terça-feira, 28 de novembro de 2023

MANIFESTO contra a plataformização compulsória, contra as escolas cívico militares e outras políticas educacionais do governo Ratinho Jr.

No dia 25 de novembro de 2023, foi lido e aprovado o Manifesto elaborado pelos participantes do Círculo de Leituras, promovido pelo NESEF-UFPR contra o uso compulsório de plataformas de ensino, contra as escolas cívico-militares e contra outras políticas educacionais implantadas ao longo do governo Ratinho Jr., no estado Paraná. Eis o seu inteiro teor: 

"Nós, participantes ativos dos Círculos de Leituras promovidos pelo NESEF-UFPR, como coletivo de educadores em defesa da escola pública democrática, temos acompanhado atentamente o projeto político educacional implementado no estado do Paraná pelo governo Ratinho Júnior desde o início do ano de 2019 e, simultaneamente, temos realizado frequentes denúncias dos ataques sistemáticos promovidos por este governo contra a educação pública.


Foto do evento com a leitura do MANIFESTO. Curitiba, 25 de novembro de 2023. UFPR.

 Ainda no ano de 2020, lançamos o livro Aulas não presenciais em tempos de pandemia: improviso, exclusão e precarização do ensino no Paraná, pela Platô Editorial, o qual procurou retratar a educação pública paranaense no contexto do pragmatismo gerencial das políticas neoliberais levadas às últimas consequências durante a pandemia da Covid-19 pelas mãos do então secretário de educação, o empresário Renato Feder. No ano de 2022, lançamos uma outra  obra com o título  Mercantilização da educação pública no Paraná: autoritarismo, violência e plataformização do ensino, também pela Platô Editorial, a qual, por sua vez, procurou desvelar os impactos destrutivos da política gerencialista adotada pela Secretaria de Educação do Paraná durante o período pandêmico, bem como sua continuidade e seu aprofundamento no controle e na vigilância dos procedimentos pedagógicos instaurados com o retorno das aulas presenciais.

Em ambos os livros, a partir da análise crítica de um grande conjunto de dados, denunciamos o processo de destruição da escola pública do Paraná, a precarização da carreira dos profissionais da educação, a retirada de direitos, o aumento da jornada de trabalho e o achatamento salarial, bem como as práticas de pressão por resultados, de constrangimento e de assédio moral que têm levado grande parte da categoria ao adoecimento. Também denunciamos o esmagamento dos princípios legais de gestão escolar democrática presentes na LDB pela vigência de um autoritarismo exacerbado, com diferentes mecanismos de vigilância, de controle e de punição, além da militarização e da privatização de unidades escolares. 

É neste contexto de luta que temos travado em defesa da escola pública, efetivamente democrática e de qualidade, que repudiamos, veementemente, o desrespeito do governo Ratinho Júnior ao direito humano fundamental de ensinar e de aprender com liberdade, princípio básico de qualquer procedimento pedagógico inerente a uma concepção de educação humanizadora.  Entendemos educação, acima de tudo, como prática de liberdade.

O educador não pode se constituir como tal sem direito ao exercício de autonomia plena, sem liberdade para estudar, pesquisar, planejar e ensinar de acordo com o conjunto de conhecimentos e de formulações teóricas de seu campo de formação aliados às necessidades de aprendizagem do contexto histórico-cultural em que atua. Esse desrespeito aos professores no estado do Paraná materializa-se, especialmente, na imposição da obrigatoriedade de uso de tecnologias e de plataformas estranhas ao trabalho docente.

Não se trata, obviamente, de negar a presença de inovações tecnológicas como recursos pedagógicos. Muito pelo contrário, a reivindicação da presença de tecnologia de ponta em nossas escolas é uma pauta histórica da luta dos trabalhadores da educação. Uma das exigências dos educadores comprometidos com a escola pública é a disponibilização de recursos tecnológicos atualizados e de qualidade. Entretanto, o que não podemos admitir, de forma alguma, é a obrigatoriedade do uso e a submissão dos educadores a aparatos tecnológicos estranhos às necessidades da mediação pedagógica. A tecnologia precisa estar a serviço do trabalho docente, jamais o contrário.

Por si só, a tecnologia não existe. Sua existência concreta depende de uma relação, mesmo que mecânica, com a pessoa que a utiliza. No âmbito educacional, portanto, repudiamos toda relação tecnológica que não agrega aprendizado, nem satisfação ou promoção de conhecimento. E, ainda, diante do cenário de obrigatoriedade do uso das plataformas no Estado do Paraná, registramos nossa indignação pela falta de fundamentação teórica e pela imposição de um currículo que não se sustenta de forma alguma na prática de ensino e tão pouco ao crivo da mais simples análise crítica. Por isso:

- repudiamos o uso das plataformas, pois elas não atestam o aprendizado efetivo de nossos estudantes;

- repudiamos o uso obrigatório das plataformas porque o tempo de ensino, o tempo de aprendizagem e o tempo de vida não cabem no tempo mecânico das plataformas; 

- repudiamos seu uso obrigatório, porque não garantem a acessibilidade de todos os docentes e discentes no território do Paraná; 

- repudiamo-nas, porque limitam a criatividade com propostas vazias e desvinculadas das realidades escolares; 

- repudiamo-nas, porque os resultados de seu uso não correspondem de maneira verossímil aos dados alardeados pela propaganda governamental na imprensa e nas redes sociais;

- repudiamos, ainda mais, porque expõem os estudantes a longas horas em frente às telas, o que pode desencadear incontáveis problemas, tanto físicos quanto psicológicos, tais como dor-de-cabeça, dores generalizadas pelo corpo, ansiedade, insônia, estresse e depressão, entre outros apontados por especialistas da saúde; 

- por fim, reforçamos nosso repúdio ao uso obrigatório das plataformas porque ele desrespeita a autonomia docente, estando a serviço do controle e da vigilância das práticas educativas, inibindo a pesquisa, a produção de conhecimento e a autoria docente, empobrecendo a mediação pedagógica e, consequentemente, comprometendo o processo de desenvolvimento e de aprendizagem de nossas crianças e de nossos jovens. 

Esse manifesto dialoga com a percepção e o sentimento de milhares de educadores do chão de nossas escola, considera inúmeros registros e documentos, tanto aqueles expressos em depoimentos nas redes sociais quanto rigorosas reflexões teóricas presentes em artigos, teses e livros recentemente produzidos e publicados, em âmbito nacional e internacional, inclusive as recentes manifestações da ONU e de responsáveis pela educação em diversos países europeus, os quais fizeram a experiência do uso de plataformas e retrocederam, após observarem os resultados catastróficos em suas comunidades educacionais.

Como educadores comprometidos com a formação plena de nossos estudantes e responsáveis com o atual momento histórico, convidamos a todos aqueles que, de uma forma ou de outra, em um ou em outro setor da sociedade civil organizada, individual ou institucionalmente, atuem em defesa de propostas de educação humanizadora, somem-se a nós na defesa intransigente da escola pública, gratuita, democrática, laica e de qualidade, repudiando políticas e práticas de mercantilização da educação, de controle e de vigilância pedagógica, de autoritarismo, de violência, de plataformização, de precarização e, consequentemente, da negação do direito de ensinar e de aprender. 

Educação, acima de tudo, é prática de liberdade e, como tal, deve estar a serviço da construção de uma sociedade efetivamente democrática. O controle, a vigilância e a padronização inerentes ao uso obrigatório das plataformas de ensino, aliado às políticas de militarização e de privatização da escola pública, são mecanismos completamente antagônicos à construção democrática, aproximando-se, indiscutivelmente, de um modelo fascista de educação. 

Assinam esta carta manifesto, juntamente com os integrantes do Círculo de Leituras NESEF, muitos educadores da educação básica da rede pública do estado do Paraná e de outras unidades federativas, professores da UFPR, da UNICAMP, da UFSM, da UFRGS, da UERJ, da UFSC, da UFU, da UFMS, da USP, da UEL, da UFF, da UFPE, da UFPA, da UNIPLAC, da URI, da PUC-GO, da UTFPR, da UFFS, do IFPR, do IFS, do IFRJ, do IFRR, da ABEH, da CEDES, da UNINOVE, da UFPI, do IFRN, da UDESC, da FURB, do IFC, do IFMGM da UNESP/Marília (entre outras), parlamentares do estado Paraná, dirigentes sindicais e autores de obras expressivas da literatura filosófica e pedagógica brasileira".

Seguem centenas de assinaturas de educadores (as) que dedicaram a vida inteira ao trabalho de educar e de formar seres humanos, estudantes e representantes de entidades classistas e da sociedade civil.

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