primeiro passo. Como a instituição da escravidão representava uma radical organização estrutural da sociedade, a sua abolição necessariamente deveria vir acompanhada de uma ação radical e profunda para alicerçar a sociedade em novos fundamentos, em novos paradigmas. Aí o liberal se transforma num planejador, num direcionador, imputando ao Estado  as forças que organizariam o futuro da nova sociedade. Não se poderia esperar que as coisas acontecessem espontaneamente. Nogueira, citando o próprio Nabuco, assim sintetizava as suas preocupações: “O abolicionismo precisava ser rigorosamente uma sucessão de empreendimentos e decisões concatenadas: um movimento ativo, determinado, sistemático, dedicado a acuar, sufocar e golpear de morte a escravidão (2002.: 186) sob pena de manter “um foco de infecção moral permanente no meio da sociedade, tornando endêmico o servilismo e a exploração do homem pelo homem (Nabuco. 2000: 164). 

A OBRA DA ESCRAVIDÃO:

Nabuco procurou legar ao Brasil os fundamentos para a constituição de uma grande Nação. Mas a República, pouco ou nada fez para acabar com a obra da escravidão. Mudou-se para não mudar. Apenas um revezamento de mãos no poder.
            Inúmeros brasileiros depois de Joaquim Nabuco dedicarão à causa, o vigor de suas inteligências, mas cremos que ninguém, com tanta profundidade, perspicácia e rigor, como Florestan Fernandes, na obra,  A integração do negro na sociedade de classes. O livro, considerado como um dos mais profundos mergulhos em nossa história está dividido em dois volumes: o legado da “raça branca” e o “limiar de uma nova era”. Não vamos aqui fazer uma análise destes dois volumes de Florestan, tarefa que seria hercúlea. Apresentaremos apenas, de acordo com o objetivo deste texto (Nabuco – O abolicionismo – a obra da escravidão), algumas pinceladas que Gabriel Cohn fez sobre esta obra, contidas no livro organizado por Dantas Motta, Introdução ao Brasil – Um Banquete no Trópico, no volume 2.  Cremos que assim fica fácil compreender a preocupação de Nabuco de que também, a obra da escravidão deveria ser abolida.
            Cohn considera o tema da análise de Florestan bastante problemática, uma vez que estamos diante de duas realidades extremamente complexas. O autor assim se expressa: “problemático é o legado que se examina que não é o do negro, mas o da ‘raça branca’; problemático é a constituição da sociedade de classes. Mas será também problemático o limiar de uma nova era” (COHN, In: MOTTA. 2002: 387-8). Considera extremas as dificuldades que foram postas para o negro, uma vez que esta nova era só alcançaria êxito com o entrelaçamento das duas trajetórias: -“a dos ex-escravos e a da formação de uma sociedade de classes – em que uma não tem como se completar sem o sucesso da outra” (IBIDEM: 388). A obra mostra que para a plena integração do negro na sociedade, havia apenas um caminho, o da classe social. E isso dependeria de duas coisas: a de termos espaços suficientes para uma plena sociedade de classes, competitiva,  e a do negro organizar-se ao nível de afirmar-se como raça, construindo a sua identidade social.
Cohn nos relata que houve uma Lei áurea, mas nunca uma via áurea, que pudesse harmonizar a condição de negros como ex-escravos, com as condições da sociedade, em que lhes foi dado viver. Foram assim empurrados para um beco, apanhados numa ratoeira, uma vez que a dupla condição para a sua plena integração nunca ocorreu. Este contexto lhes propiciou uma complexa situação e um péssimo ponto de partida, o de que não estavam mais, nem inteiramente excluídos, nem adequadamente  e muito menos equipados para incluir-se plenamente. Ocupavam assim,  uma posição vulnerável,  tanto para si próprios  como também, para toda a sociedade.
Não resistimos de aqui transcrever a parte final do texto de Cohn, que nos põem diante de toda esta problemática situação da integração de um ex-escravo, com todos os seus estigmas, numa sociedade de classes, que por sua auto-definição é uma sociedade extremamente competitiva e que, portanto, exige inúmeros pré-requisitos. Vejamos:

As consequências desse estado de coisas são muito fundas. Na consciência social do ‘branco’ o ‘preconceito de cor’ aparece ‘como se constituísse uma necessidade maldita’. E, na mais pungente frase do livro: ‘O negro prolonga, assim, o destino do escravo’.
Seres humanos pela metade. Necessidade maldita. Prolongamento do destino do escravo. Conclusão: é tempo de se promover a Segunda Abolição (IBIDEM: 402).

Reservamos um último espaço para Francisco de Oliveira, não para o seu clássico, Crítica à razão dualista (OLIVEIRA. 2003), mas a uma fala sua, em Niterói e transcrita no livro organizado por Gaudêncio Frigotto e Maria Ciavatta – Teoria e Educação no Labirinto do Capital. (2001). O artigo em questão recebe o título de: A nova hegemonia da burguesia no Brasil e os desafios de uma alternativa democrática.
Antes de entrar na análise da construção desta hegemonia, sob o governo de Fernando Henrique Cardoso, Oliveira analisa as transformações ocorridas no Brasil, a partir do complexo abolição/imigração. Violência: com esta palavra Oliveira sintetiza este período, comandado pelos chamados barões do café que “aprisionavam a mão-de-obra, o voto e criavam uma república – que não era uma res publica” (OLIVEIRA. In: FRIGOTTO. 2001:52).
Continuando a análise de nossa trajetória histórica chega ao período de 1930 – 1984. Faz cálculos: uma tentativa de golpe a cada três anos. Faz contas e rememora: 1930 – 1932 – 1934 -1935 – 1937 – 1945 – 1947. Em 1947 tivemos um golpe aplicado pelo Parlamento, que pôs na ilegalidade o Partido Comunista Brasileiro. E, continua rememorando: 1954 com o suicídio de Vargas, a tentativa de impedir a posse e JK., democraticamente eleito e duas tentativas de golpe ao longo de seus governo, tramadas, uma pela marinha e outra, pela aeronáutica. Depois houve a renúncia de Jânio Quadros e a tentativa de impedir a posse do vice, somado ao golpe da imposição do parlamentarismo. Tivemos ainda o golpe de 1964 e os golpes dentro do golpe de 1967 e 1968. Refaz seus cálculos e constata que não errou: uma tentativa de golpe a cada três anos, sem falar que este período foi entremeado por “duas longas ditaduras: a de Vargas (15 anos) e a ditadura militar (20 anos) (IBIDEM: 53).
Oliveira emprega o termo hegemonia em seu sentido gramsciano, que ousamos sintetizar como mais consenso e menos força, e que Oliveira aplica desta forma à história brasileira:
Ditaduras querem dizer, sempre, impossibilidade de hegemonia. A ditadura se apresenta pelo seu oposto, como a capacidade de dominar. Mas a ditadura deve ser vista pelo seu contrário, como a incapacidade de hegemonizar. Quando a sociedade civil, as forças do mercado, a burguesia não conseguem que seu processo de classe social seja consensualmente admitido, recorrem à força (IBIDEM: 53).

Oliveira não está satisfeito com esta construção hegemônica no Brasil (não uso de violência – ao menos explícita) dos anos 90, como bem atesta a segunda parte do título de sua fala, os desafios de uma alternativa democrática. Tão pouco este pensador está satisfeito com a hegemonia sob o governo Lula, tanto assim que acrescentou ao seu clássico de 1972, Crítica à razão dualista, um novo capítulo, O Ornitorrinco, já em 2003. Mostrava assim a sua decepção com o governo Lula. Escrevemos a respeito em Ciência e Opinião ( Rech: 2006).     
Estas análises, de Nabuco, de Fernandes e de Oliveira nos permitem algumas interrogações. Quem são verdadeiramente os abolicionistas e os anti-abolicionistas? Quem é realmente a elite brasileira? Qual é o seu ideário? Quais são os seus interesses? Tolera realmente a criação de condições para o estabelecimento de uma sociedade de classes, em que efetivas condições de competição fossem realmente dadas? O que faz com que nunca hesitassem em recorrer à força, quando minimamente viam uma ameaça a seus privilégios (uma priva Lex e não uma lei universal)? Ou, com o auxílio de Nabuco, o que é ser abolicionista, em sua segunda geração, ou cem anos após a mesma? Quais seriam as forças anti-abolicionistas hoje, quando ainda são recusadas as condições para o estabelecimento da igualdade? É realmente necessário um novo projeto abolicionista?
T.H. Marshall é um dos clássicos da sociologia. Em seu livro Cidadania, classe social e status (Zahar. 1976) mostra a evolução dos direitos em três estágios progressivos: os direitos civis, ligados a integridade física, igualdade perante a lei e liberdade de pensamento e expressão; os direitos políticos, organizar partidos, votar e ser votado e os direitos sociais, como a saúde, a educação e trabalho, entre outros. Hoje, trinta ou quarenta anos depois, teríamos que acrescentar a estes os chamados direitos ligados a discriminação positiva, das políticas afirmativas e que são relativamente toleradas.  Seriam estas medidas, no entanto, suficientes para promover a necessária integração?
O próprio Oliveira, comentando a redemocratização brasileira ao longo dos anos 80, não esconde certo grau de satisfação. Constata que a maioria delas teve a sua origem nas classes dominadas. “A iniciativa política destes últimos trinta  anos foi, portanto, toda das classes dominadas” OLIVEIRA In: FRIGOTTO 2001: 56). Assim foram os movimentos de luta pela anistia, pela eleições diretas, pela constituinte e o novo movimento sindical. Já se vislumbra hoje a possibilidade de o Brasil satisfazer todos os índices que o apontariam como país desenvolvido. No entanto, persiste a interrogação: Isto é suficiente?


CONSIDERAÇÕES FINAIS:

         Consideramos cumpridos os objetivos traçados para a produção deste texto, de por ocasião do centenário de morte de Joaquim Nabuco, analisar um pouco de sua vida e de sua obra. Nabuco viveu plenamente o seu período histórico e envolveu-se profundamente com o mais polêmico tema da época: a abolição da escravidão. Engajou-se nesta luta com as reflexões teóricas, que dariam sustentação aos movimentos abolicionistas e pela determinação em sua atividade política.
            Sua visão de mundo se dá a partir de Londres, de uma cultura europeia e dos avanços de uma sociedade liberal. De lá vislumbrava com toda a clareza a total contaminação das instituições pela convivência com a escravidão e não via qualquer possibilidade de futuro e de cidadania para uma nação sob seus ditames. Queria inserir o Brasil na modernidade, numa modernidade conservadora, que passaria pelos princípios liberais e pela sociedade do livre trabalho. A clarividência de Nabuco não se limitava ao ato abolicionista. Preconizou todo um planejamento para erradicar a “obra da escravidão”, que passava necessariamente pelo acesso à educação e pelo acesso à terra. Isto lamentavelmente não ocorreu.
Complementamos o nosso texto com a pesquisa de Florestan Fernandes sobre A integração do negro na sociedade de classes, quando mais fortemente se percebe a sua não integração, visto que as possibilidades de acesso a uma sociedade competitiva lhe foram totalmente negados. Concluímos  com o pensamento de Oliveira, de que na construção de uma das sociedades mais desiguais do mundo, as elites brasileiras nunca titubearam em recorrer ao autoritarismo político para manterem, pela força e pela violência, as suas posições privilegiadas.
Três tópicos para encerrar refletindo em torno de algumas questões levantadas pelo texto:
1) . A revista Veja (Janeiro 2010)  traz duas matérias distintas e não interligadas. Numa ela homenageia o herói do fim da escravidão (100 -109) e em outra, aborda um de seus temas permanentes e preferidos: a criminalização do MST (65 – 67).
2) . As declarações do Cônsul geral do Haiti no Brasil, George Samuel Antoine, para o SBT – Brasil, não sabendo que já estava no ar: “A desgraça do Haiti está sendo uma boa”, porque assim o país “fica conhecido” e “acho que, de tanto mexer com macumba, não sei o que é aquilo. O africano em si tem uma maldição. Todo lugar que tem africano está fodido” (Folha de S.Paulo 16 de janeiro de 2010).
3) . A crônica de Luís Fernando Veríssimo (Gazeta do Povo – 17 de janeiro de 2010). Nesta crônica Veríssimo traz a opinião do evangélico Pat Robertson, um dos líderes da direita religiosa americana, sobre as desgraças do Haiti, de que este país estaria “pagando por um pacto que fez com o Diabo, em 1804, quando pediu sua ajuda para expulsar os colonizadores franceses e tornar-se uma república”. A lindíssima crônica de Veríssimo passa por alguns passos históricos do Haiti, que explicam a sua pobreza e termina com a contraposição do Deus vingativo de Pat Robertson ao Deus solidário da Dra. Zilda Arns.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ALENCASTRO, Luiz Felipe. Joaquim Nabuco: Um estadista do império. In: MOTA,        Lourenço Dantas (org.). Introdução ao Brasil. Um Banquete no Trópico. Vol. 1. São Paulo. Ed. SENAC. 2004. Páginas 113 a 131.
COHN, Gabriel. Florestan Fernandes – A integração do negro na sociedade de classes. In: MOTA, Lourenço Dantas (org.). Introdução ao Brasil. Um Banquete no Trópico. Vol. 2. São Paulo: Ed. SENAC. 2002. Páginas 385 a 402.
CARVALHO FRANÇA, Jean. Joaquim Nabuco e a Construção do Brasil. In:       NABUCO, Joaquim. O Abolicionismo. São Paulo: PubliFolha. 2000. Páginas 175 a 180.
NABUCO, Joaquim. O Abolicionismo. Grandes Nomes do Pensamento Brasileiro. São Paulo. PubliFolha. 2000.
 FREYRE, Fernando. Prefácio. In: QUINTAS, Amaro. O Sentido Social da Revolução Praieira. Recife: Ed. Massangana – Fund. Joaquim Nabuco. 1982. Pág. 9 – 11.
  NOGUEIRA, Marco Aurélio. Joaquim Nabuco – O Abolicionismo. In: MOTA, Lourenço Dantas (org.). Introdução ao Brasil. Um Banquete no Trópico. Vol. 2. São Paulo: Ed. SENAC. 2002. Páginas 167 a 190.
OLIVEIRA, Francisco. A nova hegemonia da burguesia no Brasil dos anos 90 e os desafios de uma alternativa democrática. In: FRIGOTTO, Gaudêncio & CIAVATTA, Maria (orgs.). Teoria e Educação no Labirinto do Capital. Petrópolis. Vozes: 2001. Páginas 51 a 77.
 ____________, Francisco. Crítica à razão dualista – O Ornitorrinco. São Paulo. Boitempo: 2003.
QUINTAS, Amaro. O Sentido Social da Revolução Praieira. Recife. Ed. Massangana – Fund. Joaquim Nabuco: 1982.
   RECH, Pedro Elói. FHC e LULA. Uma Continuidade. PSDB e PT iguais. O olhar de Francisco de Oliveira. Curitiba: Ciência & Opinião. Vol 3. nº 1. jan./junho 2006. Unicenp. Páginas 15 a 27.
   FOLHA DE S.PAULO. Edição de 16 de janeiro de 2010. Mundo – A 21. São Paulo
   GAZETA DO POVO. Edição de 17 de janeiro de 2010. Pontos de Vista. – Pág. 3.
VEJA. 13 de janeiro de 2010. Edição 2147 – ano 43. nº 2.