segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

A Colônia Cecília. O seu inspirador. Franco Cenni.

Ideias libertárias sempre são sedutoras e fascinantes. Uma das mais belas e fortes doutrinas libertárias foi a dos anarquistas. Tenho duas indicações para fazer a respeito. História das Ideias e Movimentos Anarquistas, vol. 1. A ideia e História das Ideias e Movimentos Anarquistas, vol. 2. O movimento. Ambos são de autoria de George Woodcock e editados pela L&PM Pocket.

Lendo o livro de Franco Cenni, Italianos no Brasil "Andiamo in 'Merica" encontro uma coisa fabulosa, que é um encontro com Giovanni Rossi, um anarquista italiano. Rossi é simplesmente o idealizador da Colônia Cecília, uma experiência que não deu muito certo, realizada aqui no Paraná, nas proximidades da cidade de Palmeira. Rossi era um botânico que pensou em transferir experiências das plantas para os humanos. Em 1900 Rossi homenageava a cidade de Blumenau, por ocasião dos festejos de sua fundação. Vejam o encanto da poesia:
Livro de Franco Cenni Italianos no Brasil. A presença das ideias anarquistas de Giovanni Rossi.

"Se o teu verão é ardente e chuvoso, o teu inverno é tépido como uma primavera da Itália. Tão doce que a videira, apenas perdida as folha, os brotos já repontam, túrgidos, como mamilos de púbere precoce, desejosa de amor. Os teus montes são majestosos com seu esqueleto de granito e seu manto soberbo de florestas virgens, perenemente toucadas com todos as inimagináveis tonalidades do verde. os teus vales são férteis, banhados pelos afluentes do largo e pitoresco Itajaí, que te beija, e ao mesmo tempo te ameaça, e algumas vezes te invade, amigo infiel e caprichoso, ó gentil cidade de Blumenau! (...) Os teus bosques são ainda preciosos tesouros pelas madeiras que escondem, pelo húmus que acumulam,pelas fontes que conservam. tenha piedade delas a bárbara foice do colono..." E termina com um toque bem ao estilo e ao conceito doutrinário que professa. Faz, simultaneamente, a denúncia e o anúncio:

"Mas as tuas flores mais belas e mais gentis, ó Blumenau, não são as orquídeas de tuas florestas; são as moças dos teus lares, que todas as flores vencem em beleza, na doce primavera da vida; são os recém-nascidos nos teus berços, são as crianças de tuas escolas que, sobre as ruínas da nossa civilização decrépita e mentirosa, ainda verão, um dia, talvez, esplendor o futuro".

Rossi nascera em Pisa em 1860. Aqueles eram os tempos em que os conservadores olham com desdém os pensadores que abalavam o mundo (Nietzsche, Marx, Bakunin, Engels) mas os temiam. Cenni assim descreve os tempos do visionário: "O socialismo era ainda uma vasta nebulosa, e anarquia apenas sinônimo de atentados e desordens, quando ao contrário, deveria significar somente falta de governo, 'interregno em que com os Trinta Tiranos se passou um ano sem arcontes'". E, Cenni anuncia o sonho visionário: "Negação da autoridade, também,  que poderia processar-se sem violências, assim como se deu na Colônia Cecília, situada entre Palmeira e Santa Bárbara, em terras do Paraná".  

Cenni passa então a narrar as tratativas de D. Pedro II, casado com Tereza Cristina, do reino das Duas Sicílias, a fundação da colônia. Vejam a descrição: "Foi assim que um monarca estendeu a mão à anarquia... Uma anarquia, repetimos absolutamente pacífica que em 1890 despejaria da proa do vapor Città di Roma, em terras brasileiras, alguns homens e uma única mulher (intelectuais, operários e camponeses). Havia entre eles um ladrão regenerado que viria a ser o mais hábil e o mais voluntarioso trabalhador do grupo. Depois de uma breve sesta em Ponta Grossa, dirigira-se para as terras da colônia experimental, incultas e desertas, onde operaram um comprido carretão, à beira de um córrego. Aquele era o cenário natural em que o homem deveria voltar à sua vida primitiva, não fazendo nada que não fosse por ele expressamente desejado, esquecendo preconceitos e abatendo todas as barreiras típicas de uma civilização rançosa que ainda pretendia apoiar-se em sanções a fim de exigir deveres. O necessário para uma existência frugal, não mais, deveria ser tirado do amanho da terra, enquanto o resto seria descanso, estudo, amor... Trabalho livre, vida livre, amor livre"...

Mas os vícios "do velho" falaram mais alto e impediram o aflorar do novo: "Mas não se pode construir novos mundos com o concurso de homens velhos, roídos por taras milenárias que fazem aflorar, na primeira ocasião, incompreensões profundas". Logo após veio a proclamação da República e com ela o fim do sonho que já estava fazendo água.

Outra indicação de leitura sobre a Colônia Cecília podemos encontrar em Zélia Gattai, a grande memorialista, no Città di Roma, o navio que trouxe para o Brasil, entre outros, os anarquistas que viriam realizar o sonho da fundação da colônia anarquista. Neste navio vieram, com destinos diversos, os nonnos de Zélia. Os Gattai viriam para a colônia:  http://www.blogdopedroeloi.com.br/2013/03/citta-di-roma-zelia-gattai_7.html

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