segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

A Aculturação dos Alemães no Brasil. Emílio Willems.

Eu continuo seguindo na trilha aberta pelo Antônio Cândido. Desta vez quem me possibilitou segui-la foi a Estante Virtual, onde encontrei o livro. Antônio Cândido, na sua indicação de livros para compreender o Brasil, na parte que se refere à colonização alemã, indica o seguinte livro: A Aculturação dos Alemães no Brasil. O autor é Emílio Willems. A edição é da Companhia Editora Nacional. O prefácio da primeira edição deste livro nos indica que ele foi publicado originalmente em 1946. A segunda edição, que tenho em mãos, revisada e ampliada, data de 1980.
O livro de Emílio Willems, A aculturação dos alemães no Brasil. Um livro de muita pesquisa e erudição. Observem o detalhe de como se estudava o Brasil. Brasiliana - volume 250.

Emílio Willems nasceu na Alemanha em 1905, na cidade de Colônia, vindo ao Brasil em 1931. No Brasil estabeleceu-se no Paraná e dedicando-se ao magistério. Mudou-se para São Paulo em 1935 e passou a ser professor na Universidade de São Paulo, a partir de 1937. Com amplos conhecimentos de sociologia e de antropologia dedicou os seus estudos à aculturação de seus conterrâneos no Brasil. A partir dos anos 1950 passa a ser professor em diferentes universidades do mundo. O seu livro é um monumento de cultura e erudição e um modelo de pesquisa.

O livro se divide em duas partes. Uma primeira, que ele chama de parte geral, que se compõe de nove capítulos e, uma segunda, por ele denominada de parte especial, tem mais treze capítulos, sendo o último dedicado às conclusões gerais. Na primeira parte, os capítulos abordam os seguintes temas: Capítulo I. Assimilação e aculturação. É um capítulo árido em que são explicitados os conceitos sociológicos dessas palavras. É desnecessário dizer que estes conceitos fundamentam toda a análise do livro. Capítulo II. O êxodo dos alemães e os caracteres gerais de sua colonização no Brasil. Capítulo III. O peneiramento. Aqui ele examina especialmente os desajustes entre os imigrantes. Capítulo IV. Alguns aspectos ecológicos da colonização germânica. A competição pela ocupação do espaço e as brigas e desajustes que ocorrem são o tema deste capítulo. Capítulo V. A seleção. O tema é o processo adaptativo. capítulo VI. Isolamento e Contato. São analisados os conflitos decorrentes do processo adaptativo e a marginalidade cultural. Capítulo VII. Aculturação e "status". A luta pelo "status" e as mudanças decorrentes da aculturação são examinadas. Capítulo VIII. Aculturação ergológica e tecnológica. Neste capítulo são abordados os temas da alimentação, da habitação, da lavoura, da locomoção, entre outros. Capítulo IX. Caracteres gerais da sociedade e cultura teuto-brasileira. 189 páginas são consumidas por estes nove capítulos.
A cidade de Harmonia, no vale do rio Caí. Uma típica cidade de colonização alemã.

Na parte especial encontramos o seguinte: Capítulo X. A língua. Capítulo XI. A organização econômica. Capítulo XII. A escola. Capítulo XIII. Sexo e família. Capítulo XIV. A religião. Capítulo XV. A organização jurídica e política. Capítulo XVI. Literatura e imprensa. Capítulo XVII. A recreação. E o capítulo XVIII Conclusões. Creio que é fácil perceber a abrangência do livro. Só um homem muito erudito poderia produzi-lo. Ele sempre começa a análise pela Alemanha, como era a situação antes da migração, para então examinar as adaptações que houve por aqui. Esta segunda parte vai da página 193, até a 465.

É sabido que a Alemanha é um país de unificação tardia (1871) e que a imigração de povos de língua alemã começou em 1824. Sendo assim vieram ao Brasil diferentes povos que depois vieram a constituir a Alemanha. E é muito importante destacar que havia diferenças de todo o tipo nas diferentes regiões e, entre eles havia povos muito atrasados. O autor dá destaque especial aos pomeranos, neste quesito do atraso.

Um erro muito comum que cometemos quando falamos de imigração é ver os padrões alemães ou europeus de hoje e, a partir daí fazermos as transposições. Não é e nunca foi assim. De uma maneira geral os povos que compuseram a Alemanha eram muito atrasados. Muitos, inclusive, vieram analfabetos. Em termos de cidadania, nada sabiam. Eram súditos e não cidadãos. E aqui não encontraram facilidades. Vieram, ou para abrir áreas de colonização, ou para substituir o trabalho escravo, praticamente nas mesmas condições. Vejamos um trecho do livro: "A princípio, os imigrantes e seus descendentes caracterizavam-se pela sua atitude  passiva diante da política brasileira. Pequenos lavradores, trabalhadores rurais e artífices, nunca tinham ouvido coisa alguma de direitos políticos na sua velha pátria. O papel político desses imigrantes restringia-se ao de meros súditos a quem nunca se havia dado oportunidade de participar do poder".
Vista de Tupandi, outra cidade do vale do rio Caí, colonizada pelos alemães.

Outra passagem é significativa: "Para a grande maioria dos imigrantes alemães, a fixação na mata virgem significava, durante longos anos, a luta pela sobrevivência acompanhada de um desnivelamento cultural generalizado. Não sobrava tempo para outras atividades a não ser aquelas que se relacionassem com a satisfação das necessidades vitais". Desajustamentos em sua aculturação sempre estiveram presentes, com grande destaque para as bebidas alcoólicas. Também o período de emigração foi um período muito longo, o que dificulta fazer generalizações. Alemães em melhores condições vieram apenas a partir de 1848, depois das revoluções liberais, que grassaram por toda a Europa.

Algumas observações gerais podem ser feitas: A colonização se deu pela propriedade agrícola, sempre explorada pela mão de obra familiar. Enquanto esta era a organização econômica dominante, as colônias alemãs eram praticamente impermeáveis a influências externas. Grande destaque sempre foi dada ao processo de alfabetização. Para isso escolas comunais ou paroquiais foram criadas. Era difícil encontrar professores e estes passavam por enormes dificuldades. A religião permeava todas as ações. Eram divididos entre católicos e protestantes. Os católicos levaram algumas vantagens, especialmente antes da República. Os protestantes não tinham os documentos reconhecidos. As aculturações foram difíceis e as assimilações vieram bem mais tarde, com a industrialização e a urbanização.
A presença da cultura alemã em Harmonia, a cidade em que eu nasci.

Eu particularmente gostei muito do livro. Me senti descrito o tempo todo. Onde mais me encontrei foi no seguinte trecho: "Um dos maiores proprietários daquela zona  era José Inácio Teixeira, dono da fazenda Pareci que se estendia entre os rios Maratá e Caí, em ambas as margens do arroio São Salvador, até a região do planalto. Em 1854 começou a colonização dessas terras onde em 1862 já se contavam 80 famílias. É digno de nota que o povoamento da área do Caí se fazia como autocolonização. Quase todos os moradores eram filhos ou netos de imigrantes alemães". Eu explico. Eu nasci em Harmonia, no vale do rio Caí, em 1945 e, pelo que eu sei, os meus avós já eram nascidos no Brasil. Sobre as dificuldades de aculturação eu tenho a dizer que fui aprender português, apenas nos tempos de escola. Em casa a língua era o alemão.  Quanto a descrição dos hábitos, a descrição do autor corresponde com muita fidelidade ao que eu vivi.

2 comentários:

  1. Oi. Obrigada pela crítica ao livro. Estou interessada em lê-lo em virtude dos estudos genealógicos (família Schaun Pelufê). Fiquei curiosa com o seu comentário sobre o reconhecimento dos documentos dos protestantes. Abraço, Mari

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  2. Maripelufe, agradeço o seu comentário. E tomara que o livro atenda os seus anseios.

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