sábado, 24 de agosto de 2013

A Carta Testamento de Getúlio Vargas.

Estou quase ao final da leitura do segundo volume da biografia de Getúlio Vargas, escrita  pelo Lira Neto. O primeiro volume registra os acontecimentos entre 1882 e 1930 e que recebe do biógrafo o seguinte subtítulo: Dos anos de formação à conquista do poder. O segundo volume, que vai de 1930 a 1945, tem por subtítulo o seguinte: Do governo provisório à ditadura do Estado Novo. O terceiro volume ainda está por sair. É uma biografia densa e que realmente fazia falta.
Getúlio, quase 20 anos de poder. Junto com o tiro no coração, nos deixou a Carta Testamento, o mais importante documento da história deste país, ao menos, no meu modesto entendimento.

Mas não quero hoje fazer a análise destes dois volumes e nem comentar sobre o Governo Vargas. Apenas quero, por ser hoje o dia 24 de agosto, publicar a sua Carta Testamento. Creio ser este o mais importante documento da história do Brasil e ainda, de uma atualidade impressionante, ainda mais em tempos de neoliberalismo e de economia globalizada. Getúlio tinha uma enorme preocupação para que este documento efetivamente chegasse ao povo. Creio que o texto também explica o tanto de ódio que muitos alimentam contra Getúlio, como o ex presidente Fernando Henrique Cardoso, que disse que tudo faria para destruir a sua memória. Este texto não precisa de explicações, é mais do que auto-explicativo. Mas vamos ao texto:
A Carta Testamento de Getúlio Vargas em seu mausoléu, em São Borja.

"Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se novamente e se desencadeiam sobre mim.

Não me acusam; não me combatem, caluniam e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes. Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive que renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário-mínimo se desencadearam os ódios. Quis criar a liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente.

Assumi o governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançava até 500% ao ano. Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de cem milhões de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se o nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa economia a ponto de sermos obrigados a ceder.

Tenho lutado mês a mês, dia a dia, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para defender o povo que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida. Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no meu pensamento a força para a reação. Meu sacrifício nos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com o perdão. E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue terá o preço do seu resgate.

Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia, não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na história".
Em frente a casa de Getúlio Vargas em São Borja. Hoje é museu.

2 comentários:

  1. Realmente é, senão o mais importante, um dos mais importantes documentos da história do Brasil. E nesse 2016, infelizmente muito atual. Uma inspiração para manter "a vibração sagrada para a resistência". Como registrou em canção o extraordinário Jackson do Pandeiro: "Ele disse muito bem: o povo de quem fui escravo, não será mais escravo de ninguém".

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  2. Os golpistas são sempre os mesmos. Uma elite bandeirante predadora do nacional e com uma mentalidade colonial. Hoje coração e mente desta elite está voltada para Miami. A Carta Testamento é, sem dúvida, o grande documento de interpretação do Brasil. E a história se repete. Muito triste. Meus agradecimentos.

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