domingo, 30 de setembro de 2018

Leitura como prática de resistência e de humanização


No início deste ano de 2018, fui procurado pelo professor Sebastião para organizarmos um grupo de leituras. Ampliamos a discussão. Depois de passar por vários formatos e temas, optou-se pelo tema da formação do pensamento ocidental. O formato do curso passaria por leitura, discussão do lido e um relatório inconcluso.

Os livros lidos foram: MARX & ENGELS. A ideologia Alemã;
PLATÃO. O Banquete e Apologia de Sócrates;
Santo Agostinho. As Confissões;
Descartes. O Discurso do Método;
Nietzsche. O nascimento da tragédia e Genealogia da moral;
Jair Pereira dos Santos. O que é pós-moderno.

Inúmeros textos e autores fizeram as pontes para dar o sequenciamento ou mostrar as rupturas neste processo de construção. Foi um belíssimo processo de construção coletiva. O presente texto é um desses relatórios.
O professor Sebastião sempre divulgando, organizando e participando de grupos de leitura.


Leitura como prática de resistência e de humanização.

 Sebastião Donizeti Santarosa.

Scherazade, a bela contadora de histórias das “Mil e Uma Noites”, vence a morte indo ao encontro daquele que seria seu carrasco, contando-lhe histórias. No encantamento das narrativas enredadas, amplia-lhe os limites da miopia e dos caprichos individuais construídos com o ressentimento da traição conjugal e do amor ferido. Nas histórias contadas, no deslocamento do espaço e do tempo, renasce o rei amoroso que se fizera carrasco, aberto agora para o vislumbre de novos horizontes de vida.

O renascimento encoraja para a adolescência:
A vida é tão bela que chega a dar medo.
Não o medo que paralisa e gela,
estátua súbita,
mas esse medo fascinante e fremente de curiosidade que faz
o jovem felino seguir para frente farejando o vento
ao sair, a primeira vez, da gruta. 
Medo que ofusca: luz! 

Cumplicemente,
as folhas contam-te um segredo
velho como o mundo: 

Adolescente, olha! A vida é nova...
A vida é nova e anda nua
- vestida apenas com o teu desejo!
 
Encontros de formação como os que vivenciamos aqui no município de Campo Largo, são práticas de enfrentamento da morte, de renascimento e de resgate da adolescência. Nesses encontros, aquele friozinho na barriga há muito não sentido volta a provocar cócegas de desassossego. 

Por certo, as longas jornadas de trabalho rotineiro e as exigências do cotidiano corrido nos tolhem o tempo de estudo e de reflexão, apequenam nossas almas e castram nossos desejos. Como educadores, com os olhos embotados de giz e de lágrimas, corremos permanentemente o risco de desprezar a criatividade da vida e de nos tornar coadjuvantes de um itinerário de morte. A permanente expectativa pelo final de semana, pelo feriado, pelas férias e, finalmente, pela aposentadoria que temos vivido é um abominável exercício de mortificação. Se há uma inteligência safada e perversa nos impõe essa condição, é preciso ir ao encontro dela, mesmo que esteja entranhada em nosso ser e enfrentá-la cara a cara como faz Sherazade, fazendo emergir nossas tantas e ricas histórias, contidas e não-contadas, vislumbrando outros horizontes, como o jovem felino que segue em frente ao sair pela primeira vez da gruta, farejando o vento. 

Farejar o vento, a vida só é possível no movimento, sempre a se fazer, nunca pronta e acabada. A condição da vida é a liberdade para ser no fluxo contínuo do vir-a-ser. E isso, justamente, é o mais bonito:

Educamos para vida. Educamos para liberdade. E é possível ser educador aprender a ser livre, sem estudar, pensar, refletir, imaginar, criar? Ser educador é, acima de tudo, travar uma luta permanente pela libertação:

Como poucos, eu conheci as lutas e as tempestades. Como poucos, eu amei a palavra liberdade e por ela briguei”.

A guerra é a mãe de todas as coisas, nos ensinava Heráclito; não está morto quem peleia, dizia um certo capitão Rodrigo. E, em tempo de neoliberalismo exacerbado, de gestão e de descarte de indesejáveis, quando forças econômicas tentam, com ferocidade, reduzir a alma humana aos princípios de uma consciência empresarial, subjugando desejos e sonhos à lógica financeira de lucratividade ilimitada, objetivando a humana dialética do vir-a- ser à racionalidade, ao controle e à previsibilidade do mercado, a arma dos educadores para não morrer é ter coragem para encontrar espaços de subversão e de rebeldia: espaços de formação de desconformação, de formação para liberdade. 

Somos, de fato, livres. Temos a liberdade para escolher princípios éticos na relação que estabelecemos com o outro, com nós mesmos e com o mundo. A consciência que temos de nós mesmos e de nossa própria aldeia se constrói nas relações que estabelecemos com nossa própria aldeia e com os olhares dos outros sobre nós mesmos e sobre nossa própria aldeia. Nossa consciência não é consciência de um homem só, genuína como a divina concedida a um Adão no Paraíso. Nossa consciência é construída na história, na ação laboral de transformação da natureza, nas formas de interação pessoal, no trabalho de construção ideológica e cultural. Não nos formamos, portanto, sozinhos. É impossível se humanizar na solidão, salvo aquela necessária para o embelezamento do eu para o encontro com o outro.

A formação, enquanto olhar e reflexão sobre o mundo, sobre nós mesmos e sobre o outro, exige, necessariamente, a presença do outro. Seja a relação de alteridade, ou seja, com esse outro, uma relação de mera conformação de nossas perspectivas com a perspectiva do outro, seja ela uma relação de polêmica e de confronto, seja ela uma relação de absoluta negação do outro, tal como a Meduza, que congela e mata quando os olhares se cruzam. 

O limite de nosso olhar sobre o mundo é o olhar do outro. E é pelo olhar do outro que nos constituímos. Nosso olhar está sempre direcionado para frente, para o mundo e para o outro, não somos capazes de reconhecer nossa própria face, não temos a visão cabal de nosso próprio eu. É o outro, de sua perspectiva, que diz de nós o que somos. Se sou bonito ou feio, bom ou ruim, certo ou errado, é o outro que é capaz de dizer. 

E no jogo de olhares, é para apreciação dos olhos do outro que construo em mim a minha própria imagem. Como um Narciso que deseja ver sua própria beleza refletindo na fonte, é, acima de tudo, a minha beleza que quer ver brilhando nos olhos do outro. É o outro, por seu olhar, que me admira ou me despreza, que me nomina, que me julga, que diz o lugar que devo ocupar no mundo. 

O outro, entretanto, são muitos outros, assim como eu sou o outro dos outros com os quais encontro, construídos em muitos outros encontros, com diferentes faces e olhares, que me constroem e me reconstroem de diferentes postos de observação, de acordo com seus caprichos, com seus desejos, com suas miopias. É no encontro com o outro em que me faço e me refaço, em que me incluo, produtivamente, na dinâmica da criatividade permanente da vida. 

Narciso morre ao encantar-se com a própria imagem, fixa nas águas da fonte. Recusa o outro, prefere, isoladamente, mergulhar para dentro de si mesmo. Narciso queria ver o reflexo de sua beleza da fonte brilhando, por ricochete, nos próprios olhos. Lógica neoliberal de individualização, de apequenamento e de redução de horizontes existenciais. Lógica do afogamento da alma. No reverso narcísico, Mário de Andrade se dizia ser trezentos. Fernando Pessoa era Álvaro de Campos, Alberto Caieiro, Ricardo Reis e muitos outros. E o Mário ele mesmo, quem era? E o Pessoa em pessoa, quem era?

Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida
a minha face?”

O nascer, o viver e o morrer. As faces se perdem, se encontram, se refazem. 

Em nossos encontros, no microuniverso de educadores de Campo Largo, trocamos olhares, nos configuramos e nos reconfiguramos nas relações estabelecidas entre o eu-para-mim, o eu-para-o-outro e o outro-para-mim. Encontros densos de experiências ecoam martírios e magias vivenciados em jornadas escolares. Histórias contidas agora são contadas. Olhares que se encontram, se atravessam, desconfiguram e reconfiguram novas paisagens, novos horizontes, novas faces, novas possibilidades de novas escolas. As faces se transmudam, mas não se perdem.

Nesses encontros, os limites dos espaços locais e do tempo presente transcendem-se, levando-nos a perspectivas visuais de amplitude global e de vozes que ecoam na grande temporalidade, em que passado e presente formam um amálgama e descortinam o devenir. Não estamos sozinhos, definitivamente. Outras tantas almas, inconformadas e inquietas, de outros tempos e lugares, em suas vozes registradas pela escrita, de seus lugares, interpelam-nos, provocando-nos a formular novos olhares e novas respostas a seus olhares e a nossos próprios olhares, reconfigurando, nessa grande temporalidade, o eu-para-mim, o eu-para-o-outro, o-outro-para-mim.

Karl Marx, Platão, Santo Agostinho e Nietszche, traduzidos para o Português, atravessados por outros autores que disseram sobre suas obras, falados pela boca do Dirceu, do Nelson, do Acleilton, do Pedro Elói, da Hecilda, da Kika, da Reny, do Vítor, da Andreia, da Dirceia, do Dalton, da Julia, do Avanir, do Lino, Eliana, Boanerges, Simone e de todos os demais companheiros, compreendidos pelas nossas próprias palavras, renascem, agora junto com cada um de nós, nesse movimento permanente do vir a ser, em que o eu emerge, dialeticamente, na sombra e na luz de um grande nós.

Em tempos de olhares de Meduza, que congelam e petrificam, de escola sem partido, de privatização e de cerceamento do pensamento, de redução do homem a peça na engrenagem de produção e de consumo do mercado, precisamos, sem dúvidas, envidar todos os nossos esforços na luta pela emancipação e consequente humanização. Temos que ter a coragem de Scherazade e contar nossas histórias. A vida precisa ser vivida, não controlada, não objetivada, não mercantilizada.
Esse grupo de estudos, para mim, foi exercício de militância e de resistência.

Agradeço a todos que estiveram comigo.
“Eles ergueram a torre de Babel
para escalar o céu.
Mas Deus não estava lá!
Estava ali mesmo, entre eles,
ajudando a construir a torre.”
Sebastião

Não resisto sem intervir minimamente, trazendo para o grupo, Valter Hugo Mãe pelo seu personagem Camilo, que emergiu de sua solidão, em O filho de mil homens.

"Sabes, pai, gosto de pensar que nunca mais vou ficar sozinho e que alguém há de ficar comigo para sempre sem me abandonar.

O Crisóstomo disse ao Camilo: todos nascemos filhos de mil pais e de mais de mil mães, e a solidão é sobretudo a incapacidade de ver qualquer pessoa como nos pertencendo, para que nos pertença de verdade e se gere um cuidado mútuo. Como se os nossos mil pais e mais as nossas mil mães coincidissem em parte, como se fôssemos por aí irmãos, irmãos uns dos outros. Somos o resultado de tanta gente, de tanta história, tão grandes sonhos que vão passando de pessoa a pessoa, que nunca estaremos sós. O Camilo sorriu e disse: não compreendo nada, só queria dizer que gosto da Tereza e que os meus amigos de quinze anos, como eu, estão a arranjar namoradas. Gostava de arranjar uma namorada para sempre".

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

Relatos de uma viagem 1.. João Pessoa. Um pouco de história.

Tendo milhas por vencer, por sempre ter ouvido falar muito bem de João Pessoa e, por ainda não conhecê-la, foram fatores decisivos por optar por este destino. E que acerto. João Pessoa é belíssima, tem muita história e um centro histórico bem conservado. Optei por hospedagem no centro, junto ao Parque da Lagoa, mas recomendaria hoje a orla, nos arredores do hotel Tambaú, em virtude da locomoção. Facilita os passeios. O receptivo da Luck foi o que se dispôs a incluir o hotel da região central em seus roteiros. A Central dos receptivos havia me recusado, indicando apenas a busca nos hotéis da região costeira.
No centro histórico, o complexo cultural São Francisco. Uma preciosidade.

A viagem a João Pessoa é absurdamente cara. Minhas milhas não davam nem para pensar. Em compensação Recife estava muito acessível. Como a distância entre Recife e João Pessoa é pequena, é a menor distância brasileira entre as capitais, optei pelo ônibus. Foi possível mas difícil. Tem opção de metrô e de ônibus (TI -TIP 370) entre o aeroporto e a rodoviária, um mundão de distância. Outra opção seriam os próprios passeios entre as cidades. Só não o usei por falta de coincidência nos dias dos passeios. Você conhece a cidade e já fica nela. O trânsito do Recife é horroroso. A viagem entre as capitais é tranquila (120 Km. pela BR 101), passando pelas históricas cidades pernambucanas de Paulista, Abreu e Lima, Igarassu e Goiana. Além de históricas, estas cidades abrigam um novo polo de desenvolvimento.
Na parte baixa da cidade. O primeiro hotel de luxo e uma referência histórica a um dos nomes da cidade.


João Pessoa tem muita história. Ela está ligada ao rio Paraíba (rio de águas rasas - de difícil navegação - porto ruim) e ao seu afluente Sanhauá (dente redondo). Às suas margens é que começou a cidade. As falésias impediam um porto marítimo, por isso a penetração pelo rio. Posteriormente é que haverá a expansão para o litoral. A fundação data de 1585, mas houve expedições anteriores. O nome da cidade foi mudando, de acordo com os seus movimentos históricos.
A catedral da cidade em homenagem à Nossa Senhora das Neves.


Primeiramente se chamou de Nossa Senhora das Neves. Esta denominação é a da santa do dia da fundação (5 de agosto), Nossa Senhora das Neves e não, obviamente, por presença de neve na cidade. Em função da união da coroa portuguesa com a espanhola(1580-1640) e numa homenagem a Felipe II, a denominação passou a ser a de Filipeia de Nossa Senhora das Neves. Com a dominação holandesa passou a ser a cidade de Frederica e após a sua expulsão a nova designação passou a ser cidade da Parahiba. A mudança de nome que ela recebeu e que persiste até hoje ocorreu em 1930, João Pessoa. Ele era o presidente da Província, que morrera assassinado no Recife. Eram os tempos da Aliança Liberal entre os estados do Rio Grande do Sul, Minas Gerais e a Paraíba. Esta aliança também é a responsável pelo NEGO (negação de apoio a Júlio Prestes - São Paulo) e as cores preta e vermelha (luto e sangue de João Pessoa) na bandeira do estado.
Homenagens a João Pessoa estão espalhadas por toda a cidade.


A partir de João Pessoa, seguindo os rastros de Areia, Campina Grande, Cariri e Souza, se chegou ao interior. A grande riqueza sempre foi a da cana de açúcar, a agricultura, a pecuária e a pesca e, mais tarde, a indústria de alimentos, têxteis e a coureiro calçadista alavancaram a ocupação. Hoje o comércio e o turismo, este em grande expansão, ganham cada dia maior importância. Em torno de duas cidades gira mais da metade de sua riqueza. João Pessoa e Campina Grande. A população de João Pessoa gira em torno de 800.000 habitantes e a do estado ultrapassa os 4 milhões.
A beleza da orla contribui imensamente com a expansão do turismo.


O centro histórico está relativamente bem conservado. Ela é dividida entre a parte baixa da cidade, onde se concentra toda a atividade comercial e a parte alta onde estão as atividades administrativas e religiosas. A cidade se erigiu sob a forma de um cruzeiro. Os padres franciscanos se estabeleceram na parte da cabeça da cruz, os jesuítas na parte dos pés e os carmelitas e beneditinos na extremidade dos braços. Os prédios são bem conservados e considerados Patrimônio Nacional. O mais bonito é o Centro Cultural São Francisco e o mais importante é a parte dos jesuítas. Ali estão os Palácios do Governo, da Justiça e o do Legislativo, além da Faculdade de Direito. A expansão para a orla litorânea somente se deu a partir do saneamento do parque da Lagoa, um lugar muito agradável. Na parte litorânea está concentrada toda a atividade de turismo, a partir do hotel Tambaú.
O ponto mais oriental do Brasil. Farol de Cabo Branco. O mar está engolindo a terra.


Nas proximidades do Farol do Cabo Branco, onde se situa o ponto brasileiro do extremo leste, a parte mais oriental, moram os novos e velhos ricos da cidade. Ou, a gosto dos corretores de imóveis, o metro quadrado mais caro da cidade. No bairro chamado Altiplano. Nas proximidades do hotel Tambaú estão concentrados os mercados de artesanato e os centros de gastronomia. Nesta parte o sol foi preservado por leis urbanas.
O marco do extremo oriente brasileiro.


As principais cidades são as de João Pessoa, a Jampa, com 800 mil habitantes, seguida, pela ordem, por Campina Grande (410.000), Santa Rita (140.000), Patos (110.000), Baieux (100.000), Souza e Cabedelo (70.000), Cajazeiras, Guarabira e Sapé (em torno de 60.000). João Pessoa se orgulha muito do seu verde e de sua qualidade de vida. Em outro post eu publico sobre um city tour e sobre o por do sol, ao som do bolero de Ravel na Praia do Jacaré, onde não tem praia, nem jacaré.





Educação bancária e educação problematizadora. Educação como prática da liberdade.

Este post, acima de tudo, tem uma finalidade prática. O uso como subsídio para um debate e promover a reflexão. Vou apresentar dois esquemas que sempre subsidiaram as minhas aulas sobre o mestre, Patrono da educação brasileira. Não irei tecer comentários sobre estes esquemas. 

O primeiro deles, o retiro de um livro que me acompanha desde 1981. Trata-se de Educação e dependência, de autoria de Manfredo Berger. Ele diferencia a educação bancária (depositar e sacar) da educação problematizadora (perguntas/problema), que faz parte do método freireano. Está localizado à página 300 do livro citado.
O belo livro de Manfredo Berger.



Educação bancária:                                                                 Educação problematizadora:

mistifica..................................................................................desmitologiza/desmistica
resiste ao diálogo................................................................... considera o diálogo indispensável
encara o educando como objeto..............................................promove o pensamento crítico
impede a criatividade e domestica a ......................................funda-se na criatividade e estimula .........
intencionalidade da consciência. ............................................a ação autêntica.

O segundo esquema é um traçado de palavras com significados opostos, retirados da pequena introdução que o próprio Paulo Freire faz ao primeiro capítulo do livro Educação como prática da liberdade. Este capítulo tem por título - A sociedade brasileira em transição:
O extraordinário livro de Paulo Freire.


Sujeito................................................................... objeto
Relações................................................................ contatos
Reflexivo............................................................... reflexo
Liberdade/transcender........................................... domesticação/dominação
Tempo tridimensional............................................ tempo unidimensional
Ser criativo............................................................. ser passivo
Herdar/incorporar/interferir -cultura/história......... ser espectador
Integração/enraizamento.........................................adaptação/ajustamento/domesticação
Liberdade/criação....................................................ajuste/acomodação
Aberto/plástico/flexível...........................................fechado/rígido
Em trânsito..............................................................imobilizado
Participativo/reconhecimento de tarefas.................mitos imobilizadores/tarefas impostas
Sujeito/plenificação/busca......................................Objeto/o eu que não lhe pertence/alienação
Funções intelectuais................................................instintivo/emocional
Emerso.....................................................................imerso
Em trânsito...............................................................intransitivo/mudança superficial
Participação ativa.....................................................joguete passivo.


Sociedade aberta/em trânsito...................................sociedade fechada
A captação do novo.................................................a prisão ao velho/ao arraigado
Industrialização/voltado para si...............................interesses externos/agrário exportador
Radical/convencimento............................................sectário/fanático/imposição
Descoberta de si/criticidade..................................... alienação/não pertencimento
Emersão/democratização......................................... imerso/dominado/fanatismos
Sofre acusações: desordem/subversão.....................assistencialismo
Do povo e com o povo.............................................sem o povo/para o povo. A massa
Transitividade - da consciência ingênua à crítica.....a intransitividade
A captação/o diálogo................................................vida vegetativa/o não captar
A integração.............................................................o mágico/emocional/acomodador.

E duas frases:

"Segundo minhas experiências, na escola como em casa fizeram de tudo para apagar nossa peculiaridade". Fellini.
Tributo a Dom Hélder Câmara. Catedral de Olinda.


"Se dou comida aos pobres, todos me chamam de santo. Mas quando pergunto por que são pobres, me chamam de comunista". Dom Hélder Câmara. Frase em epígrafe do livro A elite do atraso, de Jessé Souza.


quarta-feira, 26 de setembro de 2018

Zé Dirceu. Memórias - Volume I.

O livro de José Dirceu Zé Dirceu - Memórias - Volume I, me chamou muita atenção desde os primeiros comentários sobre sua disposição em escrevê-lo. Comprei-o já no pré lançamento, que, descobri agora, é uma forma de financiamento, um adiantamento do leitor para que o autor tenha a possibilidade de publicação de sua obra. Certamente bem mais barato do que o caro financiamento bancário.
Capa do livro Zé Dirceu. Um lançamento setembro 2018. Uma importante fonte para a história.


O meu particular interesse é porque residi em Umuarama entre os anos de 1969 e 1993 e eu ouvia falar muito de um "terrorista" da luta armada que se refugiara na cidade de Cruzeiro do Oeste, onde ele montou uma loja e se casou com uma moça da cidade. Ela se chamava Clara e com ela teve um filho, o atual deputado federal Zeca Dirceu. Também se falava muito, que a única pessoa que sabia de sua história era o Dr. Ivo Sooma, um dos melhores seres humanos que eu conheci ao longo de minha vida e com o qual, já ao final dos anos 1980, conversava abertamente sobre o caso. O livro fala também do Dr. Gil. Em torno do Dr. Gil se formou, com certeza, o círculo de pessoas mais cultas de Umuarama.

Também ao final dos anos 1980 me filiei ao PT e, em um determinado momento, ocupei a presidência do partido na cidade. Um dia, sabendo da presença sua em Cruzeiro do Oeste, fui procurá-lo na casa de Clara, que eu já conhecia, uma vez que ela frequentava as festas do CTG Querência da Amizade. O meu intento era agendar um encontro seu com a nossa militância. Os seus afazeres o impediram de atender a nossa demanda. A sua visita à cidade atendia exclusivamente a agenda familiar. Em outro post farei algum recorte sobre esta passagem, porque agora, o objetivo é o livro.

Quando comecei a leitura, imediatamente me chamou atenção a profundidade de suas análises e a devida contextualização dos fatos vividos e rememorados. Já na leitura dos primeiros capítulos, tirei a minha primeira conclusão: Somente a prisão tornou possível este livro. Ele terminou de ser escrito em julho de 2018 e foi lançado no mercado no mês de setembro. Possui 34 capítulos, um epílogo e dois anexos. Possui 495 páginas. É um lançamento da Geração Editorial. Como consta na capa - Volume I, existe a certeza de que virá o II, o que está anunciado no epílogo deste primeiro volume. A área de abrangência é até o ano de 2007. 2007 é, portanto, o marco divisório entre os dois volumes.

Na contracapa do livro, para situar os principais temas, lemos o seguinte: "No primeiro volume de suas memórias [...] ele expõe o que jamais foi dito sobre sua vida e sobre os principais líderes da política brasileira nos últimos 50 anos. Um livro imprescindível para se entender como foi a luta contra a ditadura militar, a redemocratização, a derrubada do presidente Fernando Collor, a oposição aos governos de Fernando Henrique Cardoso, a eleição de Lula e Dilma e o atual momento político do país". É a história viva, contada por um de seus sujeitos históricos, quase sempre na condição de protagonista. Destacaria ainda, dentro da redemocratização, a questão da fundação do PT, de seu projeto de ser um partido de massas e jamais de vanguarda. Um partido, portanto, de democracia, de difícil democracia.

A leitura é apaixonante e todos os capítulos tem a sua importância. Mas eu destacaria aqueles sobre os quais ainda não temos tanta literatura. Assim, a fundação do PT, de sua constituição histórica, e das fontes que lhe deram origem. São passados carregados de história que confluem. Isso obviamente torna a sua condução algo extremamente complicado. As pessoas vinham portando muitas certezas. Tenho comigo, especialmente após esta leitura, que é o seu ideal socialista que mantém o partido em pé, que não permitiu a sua destruição ou autodestruição e que lhe dará, ainda, uma longa vida. Desde a sua fundação, o PT é presença forte em todos os momentos importantes de nossa história.

Destaque especial também merece a construção e a chegada ao poder e o seu difícil exercício deste. Zé Dirceu ganhou notória fama de grande articulador. Construção de alianças de alianças e garantias de governabilidade necessariamente passavam por ele. Havia autorizações e desautorizações, inimigos explícitos e muito fogo amigo. Nomes e fatos são explicitados. Entre eles está a crise do mensalão, que culminou com a cassação de seu mandato, seguida de uma nova espécie de exílio, desta vez dentro de seu próprio país.

O livro também ganha destaque na análise das questões fundamentais do PT à frente do governo e a reação que estas políticas causaram na elite brasileira, inimiga histórica de todas as causas populares ao longo de nossa história. Neste sentido existe uma bela análise da trajetória do PSDB, que se distancia da social democracia para abraçar as políticas neoliberais do Estado mínimo e do mercado máximo, atendendo os interesses do atual estágio do capitalismo financeiro e improdutivo. O PSDB se tornou o instrumento de execução destas políticas, capitaneando o golpe de 2016.

São eles os reias inimigos das realizações do PT, especialmente, quando este afirma a soberania nacional e popular e os direitos sociais e os do trabalhador. Vejamos um trecho do epílogo, quando ele analisa o Brasil, já após o golpe de 2016: "Não é preciso fazer um balanço e um histórico do governo Lula e de seus, nossos erros, alguns crassos. Basta conferir a agenda, o discurso, a propaganda do governo Temer e de seus reais aliados, a mídia e o grande capital financeiro e rentista. É fácil constatar: tudo o que eles atacam é nossa realização, que diz respeito aos interesses nacionais e aos direitos dos trabalhadores.
A cortina de fumaça da corrupção só é usada e desvendada para encobrir a verdadeira natureza e o real objetivo do golpe e da volta regressiva dos governos tucanos a serviço da banca internacional e da elite reacionária do país, de suas classes médias iludidas e enganadas" (pág.458).

Esta citação retirada do apêndice, que é uma perfeita análise de conjuntura do momento que estamos vivendo. Nele também afirma as razões do golpe: "Era insuportável para a elite ver o povo 'invadir' seu meio social, cultural, seus espaços 'exclusivos' (universidades, aeroportos e aviões, por exemplo); ver o povo ascender, por políticas públicas universais,, na cultura, na renda, na cidadania e no poder" (pág. 459).

Apresento ainda os dois parágrafos finais do capítulo 34, o último, antes do epílogo. Eles sintetizam o sentido da luta que pautou toda a sua vida e aponta para a sua continuidade: "No afã de derrubar Lula e o PT, nossas elites manipulam e açulam o ódio e o preconceito. Buscam atalhos, não vacilando em assassinar biografias. Ou até vidas, como na ditadura civil-militar de 1964. Seu alvo principal é a anulação das lideranças e de suas ações, fazer regredir o que se acumulou de força social e de cultura política. Colocar a roda da História rodando ao contrário para fazer o tempo retroceder. Manter o status quo dos muito ricos, que moldam a sociedade à sua imagem e semelhança não em renda, riqueza e cultura, mas no acatamento de sua dominação.

Nós, como outros, éramos uma ameaça, potenciais candidatos de um projeto-processo histórico que não se encerrou. Apenas retrocedeu pela força, agora da própria Lei e do Parlamento, usados como instrumento do golpe de 2016" (pág. 451).

O livro foi revisado por ninguém mais, ninguém menos do que Fernando Morais. O segundo volume está sendo escrito, com previsão de lançamento no primeiro semestre de 2019. E - com certeza - no futuro, muitos historiadores se debruçarão sobre este livro para escrever a história destes momentos vividos pelo país. É um livro  escrito com a paixão do viver, com todas as suas dores e alegrias, suas denúncias e seus anúncios. A história de uma vida, escrita com paixão, sentido e finalidade. E, obviamente, também uma versão em sua defesa perante os fatos. Dirceu sempre foi protagonista.


segunda-feira, 10 de setembro de 2018

O retrato de Dorian Gray. Prefácio.

Existem coisas tão belas que precisam ser mais divulgadas. Uma delas é o prefácio deste maravilhoso livro, O retrato de Dorian Gray. Ele foi escrito quando Oscar Wilde (1854- 1900) tinha 36 anos de idade. A arte, a estética. Um poema. Uma obra de arte.
Não é o exemplar que eu tenho. O meu é o da Abril, da coleção Os imortais da literatura universal - 35 - 1972.


O artista é o criador de coisas belas.
Revelar a arte e ocultar o artista é a finalidade da arte.
O crítico é aquele que pode traduzir, de um modo diferente ou por um novo processo, a sua impressão das coisas belas.
A mais elevada, como a mais baixa, das formas de crítica é uma espécie de autobiografia.
Os que encontram significações feias em coisas belas são corruptos sem ser encantadores. Isto é um defeito.
Os que encontram belas significações em coisas belas são cultos. Para estes há esperança.
Existem os eleitos, para os quais as coisas belas significam unicamente Beleza.
Um livro não é, de modo algum, moral ou imoral. Os livros são bem ou mal escritos. Eis tudo.
A aversão do século XIX ao Realismo é a cólera de Calibã para ver o seu rosto num espelho.
A aversão ao século XIX ao Romantismo é a cólera de Calibã por não ver o seu próprio rosto num espelho.
A vida moral do homem faz parte do tema para o artista, mas a moralidade da arte consiste no uso perfeito de um meio imperfeito. O artista nada deseja provar. Até as coisas verdadeiras podem ser provadas.
Nenhum artista tem simpatias éticas. A simpatia ética  num artista constitui um maneirismo de estilo imperdoável.
O artista jamais é mórbido. O artista tudo pode exprimir.
Pensamento e linguagem são para o artista instrumentos de uma arte.
Vício e virtude são para o artista materiais para uma arte.
Do ponto de vista da forma, o modelo de todas as artes é a do músico. Do ponto de vista do sentimento, é a profissão do ator.
Toda arte é, ao mesmo tempo, superfície e símbolo. Os que buscam sob a superfície fazem-no por seu próprio risco.
Os que procuram decifrar o símbolo correm também seu próprio risco.
Na realidade, a arte reflete o espectador e não a vida.
A divergência de opiniões sobre uma obra de arte indica que a obra é nova, complexa e vital.
Quando os críticos divergem, o artista está de acordo consigo mesmo.
Podemos perdoar a um homem por haver feito uma coisa útil, contanto que não a admire. A única desculpa de haver feito uma coisa inútil é admirá-la intensamente.
Toda arte é completamente inútil.

Junto com as obras da coleção saíram as biografias. A de Wilde está no terceiro volume.  Aí aparece uma pequena contextualização deste prefácio:"No prefácio do romance ele esclarece que o artista jamais é mórbido..." e repete as principais afirmações. Os críticos, porém, parecem não se ter dado ao trabalho de analisar profundamente as ideias do autor. A obra foi considerada como envenenadora dos costumes.O link da resenha da obra: http://www.blogdopedroeloi.com.br/2018/09/o-retrato-de-dorian-gray-oscar-wilde.html

O Retrato de Dorian Gray. Oscar Wilde.

Creio que conhecer dados biográficos de Oscar Wilde ajuda a entender a leitura de sua obra mais controvertida e famosa, O retrato de Dorian Gray.  Vamos aos dados mais interessantes, Nasceu em Dublin, na Irlanda, em 1854 e morreu em Paris, em 1900. Depois de dois anos de prisão exilou-se em Paris, onde os amigos foram escasseando até morrer praticamente sozinho mas tendo o seu último pedido aceito, o de ser recebido no seio da igreja católica. O arrependimento está muito presente ao longo do livro, especialmente em seu final. Levara uma vida dissoluta, segundo os padrões morais, tendo se envolvido em práticas homossexuais, inadmissíveis na época. 
Juventude e beleza e o drama da consciência. Do Prefácio: "Um livro não é, de modo algum, moral ou imoral, Os livros são bem ou mal escritos. Eis tudo.


Por essas questões postas, o seu romance não foi bem recebido. O livro de biografias que acompanha a edição de Os Imortais da Literatura Universal assim se refere à obra: "É uma estória simples mas original sobre um jovem belíssimo, Dorian Gray, que apaixonadamente cultua a beleza e o prazer. Basílio Hallward, um pintor seu amigo, presenteia-o com um retrato que o reproduz no auge da juventude, e o faz sentir com maior violência a dor pela efemeridade da vida. Em virtude de certo voto mágico, as vicissitudes não deformarão o rosto vivo e perfeito de Dorian Gray: apenas o retrato sofrerá a passagem do tempo. O romance não foi bem recebido pelos críticos, principalmente pelos moralistas, que o consideraram uma obra 'envenenadora dos costumes'".

Bem, já apareceram dois dos principais personagens da história. nenhum terá final feliz.  O terceiro personagem, talvez o mais importante de todos, é o amigo de ambos, Lorde Henry (Harry), que exercerá forte influência sobre o jovem, uma influência que o levará a viver o seu egoísmo, narcisismo e hedonismo. Será ele o portador dos conteúdos 'envenenadores dos costumes". Já o pintor Basílio será uma espécie de consciência moral punitiva de Dorian, que não o suportará. Entre os três se darão os mais longos diálogos, quando o jovem não dialoga com a sua própria consciência, como ocorre no capítulo de número onze, por sinal, o mais longo dos vinte capítulos.

Um dos capítulos mais polêmicos certamente é o de número dezesseis. Nele se encontra a famosa tese de "curar a alma através dos sentidos e curar os sentidos através da alma". No caso ele irá curar as dores da alma através dos sentidos, num inferninho nas proximidades do porto. Sexo e drogas, o ópio mais precisamente, entram em cena. Tendências à relações homoafetivas estão levemente implícitas em toda obra, envolvendo os trio condutor do romance.

Dois outros importantes personagens aparecem ao longo da história. Sibyl e James Vane. Sibyl é uma bela, talentosa e jovem atriz, que fracassa numa interpretação de Julieta. Dorian não a perdoa e leva a menina ao suicídio. James, uma espécie de protetor da irmã, era contra o namoro e prometera vingança se caso algo acontecesse à irmã. Dorian, frente a frente com James, foi salvo pelo seu rosto, permanentemente jovem. Mas tudo termina em tragédia. Até aqui o rosto de Dorian ainda sofrera alterações. A aparência jovem o salvou.

Outro personagem envolvido ao longo da história é Alan Campbell, que além dos dotes musicais, conhece também os segredos da química. Dorian precisa de seus serviços e o força a executá-los. A culpa o levará ao suicídio.

Deixo duas passagens extremamente ilustrativas na compreensão da obra. Ambas são do último capítulo, sendo a segunda a de encerramento do livro. Vamos à primeira, o drama de consciência de Dorian: "Melhor seria não pensar no passado. Nada mais poderia alterá-lo. Era em si mesmo e no seu futuro que devia pensar. James Vane jazia em uma sepultura sem nome, no cemitério de Selby. Alan Campbell tinha-se suicidado uma noite em seu laboratório, mas não havia revelado o segredo do qual o tinha obrigado a participar. A agitação momentânea causada pelo desaparecimento de Basílio Hallward desapareceria rapidamente. Já estava mesmo diminuindo. Estava inteiramente salvo. Na realidade, não era a morte de Basílio o que mais lhe pesava sobre o espírito. O que o transtornava era a morte em vida de sua própria alma. Basílio tinha pintado o retrato que havia destruído sua vida. Não poderia perdoar-lhe. O retrato tinha sido a causa de tudo. Basílio  lhe tinha dito coisas terríveis, insuportáveis, e, todavia, tinha-o escutado com paciência". A consciência...

E, o parágrafo final: "Ao entrar, encontraram pendurado na parede um esplêndido retrato de seu patrão, que o representava como estavam acostumados a vê-lo, em toda a pujança de sua rara juventude e beleza. Estendido no solo, encontrava-se um homem morto, em traje de cerimônia, com uma faca cravada no coração. Era velho, cheio de rugas e seu rosto inspirava repugnância. Só o reconheceram quando examinaram os anéis que usava".

No livro biografia que acompanha a coleção temos uma frase em espécie de epígrafe final: A ÚNICA COISA TERRÍVEL QUE EXISTE NO MUNDO É O TÉDIO. É O ÚNICO PECADO PARA O QUAL NÃO EXISTE PERDÃO. Antes de morrer, Doriam havia prometido a Lorde Henry de que se tornaria um ser bom. Será que assim consentiria na prática do único pecado imperdoável ao longo de sua vida de juventude e beleza?

domingo, 9 de setembro de 2018

Oswald de Andrade e a Faculdade de Direito de São Francisco.

Ao final de sua vida, Oswald de Andrade, estimulado por Antônio Cândido, resolve escrever as suas memórias, em vários volumes. A morte interrompeu o seu trabalho e elas se limitaram a Um homem sem profissão, o primeiro e único volume. Lembrando que Oswald nasceu em 1890 e morreu em em 1954, ano em que certamente o escreveu. O limite do relatado chega ao ano de 1918, privilegiando assim as memórias de sua infância e juventude, seus tempos de formação, incluindo uma primeira viagem para a Europa. Já fiz a resenha do livro e agora quero relatar a sua visão sobre a Faculdade de Direito de São Francisco, onde se formou em 1919.
http://www.blogdopedroeloi.com.br/2018/09/um-homem-sem-profissao-oswald-de-andrade.html
O primeiro e único volume de memórias.

Vou estabelecer apenas os vínculos entre as suas observações, abstendo-me de comentários. A edição que eu tenho é a da Editora Globo - 2ª reimpressão, de 2009. Encontramos um primeira referência, na página 89, quando descreve o ano de 1909, o ano de seu ingresso. Diz o seguinte: "Fui matricular-me, em Março, no primeiro ano da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco e aí tive uma das piores decepções de minha mocidade. Os veteranos cercaram a mim e a meu colega Inácio Tamandaré Uchoa aos gritos: - Bicho! Dança, bicho! E fazendo-nos enfiar as calças por debaixo das meias, nos obrigaram a executar evoluções imbecis. Eu trazia outra ideia da Faculdade. Ela dera três grandes poetas ao Brasil. Castro Alves, Fagundes Varela, Álvares de Azevedo. Era a escola de Ricardo Gonçalves e Indalécio de Aguiar. A valentona imbecilidade daquele grupo do trote criou em mim verdadeira alergia por tudo que se processe 'debaixo das Arcadas'. Daí talvez se originasse a minha briga com os estudantes, quando redigi O homem do Povo, em 1931. Apesar de todas as oficiais reconciliações e palinódias, guardo um íntimo horror pela mentalidade da nossa escola de Direito. Por instinto e depois conscientemente, sempre repeli esse Direito ali ensinado para engrossar a filosofia do roubo que caracteriza o capitalismo. Aliás, já nesse tempo eu me declarava anarquista" (Página 89-90).

Na página seguinte ele continua: "A Faculdade de Direito, com sua bucha visível, para onde me vi forçado a entrar por um equívoco de colega, com suas lentes idiotas, seus velhos alunos cretinos, sua tradição de miserável atraso colonial, me provocava o mais justo dos desprezos" (Página 91).

O seu curso foi interrompido por uma viagem à Europa, onde fortalece o seu gosto pelas letras e a vontade de ser escritor. Mostra desgosto pela literatura brasileira, da qual, segundo ele, se salvava apenas Machado de Assis e Euclides da Cunha. Mas a bronca mesmo era com a Faculdade de Direito; "A vida estudantil não existia para mim, tal o arraigado e sábio desprezo que tomei pela Faculdade do Largo de São Francisco, pelo Direito Romano que eu muito bem supunha responsável pela legislação reacionária, pela chamada Filosofia do Direito de que era detentor com exclusividade e monopólio o bonzo Pedro Lessa.  Conhecera outro professor de Filosofia dali, mas minhas relações com ele se fizeram através dos juros altos que ele cobrava sobre títulos meus e de meu pai. Era usurário e morreu assassinado, não sei se por isso" (Página 113-4).  Esse professor fora o seu professor no Colégio São Bento e que queria reprová-lo a todo custo: "Chamava-se Carlos Augusto Germano Knuppell e era um produto da Faculdade de Direito, de que fazia os mais levados elogios. Para ele, ser bacharel pela escola do Largo de São Francisco traduzia um incalculável penhor de saber e de caráter". (Página 77).

Também conta de seu ingresso na Faculdade, onde viveu como um prisioneiro em sua masmorra: "Entreguei-me ao inimigo, aderi vencido à fé de meus pais. Como adere um prisioneiro no fundo de uma masmorra. Procurara anos antes, criança ainda, inutilmente obter um padrinho, que diziam rico, que me fizesse estudar Filosofia em Paris. Inutilmente me quisera dedicar à medicina. Não havia ainda a Faculdade daqui. A Escola do Largo de São Francisco era o simples bastião colonial destinado a transmitir às gerações dominantes o vírus do Direito Justiniano, trazido para a livre América pela reação portuguesa. A sabedoria patriarcal do VI século romano! Eu sentia o enorme antagonismo que separava disso meu instinto de homem livre" (Página 129).

Acho que passei a compreender melhor duas pessoas. O grande Jessé de Souza e suas interpretações da elite brasileira a partir da USP e a tresloucada senhora do impeachment.

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Um homem sem profissão. Oswald de Andrade.

Ao ler Oswald de Andrade - biografia, de Maria Augusta Fonseca  http://www.blogdopedroeloi.com.br/2017/05/oswald-de-andrade-biografia-maria.html, passei a me interessar mais de perto pela leitura de sua obra. Foi agora que fiz a primeira, com Um homem sem profissão, o livro de suas memórias. Este livro se ocupa essencialmente dos anos de sua infância e juventude. Termina no ano de 1918, não entrando, portanto, nas questões da Semana da Arte Moderna, nem mesmo nos seus preparativos. Os seus romances, já neste período, fazem do livro também uma história de amor.
Oswald tinha muito para contar. Um dos melhores livros de memórias que eu já li.

Oswald (Oswáld, por favor, jamais Ôswald) de Andrade (1890 - 1954) é filho de tradicional família, com passagem da era patriarcal rural para a industrial e urbana. Estas memórias são um registro vivo da história da região central de São Paulo, passando pela Sé, Praça da República, Teatro Municipal, Barão de Itapetininga, Caetano de Campos, Colégio dos maristas, Mosteiro de São Bento, Consolação e pela Faculdade de Direito São Francisco. A questão imobiliária fez a fortuna e a ruína da família. Os agiotas!

Das memórias da infância o grande destaque vai para a origem da composição familiar. Muita tradição, tanto pelo lado paterno, quanto pelo materno. Em comum, a presença da fé católica, que Oswald manteve a seu modo. O órfico. Manteve sempre um mística e muitas visitas aos centros de romaria populares, como Aparecida e Pirapora. Também o culto aos santos era um forte da família. Podemos, sem dúvida, afirmar que ele foi educado dentro de uma fé absolutamente ingênua. 

Mas é a educação que ganha as melhores páginas deste menino, que desde muito cedo aspira liberdade e rebeldia. Passa pelos mais variados colégios, inclusive por uma educação em casa. Destaquei algumas passagens. A primeira quando sai do colégio para estudar em casa: "Sozinho num gabinete silente, eu me sentia muito melhor e mais feliz do que no meio da canzoada do colégio, nos seus recreios poeirentos e ruidosos, nas suas aulas pálidas e inexistentes". Aulas pálidas, que horror! Outra tristeza: "Não sei dizer como me alfabetizei. Sei que tive um professor de desenho que nada me ensinou". Conta também de suas leituras. Castro Alves e um livro muito presente nesta época, a incendiar imaginações, Carlos Magno e os doze pares de França.

Uma das descrições deste período de formação escolar é bem marcante: "No quarto ano, produziu-se a crise esperada. Encontrei pela minha frente um professor teutônico, pré-nazista de peito emproado, purista e autoritário. [...] Chamava-se Carlos Augusto Germano Knuppell e era produto da Faculdade de Direito, de que fazia os mais elevados elogios. Para ele, ser bacharel pela escola do Largo de São Francisco traduzia um incalculável penhor de saber e de caráter".  O pai de Oswald teve um caso judicial em que ele era o advogado contrário. Isso bastou para que Oswald sofresse ameaças: "Vi-me logo condenado a repetir o quarto ano, ameaça que ele fez abertamente em classe. E agora vem o inusitado da história.

"Prevalecia na época a decoreba. Oswald decorara os portos brasileiros em ordem alfabética. Assim no Pará os portos eram: Alenquer, Bragança, Breves,  Cametá, Cintra, Curupá etc. Mas a pergunta da prova oral veio fora de ordem. Os portos brasileiros de segunda ordem, a partir do Rio Grande do Sul. Oswald foi respondendo: Torres, Florianópolis, Iguape, Cananeia, São Sebastião, Ubatuba, Paraty e Rio de Janeiro. Aí veio a alegria da galhofa do professor:

- Rio de Janeiro! A Capital da República, porto de segunda ordem! Vou expulsá-lo da banca!
Mais morto do que vivo, eu respondi:
- Desci para ir de barca a Niterói!
O estrépito da classe atingiu o delírio. Vermelho, 'Knuppell' gesticulava:
- Ponha-se daqui"!

Eis o desfecho: "Acabara o exame e um monte de meninos acumulou-se ante a porta fechada, onde se produzia a classificação das notas. Eu me acoitara a um canto, sem nenhuma esperança. A porta abriu-se, leram-se os nomes, o meu vinha no fim. Eu tinha sido aprovado, simplesmente, grau 1. 'Contra o voto do professor da cadeira'". Triste espetáculo!

A leitura de A Relíquia, de Eça de Queirós, lhe provocou a primeira crise religiosa. E as leituras continuaram por Nietzsche e Dostoiévski. Ganhou de presente as obras completas de Anatole France. Ingressa na Faculdade de Direito da Faculdade de São Francisco e empreende a primeira viagem para a Europa onde ocorre o famoso choque de costumes. Lhe fala alto a liberdade sexual e a contrapõe com a moral de um país sob a marca da repressão e do ressentimento, de um país em que não há divórcio. Começam as suas aventuras amorosas, Kamiá....

Na volta, a decepção, a morte sua mãe, que lhe fora ocultada. Chega a tempo para a missa de sétimo dia. Perdeu a sua ancoragem. Questões morais (Kamiá x Landa) e financeiras o distanciam do pai. Seus amores são vividos com muita intensidade e paixão mas são acompanhados também de muito sofrimento. Ele termina este primeiro e único volume de memórias num trágico lamento:

Sinto-me só, perdido numa imensa noite de orfandade. A amada que me deu a vida partiu sem me dizer adeus.
A francesa que trouxe de Paris veio buscar o dinheiro para outro homem.
Landa, que foi o primeiro sonho vivo que me ofuscou, tornou-se a estátua de sal da lenda bíblica. Olhou para o passado.
Isadora Duncan estrondou como um raio e passou. E a que encontrei enfim, para ser toda minha, meu ciúme matou... Estou só e a vida custa a reflorir. Estou só.
Uma bela biografia de um grande biografado.


Restaria falar sobre a faculdade de Direito de São Francisco. Mas isso eu faço em outro post. Esta sua relação me causou forte impressão. E fico com uma imagem que me foi passada pela leitura de  Maria Augusta Fonseca. Em vida Oswald dera muitas festas. Em seu velório tinha menos gente do que na festa menos concorrida que ele deu em vida.

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

Minuano. Tabajara Ruas. Os Lanceiros Negros.

O meu primeiro contato com Tabajara Ruas foi pelos três volumes de Os varões assinalados - o grande romance da guerra dos farrapos. Este contato foi magnífico. Agora vi um comentário sobre Minuano. Este comentário falava que o tema do livro envolvia o triste, possivelmente o mais triste episódio de toda a violentíssima história do Rio Grande do Sul, o dos Lanceiros Negros. A leitura deste livro fez crescer, e muito, o conceito deste escritor, seguramente no pantheon de nossos grandes escritores.
O humano/cavalo - Centauro como narrador. Maravilhoso.

Vejam só o comentário que ele recebeu do Luís Fernando Veríssimo, uma verdadeira condecoração: "Tabajara Ruas é um escritor com um sentido de épico nas pequenas coisas e de humano no épico". Esta condecoração figura na orelha do livro, onde também se lê este fabuloso comentário: "Transitando entre as paisagens monumentais do sul do Brasil (Isso é para quem conhece os chamados - Campos de Cima da Serra - dos Aparados da Serra - Itaimbezinho e Fortaleza), participando de momentos históricos marcantes e carregando o estandarte da negritude por justiça e reparação, Minuano é uma narrativa de elegante delicadeza - e acompanhará o leitor para sempre. E ponha delicadeza e elegância nisso!

E, me permitam e me perdoem, recorrer ao já pronto nesta resenha. É por que é muito bem feita: "Djinga não tinha cavalo. Mulher no Corpo de Lanceiros não tinha cavalo. Mulher, nos exércitos daqueles tempos, só servia para fazer comida, lavar roupa e ajudar a montar e desmontar o acampamento. Mas a imponente Djinga impunha sua autoridade. Era a única que conseguia um cavalo para se deslocar nas marchas, se bem que o sargento chegasse e a obrigasse a desmontar. Cavalo é para homem, desmonta daí, ele rugia e tomava o cavalo de Djinga. Isso aconteceu muitas vezes, tanto que ele começou a achar graça com a insistência de Djinga. Ela era uma garota muito magra, só nervos e músculos, mais alta que qualquer homem e com um rosto redondo, de menina travessa, que escondia a dureza que subitamente assomava aos olhos, quando era contrariada. Estranheza também causavam as marcas em sua testa, marcas tribais feitas com objeto de ponta, com algum significado ignoto para todos os que a conheciam e talvez também para ela. Um dia o sargento disse, Djinga, fica com esse para ti, o manquinho, tu e ele vão ajudar a distribuir água para os soldados. Djinga me olhou com raiva".

Bem, o cavalo manquinho é Minuano, o narrador da história. Será ele o portador do humano, que talvez já tenha desaparecido entre os humanos. Minuano é muito mais do que um cavalo. Ele é um centauro. Ele é um cavalo manquinho porque em sua infância sofreu o ataque do leão baio, mas foi socorrido em tempo pelo pai. Sofreu o preconceito entre os homens, mas não entre os de sua espécie. Pelo contrário, isso lhe mereceu maiores atenções. O manquinho Minuano chegou a servir de montaria para  Bento Gonçalves, lhe prestando um grande serviço, que mereceu, inclusive, elogios do comandante.

A história é desenvolvida em três etapas: o cenário, a guerra e o episódio dos lanceiros. É um livro profundamente poético e humano. Um livro para se apaixonar pela leitura. Se estivesse em sala de aula, no ensino médio, não teria dúvida em adotá-lo para uma leitura e tenho a convicção absoluta de que agradaria. Mas tem que fazer isso antes da aprovação dessa tal da BNCC, que simplesmente acaba com o Ensino Médio.  Escolho alguns trechos que assinalei:

Sobre a chegada da primavera: "Então, uma manhã bem cedo, eu aspirei um perfume de seiva, floral, que a brisa trazia do bosque de araucárias, e percebi que o canto dos galos tinha uma entonação de sinfonia e foi aí que eu soube que era a Primavera entrando outra vez no mundo. Eu sempre quis saber de onde vem a Primavera e porque ela fica tanto tempo escondida. Mesmo dentro do estábulo, eu sabia que era Primavera, e saí um pouco mais feliz, um pouco mais leve, cheio de vontade de saltar e fazer coisas bobas, que é mais ou menos como a Primavera deixa a gente...". Foi aí que apareceu Bento Gonçalves.

Sobre preconceitos contra o Minuano manco e o trote ao ritmo da milonga. Bento rebate a uma consideração desairosa: "Esse cavalinho, senhores, é dos mais valentes e nobres que eu já conheci e não é porque tem um pequeno problema na perna que que pode ser desfeitado impunemente. No meio do susto de que eu estava tomado, minha alma ficou leve. O bolicheiro se dirigiu, aflito ao barbudo: seu Antunes, por favor, reconsidere a situação, esse senhor não fez nada demais, só se defendeu da desfeita. O barbudo olhou para a faca cintilando na mão do general, avaliou a firmeza de tarumã da mão morena. Parece que houve por bem reconsiderar, pois gaguejou um pouco: não quis fazer desfeita a ninguém, só fiz uma brincadeira, eu é que fui ofendido, chamado de ignorante. O general pensou um pouco e disse se o senhor afirma que foi uma brincadeira, eu aceito. Prontamente, o bolicheiro colocou a garrafa de canha no balcão e disse muito bem, senhores, assim falam homens inteligentes, este trago agora é por conta da casa. O clima relaxou, o silêncio foi embora, o general comeu sua linguiça pausadamente, saboreando cada mordida. Eu sentia por dentro uma alegria cor da ametista que o general levava no bolsinho do colete, saí dali com o peito estufado, num trote de milonga bem pontuada". Milonga bem pontuada!

Sobre a Revolução Farroupilha ou sobre qualquer guerra: "Dizem que essa guerra foi por causa do imposto sobre o charque. Não acredito numa coisa tão ridícula. Escutei muitos discursos falando em república e abolição, a maioria pura lorota, mas nunca ouvi nenhum político de cartola e colarinho alto ou um desses oficiais cheios de medalhas encherem o peito e conclamar os soldados a morrer lutando contra o imposto sobre o charque. Precisa ser muito idiota para ir morrer por uma coisa dessas. Não existe heroísmo nenhum na guerra, só dor e desespero. Encontrei muitos pobres soldados carregados de medalhas com fitinhas coloridas e os ouvidos entupidos de discursos empolados, mas faltando um pedaço da perna ou um olho, ou sem os dois braços e a maioria deles com a alma cheia  de enormes buracos escuros. A guerra, e peço licença para dizer isso bem claro, a guerra é uma bosta. Só idiotas vão para a guerra". Lembrem que Minuano é o narrador.

E para não encompridar demais, o episódio final dos lanceiros negros, já desarmados pelo novo chefe Farroupilha, Davi Canabarro: "Saímos dali sem fazer ruído nenhum e deslizamos para o acampamento, onde entramos dando gritos de alerta, mas deu para ver que nossa intenção foi em vão, porque, na noite escura, uma sombra maior cresceu e avançou sobre nós, engolindo as barracas e os currais improvisados e aquilo monstruoso era o exército inteiro de Cabeça de Moringue e seu arsenal de morte. Vinham de todos os lados. Eram mais de dois mil e o Corpo não tinha mais de trezentos lanceiros. Procurei pela Moura e os dois potrinhos e me juntei a eles. Fatumbi comandou a defesa ao lado de Gavião, mas não havia o que defender. Estávamos totalmente cercados e o único jeito de tentar manter a vida era romper o cerco e foi isso que fizemos como alucinados. Eu e Djinga e a Moura e Fatumbi e o Gavião e os dois potrinhos e o grosso do sargento e mais uns quarenta guerreiros conseguimos escapar de alguma maneira. Não sei como. Nenhum de nós sabe como. Em farrapos. Sangrando. Brandindo as armas, despejando os revólveres, atropelando com as lanças. Corremos desesperadamente. Rompemos o maldito cerco. Infiltramo-nos no bosque próximo. Não paramos de correr. Gritando. Chorando. Odiando. Até cair exaustos. E dormir. Dormir profundamente. O que aconteceu naquela noite de massacre em Porongos se resume a duas palavras: Infâmia e horror".

Lembrando que a Revolução Farroupilha terminou em 1845 e a libertação dos escravos ocorreria apenas em 1888. A República do Piratini havia abolido a escravidão. Como incluir esta cláusula nos tratados de paz com o império? O massacre de Porongos foi a cláusula não escrita dos tratados de paz.

Incluo no post duas músicas regionais. Uma mostrando a estreita ligação entre o gaúcho e seu cavalo e outra sobre as medalhas e as cicatrizes de batalhas:

Florêncio Guerra e seu cavalo - a perfeita imagem do centauro: https://www.youtube.com/watch?v=u1Yr-YzquSc  

e Sabe Moço. No meu peito em vez de medalhas - cicatrizes de batalhas. https://www.youtube.com/watch?time_continue=9&v=vCYhcKKn-eY