terça-feira, 11 de março de 2025

MOBY DICK. Herman Melville. 1851.

Um livro muito diferente. Seguramente, muito diferente. Estou falando de  Moby Dick, do escritor dos Estados Unidos, Herman Melville (1819-1891). O livro foi lançado no ano de 1851. Não há contextualizações a fazer. Trata-se de um livro sobre baleias, de caça às baleias, de uma raça, em particular, entre elas, a dos cachalotes. E entre os cachalotes, uma de maneira toda especial, Moby Dick. O livro é um tratado, uma espécie de ensaio sobre baleias, à sua caça e o seu enorme valor comercial, a época. Seu óleo e, mais uma vez, em especial o espermacete, abundante nos cachalotes, pela sua qualidade e valor comercial bem mais elevado. Era usado no fabrico de velas e iluminação. Vejam bem, estamos no ano de 1851.

Moby Dick. Herman Melville. Abril. 1972. Tradução: Péricles Eugênio da Silva Ramos.

Como falei, o livro é uma espécie de ensaio e, por isso mesmo, aprendi muito sobre as baleias. Desde a baleia bíblica, a que engolira o profeta Jonas, até sobre a cidade de Nantucket e Bedford (Massachusetts), os grandes centros pesqueiros de baleia dos Estados Unidos. Aprendi sobre os baleeiros, sobre os navios baleeiros, sobre as diferentes espécies de baleias, sobre o seu peso e tamanho,(trinta metros- até noventa toneladas) sobre a sua valentia e dificuldades de ser abatida, sobre os hábitos dos caçadores, assim como os do enorme mamífero, sobre as infindáveis viagens, sobre os diferentes valores comerciais e assim por diante. As descrições são minuciosas e longas. O livro tem 135 capítulos, estendidos ao longo de 668 páginas. A edição que eu li foi o da coleção Os imortais da literatura universal, da Abril cultural, numa publicação do ano de 1972.

Ao longo da leitura, uma curiosidade me acompanhou. O que levaria um escritor a escrever um tratado sobre baleias. A coleção dos livros é acompanhada de mini biografias e pequenas contextualizações das obras. Creio que na leitura da biografia do autor encontrei segura resposta. Uma vida de dificuldades financeiras o levou aos navios baleeiros. E nesse sentido, o seu livro pode ser até considerado como um diário de bordo.

As suas dificuldades passaram pela falência e morte prematura do pai e de estar entre oito irmãos. Depois de alguns empregos insignificantes, meteu-se pelos mares. Era o ano de 1841 e o navio era o Acushnet: "Era um veleiro de três mastros, com 36 toneladas e 35 metros de comprimento, equipado com oficina mecânica, carpintaria, sala de costura, e repleto de provisões. Tripulavam-no 26 homens comandados pelo capitão, que era o único responsável pela escolha dos locais de caça e autoridade máxima durante todo o tempo de permanência no mar. Logo abaixo do capitão vinham os imediatos, os arpoadores, alguns marujos experientes e, por fim, os aventureiros. Todos eles participavam da caça à baleia, trabalho perigoso e emocionante.

Para realizar sua tarefa, esses homens utilizavam as chalupas, pequenos barcos de madeira leve, com cerca de seis metros de comprimento por dois de largura, um pequeno mastro para vela auxiliar e uma caixa que ia à frente com mais de quinhentos metros de corda presa ao arpão.

A operação era comandada pelos imediatos, que tinham sob suas ordens cinco remadores. A um dos remadores cabia a difícil missão de arpoar a baleia. Como nessa época não existiam ainda dispositivos mecânicos para arpoar, o caçador atirava sua arma com a mão, bem de perto e com toda a força. Podia errar o alvo, e perder a presa. Podia atingir o animal, porém isso não era ainda uma vitória. Muitas vezes, a baleia ferida afundava e se perdia no oceano. Ou saía nadando velozmente e arrastava o pequeno barco. Somente quando ela se cansava é que a chalupa podia aproximar-se; então o imediato a feria mortalmente, atravessando-lhe o corpo seguidas vezes, com uma lança metálica. Depois, ela era arrastada para perto do navio, onde se fazia a extração do óleo - trabalho que chegava a demorar umas cinquenta horas". Vou parar por aqui, senão dou o spoiler do livro. Observem o ano.

Depois continuou navegando, dando aulas e escrevendo, mas não se encontrava. Com a ajuda do sogro, compra uma fazenda e aí encontra o ambiente para escrever a sua grande obra, que ganha, de acordo com a síntese biográfica, um belo sub título Moby Dick ou o homem e seu destino. Vejamos como a obra é apresentada: "Foi ali, entre plantas, árvores e animais, que começou a elaborar Moby Dick: a estória do capitão Acab, comandante do "Pequod", contra Moby Dick, a baleia branca. Acab tinha vivido uma vida de solidão durante quarenta anos (belíssimas reflexões - capítulo CXXXII - A sinfonia). Casara-se muito tarde e em seguida partira para o mar. Seu maior desejo era vingar-se da baleia que lhe arrancara uma perna". (A caça a Moby Dick, ocupa os três capítulos finais do livro). É a narrativa de suas experiências no Acushnet. 

Mas o livro é muito mais. O livreto de biografias explicita o subtítulo que lhe atribuiu: "No entanto, o sentido mais profundo da obra é a eterna procura do homem, o intenso combate contra as forças do mal, o anseio de pureza, e por fim a amarga desilusão: a terra não é nem nunca virá a ser um paraíso". 

O livro foi um fracasso editorial. Ele foi efetivamente descoberto apenas ao longo do século XX, quando se compreenderam as complexas inter-relações filosóficas e religiosas de sua obra. Ainda, do livro de biografias deixo duas críticas. David Herbert Lawrence, apresenta a obstinação de Acab como "o instinto vital em luta contra o intelecto que o mata", enquanto que o renomado escritor e filósofo Albert Camus assim se refere ao escritor e ao livro: "Esse livro incessantemente reescrito, essa infatigável peregrinação através do arquipélago dos sonhos e dos corpos, sobre o oceano 'onde cada vaga é uma alma', essa odisseia sob um céu vazio, faz de Melville o Homero do Pacífico".

Deixo também o registro da extrema erudição do autor, de seu conhecimento da cultura clássica, bem como o da Bíblia, especialmente sobre o Antigo Testamento, donde retira precisas ilustrações. Suas observações religiosas são extremamente pertinentes, especialmente sobre os protestantes dos Estados Unidos. O narrador da epopeia do "Homero do Pacífico" é um marinheiro sobrevivente, como vemos no apêndice do livro.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado pelo comentário. Depois de moderado ele será liberado.