Ao final de sua vida, Oswald de Andrade, estimulado por Antônio Cândido, resolve escrever as suas memórias, em vários volumes. A morte interrompeu o seu trabalho e elas se limitaram a Um homem sem profissão, o primeiro e único volume. Lembrando que Oswald nasceu em 1890 e morreu em em 1954, ano em que certamente o escreveu. O limite do relatado chega ao ano de 1918, privilegiando assim as memórias de sua infância e juventude, seus tempos de formação, incluindo uma primeira viagem para a Europa. Já fiz a resenha do livro e agora quero relatar a sua visão sobre a Faculdade de Direito de São Francisco, onde se formou em 1919.
http://www.blogdopedroeloi.com.br/2018/09/um-homem-sem-profissao-oswald-de-andrade.html
O primeiro e único volume de memórias.
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O primeiro e único volume de memórias.
Vou estabelecer apenas os vínculos entre as suas observações, abstendo-me de comentários. A edição que eu tenho é a da Editora Globo - 2ª reimpressão, de 2009. Encontramos um primeira referência, na página 89, quando descreve o ano de 1909, o ano de seu ingresso. Diz o seguinte: "Fui matricular-me, em Março, no primeiro ano da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco e aí tive uma das piores decepções de minha mocidade. Os veteranos cercaram a mim e a meu colega Inácio Tamandaré Uchoa aos gritos: - Bicho! Dança, bicho! E fazendo-nos enfiar as calças por debaixo das meias, nos obrigaram a executar evoluções imbecis. Eu trazia outra ideia da Faculdade. Ela dera três grandes poetas ao Brasil. Castro Alves, Fagundes Varela, Álvares de Azevedo. Era a escola de Ricardo Gonçalves e Indalécio de Aguiar. A valentona imbecilidade daquele grupo do trote criou em mim verdadeira alergia por tudo que se processe 'debaixo das Arcadas'. Daí talvez se originasse a minha briga com os estudantes, quando redigi O homem do Povo, em 1931. Apesar de todas as oficiais reconciliações e palinódias, guardo um íntimo horror pela mentalidade da nossa escola de Direito. Por instinto e depois conscientemente, sempre repeli esse Direito ali ensinado para engrossar a filosofia do roubo que caracteriza o capitalismo. Aliás, já nesse tempo eu me declarava anarquista" (Página 89-90).
Na página seguinte ele continua: "A Faculdade de Direito, com sua bucha visível, para onde me vi forçado a entrar por um equívoco de colega, com suas lentes idiotas, seus velhos alunos cretinos, sua tradição de miserável atraso colonial, me provocava o mais justo dos desprezos" (Página 91).
O seu curso foi interrompido por uma viagem à Europa, onde fortalece o seu gosto pelas letras e a vontade de ser escritor. Mostra desgosto pela literatura brasileira, da qual, segundo ele, se salvava apenas Machado de Assis e Euclides da Cunha. Mas a bronca mesmo era com a Faculdade de Direito; "A vida estudantil não existia para mim, tal o arraigado e sábio desprezo que tomei pela Faculdade do Largo de São Francisco, pelo Direito Romano que eu muito bem supunha responsável pela legislação reacionária, pela chamada Filosofia do Direito de que era detentor com exclusividade e monopólio o bonzo Pedro Lessa. Conhecera outro professor de Filosofia dali, mas minhas relações com ele se fizeram através dos juros altos que ele cobrava sobre títulos meus e de meu pai. Era usurário e morreu assassinado, não sei se por isso" (Página 113-4). Esse professor fora o seu professor no Colégio São Bento e que queria reprová-lo a todo custo: "Chamava-se Carlos Augusto Germano Knuppell e era um produto da Faculdade de Direito, de que fazia os mais levados elogios. Para ele, ser bacharel pela escola do Largo de São Francisco traduzia um incalculável penhor de saber e de caráter". (Página 77).
Também conta de seu ingresso na Faculdade, onde viveu como um prisioneiro em sua masmorra: "Entreguei-me ao inimigo, aderi vencido à fé de meus pais. Como adere um prisioneiro no fundo de uma masmorra. Procurara anos antes, criança ainda, inutilmente obter um padrinho, que diziam rico, que me fizesse estudar Filosofia em Paris. Inutilmente me quisera dedicar à medicina. Não havia ainda a Faculdade daqui. A Escola do Largo de São Francisco era o simples bastião colonial destinado a transmitir às gerações dominantes o vírus do Direito Justiniano, trazido para a livre América pela reação portuguesa. A sabedoria patriarcal do VI século romano! Eu sentia o enorme antagonismo que separava disso meu instinto de homem livre" (Página 129).
Acho que passei a compreender melhor duas pessoas. O grande Jessé de Souza e suas interpretações da elite brasileira a partir da USP e a tresloucada senhora do impeachment.
O seu curso foi interrompido por uma viagem à Europa, onde fortalece o seu gosto pelas letras e a vontade de ser escritor. Mostra desgosto pela literatura brasileira, da qual, segundo ele, se salvava apenas Machado de Assis e Euclides da Cunha. Mas a bronca mesmo era com a Faculdade de Direito; "A vida estudantil não existia para mim, tal o arraigado e sábio desprezo que tomei pela Faculdade do Largo de São Francisco, pelo Direito Romano que eu muito bem supunha responsável pela legislação reacionária, pela chamada Filosofia do Direito de que era detentor com exclusividade e monopólio o bonzo Pedro Lessa. Conhecera outro professor de Filosofia dali, mas minhas relações com ele se fizeram através dos juros altos que ele cobrava sobre títulos meus e de meu pai. Era usurário e morreu assassinado, não sei se por isso" (Página 113-4). Esse professor fora o seu professor no Colégio São Bento e que queria reprová-lo a todo custo: "Chamava-se Carlos Augusto Germano Knuppell e era um produto da Faculdade de Direito, de que fazia os mais levados elogios. Para ele, ser bacharel pela escola do Largo de São Francisco traduzia um incalculável penhor de saber e de caráter". (Página 77).
Também conta de seu ingresso na Faculdade, onde viveu como um prisioneiro em sua masmorra: "Entreguei-me ao inimigo, aderi vencido à fé de meus pais. Como adere um prisioneiro no fundo de uma masmorra. Procurara anos antes, criança ainda, inutilmente obter um padrinho, que diziam rico, que me fizesse estudar Filosofia em Paris. Inutilmente me quisera dedicar à medicina. Não havia ainda a Faculdade daqui. A Escola do Largo de São Francisco era o simples bastião colonial destinado a transmitir às gerações dominantes o vírus do Direito Justiniano, trazido para a livre América pela reação portuguesa. A sabedoria patriarcal do VI século romano! Eu sentia o enorme antagonismo que separava disso meu instinto de homem livre" (Página 129).
Acho que passei a compreender melhor duas pessoas. O grande Jessé de Souza e suas interpretações da elite brasileira a partir da USP e a tresloucada senhora do impeachment.
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