terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Sobre educação - gratidão - invisibilidade e imensurabilidade de seus resultados.

Confesso que os tempos que estamos vivendo não são os melhores. São tempos meio depressivos. Tempos de afirmação de cloroquina e ivermectina, símbolos maiores dos tempos negacionistas que se instalaram nas altas esferas de poder desse "pobre país". Estamos assistindo o triunfo das nulidades e das indecências morais e éticas. Na educação - então! A formação humana, na concepção de Bildung ou Aussbildung se transformou em inimiga dos governantes dessa geração cloroquina no poder. Tempos de triunfo do antiintelectualismo.

"Constituído de modo correto e sem falha, nas mãos, nos pés e no espírito" (Página 13). Um conceito símbolo retirado de um livro símbolo sobre a educação como formação integral do ser humano. Paideia - a formação do homem grego, de Werner Jaeger. Martins Fontes.

Particularmente, no campo da educação, as forças do mercado instaladas no poder estão reduzindo a nobre função de formar o ser humano em um mero adestramento em "habilidades e competências", uma redução à qual, creio, nem mesmo os adeptos das teorias do "Capital humano" conseguem se conformar. Particularmente, no Paraná, os destinos da formação humana estão sendo entregues ao coturno e à continência. A beleza e a leveza do ser humano estão sendo pisadas pelas botinas e entregues à sanha das marchas e dos uniformes. Bem ao gosto...

E, ainda mais particularmente, no campo da educação um dos setores mais minados é o campo da avaliação. Movido pela sanha do controle externo, de setores estranhos ao processo educativo, os  seus resultados são milimetricamente observados e servem, inclusive, de parâmetro para financiamentos. Todo o processo educativo, de longa construção histórica, é submetido à avaliação, ao IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). Em nome dele, todo um sistema de falsificação de dados é instituído. 

Mas chega de lamentações! Ante esses tristes valores dominantes - a força do humano resiste e, qual "água nova brotando", estão se formando novos fluxos de esperança e de humanidade para os quais não haverá forças que os consigam conter. São as lições da história.

Em meio a esse estado psicológico que estamos vivendo, aprofundado por uma consciência social e desejo de humanidade, recebi um confortável e animador afago. Ele, de forma inesperada, me veio pelo Messenger e, confesso, me fez um bem enorme. Acima de tudo fortaleceu as minhas convicções de que a educação, acima de tudo, é presença, presença interativa, de encontro, soma e absorção de alteridades. As diferenças que se somam e se multiplicam. É óbvio que o sistema educacional não prescinde de planejamento, estabelecimento de objetivos e de avaliação. Mas deixo aqui a minha crença de que os seus melhores resultados serão sempre intangíveis e inalcançáveis pelo olhar dos sistemas avaliativos. Os seus melhores resultados penetram nas entranhas do ser humano e nele se instalam definitivamente para orientarem e darem direção a vidas. São as raízes.

Como estou tecendo considerações para além do conteúdo da mensagem recebida e, como esta me veio de forma privada, mantenho o missivista no anonimato mas, quero publicamente retomar o agradecimento que já manifestei privadamente. Fica aqui registrada a minha gratidão e o meu agradecimento. Eis o teor do afago recebido:

"Oi, professor, tudo bom? Fiz aula contigo nos anos de 2009/2010, curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Positivo (na época Unicenp ainda).

Estou passando para te agradecer. Levei comigo duas grandes lições suas (na verdade foram muito mais, mas essas duas foram as mais marcantes). A primeira é que você sempre falava: “tem um monte de curso ensinando aí: leia 200 páginas em uma hora. Vou lançar um curso: leia 5 páginas em duas horas”. Isso mudou profundamente meu contato com a leitura e o estudo. Não fico mais ansioso ao passar um longo tempo apreciando e entendendo poucas páginas. Saber valorizar a profundidade de cada palavra e frase com certeza foi um grande ensino que você me passou. O segundo ensinamento foi uma frase linda: “só voa livre quem tem raízes em algum lugar”. Volta e meia essa frase volta a minha vida, e se encaixa perfeitamente em diversas situações. Era isso. Acredito que a gratidão move o universo e queria te agradecer por ter me presenteado com esses valiosos ensinamentos, mais de 10 anos atrás. Abraço!"

Contextualizando um pouco, relembrando as situações em que esses fatos ocorreram. As minhas aulas sempre foram entremeadas de muitas conversas sobre os momentos vividos. A primeira situação, lembro bem. Era comum que nas feiras universitárias de livros que eu frequentava, sempre havia os "ofertadores" desses cursos de "leitura dinâmica". Creio que era assim que se chamavam. Faz parte da pressa e do aligeiramento da formação. O mundo tem pressa. É a pressão por resultados. A pressão tem consequências.

O segundo fato, também o tenho muito presente. É a presença de Paulo Freire em minha formação. É dele esta frase norteadora. Voar implica em liberdades. Voar exige desprendimentos, exige experimentar inseguranças, desassossegos e desconfortos. Voar está acima das planuras. Mas, com certeza, raízes nos impedem de nos perdermos nos imensos temporais da vida.

Assim está registrado meu agradecimento ao querido aluno dessa mensagem e também a minha indignação diante dos rumos que a formação humana está tomando pelas mãos dos homens unidimensionais do mercado. Afinal, sem a indignação, oriunda da tomada de consciência da situação, não haverá reação. Reação necessária para que o humano e não o econômico volte a ser o princípio norteador de nossas vidas.

4 comentários:

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    1. A profissão de professor é extremamente gratificante. E é de muita responsabilidade. Você exerce influências muito fortes na formação da pessoa humana. Agradeço a sua manifestação, Leni.

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  2. Grande, mestre. Não tive o privilégio de ser seu aluno, mas aprendo muito com você na militância, nos cursos de formação, em suas postagens, nas rodas de cerveja... Um imenso abraço e obrigado por esse seu trabalho incansável de busca e de partilha de conhecimentos.

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    1. Você é que é um dos meus mestres, Sebastião. Uma das maiores verdades que carrego comigo nos dias de hoje é a de que a formação humana é decorrência da alteridade. Aprendemos nas trocas e somas com os outros. E essas trocas se dão sem perdas. Só somamos e multiplicamos. Hasta la victória, siempre. Agradeço o seu generoso comentário.

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