segunda-feira, 5 de junho de 2023

Noite na taverna. Álvares de Azevedo. Vestibular 2024 - UFPR.

Creio que poucas vezes demorei tanto para ler um livro. A sua leitura não foi nada agradável. Histórias extremamente escabrosas. Estou falando de Uma noite na taverna, de Álvares de Azevedo. O livro é uma indicação para o vestibular da Universidade Federal do Paraná para o ano de 2024. Fui buscar ajudas, para compreender a obra. Algumas informações preliminares: A obra é uma publicação póstuma do ano de 1855, três anos após a sua morte, absolutamente prematura. Álvares de Azevedo nasceu em São Paulo, no ano de 1831 e em 1840 muda-se, com sua família, para o Rio de Janeiro. Em 1848 volta para São Paulo para cursar a faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Morre em 1852, no Rio de Janeiro, aos 21 anos de idade. 

Noite na taverna. Álvares de Azevedo. Principis. 2019.

Por óbvio, a sua breve vida me chamou muita atenção. Ele é um daqueles poetas românticos, de vida curta, dos quais ouvimos falar ao longo do ensino médio. Ele foi uma das tantas vítimas da tuberculose, que tantas vidas ceifara, em tempos em que não havia antibióticos. Um poeta romântico. Talvez seja esta a maior dica para compreender a sua obra. Ele era um romântico da segunda geração, ou um ultrarromântico. O romantismo brasileiro já saíra de sua primeira geração, em que os temas eram essencialmente nacionais, para se ocupar dos temas universais. A obra é extremamente erudita, com um sem fim de citações de autores clássicos e dos românticos europeus, que tanto o influenciaram e que, por meio dele, chegaram ao Brasil.

Mais alguns dados preliminares: Ele pertencia a uma família de posses. No Rio de Janeiro ele frequentava a corte. A mudança para São Paulo se deveu exclusivamente em função da Faculdade de Direito. Havia apenas duas no Brasil, na época. A de São Paulo e a do Recife. A São Paulo da época não devia oferecer muitas atrações, o que favorecia as noites de bebedeira e orgia, como a dos contos presentes no livro. O livro é de muita ousadia e, possivelmente, a sua publicação póstuma tenha sido proposital. Seria uma ousadia ainda maior publicá-la em vida. Os contos são um horror, uma afronta, o que repercutiu sobre a recepção da obra pela crítica. Muitos juízos morais em vez de literários.

Vamos à obra. Cinco jovens encontram-se em uma taverna, entre prostitutas, embriaguez, vinho e muito fumo. Depois de absolutamente bêbados, eles fazem uma espécie de concurso para ver quem consegue a proeza do conto mais escabroso. São sete os contos, ou se preferirem cinco. O primeiro é uma espécie de preâmbulo ou prólogo e o último, um posfácio. Vamos a eles. Uma parte do preâmbulo está contida na contracapa: " - Agora ouvi-me, senhores! [...] o que nos cabe é uma história sanguinolenta, um daqueles contos fantásticos como Hoffmann os delirava ao clarão dourado do Johannisberg! - Uma história medonha, não Archibald? - falou um moço pálido que a esse reclamo erguera a cabeça amarelenta. - Pois bem, dir-vos-ei uma história. Mas quanto a essa, podeis tremer a gosto, podeis suar a frio da fronte grossa de bagas de terror. Não é um conto, é uma lembrança do passado". Hoffmann (1776-1822) é um dos tantos autores do romantismo que por meio dele chegaram ao Brasil. Neste preâmbulo está contido o cenário dos contos, bem como os temas e os participantes da Noite na taverna. 

O conto de número dois (vamos adotar o critério dos sete) é contado por Solfieri e tem Roma, a cidade da perdição e do fanatismo como cenário. No conto aparece a sombra de uma mulher, com a qual ele irá parar num cemitério. Não era uma sombra, mas sim, uma mulher de verdade. Na saída, carregando-a, ele tropeça no coveiro, passa por uma patrulha policial, a qual ele dribla, beijando-a para provar que não era um cadáver. Ao chegar a seu quarto, após dois dias ela morre. Ele manda fazer dela uma estátua, mas enquanto ela não fica pronta, ele dorme sob a sua lápide. Ele abre o peito para mostrar o amuleto que carregava, o seu crânio. Uma amostra.

O terceiro conto  é de Bertram e é o mais longo. Envolve várias situações, com proezas escabrosas diversas, envolvendo mulheres, duelos, túmulos, velórios, degolas, traições, desonras, venda de mulher por dívida, suicídio, blasfêmias, piratas, antropofagia e necrofilia. Precisa mais!

O quarto conto é o de Gennaro, que conta uma história de seus tempos de aprendiz de pintor. O mestre vivia com a sua segunda mulher e uma filha. Meninas novas. Este é o cenário e os horrores que, creio, são de fáceis de imaginar. O quinto conto é o de Claudius Hermann, um conto também um pouco mais longo, alongado por divagações românticas. Envolve uma história de sedução e de traição, que termina em leito ensanguentado. O conto de número seis é o de Johann e tem como cenário um encontro em um bilhar de Paris e, as consequências. Envolve duelo, morte de irmão e encontro com a irmã.

O sétimo conto, ou o epílogo, ocorre já ao amanhecer, quando uma mulher entra na taverna e, um punhal reluz ao contato com os primeiros raios de sol. Envolve morte e é uma sequência do conto de número seis. Vingança contra o irmão.

Bem, mais dados gerais. Álvares de Azevedo, apesar da precocidade de sua obra (fundamentalmente composta por Noite na taverna e Lira dos vinte anos, coletânea de suas poesias) teve enorme repercussão e influenciou profundamente as gerações posteriores. Ele já pensava numa Academia de Letras, e a Academia Brasileira de Letras, como reconhecimento, o nomeou patrono da cadeira de número dois. A sua maior marca é a de ser o precursor brasileiro do ultrarromantismo e de ter trazido para o Brasil, a geração desses escritores estrangeiros ao Brasil. E depois do ultrarromantismo, certamente vocês conhecem a sequência de realismo, naturalismo...

O livro que eu li é o da editora Principis, 2019. Senti muita falta de um prefácio, de notas explicativas ao longo do texto e de um posfácio. Isso me levou a buscas em outros espaços. Aproveito para deixar uma recomendação: o comentário de Isabela Lubrano - do Ler antes de morrer. Uma exposição bem humorada e com teor. Deixo ainda alguns dos autores que o influenciaram: Lord Byron (1788-1824), Schiller (1759-1805), Goethe (1749-1832) e Edgar Allan Poe (1809-1849), este, dos Estados Unidos.

 



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