segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Conservatória I. A Capital da Seresta. Um pequeno histórico.

Felizmente tenho bons vizinhos. Um deles, o Celso, me contou de suas andanças. Foi então que, pela primeira vez em minha vida, ouvi falar de Conservatória. A impressão que a cidade deixou no meu vizinho foi muito forte e o que realmente lhe chamou a atenção foi este fato de ser ela a capital da seresta. Prometi ao Celso conhecer a cidade na primeira oportunidade que eu tivesse. Como tenho um filho trabalhando no Rio de Janeiro, mais precisamente no COMPERJ, em Itaboraí, isso não seria uma tarefa muito difícil. Na primeira visita que lhe faria, conheceríamos a tal de Conservatória.

Isto aconteceu agora, entre os dias 20 e 22 de setembro (2013), de uma sexta feira até o domingo. E esta é a primeira informação importante. A cidade praticamente só tem existência nos finais de semana, que é quando os turistas chegam. Tomei de todas as informações possíveis e lá chegamos nós, eu e o meu filho Alexis. Quando o maravilhamento tomou conta de mim, prometi, para mim mesmo, divulgar a cidade ao máximo, para que mais pessoas possam usufruir deste verdadeiro paraíso. Farei alguns posts com este objetivo e, no de hoje, vou abordar um pouco de sua origem histórica.
Hoje é a rodoviária, mas já foi a estação ferroviária, nos áureos tempos do café.

A curiosidade é a minha grande companheira de viagens. Eu queria conhecer tudo sobre a cidade, especialmente sobre a sua vocação para a música. Para conseguir este intento é preciso conversar com as pessoas. Aliás uma das frases que também sempre me acompanha diz, que quando você conversa com alguém é um mundo novo que se abre para você. Nestas conversas recebi a indicação de um livro, que eu poderia encontrar na Pousada 206. De fato lá o encontrei. Creio ser um dos últimos exemplares: A Conservatória dos Índios - Um Arraial esquecido. A autoria é de F.A. Noronha Santos.

O livrinho não atendeu a minha curiosidade mais específica, sobre a questão da música, mas me possibilitou um histórico da região, do hoje denominado Vale do Café, nos áureos tempos do império, quando a região conheceu o seu tempo de maior prosperidade. Com a abolição da escravidão toda a região conheceu o seu declínio. Fui ver a data de publicação do livrinho. Surpresa absoluta. A sua primeira publicação se deu em 1928 e teve uma republicação em 2007. Isto me indica que todos os dados nele constantes chegam no máximo ao ano de 1928, fato que os torna mais preciosos, uma vez que revestidos do caráter histórico. O seu autor tem conhecimento do lugar e familiaridade com a pesquisa. Noronha Santos aposentou-se como diretor do Arquivo Municipal da cidade do Rio de Janeiro.
A Serra da Beleza é a cadeia de montanhas que rodeia Conservatória.

As páginas iniciais são as mais interessantes. As outras, as finais,  são muito específicas de números e datas. As iniciais descrevem a região. Creio que antes disso devo contextualizar o mapa geográfico da região. Conservatória é um distrito do município de Valença -RJ. Para chegar a Conservatória você larga a rodovia presidente Dutra, indo para Volta Redonda ou para Piraí. Em ambos os casos deve-se ir até a Barra do Piraí e daí seguir até Conservatória. Como já falamos ela pertence ao Vale do Rio Paraíba, ao Vale do Café. A região é montanhosa e uma de suas atrações turísticas é um mirante, donde se avista a Serra da Beleza. Vou transcrever alguns dados, mantendo a grafia da época:

"O clima de Conservatória e de suas redondezas é excellente e dos mais salubres e recommendáveis das regiões serranas do estado do Rio" [...] "Goza-se sempre de suave temperatura, mesmo na época das chuvas - de outubro a março- na qual são frequentes fortes, mas passageiras, trovoadas de verão. Nesses mezes, apesar dos dias quentes, as manhãs e as tardes são agradabilíssimas. No inverno, os dias são lindos. O céo é de um azul diaphano, sendo communs as noites estrelladas e claras". Talvez esteja aí, nestas noites claras e estreladas uma das raízes para a cidade das serestas. Ainda diz que as temperaturas de inverno podem chegar aos 4 ou 5 graus e no verão a 28 ou 30.
As casas de Conservatória seguem o padrão do Segundo Reinado. Por isso ela é muito procurada para a filmagem de novelas de época.

E olhem  o encanto do autor com a cidade: "A demographia sanitária concorre para a bôa fama da salubridade local. Morre-se pouco. Vive-se muito, rastejando a longevidade por 80 e 90 annos". vejam também a preocupação do autor com as questões sociais, ao falar da mortalidade das crianças, especialmente das crianças pobres: "É lastimável que localidade, tão aprazível e dispondo de excellentes condições de salubridade, e onde a natureza é sempre acolhedora e risonha - não se nos apresente bemfazeja ás crianças dos lares desprotegidos da fortuna". Seleciono ainda uma última frase, simultaneamente de encanto e desencanto pelo local:
Olha aí a preciosidade que eu encontrei. F. A. Noronha Santos conta a história de Conservatória, até 1928, amo da publicação do livrinho.

"Nada lhes falta. Ar puríssimo, agua em abundancia e altitudes razoaveis, sobre o nível do mar, aconselhaveis aos doentes que precisam de socego e refazer forças. Permanecem, porém, abandonadas; - desconhecem-n'as os que têm recursos e que se abalançam a longas viagens a terras estranhas, desprezando o que é nosso - porque é brasileiro".

A maior riqueza de Conservatória é o seu povo e o seu cultivo da música - A capital mundial da seresta.

Com a abolição da escravidão veio a decadência das lavouras de café. As terras foram perdendo o seu valor e o povo abandonou a região. A cana e milho foram as lavouras que se seguiram, mas também abandonadas, para que a região fosse dominantemente ocupada pela pecuária. Mas vejam a suavidade bela do lamento do historiador ao descrever a decadência econômica do lugar. "Quem viu, naquella época a bacia do Parahyba, ostentando soberbamente o vasto oceano de suas culturas e observe hoje a desolação de suas terras despidas, a decadencia de suas cidades e a depreciação geral das propriedades, o esqueleto das fazendas, cuja casaria deixa a impressão de um monte de ossadas, sente a tristeza apertar-lhe o coração e pergunta a si mesmo, se a obra dos nossos maiores correspondeu, ao menos á devastação do patrimonio, com sacrificio das gerações futuras". Saudosismo, nostalgia. Pois é: este lindo e aprazível lugar continua existindo e o seu charme é altamente benfazejo e contagiante. Amanhã eu conto mais.

2 comentários:

  1. Olá Eloi,

    Gostei muito do seu blog. Parabéns!
    Estou fazendo uma pesquisa sobre Ipiabas e Conservatória e gostaria de saber onde comprar uma cópia do livro de Noronha Santos, "Conservatória dos Índios".
    Mais uma vez, parabéns.

    Mario Sampaio Vianna

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  2. Oi Mário. Como digo no texto, o encontrei na Pousada 206. Ela fica logo na entrada, à direita de quem chega, nas proximidades da igreja. A Pousada é fácil de encontrar, já o livro, creio que nem tanto. Joguei na Estante Virtual e nenhum livro retornou. Mas o livro é conhecido na cidade. Sinto não poder dar maiores informações. Agradeço o seu elogioso comentário e êxito em sua pesquisa.

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