"Era preciso aceitar a tarefa mais ingrata: essa de se deixar ficar enquanto fosse possível a reedição diária das horas. Se me impregnasse todo do fluxo invisível da minha manutenção, me deixaria ficar ali na praia, torrando debaixo do sol, dormindo por ali mesmo, saciado muito mais do que carente, pronto para ser abatido, é certo, mas sentindo também, é certo, um surdo regozijo sem o poder de me levar a parte alguma, a nenhum lugar. Eu estaria bem se assim se desse, juro".
O livro de João Gilberto Noll sobre a preguiça. Canoas e marolas.
Este é o meu segundo livro, da coleção Plenos pecados. O pecado tratado é a preguiça. O nome do livro é Canoas e marolas. O autor é João Gilberto Noll. É o meu primeiro contato com este autor, nascido em Porto Alegre no ano de 1946. Julgo até possível que algum dia a gente tenha se cruzado em alguma rua da cidade de Porto Alegre.
O primeiro livro da coleção que eu li foi Terapia, de Ariel Dorfman, que versava sobre a avareza. O livro não tocou diretamente no pecado da avareza. Entrou pelo mundo dos mercados globalizados. Canoas e marolas também ficou um tanto distante do pecado da preguiça. Busco uma aproximação com o tema com o que está escrito na contracapa do livro e com a frase de abertura deste post. Vamos à contracapa:
"Na ilha, há um rio caudaloso e encorpado. Há um menino com jeito de índio, a vagar pelas ruas. E há um homem em busca de Marta - a filha desconhecida. São estes os elementos que o talento de João Gilberto Noll combina para construir sua narrativa sobre a preguiça. No seu texto de incomparável poesia, Noll dá um novo tratamento ao tema, mostrando o mais indolente dos pecados capitais como uma grande metáfora do desalento e apatia do homem contemporâneo".
Considero a construção da narrativa um tanto complexa. Por isso dou mais um trecho do próprio livro, agora de sua orelha.
"Nesta ilha, ancora um homem e sua busca. Nesta ilha ele chega procurando Marta - a filha de um amor fugidio que nunca chegou a conhecer. Sabe que é estudante de medicina. Ouviu dizer que trabalha no projeto de Ablação de Mentes, uma tentativa de auxiliar doentes terminais. Marta é a dama de companhia dos que vivem o olho no olho da morte, tentando fazer ressurgir uma réstia que seja de ilusão na vida que se esvai. Num texto denso, João Gilberto Noll vai, pouco a pouco, construindo uma melancólica imagem do homem e seus sonhos. Quinto volume da coleção Plenos Pecados, Canoas e marolas é uma visão original do pecado da preguiça. Na poética linguagem de Noll, este pecado surge como uma metáfora do desalento do homem contemporâneo".
Acho que com este roteiro indicado no próprio livro, não preciso entrar em maiores detalhes. Volto a falar da complexidade de sua construção. Como busquei no Aurélio, uma definição de avareza, passo a fazer o mesmo com relação à preguiça. Vejamos:
Preguiça: aversão ao trabalho; negligência, indolência, mandriice. Morosidade, lentidão, pachorra, moleza. Seria então a preguiça a moleza diante da própria vida? Bom assim. Gosto de terminar com interrogações.
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