sábado, 18 de março de 2017

O santo e a porca. Ariano Suassuna.

Conheci a obra de Ariano Suassuna, ainda em Umuarama, nos anos 1970. Lá havia o professor Carlos, que tinha uma verdadeira obsessão pelo grande escritor e promovia a encenação da peça Auto da Compadecida. Todos os méritos para o professor Carlos. Posteriormente a obra ganhou grande popularidade com a televisão. Retomo o contato com o autor através das indicações literárias cobradas por diferentes universidades brasileiras em seus vestibulares.

Desde os tempos de estudante Suassuna se envolveu com o teatro, participando de grupos que encenavam do clássico ao popular. Daí para escrever as suas peças foi um passo só. Os seus personagens são pessoas que foi conhecendo ao longo de sua vida, especialmente, em seus anos de formação, no interior da Paraíba e depois na cidade de Recife. A política muito cedo o tornou órfão de pai. Ele foi governador da Paraíba e assassinado no Rio de Janeiro, nos anos que antecederam os acontecimentos de 1930.
Uma bela edição. Apresentação do autor e contextualização da obra e ilustrações.

O santo e a porca foi escrita como uma peça de teatro. Fé popular e sovinice se somaram à ironia e à sátira e mais uma suposta esperteza, para formar uma verdadeira obra prima. O santo em questão é santo Antônio, o santo dos casamentos e também o santo da devoção de Euricão, o personagem principal da peça. Já a porca, fiz uma fácil associação dos tempos em que aqui no Paraná havia o Banco do Estado do Paraná, que distribuía um porquinho onde se guardavam moedas, para estimular a poupança entre as crianças.

Pois bem, em torno de Euricão, do seu santo de devoção e de sua obsessão pelo dinheiro, guardado numa porca de madeira, e mais meia dúzia de pessoas, Suassuna construiu esta hilariante peça, que ganhou o mundo. Os outros personagens são Benona, irmã de Euricão, Eudoro, um rico latifundiário, pai de Dodó e pretendente, primeiro de Benona, e depois de Margarida, o tesouro de Euricão e mais Pinhão e Caroba, que trabalhavam para os seus patrões.

Euricão era um árabe, conhecido pela sovinice e pelo trato duro para com Pinhão e Caroba e pelo apego à uma porca de madeira, herdada de seu avô. Vivia com a irmã Benona, que fora namorada de Eudoro, mas que, as timidezes não fizeram o noivado avançar. Dodó era o filho de Eudoro, que dedicava a vida aos estudos, mas por coisas da paixão se aproximou de Margarida, a filha de Euricão para dar-lhe proteção ou algo mais. Certamente por falta de opção Pinhão e Caroba também tiveram os seus encontros.

Eudoro manda carta a Euricão, avisando de sua chegada. Este temia que lhe viesse tomar dinheiro emprestado, mas na verdade, estava de olho em Margarida, o tesouro de Euricão, para quem o tesouro era a sua porca, a quem dedicava todo o zelo e cuidado, sob a proteção de santo Antônio. A visita incomodava Euricão, pois ela poderia lhe acarretar despesas. - "Ai a crise, ai a carestia"! Tomou providências para  não tê-las. Pai e filho queriam Margarida, mas todos os personagens se envolvem, uns por interesses financeiros, outros com fins amorosos. As tramas vão se desenrolando de forma bem hilária.

Ao contrário das expectativas iniciais os desfechos não são os esperados, mas todos se envolvem formando uma grande família. Os casamentos se realizam e a porca que desaparecera é devolvida ao seu Euricão, mas sob a triste constatação do seu já não mais valor. A peça se desenvolve ao longo de três atos e ao final do terceiro ato vem as lições de moral, uma delas na voz de Eudoro: "- Eurico, o dinheiro não é tudo neste mundo. Você tem sua filha, tem a todos nós que agora somos a sua família. Deixe de depositar toda a sua vida nesse dinheiro! Não dê tanta importância ao que não vale nada! Porque..."

Antes de descerrar o pano Euricão está sozinho no palco e lança o grande questionamento para a vida: "- Bem, e agora começa a pergunta. Que sentido tem toda essa conjuração que se abate sobre nós? Será que tudo isso tem sentido? Será que tudo tem sentido? Que quer dizer isso, Santo Antônio? Será que só você tem a resposta? Que diabo quer dizer tudo isso, Santo Antônio"?

A edição que eu li é a 33ª, da José Olympio, de 2016. Ela tem uma bela nota bibliográfica introdutória, que traça um panorama da vida e obra do escritor, além de explicações do autor sobre a recepção de suas peças pelo público e pela crítica. Tem ainda ilustrações de Zélia Suassuna e uma nota sobre a sua primeira apresentação no Teatro Dulcina, em 1958, no Rio de Janeiro, pelo Teatro Cacilda Becker, sob direção de Ziembinski, e com os seguintes autores em seus respectivos papéis: Caroba - Cleyde Yaconis; Euricão árabe - Ziembinski; Pinhão - Rubens Teixeira; Margarida - Cacilda Becker; Dodó - Fredi Kleemann; Benona - Kleber Macedo e Eudoro - Jorge Chaia.


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