sexta-feira, 22 de setembro de 2017

1917 - 2017. Cem anos da Revolução Russa.

Com a chegada do mês de outubro, um tema se impõe. A Revolução comunista de 1917, na Rússia. Ela foi a mais importante tentativa histórica de superação do sistema capitalista. Por questão de espaço não vou falar de suas causas. Mas não poderia deixar de mencionar que houve uma relação direta entre as análises que Marx fizera sobre as contradições e mazelas do sistema capitalista para que o processo revolucionário se desencadeasse. Foram elas que forneceram o estofo teórico para deflagrar e dar rumo e direção para a Revolução.

A Rússia vivia uma situação peculiar de opressão e, sob ela, foram criadas as chamadas condições objetivas para o início de um processo revolucionário. Sobre o tema recomendo muito o clássico de Sergei Eisentein O Encouraçado Potemkim, que nos dá uma ideia da situação opressiva sob o regime absolutista dos czares. Quanto ao processo revolucionário em si a recomendação de leitura vai para Dez dias que abalaram o mundo, de John Reed. Recomendo ainda a leitura de um livro que sempre me acompanhou em minhas aulas de história. Trata-se de História da Riqueza do Homem, de Leo Huberman, um livro dividido em duas partes: a primeira se ocupa da transição do feudalismo ao capitalismo e a segunda, do capitalismo ao? Uma verdadeira profissão de fé.

Com a tomada do poder, implantar o socialismo na Rússia se tornou uma tarefa extremamente complexa, pois ali o capitalismo mal e mal chegara com a sua modernização da economia. A Rússia ainda era um país rural. Também a morte prematura de Lênin e a sua sucessão trouxeram dificuldades. Mas a Revolução transformou a Rússia na União Soviética e esta, em grande potência mundial. Ocasionou a chamada bipolaridade, dividindo o mundo em duas grandes potências. Esta potência também exerceu papel decisivo na Segunda Guerra Mundial, determinante para a derrota do regime nazista, em sua expansão em busca do espaço vital. Mas havia a ditadura do proletariado. E havia também o grande problema da construção da igualdade sob um regime de liberdade. Diante desta questão sobra um pergunta de difícil resposta: Existe compatibilidade entre a liberdade e a igualdade?

Quanto as influências de 1917 sobre as mentes e corações dos trabalhadores também teríamos muito a dizer, mas vou me ater ao Brasil. Mas antes recomendo mais uma leitura. Navegação de cabotagem de Jorge Amado. Nele o escritor relata as suas andanças, o seu encontro com os grandes intelectuais do mundo. A leitura deste livro dá uma sensação de que todos os que se ocupavam com a mente, com a poesia, com o cinema e com a literatura em geral, professavam o ideário tornado concreto com a Revolução de 1917. As decepções começam com o XX Congresso do PCUS, quando Khrushchev denuncia as atrocidades cometidas sob o regime de Stálin.

No Brasil, pelas peculiaridades da imigração, os ideais igualitários vieram com os anarquistas italianos, ao final do século XIX. As influências da Revolução de 1917 chegam mais tarde, em 1922, quando se funda, em Niteroi, o Partido Comunista do Brasil, o PCB, que ao longo da história ficaria mais conhecido como o Partidão. Ele obedeceu aos ditames da Terceira Internacional, criada em Moscou em 1919 para, em torno dela, aglutinar os trabalhadores do mundo inteiro. Ao longo da história do Partidão, o líder mais conhecido foi Luís Carlos Prestes, que aderiu ao partido depois da épica Coluna Prestes.

Contar a história do Partidão também não é tarefa fácil, especialmente em função do fracionamento das esquerdas, derivadas tanto das quatro Internacionais, quanto aos movimentos posteriores a elas. A construção da unidade sempre foi tarefa praticamente impossível, tal o número de divergências, especialmente com relação aos meios de se chegar ao poder, ou mesmo o relacionamento com ele, enquanto não se deflagrava a Revolução. Recomendaria a leitura de biografias de Prestes, em especial a de Daniel Aarão Reis - Luís Carlos PRESTES - Um revolucionário entre dois mundos. Esta biografia recebeu pronta contestação da filha de Prestes, Anita Leocádia. Daniel Aarão Reis também ajudou a organizar os seis volumes da História do marxismo no Brasil, possivelmente o estudo mais completo sobre o tema.

A atuação do Partidão foi extremamente confusa no período da ditadura militar, quando se envolveu na luta armada, na guerrilha do Araguaia. Sofreu também várias dissidências, como a do PCdoB. Com a redemocratização perdeu a hegemonia das esquerdas, para o moderno socialismo pós soviético, do socialismo com democracia, que no Brasil se construiu em torno do Partido dos Trabalhadores. Quanto ao Partidão, ele proclamou a sua autodissolução, em Congresso realizado na Câmara Municipal de São Paulo, em 1992. Este Congresso foi capitaneado por Roberto Freire. Sobraram alguns remanescentes, que continuam sob a sigla do PCB.

Com os adventos da queda do muro de Berlim (1989) e do fim da URSS (1991) o mundo da bipolaridade acabou. Triunfalmente o mundo liberal anunciou o fim da história e o advento do pensamento único, como se as contradições do sistema capitalista tivessem acabado. Sob o neoliberalismo e a globalização dos mercados e a ascensão do chamado capitalismo financeiro, as crises só fizeram por crescer e as desigualdades por aumentar, especialmente, após a crise global de 2008, que longe está de terminar. Aliás, com o neoliberalismo e a globalização dos mercados, as crises antes cíclicas, se tornam agora permanentes.

Às lutas históricas dos trabalhadores somam-se hoje as novas dificuldades como as do avanço tecnológico e das ideologias do individualismo que se reinventam com significativas e sedutoras formas como as professadas pelas religiões ou seitas ligadas à teologia da prosperidade, do empreendedorismo e da meritocracia, que culpam o indivíduo pelos seus fracassos. O antídoto sempre será o apelo à formação da consciência e para a necessidade da organização coletiva. E, enquanto houver exploração capitalista, as análises de Marx, que continuam sendo um apelo à Revolução, não estarão superadas. E a convocação final do Manifesto continua absolutamente necessária. Trabalhadores do mundo inteiro, uni-vos, ou Proletarier aller Länder, Vereinigt euch!, no original.



2 comentários:

  1. Professor,

    Gosto muito do livro do Aaarão. Uma história da revolução perdida em que ele faz uma análise crítica do socialismo soviético. Muito bom também. Abraço!

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  2. Luis Fernando, eu também gosto muito do Aarão. Irei Lê-lo. No artigo, procurei mais fazer indicações de leitura do que análises. Um artigo é muito limitado para tanto assunto. Agradeço o seu comentário e a sua indicação.

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