"Este livro pretendeu apresentar uma narrativa crítica sobre a história da ditadura mais recente: como se instaurou, se vertebrou e alcançou um certo apogeu, para declinar e se retirar, em boa ordem. É certo que, no período final, os capitães que estavam no leme se sentiram ultrapassados, pilotando um processo que lhes fugia ao controle, inclusive porque muitos dos seus camaradas pulavam do barco, a engrossar forças oposicionistas cada vez mais diversas. Depois, houve longa transição, consumada por uma nova Constituição que forjou um estado de direito democrático tendo, em seus flancos (ou em seu coração?), legados indeléveis fixados ou consolidados no regime ditatorial".
Capa do livro Ditadura e democracia no Brasil, de Daniel Aarão Reis, lançado pela Zahar. 2014.
Assim Daniel Aarão Reis encerra o seu livro Ditadura e democracia no Brasil, que integra a coleção 1964 - 50 anos depois. Depois desta síntese ainda faz uma advertência final, sobre o que quis efetivamente dizer: "não há como se libertar da ditadura sem pensar nela. Nos medos dos quais ela foi produto, nas marcas, visíveis a olho nu, que ela gravou - com ferro em brasa - no lombo da sociedade. O pensamento crítico pode constituir a melhor defesa da democracia, à maneira de um antídoto às tentações autoritárias, sempre à espreita, prontas a ressuscitar tão logo reapareçam no horizonte novas crises e outras ameaças à ordem".
Comprei o livro num pacote de promoções da livraria da Travessa, sobre os 50 anos do golpe militar-civil, perpetrado contra as instituições democráticos do Brasil de 1964. Tanto o autor, quanto a editora merecem todo o meu crédito e foram o motivo para a minha escolha. De uma certa maneira o meu trabalho de apresentar uma pequena resenha está totalmente facilitada, ou já feita, pois o próprio autor se encarregou de fazê-la ao final de seu livro. O mesmo ele também o faz, com relação aos objetivos do livro. Estão aí dois parágrafos muito ilustrativos. Sobre o tema existe farta literatura e, isto provocaria para a questão, da necessidade do livro.
Foto recente de Daniel Aarão Reis, historiador da UFF e autor do livro.
Apresentaria como mérito principal, a sua capacidade de síntese e a clareza dos fatos em sua apresentação. Ele me fez lembrar do tempo em que eu ainda estava em sala de aula, na busca de material didático para apresentar. Não teria dúvidas em indicá-lo como livro didático sobre os temas que ele aborda. Ele é formado por sete capítulos e uma breve conclusão, uma espécie de posfácio, distribuídos ao longo de 191 páginas. Vejamos os temas abordados em cada um dos capítulos: 1. Ditadura no Brasil: uma incômoda e contraditória vitória. Este capítulo é uma espécie de introdução a cada um dos outros seis capítulos. 2. A gênese da ditadura (1961-1964). É óbvio que neste capítulo ele traça um panorama da conjuntura internacional e nacional daquele momento histórico. O modelo do nacional-estatismo ganha força nesta análise, como o modelo derrotado.
3.Ditadura ou democracia: a busca de uma identidade (1964-1968). Este capítulo passa por uma análise da chegada de Castelo Branco ao poder e as tentativas de remoção do modelo nacional-estatista e a sua substituição pelo internacional-liberalismo, de alinhamento incondicional aos interesses dos Estados Unidos. Envereda ainda pelos caminhos trilhados até chegar à declaração aberta de uma ditadura. 4. Os anos de ouro e de chumbo: a retomada do nacional-estatismo (1968-1974). O capítulo está explicitamente enunciado. Nele se trata do período tido e glorificado pela ditadura como os anos do milagre econômico, com o crescimento inusitado do PIB, sob a batuta do Estado e tendo como contrapartida os duros anos de repressão, que dizimaram completamente as reações contra o regime, especialmente as opções em torno da luta armada. Mostra ainda o desalinhamento da política internacional, antes totalmente controlada pelos Estados Unidos.
5. O Governo Geisel e os planos de uma nova institucionalização da ditadura (1974-1979). Este capítulo é extremamente interessante. O novo se refere a uma volta ao período de Castelo Branco, em que se pretendia instituir um governo forte, mas sem medidas de exceção, uma espécie de democracia controlada. A conjuntura internacional se torna desfavorável com a crise do petróleo e o decantado milagre econômico faz água. Para se manter no poder Geisel faz largo uso de medidas de exceção, destacando-se o "pacote de abril", que promoveu o alijamento político das oposições em ascensão.
5. O Governo Geisel e os planos de uma nova institucionalização da ditadura (1974-1979). Este capítulo é extremamente interessante. O novo se refere a uma volta ao período de Castelo Branco, em que se pretendia instituir um governo forte, mas sem medidas de exceção, uma espécie de democracia controlada. A conjuntura internacional se torna desfavorável com a crise do petróleo e o decantado milagre econômico faz água. Para se manter no poder Geisel faz largo uso de medidas de exceção, destacando-se o "pacote de abril", que promoveu o alijamento político das oposições em ascensão.
6. A transição democrática (1979- 1988). A transição fora estabelecida por Geisel e seria comandada pelo general Golbery do Couto e Silva. Para isso sepultaram-se as pretensões do general Sílvio Frota e o estabelecimento de João Batista Figueredo como o novo ungido do poder. Passa pelas últimas reações da extrema direita, pelo estabelecimento da Anistia (agosto de 1979), pelo movimento das Diretas já, pelo novo pluripartidarismo, pelo surgimento do PT e desembocando na Assembleia Nacional Constituinte. 7. A Constituição de 1988 e a restauração da democracia. Mostra as grande linhas ideológicas presentes, o trabalho da Comissão de Sistematização e a grande liderança exercida pelo então progressista senador Mário Covas e, ainda, os atropelamentos do executivo, com a formação do Centrão.
Momento histórico da promulgação da Constituição de 1988. O país volta à normalidade democrática.
É também muito interessante a análise que faz da vitória na Constituinte do modelo do nacional-estatismo, num momento em que o mundo enveredava dez vez para o internacional liberalismo, ou pelo neoliberalismo, como então já era chamado, e que se constituía na grande força no mundo de então. Aponta ainda as grandes conquistas, especialmente as dos campos dos direitos sociais e individuais. Ulisses Guimarães em um de seus arroubos, encarna Rousseau para anunciar "o primado da sociedade sobre o Estado" e a Constituição cidadã.
Em seu posfácio: reflexões sobre ditadura e democracia no Brasil, faz uma análise mais abrangente, dos anos 1960 a 2014 e constata grandes, para não dizer, enormes transformações em todos os campos. Foram feitas mudanças tão significativas, que em outros países levaram séculos para serem feitas. Aí envereda para as reflexões finais, com as quais começamos este texto.
Momento histórico da promulgação da Constituição de 1988. O país volta à normalidade democrática.
É também muito interessante a análise que faz da vitória na Constituinte do modelo do nacional-estatismo, num momento em que o mundo enveredava dez vez para o internacional liberalismo, ou pelo neoliberalismo, como então já era chamado, e que se constituía na grande força no mundo de então. Aponta ainda as grandes conquistas, especialmente as dos campos dos direitos sociais e individuais. Ulisses Guimarães em um de seus arroubos, encarna Rousseau para anunciar "o primado da sociedade sobre o Estado" e a Constituição cidadã.
Em seu posfácio: reflexões sobre ditadura e democracia no Brasil, faz uma análise mais abrangente, dos anos 1960 a 2014 e constata grandes, para não dizer, enormes transformações em todos os campos. Foram feitas mudanças tão significativas, que em outros países levaram séculos para serem feitas. Aí envereda para as reflexões finais, com as quais começamos este texto.
Muito bom o blog!!
ResponderExcluirMeus agradecimentos pelo elogio.
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