Retomando livros para a releitura deparei com O último leitor, livro do escritor argentino Ricardo Piglia. Seu livro é datado 2006 e eu o adquiri, por indicação de alguém, certamente do círculo de leituras informal que mantínhamos na sala de professores do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Positivo. Era comum trocarmos informações sobre o que estávamos lendo e assim nos enriquecíamos coletivamente. Este livro se destina para leitores, leitores não amadores, mas para leitores extremamente atentos, leitores - como se cada um fosse realmente o último leitor.
O último leitor. Ricardo Piglia. Companhia das Letras. 2006.O livro se constitui de ensaios do escritor, em que ele narra experiências suas com a leitura, nos deixando assim experiências muito ricas de sua visão sobre obras, entre as mais importantes da literatura universal. Na contracapa do livro, há dicas sobre leitores que, segundo critérios do escritor, poderiam ser considerados como esses últimos leitores. Vejamos:
"Escritor máximo, Borges dizia orgulhar-se sobretudo dos livros que lera; Cervantes, auto-retratado nos primeiros capítulos do Quixote, lia tudo, até os papéis jogados pela rua; Anna Kariênina aproveitou a viagem de trem de Moscou a Petersburgo para ler comodamente 'um romance inglês', ao passo que Che Guevara fez uma pausa na guerrilha boliviana para subir numa árvore e ler em paz. Personagens assim, reais e imaginários, povoam as páginas de O último leitor, de Ricardo Piglia. Na sequência dos ensaios brilhantes de Formas breves, o escritor argentino agora se interessa pela figura do leitor que vai atrás do sentido da própria vida nas páginas de um livro - não o leitor casual e distraído criado pela cultura de massas, mas o 'último leitor', aquele leitor essencial que personifica a própria literatura".
O livro de Piglia é formado por Prólogo e epílogo e seis ensaios, ocupando um total de 186 páginas. Os capítulos tem os seguintes títulos: 1. O que é um leitor (aquele que efetivamente busca sentido e interpreta o lido); 2. Uma narrativa sobre Kafka (suas cartas para Felice Bauer); 3. Leitores imaginários (as origens dos romances policiais modernos); 4. Ernesto Guevara, rastros de leitura (a leitura e as transformações provocadas. Suas sete vidas: o viajante, o escritor, o médico, o aventureiro, o testemunha, o crítico social e o guerrilheiro), 5. O lampião de Anna Kariênina (as mulheres como protagonistas: Anna, Madame Bovary, Molly Bloom), 6. De que é feito o Ulisses (metempsicose e carregar uma batata no bolso).
Pelo visto, podem constatar a riqueza dos ensaios. Uma vagarosa caminhada pela literatura, com paradas em seus momentos mais marcantes. Com certeza, passei a compreender melhor as dúvidas de Hamlet, a conhecer melhor Gramsci e Trotski, as raízes do romance policial e os seus componentes, os sonhos provocados pelas leituras e a façanha de querer vivenciá-las, e a entender bem a relação e a soma entre a leitura e as vivências que provocaram as transformações de vida no Che e por aí vai. A dificuldade principal na leitura foi a de não conhecer todas as obras analisadas, especialmente as ligadas aos romances policiais.
Vejamos a frase final de seu epílogo, onde relata a experiência da escrita desse livro: "Claro que este livro não pretende ser exaustivo. Não reconstrói todas as cenas possíveis de leitura; digamos que acompanha uma série privada; é um percurso arbitrário por algumas maneiras de ler que estão em minha lembrança. Minha própria vida de leitor está presente, e por isso este livro talvez seja o mais pessoal e mais íntimo dos que já escrevi".
O livro termina com indicações bibliográficas, com um esclarecimento do editor: "Este livro é feito de muitos livros. Nesta lista indicamos algumas edições brasileiras das obras citadas mais longamente". Vou dar aqui, apenas os autores. São eles: Edgar Allan Poe, Walter Benjamin, Jorge Luís Borges, Elias Canetti, Miguel de Cervantes, Raymond Chandler, Júlio Cortazar, Daniel Defoe, Isaac Deutscher, Fiodor Dostoévski, T.S. Eliot, Gustave Flaubert, Ernesto Che Guevara, José Fernandez, Homero, James Joyce, Franz Kafka, Karl Marx, Herman Melville, Marcel Proust, Jean Jacques Rousseau, Domingo Faustino Sarmiento, William Shakespeare, Liev Tolstói.
Chama a atenção a capa do livro. No capítulo 4, consta que Che Guevara, na Bolívia, já em seus dias finais, sobe a uma árvore para aí encontrar a solidão e o isolamento necessário para ser um bom "último leitor". Na capa é mostrada a foto que retrata essa situação. A foto é do Centro de Estudios Che Guevara y Aleida March. A edição é da Companhia das Letras, 2006. A tradução é de Heloisa Jahn.
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