sexta-feira, 29 de julho de 2016

Projeto Memória. Crônicas da Resistência.



Cleusa Slaviero foi minha aluna no curso de jornalismo na Universidade Positivo. Foi uma das alunas que mais foi tocada pela formação de uma consciência crítica da realidade, percebendo as suas contradições. Neste processo formou uma visão humanitária de mundo e se apegou aos valores de uma democracia fortemente participativa, apegada a políticas públicas de promoção da igualdade pela inclusão social.

Neste momento conturbado da democracia brasileira Cleusa idealizou e concretizou um sonho. Reuniu em livro mais de 80 pessoas, convidando-as para escreverem Crônicas da Resistência 2016 - Narrativas de uma democracia ameaçada. O livro é uma construção coletiva, desde a indicação de autores até o financiamento de sua produção. Mas o grande mérito do livro, marco de resistência democrática, é da Cleusa que figura na capa como a organizadora do livro.
Cleusa nas vésperas do lançamento do livro. Um momento de descontração num bar, com o boné revolucionário do Chê.


O livro tem importantes adesões. O prefácio é uma contribuição de Adolfo Pérez Esquivel, o Nobel da Paz do ano de 1980 e de Leonardo Boff, o notável teólogo da teologia da libertação e escritor mais do que reconhecido. Os cronistas são professores, sindicalistas, jornalistas e militantes dos movimentos sociais, todos marcados pelas convicções democráticas e a democracia vista como a forma pública de efetivar políticas afirmativas de inclusão social. Como consta na capa do livro, este se constitui de "reflexões e vivências de autores que fazem parte de um grupo de resistentes".

Cleusa me honrou com o convite para dele participar e aproveito o momento para fazer o meu agradecimento. Publico hoje um primeiro texto, escrito dentro das primeiras exigências, entre elas a de não ultrapassar dois mil caracteres. Depois escrevi outro texto, escrito na segunda feira pela manhã e cheio de indignação pelo trágico da votação ocorrida no domingo e que resultou no impedimento da presidente Dilma. Deixo com vocês o primeiro texto, especialmente escrito para este livro. 
Capa do livro Crônicas da Resistência 2016.


Projeto Memória.

Um olhar retrospectivo sobre nossa história nos mostra que a elite brasileira tem uma enorme vocação golpista.

De 1930 a 1985 houve duas longas ditaduras e uma tentativa de golpe a cada três anos.

Com a Constituição de 1988 vivemos a mais longa experiência democrática. Vivemos uma jovem democracia. Velhos pedófilos, estupradores e anões morais atentam contra ela.

O combate à corrupção sempre foi o pretexto. O mar de lama, o perigo comunista e a Lava-jato.

A corrupção oculta o verdadeiro problema brasileiro: a escandalosa concentração de renda. 1% tem tanto, quanto os outros 99%. Mas isso não pode ser visto pelo povo. Os privilégios são mostrados como direitos e frutos da meritocracia. Se pratica um esforço de intelectualização do senso comum.

Vivemos doze anos de distribuição de renda, via políticas públicas, valorização do salário mínimo, políticas afirmativas e de complementação de renda.

Veio a crise. As crises são invenções do capital para promover a sua acumulação. Direitos são suprimidos para que o livre mercado e seus valores competitivos possam ser afirmados.

Destroi-se o Estado/Nação, a Pátria, o pai comum de muitos filhos. A solidariedade desaparece do horizonte. E este passa a ser nebuloso.

O Príncipe, o Estado Leviatã e os fascis, - os feixes de varas – são usados para desobstruir os caminhos do livre mercado global, da competição, da desumanização, do ódio e das humilhações. 

A cada dia que passa, entendo melhor Adorno. Ele nos descrevia a personalidade autoritária em potencial, contida na cultura ocidental, capitalista e cristã, em suas versões fundamentalistas.

E com Adorno também reafirmo que “a exigência que Auschwitz não se repita é a primeira de todas para a educação”, e de toda a ação política. 

Esta é minha percepção deste nebuloso momento.

Pedro Eloi Rech – Professor - Curitiba – Paraná.

2 comentários:

  1. Pois é. E o pior de tudo é que não temos uma organização que encampe as várias lutas dispersas e dê um sentido unitário, abrangente, transformador. Tristes trópicos.

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  2. Perda de rumos. Falta de direção. É triste de ver. Festivais de egos. Cargos de direção são vistos como cargos honoríficos e não de luta, organização e aglutinação. Muito obrigado pelo seu comentário, Romeu.

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