segunda-feira, 22 de abril de 2019

Henry Ford. Fascista e antissemita?

No livro Espelho do Ocidente - o nazismo e a civilização ocidental li que Hitler admirava Henry Ford. O admirava a tal ponto que mantinha sobre a sua estante uma única estatueta e esta era de Henry Ford. Quis saber mais e fui buscar. Encontrei muita coisa na ficção de Philip Roth, Um complô contra a América. Depois da ficção, ao final do livro há um post-scriptum, em que nos apresenta os fatos e os personagens envolvidos em seu mundo real. Tomo deste pós escrito os dados sobre Ford, sem tecer comentários. Não há necessidade.
Da Companhia de Bolso. Complô contra a América.

HENRY FORD - 1863-1947.

"1903- 1905. O primeiro automóvel Ford, o Model A de dois cilindros e oito cavalos, projetado por Henry Ford e fabricado pela recém-criada Ford Motor Company, é lançado em 1903, ao preço de oitocentos e cinquenta dólares. Modelos mais caros aparecem nos anos seguintes.

1908. Projetado para o meio rural, surge no mercado o Ford Model T; único modelo fabricado pela empresa até 1927, ele torna Ford o maior fabricante de automóveis do país, realizando seu plano de 'fazer um carro para as multidões'.

1910-1916. Com seus sócios, cria um processo de fabricação por meio de produção em sequência e divisão do trabalho, resultando na linha de produção contínua - considerada o maior progresso na indústria desde o advento da Revolução Industrial - e possibilitando a produção em massa do Model T. Em 1914, Ford anuncia o salário básico  de cinco dólares para uma jornada de oito horas; na verdade, essa oferta só se aplica a parte dos empregados de Ford. Não obstante, graças ao 'dia de cinco dólares', Ford é elogiado e ganha fama como um empresário esclarecido, ainda que não como um pensador esclarecido. 'Não gosto de ler livros', ele explica. 'Eles confundem minha cabeça'. Afirma também: 'A história é, de modo geral, uma bobagem.

1916-1919. Seu nome é proposto como candidato à Presidência na Convenção Nacional Republicana, e recebe trinta e dois votos no primeiro escrutínio. Consegue ter o apoio absoluto sobre todas as empresas Ford. Em 1916, a companhia já produz dois mil carros por dia; o total da produção do Model T até esse ano chega a um milhão. Quando eclode a Primeira Guerra Mundial, atua como militante pacifista contra o conflito.. Numa reunião de funcionários da Ford afirma: 'Eu sei quem causou a guerra. Os banqueiros judeu-alemães. Tenho as provas aqui. São fatos. Os banqueiros judeu-alemães causaram a guerra'. Quando os Estados Unidos entram na guerra, promete 'atuar sem lucrar um centavo' nos contratos com o governo, mas não cumpre o prometido. Por insistência do presidente Wilson, concorre ao Senado como democrata - embora anteriormente se identificasse como republicano - e é derrotado por pequena margem de votos. Atribui sua derrota aos 'interesses' de Wall Street e aos 'judeus'.

1920. Em maio, o Dearborn Independent - um hebdomadário local comprado por Ford em 1918 - publica o primeiro de uma série de noventa e um detalhados artigos cujo tema é 'O judeu internacional: problema mundial'; em números subsequentes, publicam em folhetim os apócrifos Protocolos dos sábios de Sião, afirmando que o documento - que revela um plano judaico para dominar o mundo - é autêntico. A circulação do hebdomadário alcança quase trezentos mil exemplares em seu segundo ano de publicação; os revendedores de produtos Ford são obrigados a fazer assinaturas, e os artigos de cunho fortemente antissemita são depois reunidos numa edição em quatro volumes: The International Jew: The World's Foremost Problem ('O judeu internacional: o principal problema mundial').

Década de 1920. Em 1921, a Ford atinge cinco milhões de carros produzidos; o Model T responde por mais da metade dos automóveis vendidos no país. Ford constrói a imensa fábrica de River Rouge e uma cidade industrial em Dearborn. Adquire florestas, minas de ferro e carvão para abastecer sua empresa com matérias-primas. Diversifica a linha Ford. Em 1922, sua autobiografia, My Life and Work, torna-se um best-seller na categoria não ficção; o nome e a lenda de Ford ganham fama no mundo todo. Pesquisas de opinião mostram que ele é mais popular do que o presidente Harding, e seu nome começa a ser sugerido como ideal para uma possível candidatura à Presidência pelo Partido Republicano; no outono de 1922, pensa em se candidatar. Adolf Hitler, numa entrevista em 1923, afirma: 'Consideramos Heinrich Ford um líder do crescente movimento fascista nos Estados Unidos'. Em meados da década, um advogado judeu de Chicago o processa por difamação, e o caso é encerrado com um acordo extrajudicial; em 1927, retira seus ataques aos judeus, resolve interromper suas publicações de material antissemita e fecha o deficitário Dearborn Independent, que já lhe custara quase cinco milhões de dólares. Quando Lindbergh vai a Detroit em agosto de 1927 no Spirit of St. Louis, encontra-se com Ford no aeroporto Ford e o leva a voar pela primeira vez no famoso avião. Lindbergh desperta o interesse de Ford na produção de aviões. Os dois se reúnem posteriormente muitas vezes, e numa entrevista concedida em 1940, em Detroit, Ford observa: 'Quando Charles vem aqui, nós só conversamos sobre os judeus'.

1931- 1937. A concorrência da Chevrolet e da Plymouth, mais o impacto da Depressão, trazem grandes prejuízos à Ford, apesar da inovação representada pelo motor V-8. Surgem dificuldades nas relações com os empregados na fábrica de River Rouge, causadas pela aceleração do ritmo de trabalho, insegurança no emprego e espionagem industrial. Quando o sindicato United Auto Workers tenta fazer campanha na Ford, tal como na General Motors e na Chrysler, Ford reage com violência e intimidação; grupos paramilitares de Detroit espancam sindicalistas em River Rouge. As políticas trabalhistas da Ford Company são condenadas pelo Conselho Nacional de Relações Trabalhistas e consideradas as piores da indústria automobilística.

1938. Em julho, ao completar setenta e cinco anos, aceita a Cruz de Serviço da Águia Alemã oferecida pelo governo nazista de Hitler num jantar comemorativo de seu aniversário em Detroit, para o qual foram convidados mil e quinhentos cidadãos importantes. (Quando a mesma medalha é concedida a Lindbergh em cerimônia realizada na Alemanha em outubro, o secretário do Interior, Ickes afirma numa reunião da Sociedade Sionista de Cleveland, em dezembro: 'Henry Ford e Charles A.Lindbergh são os dois únicos cidadãos livres de um país livre que, com subserviência, aceitaram essas homenagens desprezíveis numa época em que aquele que as concedeu considera perdido o dia em que não cometeu nenhum novo crime contra a humanidade'). Sofre o primeiro de seus dois derrames.

1939-1940. Quando tem início a Segunda Guerra Mundial, passa a defender, com seu amigo Lindbergh, o isolacionismo e o Comitê América em Primeiro Lugar. Pouco depois de Ford ingressar na Comissão Executiva do movimento, Lessing J. Rosenwald, diretor judeu da Sears, Roebuck and Company, renuncia por causa da reputação antissemita de Ford. Durante algum tempo, tem encontros regulares com o padre Coughlin, que faz pronunciamentos antissemitas no rádio; Roosevelt e Ickes acreditam que Ford o esteja financiando. Dá apoio financeiro ao demagogo antissemita Gerald L.K. Smith, pagando seus programas radiofônicos semanais e suas despesas cotidianas. (Anos depois, Smith reedita The International Jew; na década de 1960, ainda afirma que Ford 'nunca mudou sua opinião a respeito dos judeus). 

1941-1947. Sofre o segundo derrame. A companhia passa a produzir artigos bélicos à medida que a guerra se aproxima; durante o conflito, produz o bombardeiro B-24 na imensa fábrica de Willow Run, onde Lindgergh é contratado como assessor. Por motivo de saúde, Ford não consegue mais dirigir a empresa e se aposenta em 1945. Morre em abril de 1947; uma multidão de cem mil pessoas comparece ao velório. A maior parte da imensa fortuna em ações da empresa vai para a fundação Ford, que em pouco tempo se torna a mais rica fundação privada do Mundo".

ROTH, Philip. Complô contra a América. São Paulo, Companhia das Letras, 2015. Páginas 420-423.

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