sábado, 1 de dezembro de 2012

1900 - Novecento - Bernardo Bertolucci.

O melhor filme político que eu já tinha assistido foi, sem dúvida nenhuma,  Queimada, um filme de Gillo Pontecorvo, com uma atuação, é até desnecessário dizer, extraordinária de Marlon Brando. Queimada é uma ilha, um pouco da história de Cuba e do Brasil. Marca a passagem entre o colonialismo e o regime de escravidão, de portugueses e espanhóis para o imperialismo britânico e o dito "trabalho livre". O filme data do ano de 1969.

Sempre ouvi falar muito de 1900, mas nunca tive oportunidade de assisti-lo. Agora compreendi até a causa disso. O filme foi concebido para ser o maior épico de todos os tempos, com oito horas de duração. Foi bem recebido na Itália e não tão bem nos Estados Unidos. O seu formato, não formal - oito horas - em muito contribuiu para isso. No Brasil, a mesma coisa. Ele foi, inclusive, separado em duas partes e passado separadamente nos cinemas. No Brasil o filme sofreu ainda os cortes impostos pela censura do regime militar. O filme é uma produção do ano de 1976.

O que pode acontecer quando se juntam pessoas como Bernardo Bertolucci (direção), Ennio Morricone (música) e Vittorio Storaro (fotografia) com atores do tamanho de Gérard Depardieu, Robert de Niro e Burt Lancaster? Uma obra prima, naturalmente. O maior épico de todos os tempos, como o classificou o New York Times. Em DVD, o filme ganhou a sua versão mais ou menos definitiva, com a duração de 314 minutos, em torno de cinco horas, que passam quase imperceptíveis. Agora passo a ter dois filmes políticos preferidos.
O filme 1900 de Bernardo Bertolucci, com Robert De Niro e Gérard Depardieu, nos paéis principais.

Muitos estudiosos se ocuparam com o tema das causas da ascensão do fascismo e do nazismo, ou das raízes da possibilidade da  ascensão dos regimes autoritários em geral. Não cabe aqui a análise disso, embora seja sempre um tema muito tentador. Bertolucci tentou fazer isso com este filme. E aponta para as causas com uma clareza, ao menos para ele, mais do que evidentes. Os patrões semearam os fascistas diz Olmo, sem fazer qualquer rodeio ou concessão.

O filme inicia no dia 25 de abril de 1945, o dia da libertação, o fim da Segunda Guerra Mundial, o dia da vitória sobre o regime fascista. A partir daí faz uma retrospectiva histórica do que foram os primeiros cinquenta anos do século XX.  Retrocede ao 27 de janeiro de 1901, data da morte de Giuseppe Verdi e do nascimento de Dalco Olmo e de Alfredo Berlinghieri. Alfredo é filho de latifundiários e Olmo de camponeses. Meu filho será advogado, diz o pai de Alfredo, para em seguida perguntar ao pai de Olmo, sobre o futuro de seu filho. O pai secamente responde: "o meu filho será um ladrão". Um corcunda que os acompanha se rejubila: "Oba! ao menos não vai ser padre".

Estão aí colocadas as grandes perspectivas do filme. Alfredo nasce para ser patrão, enquanto que Olmo nasce para ser camponês, para ser operário. Quanto ao clero, aulas de conformação ao sistema! Alfredo e Olmo crescem como amigos mas a sua condição social os afasta com o passar do tempo e na medida exata em que Alfredo se torna patrão, ocupando funções de poder exigidos pela sua condição de herdeiro. Olmo por sua vez se transforma em líder revolucionário por sua condição de camponês. Um papel maravilhoso (do ponto de vista da compreensão histórica) é exercido pelo casal Áttila e Regina. Áttila é o feitor de Alfredo e faz parte da herança recebida. É patrão sem ser patrão. Age na defesa dos interesses do patrão e passa a ser muito pior do que o próprio patrão. Comportamento de classe média,diríamos hoje.

Alfredo se casa com Ada, uma figura que age como uma espécie de consciência de Alfredo e que irá perturbá-lo dialeticamente na sua relação de amizade com Olmo e com o poder. Na exata medida em que Alfredo se torna patrão, o casamento começa a declinar, até terminar em completa ruína. A oposição entre Olmo e Alfredo também cresce na media em que o regime fascista faz os seus avanços.

Poucas vezes na história do cinema um diretor assume uma postura ideológica tão clara como neste filme. Alfredo encarna o patrão, o herdeiro, e o latifúndio e em consequência a opressão, a injustiça, a arrogância e a prepotência. É a encarnação do mal e o campo fértil em que será plantada a semente do fascismo,que será diligentemente regada por Attila, o fiel cão de guarda da nova ordem. Enquanto isso Olmo encarna a luta contra a opressão e a busca da liberdade com a prática dos princípios do socialismo.é a encarnação do bem. O partido é mostrado como o grande instrumento da esperança para a conquista do bem.

O filme, obedecendo ao que foi traçado pela história, volta ao dia da vitória e mostra o triunfo sobre as forças do fascismo e termina num grande tribunal popular, que irá executar Attila na praça do cemitério, no qual estão enterradas muitas de suas vítimas. Quanto a Alfredo, ele encerra as contradições de sua vida com a solução de um suicídio nas linhas do trem.

Falar da música de Morriconi é absolutamente desnecessário. O cinema já o consagrou, como também a Storaro. Mas devo dizer, que a fotografia é simplesmente linda. Os camponeses no belo cenário da região da Emília formam um espetáculo à parte.

Não é fácil localizar esse filme. O consegui pelo Mercado Livre.




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