segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Italianos no Brasil. "Andiamo in 'Merica. Franco Cenni.,

Antônio Cândido indica e a Estante Virtual me põe em contato. Descobri o livro pelas indicações de Antônio Cândido. Dez livros para compreender o Brasil. Entre eles, sobre o tema da imigração italiana, está este livro Os Italianos no Brasil - "Andiamo in 'Merica", de Franco Cenni. Como a última edição do livro data de 2003, o jeito para comprá-lo é recorrer à Estante Virtual. O livro tem a edição da EDUSP. A primeira edição do livro é de 1960, quando Cenni ganhou o prêmio Itália, promovido em honra da visita do presidente italiano, Gionanni Gronchi, ao Brasil. Entre os jurados para a escolha do prêmio estava o próprio Antônio Cândido.
O livro de Franco Cenni, Italianos no Brasil. A primeira edição foi de 1960. Esta é de 2003, da EDUSP.

É difícil imaginar um livro com tamanha abrangência. Ele começa pela influência dos navegadores italianos nas viagens do descobrimento da América e do Brasil e termina com as últimas influências culturais italianas sobre o Brasil, nos anos 1950. Constitui-se de uma retrospectiva histórica, na primeira parte do livro, passando depois a um relato das influências italianas sobre a formação do povo brasileiro, nos mais amplos setores em que poderiam ter influenciado. O livro é, acima de tudo, um grande livro de história do Brasil, com força total para as contextualizações.

Como não tenho a intenção de fazer um resumo do livro, missão que seria absolutamente impossível e, como também é muito difícil fazer uma resenha, darei um passeio por seus capítulos, indicando os temas abordados, tendo como objetivo motivar para a leitura. São 14 capítulos espalhados pelas 535 páginas do livro.
Franco Cenni também era pintor. Óleo sobre tela de típica cena de colonos italianos.

No primeiro capítulo, intitulado Quando Havia Caravelas e Capitães de Ventura, o foco são os inúmeros navegadores italianos que navegaram a serviço dos descobrimentos. Merecem destaque Américo Vespúcio e os genoveses irmãos Adorno.

No segundo capítulo, intitulado No Tempo do Império, merecem destaque a influência italiana no primeiro florescimento cultural brasileiro nos campos da botânica, da medicina, na literatura e na imprensa. Outro destaque é dado ao casamento de D. Pedro II, com a princesa Tereza Cristina, do reino das duas Sicílias e a aproximação de Pedro II com a cultura italiana.

No terceiro capítulo, intitulado Carbonários de Além-mar, é narrado um belo capítulo da história do Rio Grande do Sul em seus tempos de Revolução Farroupilha e as influências que o movimento da Giovane Itália exerceu sobre os revolucionários farroupilhas. São contadas as epopeias de Tito Lívio Zambecari e de Garibaldi e o seu encontro com Anita. Grande destaque é dado aos barcos transportados por terra, ideia que Garibaldi tirou de suas leituras de Plutarco sobre as guerras do Império Romano.

No quarto capítulo, intitulado A Colonização italiana no Rio grande do Sul, merecem destaque as dificuldades de toda ordem encontradas pela colonização italiana, tardia com relação aos alemães, tanto pelas condições da natureza e da qualidade das terras. É mais um capítulo da história do Rio Grande do Sul.
Italianos no Rio Grande do Sul.

No quinto capítulo, intitulado Italianos nos Estados, são focados os estados do Paraná, de Santa Catarina, de Minas Gerais, Espírito Santo, Mato Grosso e nos estados do Norte. No Paraná ganha destaque a localidade de Alexandra, esta das margens da BR 277, já próxima a Paranaguá, na entrada para as praias.

No sexto capítulo, intitulado O Rei café e a Grande Imigração, o estado de São Paulo será o grande foco. É um dos capítulos centrais do livro e que recebe uma belíssima contextualização sobre a substituição da mão de obra escrava pela mão de obra do imigrante, que atingiu o seu auge entre os anos de 1886-88. A narrativa deste capítulo abrange, desde a experiência pioneira do senador Vergueiro, até o relato de mais de um milhão de imigrantes que chegam num período de 20 anos. Aí também encontramos a história do rei do café, o poderoso Geremia Lunardelli.

No sétimo capítulo, intitulado Evolução Industrial, o tema é óbvio. Neste capítulo se estabelece a relação entre a imigração italiana e a evolução industrial brasileira, no estado de São Paulo. A do Rio Grande do Sul já fora abordada no capítulo referente àquele Estado. Nomes como o de Crespi e Matarazzo afluem ao natural. Também as crises da economia cafeeira ganham destaque.

No oitavo capítulo, intitulado Passaporto Rosso, começa a análise das heranças italianas recebidas pela cultura brasileira. Salienta que todos os imigrantes vieram sob um denominador comum, que era a falta de dinheiro. Destaca depois o espírito criativo dos italianos e a fundação de suas agremiações, tanto de benemerência, quanto esportivas, culturais e educacionais. É contada a história do surgimento do Palmeiras, que contarei num post em separado.
Placa em Antônio Prado, anunciando a cidade mais italiana do Brasil.

No Nono capítulo, intitulado Agitadores de Ideias, o grande destaque é dado para o amor à liberdade, expressa pela liberdade de pensamento, especialmente o de sua expressão. Neste capítulo não poderiam faltar as ideias anarquistas que acalentaram a formação da Colônia Cecília. O sonho de seu idealizador, Giovanni Rossi, é magnificamente explicitado.

No décimo capítulo, intitulado Ciência e Cultura são expostas as influências italianas na constituição do Direito no Brasil, bem como na filosofia e na medicina. Livros e livreiros também são abordados. Giuseppe Bertaso, da editora Globo, de Porto Alegre, ganha uma referência especial. O livro não aborda mas é bom lembrar que Bertaso deu o primeiro emprego a Érico Veríssimo e lhe editou os seus livros.

No décimo primeiro capítulo, intitulado Arquitetura, começa narrando as influências dos jesuítas italianos na construção dos templos dos sete povos das missões, indo depois para o Rio de Janeiro e para São Paulo. Ganham destaque desde os construtores mestres de obra até os arquitetos. Entre as obras os destaques vão para o Museu do Ipiranga, para o Teatro Municipal de São Paulo e o edifício símbolo do progresso de São Paulo, o edifício Martinelli.

No décimo segundo capítulo, intitulado Teatro, Música, Pintura e Escultura, o destaque vai para a ópera italiana e para as companhias italianas que a trazem para cá. É relatada a inauguração dos Teatros Municipais, tanto o do Rio de Janeiro, em 1909 e o de São Paulo, em 1911. Na pintura Anita Malfatti e Cândido Portinari são lembrados.

Portinari. Os italianos na pintura. Os italianos e o café. A substituição da mão de obra escrava pela imigração.

No décimo terceiro capítulo, intitulado Contribuição Civilizadora, Científica e Cultural de Religiosos, o grande destaque vai para as ordena religiosas, com destaque para jesuítas, para os capuchinhos, para os Missionários de São Carlos e para os salesianos. Para quem interessar, aqui em Curitiba andou um padre, de nome Pietro Cobachini, responsável por pinturas em igrejas de diversos bairros. Antonil (ou Andreoni) e o seu livro Cultura e Opulência do Brasil por suas Drogas e Minas também ganha referência. O livro foi proibido logo após a sua publicação em 1711, para não despertar a cobiça dos europeus sobre as nossas drogas e minas. Também a descrição do local de uma futura cidade, feita por D. Bosco é destacada. A futura cidade será Brasília.

No décimo e quarto e último capítulo, intitulado Da Primeira Guerra Mundial até Nossos Dias, o destaque vai para as medidas restritivas impostas, tanto pelos países que recebem imigrantes, quanto pelos que cederam suas gentes para a emigração. Volta ainda para as mais recentes influências culturais e termina com uma belíssima exortação em favor da humanidade, que recentemente havia se perdido na xenofobia dos nacionalismos.

Um livro absolutamente recomendável. É uma viagem maravilhosa e que abre mil possibilidades para a satisfação de nossa curiosidade com relação ao povo italiano e as suas aventuras aqui no Brasil. De aperitivo deixo a frase final do Livro:

"...Porque inquestionavelmente latina é esta América em que, mesmo no crisol de tantas raças diferentes, italianos, portugueses e espanhois se identificam com os nacionais numa mesma tradição humanística, numa mesma religião, numa reação idêntica frente aos mesmos problemas, no desejo comum, que se constituiu numa das mais peculiares características do brasileiro, de fazer com que ninguém se sinta exilado nesta terra". 



2 comentários:

  1. Eu tenho a primeira edição desse livro comprado em sebo. Não me canso de ler e reler. Verdadeira aula de história do Brasil, muito além da oficial e superficial que vemos na escola. Recomendo como fonte de pesquisa ou simples curiosidade.

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  2. Realmente um belo livro. Para mim, as indicações do Antônio Cândido são sempre referência de primeira qualidade. Agradeço o seu comentário, Márcia.

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