segunda-feira, 7 de agosto de 2023

GRANDES ESPERANÇAS. CHARLES DICKENS.

Do Facebook: Mais ou menos assim: Em matéria de ciência sempre leia os livros mais novos, os mais atualizados. Em matéria de romances, de literatura, leia os mais antigos. Nem é preciso retroceder até Homero para conferir essa verdade. Estou escrevendo isso para dizer que eu li Grandes esperanças, de Charles Dickens. O livro foi escrito entre os anos de 1860-1861. O grande escritor britânico nasceu em 1812 e morreu em 1870. Ao término da leitura me sobrou uma exclamação: Que pena que a leitura terminou!. Em literatura, recorra aos mais antigos!

Grandes esperanças. Charles Dickens. Penguin & Companhia das Letras. 2022.
 

A minha edição do livro é da Penguin & Companhia das Letras, da coleção clássicos, com tradução de Paulo Henriques Britto, décima impressão, de 2022. O livro tem uma bela introdução, a cargo de David Trotter, além de uma nota sobre o texto, em que é mostrada a forma de sua publicação. Ele foi publicado por trechos semanais na revista All the Year Round, entre os anos de 1860 e 1861. Eu consigo imaginar a expectativa dos leitores em torno da ansiedade da espera do próximo capítulo. Eu tive uma experiência dessas com a minha mãe, nos anos 1950. Em Porto Alegre, naquele tempo circulava um jornal, com o título - A Nação -, basicamente destinado às colônias alemãs do Rio Grande do Sul. Ele publicava romances, nessa modalidade de folhetins. A próxima edição sempre era esperada com muita ansiedade e eu tinha que lê-la para a minha mãe. Este foi, inclusive, o meu primeiro contato com as letras e a alfabetização.

Mas deixando o saudosismo de lado, vamos para  As grandes esperanças. O que seriam essas grandes esperanças? E aí mais uma vez me volta o saudosismo, lembrando das minhas aulas de filosofia com o inesquecível professor Dom Antônio Cheuiche, na época, o simples frei Antônio. Ele dizia que o século XIX era o século das grandes esperanças, movidas pela ideia do progresso indefinido, motivado pelo avanço das ciências e pela capacidade de entendimento entre os humanos, com o fim do absolutismo político trazido pelo Iluminismo. Os conflitos seriam negociados pela mediação da racionalidade. O futuro seria determinado pelo progresso e pela paz. Tudo isso desmoronou já na segunda década do século XX, com a irrupção da Primeira Guerra Mundial e o que se seguiu.

Uma observação semelhante me levou à compra e à leitura do livro. Li, em algum lugar, que Charles Dickens era um cronista de sua época, colocando em sua obra os grandes temas e problemas da época do avanço da industrialização no Reino Unido. Tempos de progresso da Revolução Industrial e de problemas com a industrialização e a urbanização caótica. Do autor já tinha lido Um conto de natal, um clássico em que aparece Scrooge, personagem que inspirou o surgimento do famoso Tio Patinhas. Dele também tenho, mas ainda não li, As aventuras do Sr. Pickwick (1837), mas as letrinhas minúsculas da coleção - Os Imortais da Literatura Universal, ainda não me deram ânimo para a sua leitura. Mas vamos à obra, a sua grande obra derradeira.

O menino PIP é o grande personagem da obra. Sem pretender dar um spoiler, recorro a David Trotter, o autor da introdução da presente edição do livro, para um primeiro contato com a obra. Vejamos: "A característica mais imediata de Grandes esperanças é ser uma história de redenção moral. O protagonista, um órfão criado num lar humilde, nas primeiras décadas do século XIX, herda uma fortuna, e imediatamente rejeita os familiares e os amigos. Quando a fortuna perde o brilho, e depois desaparece por completo, ele é obrigado a assumir sua própria ingratidão, e aprende a amar o homem que o elevou e também o destruiu. A história é narrada pelo próprio protagonista..." Joe Gargery, e a irmã de PIP, a sra. Joe Gargery, além de Biddy são as personagens desse bloco da narrativa. Depois, o viver em Londres, entra em cena. Os personagens são múltiplos. Os movimentos da consciência de PIP se constituem no fundamental da obra. Um drama profundamente humano.

Nas palavras de Trotter, os grandes temas da obra são apresentados: "Questões de peso permeiam todo o romance, de todos os lados, deixando marcas em cada detalhe de descrição, cada lance da narrativa. À medida que vamos lendo, acompanhamos por dentro, por assim dizer, as formas que elas moldaram por fora. Tudo aquilo que o romance tem a dizer sobre a bondade (Joe e Biddy), sobre a culpa e o desejo (Pip), sobre a natureza do capitalismo (questões ligadas à herança..., a falsidade e a reverência ao dinheiro) e nenhuma dessas questões poderia ser deixada de lado numa introdução ao livro - ele o faz pela maneira como mede a pressão de cada uma e como lhes distribui os pesos". Swinburne, citado por Trotter, assim definiu o livro: "Os defeitos são quase tão imperceptíveis quanto manchas no sol ou sombras num mar ensolarado", passagem várias vezes presente no livro. Os entre parênteses são acréscimos meus.

O volumoso livro é dividido em três volumes. O primeiro com 19 capítulos; o segundo com 20 e o terceiro, também com vinte capítulos. O total de páginas é de 702. Ao final de sua leitura, um grande lamento: Que pena que terminou! Quero ainda ressaltar, em acordo com o autor da introdução, a presença da culpa na consciência de Pip, o menino querido, protagonista de todo o romance. Sem dúvida um grandioso tema - profundamente humano, que recebe sempre um merecido castigo.

Deixo ainda a contracapa do livro: "Considerado por muitos críticos o principal romance de Charles John Huffman Dickens (1812-1870) Grandes esperanças conta a história de Pip, um órfão de família humilde que ao receber uma herança renega o passado e muda-se para Londres para tentar inserir-se na alta sociedade. Saudado por autores como Bernard Shaw e G.K. Chesterton pela perfeição narrativa, este romance discute, na figura do protagonista, a imoralidade, a culpa, o desejo e a desilusão.

Esta edição traz o final considerado definitivo, escolhido por Dickens após ceder às críticas de que o primeiro era triste demais, e também um apêndice com o original, preferido por parte dos leitores (691-692).

A introdução de David Trotter, especialista em literatura britânica do século XIX, contextualiza o livro em sua época, revelando as ideias de reforma social defendidas pelo autor". Antes de terminar, uma questão sobre Grandes esperanças. Quais seriam elas? Um vida no fausto da riqueza mas de falsidades ou a vida simples mas autêntica vivida entre as pessoas simples e pobres. Um grande romance. Leitura atualíssima.



4 comentários:

  1. "O LIVRO CAINDO N ALMA /É GERME QUE FAZ A PALMA / É CHUVA QUE FAZ O MAR! / BENDITO O QUE SEMEIA LIVROS / LIVROS À MÃO CHEIA / E MANDA O POVO PENSAR!" (Castro Alves - O Livro e a América)

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    1. Lindo. Maravilhoso. Semear livros - ou então semear a vontade de lê-los. Grande Castro Alves e grande Charles Dickens. Que livro fantástico que é este "Grandes esperanças". Muito obrigado pela sua bela manifestação. Fazer o povo pensar.

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  2. Caro Professor Elói: Os versos do grande Castro Alves foram citados por nós - Pedro Dias - e foram extraídos do livro "Hinos do Equador".
    É também do poeta o poema "O Navio Negreiro" onde, em versos de extraordinária inspiração e eloqüência poética deplora a escravidão!

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  3. Está feito o seu registro, meu caro. Agradeço a sua manifestação.

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