sexta-feira, 17 de abril de 2020

A difícil democracia. No Paraná, as escolas reagem ao projeto de educação à distância.


Não bastassem as dificuldades que a população brasileira e paranaense está vivenciando em função da pandemia do coronavírus, a Secretaria de Estado da Educação está implantando o terrorismo real e simbólico em nossas escolas, atingindo, simultaneamente, toda a comunidade escolar: alunos, pais e educadores.

Este terrorismo advém da implantação de um projeto de educação à distância, em substituição ao sistema presencial, único sistema viável, quando se trata da educação infantil e da educação básica. Até no nível superior ela sempre deverá ter um caráter de complementação. Existem até discussões pedagógicas que duvidam da possibilidade, ou não, de alunos do ensino fundamental estarem aptos para a realização de pesquisas, o que se dirá então, da educação à distância? Em suma, o que comanda o processo educacional nesta fase da vida é o rico mundo de relações pessoais que se estabelece no espaço físico da escola. Além do mais, o processo educativo vai para muito além da mera preocupação com a transmissão de conteúdos, que deve ser o motivo do projeto. Ah, o CREP! Ah, a Prova Paraná! Quanto pensar pequeno! Quanto apequenamento do grandioso conceito de - a partir de um ser inacabado - transitar no rumo de um "SER MAIS!

A implementação de um novo projeto sempre deve ser precedida de muito cuidado. O novo sempre assusta. Experiências no setor devem ser consultadas, teóricos são chamados a opinar e, normalmente, se realizam experiências piloto para a avaliação de seus resultados. Estas são as condições, sem as quais, pessoas sérias não se aventurariam.

Assim no Paraná, durante o período do isolamento social causado pela pandemia, a comunidade escolar paranaense foi surpreendida com a imposição vertical de um projeto de educação à distância, com a pronta aquiescência do Conselho Estadual de Educação. E as perguntas surgem. Quais são os fundamentos teóricos e empíricos deste projeto? A única hipótese possível é a de que eles saíram da mente "empreendedora” do senhor secretário de educação do estado do Paraná, o empresário Renato Feder.

Renato Feder merece uma palavra toda especial, sob a forma de uma nova pergunta. A curiosidade epistemológica me obriga a perguntar. Quem é ele e quais são as suas credenciais para ter sido indicado a tão elevado cargo? Quais são as suas experiências teórico/práticas no campo da educação que o elevaram à condição para o exercício do cargo?

Diante disso, as perguntas continuam. Quem o nomeou? É óbvio que quem o nomeou foi o governador do Paraná, o senhor Ratinho Júnior. Quais as referências que ele dele teve, para referendá-lo a tão alto cargo? Sei que em alguns setores da administração estadual os quadros dirigentes foram escolhidos entre os profissionais das próprias entidades ou instituições, e a partir daí, surge uma nova interrogação. Por que este critério não foi também estabelecido na educação? Não há nela quadros competentes para tal? Por que trazer um triplo alienígena para o seu comando? Triplo sim. De fora dos quadros da educação, alheio às questões educacionais e de fora do próprio estado do Paraná? 

Todos estes são componentes para a democracia não dar certo. Para ela ser uma prática difícil. Na democracia, o principal ingrediente para que ela efetivamente funcione é a busca da adesão, do convencimento e o instrumento para tal é o diálogo. O diálogo entre este governo e o setor da educação ainda não ocorreu. A violência, esta sim, já. Questões de herança truculenta. 30 de agosto, 29 de abril. 

Mas voltemos ao ato da educação à distância. O improviso está acontecendo. Nada funciona corretamente. Por relatos sei que existe um despejar de conteúdos que são pessimamente trabalhados. Setenta reais seduziram inescrupulosos que desfilaram incompetências. Contratos milionários foram assinados. Não houve nenhum treinamento para a assimilação das tecnologias inerentes ao processo. A situação real da comunidade foi simplesmente ignorada. Foi ignorado, inclusive, o estado de carência de grande parte, senão da maioria dos alunos da escola pública, carentes dos meios para que uma educação à distância possa ser viável do ponto de vista técnico, que é a sua razão de ser.

O que sobrou, no entanto, nesse processo? Ameaças e mais ameaças. Reposição em período de férias, quebras à hierarquia a serem julgadas e punidas, faltas, licenças obrigatórias, retirada dessas licenças, protagonismo subserviente, indisposições com a comunidade, ruptura de contratos precários. E o próprio futuro profissional. Não será um abrir de porteiras para um futuro não distante?

Além das preocupações psicológicas com a pandemia se somam agora as ameaças reais e simbólicas da vontade autoritária do sorridente secretário. Vejo postagens de professores que afirmam não dormir, que entram nos sistemas de manhã, voltam à tarde e à noite e não conseguem conexões. E as ameaças pairam no ar. Circulam as imagens grotescas de uma senhora chefe de núcleo com ameaças vexatórias, que deveriam envergonhar qualquer currículo.

E o pior. Muitos estão tomados pelo medo. Sabemos que os dois mais importantes afetos humanos são o medo e a esperança. O medo faz mal e a esperança faz bem. Mas os professores estão com medo, com medo até de perder a esperança. E perder a esperança implica na própria condição do humano. A democracia é um difícil exercício entre pessoas que se consideram iguais e que se respeitam e que aprendem com a riqueza do encontro das alteridades. A democracia é um difícil exercício entre a liberdade, o exercício da autoridade e a responsabilidade. O exercício da democracia não suporta mandonismos, tutores, supressão de eleições e imposição de medos. Tomara que os superiores hierárquicos abram pequenas fendas para que ar puro possa penetrar.

Para terminar. Existem protagonismos. Hoje (17.04.2020) fiquei sabendo do protagonismo da Colégio Edith, de Campo Largo. Usaram de um expediente do Conselho Estadual de Educação e convocaram o Conselho Escolar para deliberarem sobre a aceitação ou não da dita imposição. Optaram pelo não. Mas não um não absoluto e definitivo. Sobrou espaço para redefinir. Daqui a uma semana voltarão a se reunir para democrática e coletivamente deliberarem os próximos passos. Os protagonistas fazem história. Os autoritários também. Porém todos serão julgados e, como estamos nos aproximando do 21 de abril, uns serão lembrados como Tiradentes, como protagonistas de tempos de libertação e outros como Joaquins Silvérios. A obediência cega levou aos piores julgamentos da história. Que Adorno, Hannah Arendt, Primo Levi, entre outros, não permitam que percamos nossa condição e capacidade de refletir.






4 comentários:

  1. Com incertezas e muito triste contatamos a forma que nossos educandos tem sido visto por esse governo terrorista. Nesse momento de pandemia vem esses escrotos tirar a paz dos lares já fragilizados.

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    1. Em primeiro lugar agradeço o comentário. Atitudes tomadas pelos homens da mercadoria.

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  2. Que artigo fantástico. As qualificações que colocam o secretário da inducassão, são as mesmas que coloma co sinistro lá em Brasília. Conchavos políticos e politiqueiros. Uns abutres que nem sabem oque fazem lá, só querem o salário no final do mês. Em relação á essa escola de Campo Largo. Que exemplo de RESISTÊNCIA, minha solidariedade e compaixão por esses guerreiros.

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    1. Muito obrigado pelo seu comentário, professor Gilmar. Estamos realmente vivendo tempos de turbulência. O humano está sob escombros e ruínas.

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