quarta-feira, 11 de outubro de 2017

História de São José do Hortêncio. Felipe Kuhn Braun.

Continuo na minha fase saudosista. Esta fase teve origem na visita que fiz ao meu irmão, em Mondaí SC., recentemente.  Entre as conversas, retornamos às longínquas origens em Harmonia, em meio a reportagens, livros e cartas, que ele guarda com muito cuidado. Entre os livros, um deles me chamou particular atenção. A História de São José do Hortêncio - A antiga picada dos portugueses. Se eu falar da portugieserschneis, as pessoas da minha idade certamente se lembrarão.
O livro sobre São José do Hortêncio, da Editora Oikos.

Eu conheço esta pequena cidade, pois numa certa ocasião fui para lá, em companhia de um outro irmão meu. São José do Hortêncio tem hoje, apenas algo em torno de quatro mil habitantes, o que não faz jus à sua antiquidade e à sua importância histórica. São José do Hortêncio foi simplesmente a primeira localidade de imigração germânica no vale do rio Caí e a primeira paróquia da região.(Isso praticamente significa, para os dias de hoje, a sua elevação a município, devido a unidade entre a Igreja e o Império) A fundação desta paróquia data de 1849 e ela esteve ao cuidado dos padres jesuítas alemães, que acabavam de chegar ao Brasil no ano anterior. Os jesuítas a conduziram até o ano de 1911, passando então o comando para os padres seculares. Os primeiros registros da presença alemã datam de 1828, quando lá já havia lusitanos. Lembrando que os primeiros imigrantes alemães chegaram em São Leopoldo, no vale do rio dos Sinos, em 25 de julho de 1824.

O meu interesse pelo livro se deve a uma observação sobre as primeiras famílias que ali se estabeleceram. Na página 44 do mesmo se lê o seguinte: Nicolau Rech: Imigrante católico, nascido em 1802, emigrou solteiro no ano de 1829, vindo como militar. Casou-se com Margarida Ludwig, com quem teve 9 filhos. Seu filho Jorge aparece na lista de fundadores da igreja matriz de São José do Hortêncio. Como vimos, esta foi fundada em 1849. Numa anotação do meu irmão, os primeiros filhos aparecem como tendo sido batizados em São Leopoldo e outros em São José do Hortêncio. Alguns não tiveram o registro de batismo, em função da Revolução Farroupilha. Entre estes devia estar o pai do meu avô. O meu avô eu cheguei a conhecer. 

Este senhor Nicolau Rech deve ter sido o avô do meu avô. Esta ascendência já vai longe. O fato de ser militar não significa muita coisa. Foi este, inclusive, um dos motivos pelos quais os alemães da região do Hunsrück decidiram emigrar. Os pesados serviços militares que lhes eram impostos. Era o tempo das guerras napoleônicas. Esta região está na divisa com a França. Lembrando ainda que a unificação alemã só ocorrerá bem mais tarde, apenas em 1871.

O livro é de autoria de Felipe Braun Kuhn, jornalista de profissão. Ele é um estudioso da imigração alemã no Brasil. A parte inicial do livro é dedicada aos motivos que levaram os alemães para a emigração e à escolha do Brasil como seu destino. A maior parte do livro é dedicada às atividades da comunidade católica de São José do Hortêncio, pelo fato, deduzo, de que existe o maior número de registros. Estes são um tanto monótonos, pois os fatos, invariavelmente se repetem, ano após ano: a troca dos padres, as dificuldades financeiras dos colonos, o irmão leigo que ajuda nas tarefas da igreja, as cartas aos superiores bem como as respostas e as visitas destes. Também merecem registro as epidemias, as secas e as procissões pedindo chuvas, bem como as enchentes provocadas pelos seus excessos.

Depois vem os registros da comunidade protestante. Quero destacar que ao longo do Império, a construção de igrejas do credo protestante era proibida e os registros de suas atividades não tinham o devido reconhecimento. Os demais temas que merecem notas são o registro das ocupações e profissões, as atividades dos comerciantes e a sua ascensão econômica, a guerra do Paraguai, que envolveu cinco pessoas do local, os Muckers, as bandinhas e as diversões, além de observações sobre o sistema educacional. Alguns colonos, inclusive, chegaram a ser proprietários de escravos. O livro também é acompanhado de uma bateria de fotos das famílias dos descendentes. Fotos de família, de casamentos, de primeira comunhão e de festas da comunidade. Estas já remetem para a década de 1920.
Um mapa para ajudar na localização. Sempre é bom.

Merece também um destaque especial o fato da rápida multiplicação das famílias. Todas tiveram muitos filhos e o problema das terras promoveu novas migrações. Raros são os descendentes de alemães, espalhados pelo Brasil afora, que não tiveram um de seus ascendentes originários de São José do Hortêncio. Assim ocorreu com a povoação de todo o vale do rio Caí, do rio Taquari, da região missioneira, tanto no Rio Grande do Sul, quanto na Argentina e no Paraguai, de Santa Catarina, e depois, Brasil afora. Doze paróquias se desmembraram da paróquia original.

Li o livro com os olhos e os interesses voltados para Harmonia. A primeira data remete ao ano de 1887, ano em que a sede da paróquia de Tupandi (São Salvador) é transferida para Harmonia, a partir de informações falsas que o bispo teria recebido. A solução encontrada foi a elevação à paróquia das duas localidades, sendo que Harmonia não seria entregue aos padres jesuítas e sim aos padres seculares. A segunda referência data de 1904, quando Harmonia recebeu a visita do padre Theodor Amstad para formar a Associação de Poupança e a terceira, é referente ao ano de 1909, quando houve uma reunião regional do clero.

O episódio da visita do padre Theodor Amstad, um jesuíta suíço, me despertou particular interesse. Este padre é singular. Tem algumas observações bem peculiares no livro, que não passam despercebidas a um olhar mais atento. Uma é sobre as suas obrigações religiosas, que teriam sido negligenciadas e uma outra fala de um possível envolvimento seu em política, tomando partido. O certo é que ele teve muitas ideias cooperativas e em Harmonia existe, até hoje, uma cooperativa, que começou com a união dos suinocultores. O padre tem muita história em Nova Petrópolis, ligadas a atividade cooperativa no mundo das finanças. Tem a ver com o SICREDI, fundado pelo padre em 1902, nesta cidade de Nova Petrópolis, cuja paróquia, por sinal, também foi desmembrada de São José do Hortêncio.

Muito boa a leitura que me satisfez muitas das minhas curiosidades neste meu tempo de saudosismo. Ainda uma observação, no sentido de destacar a importância histórica desta cidade. No livro A missão dos jesuítas alemães no Rio Grande do Sul, o padre Ambros Schupp (Ed.Unisinos) chama São José do Hortêncio como a outra colônia-mãe, sendo Dois Irmãos a outra, ou a primeira que ele descreve.

2 comentários:

  1. Felipe, onde é hoje a colônia 10 de 1856. Foi li que meu bisavô Paulus Funk se estabeleceu. Consta no teu livro?

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    1. Fica aqui o registro. Creio que por este meio você não tem contato com o autor, mas fica aqui o seu registro. Agradeço a sua manifestação.

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