sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Jubiabá. Jorge Amado.


O posfácio, ao livro Jubiabá, de Jorge Amado, escrito por Antônio Dimas, para a edição comemorativa ao centenário de nascimento de Jorge Amado, da Companhia das Letra é tão bonito, que dá vontade de usar apenas esta referência para apresentar esta obra de Jorge Amado, possivelmente o seu primeiro grande romance e onde aparecerão muitos dos temas que serão permanentes na literatura do grande escritor, como os meninos de rua e o mar, que ainda está em formação. A obra é de 1935, quando Jorge tinha apenas 22-23 anos de idade.
A edição da Companhia das Letras de Jubiabá. Literatura da década de 1930.

A intenção do romance fica explicitada em carta de Jorge para o escritor português, Ferreira de Castro, para quem, entre outros, dedica o livro. Mais explícito é impossível: "Venho de passar quatro meses na Bahia, recolhendo material para um romance sobre negros. Chamar-se-á Jubiabá, nome de um macumbeiro de lá, e espero fazer um livro forte, fixando nas duas primeiras partes - "Bahia de Todos os Santos" e "Grande Circo Internacional" - todo o pitoresco do negro baiano - música, religião de candomblé e macumba, farras, canções, conceitos, carnaval místico - e toda a paradoxal alma do negro - raça liberta, raça de grandes gargalhadas, de grandes mentiras e raça ainda escrava do branco, fiel como cão, trazendo nas costas e na alma as marcas do chicote do Sinhô Branco. A terceira parte - "A Greve" - será a visão da libertação integral do negro pela sua proletarização integral. Que acha v. do plano?" Esta carta consta do posfácio de Antônio Dimas.
A primeira edição de Jubiabá, O pitoresco do negro baiano. O livro é de 1935.

Antônio Dimas enquadra este romance como um romance de formação, em que Antônio Balduíno, o Baldo, discípulo de Jubiabá, o pai de santo, vai conhecendo e formando a sua visão de mundo entre o "olho da maldade" e o "olho da piedade". Baldo e Jubiabá moram no morro do Capa-Negro. Baldo é criado solto no mundo, tendo como referência apenas uma tia, a tia Luiza, que enlouqueceu de tanto trabalhar, carregando coisas na tabuleiros na cabeça  e que, por isso mesmo, cedo morreu. Baldo vira chefe de gangue e herói do morro, ao derrotar, em luta de boxe, em pleno largo da Sé,o ariano Ergin. Já seria uma insinuação a suposta superioridade racial dos brancos? Certamente que sim. A vitória de Baldo e a consequente derrota de Ergin são assim, profundamente emblemáticas e simbólicas

Jubiabá e os seus olhos da maldade e da piedade eram a referência moral do morro e a única voz a que Antônio Balduíno efetivamente obedece. É de Jubiabá que Antônio Balduíno ouve a história sobre Zumbi dos Palmares, no dia do enterro de sua tia Luiza. Como perdera a sua única referência, Zumbi ascende à categoria de heroi único do menino em formação. Zumbi se jogou da montanha para não mais ser escravo. Antônio Balduíno também não queria ser escravo. Queria ser livre, embora não compreendesse bem o que significava este "ser livre". Virou lutador de boxe, chefe de gangue de meninos de rua, compositor de sambas, artista de circo e muito mais.
Ilustrações do amigo Carybé para o livro de Jorge Amado.

Uma paixão de infância o atormenta a vida toda. Lindinalva, a filha do Comendador. Todas as muitas mulheres que Antônio Balduíno possuíra, todas tomaram a forma da menina branca e sardenta. Ela o esnobou. O comendador cai em desgraça e morre em casa de mulher dama. Lindinalva está grávida de advogado branco que a abandona. Para Lindinalva, agora já mãe de um menino forte, sobra como opção de sobrevivência, trabalhar na Pensão Monte Claro, na prostituição de alto luxo. Porém o tempo se encarregou de levá-la para a rua de Baixo, na prostituição barata, até parar na ladeira do Tabuão, donde só sairia, ou para o hospital, ou para o necrotério. Degradação completa. 

Antônio Balduíno reencontra Lindinalva nestas circunstâncias, estando já à beira da morte. Arrependida de seu desdém, pede a Baldo por Gustavinho, o seu filhinho. Baldo que também atravessava um momento difícil em sua vida, já pensava no caminho do mar como alternativa para os fracassos em sua vida. O olhar da piedade volta para a sua vida e passará a trabalhar de estivador, para cuidar de Gustavinho, como prometera para Lindinalva.
O fantástico elogio de Albert Camus para o livro de Jorge Amado.

É neste momento que começa a terceira parte do livro, a da greve, que "será a visão da libertação integral do negro pela sua proletarização integral", como Jorge explicitara para Ferreira de Castro, em carta sobre as intenções do romance. É o momento palanque do livro, quando Antônio Balduíno se torna líder da greve que irrompe na cidade de Salvador. Greve que começa com o pessoal dos bondes e se estende para os funcionários das companhias de eletricidade e de telefonia e das padarias e que ganha a adesão de todos os trabalhadores, que simplesmente param toda a cidade de Salvador. A vitória dos trabalhadores será simplesmente total e completa, tal a força que o movimento ganhara.

Antônio Balduíno, que admirava o ABC de Zumbi dos palmares e de outros herois negros sempre queria também para si um ABC. Ganhou um. Também virara um heroi. Neste seu ABC, se lia:
"Este é o ABC de Antônio Balduíno
negro valente e brigão
desordeiro sem pureza
mas de bom coração.
Conquistador de natureza
furtou mulata bonita
brigou com muito patrão
..................................................
morreu de morte matada
mas ferido à traição".

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