quarta-feira, 14 de maio de 2014

Getúlio. Os momentos finais. O filme de João Jardim.

Sem sombra para qualquer tipo de dúvida, Getúlio Vargas é o maior personagem histórico do Brasil em seu século XX. Ele tem a ver com a consolidação do Estado brasileiro, pelo avanço em suas instituições e na consolidação de sua unidade. Foi Getúlio quem deu ao Brasil os seus aspectos de fisionomia moderna, de um país industrial e urbano e de uma sociedade plural. A opção pela industrialização foi o seu grande feito e, nesse campo, podemos dizer que praticamente construiu um modelo próprio, o chamado nacional desenvolvimentismo, que, depois em outros governos, sofreu uma alteração para o estatal desenvolvimentismo, pelo qual o Estado é um, ou o grande indutor das políticas de crescimento econômico. Apenas este parágrafo já é suficiente para vislumbrar todo um campo de tormentosos conflitos.
A bela biografia de Getúlio, do jornalista Lira Neto, em três volumes. O 3º ainda não foi editado. Outra bela biografia é a de Juremir Machado da Silva, Getúlio - Romance.

Getúlio tornou-se presidente através de uma revolução vitoriosa, que apeou do poder os oligarcas latifundiários e de um modelo econômico agrário exportador, ainda em regime, para sermos generosos, de semi escravidão. Depois de enfrentar a revolta constitucionalista de São Paulo foi eleito presidente pela via indireta e em 1937 tornou-se o ditador do chamado Estado Novo, um estado de verdadeiro terror político. Este é o período histórico que macula a sua biografia. Foi deposto em 1945 e voltou ao poder em 1950, pela via democrática da eleição direta. Neste seu governo, a Constituição foi o seu manual de governo. Na disputa pela memória, prevaleceu o estadista sobre o ditador.

A intervenção do Estado na economia como o seu grande indutor e os avanços na legislação social do país lhe gerou uma oposição raivosa, cheia de ódios, entreguista em conluio com os interesses do capital internacional, das regras da economia ditadas exclusivamente pelo livre mercado. Estas forças se aglutinaram em torno da UDN. À oposição parlamentar se juntou a da mídia, absolutamente comprometida com a velha ordem, do modelo agrário exportador. O ex comunista e, agora americanófilo, Carlos Lacerda trovejava ruidosos discursos contra Vargas diuturnamente. Soma-se a este quadro uma herança histórica de um país em que a sua República foi uma proclamação militar, donde nasceu um espírito de tutela sobre os seus rumos. A marinha e especialmente a aeronáutica era constituída por forças absolutamente conservadoras e elitistas, que não suportavam Getúlio no poder. Esta situação se agravou com a morte do major Vaz, num atentado dirigido contra Carlos Lacerda.
Cartaz de divulgação do filme Getúlio. Últimos dias de um presidente.

É apenas neste momento que o filme de João Jardim entra em cena. Os dias finais, de profunda angústia e agonia de Getúlio Vargas. As duas/três semanas finais da vida do presidente. O diretor faz um trabalho muito sério e uma reconstituição histórica perfeita dos acontecimentos e com uma visão positiva do seu personagem tema. Angústia e ternura se alternam ao longo do filme. O filme tem a direção de João Jardim. Tony Ramos interpreta magnificamente o Getúlio, Drica Moraes é a filha Alzira e Alexandre Borges, o nefasto Carlos Lacerda.

As cenas de ternura ocorrem na relação com a sua filha Alzira e o momento de rememoração da morte de seu filho Getulinho, vitimado pelas consequências da poliomielite, enquanto que as cenas mais angustiantes se dão em seu imaginário, vendo-se, saindo do Catete, preso e algemado nas mãos de seus oponentes. Temia um golpe contra o seu governo, oriundo da aeronáutica e das instigações e agitações diárias promovidas por Carlos Lacerda. Getúlio sofre a acusação de envolvimento direto com o atentado contra Lacerda, do qual resultou a morte do major Vaz. O crime foi protagonizado pela guarda pessoal do presidente, sob o comando de um peão, mui amigo, trazido lá do Rio Grande, de São Borja, a terra natural do presidente. Só neste momento é que Getúlio efetivamente conhece os círculos mais próximos ao poder. A situação se torna mais intensa na exata medida em que as investigações chegam mais próximas ao Catete. Getúlio nada faz para impedir as investigações.

As intrigas palacianas são outro fator bem trabalhado no filme. Nos bastidores de poder sempre existe mais fogo amigo do que se possa imaginar.  Outro aspecto muito bem trabalhado é a decisão do presidente de não renunciar. Esta seria a suprema humilhação, na qual não sabia o que poderia lhe acontecer, entregue em mãos da oposição. Daí a decisão firme de não renunciar, mesmo sob a perspectiva da auto imolação da própria vida, fato cada vez mais evidente, com o seu trabalho na redação de sua carta testamento, magnificamente destacado pelo diretor.

Para aqueles que conhecem o palácio do Catete e o magnífico museu que ali funciona, facilmente conseguem prever a cena final do suicídio, pelo pijama que ele estava usando. Este pijama está ao lado da cama, bem como o revólver usado no suicídio, naquele quarto que era o do presidente. Para mim, é um filme de rara beleza e passa a se constituir num grande documento da nossa história. Tenho certeza de que ele ainda será muito usado em salas de aula.
Manuscrito da carta testamento de Vargas. O grande documento histórico do Brasil.

Particularmente fiz uma relação do momento histórico retratado pelo filme com os dias da política atual. Cheguei a algumas conclusões, já expressas pelo FB: "O governo do presidente Getúlio era popular, democrático e potencializador da riqueza nacional e a oposição era raivosa e entreguista da riqueza nacional. Os jornais mentiam escandalosamente e agiam em conluio com os interesses do capitalismo internacional e a corrupção era o único e eterno argumento para combater o governo. Como será que a história representará este momento político vivido nos dias de hoje? Quem será o candidato a Carlos Lacerda, o traidor máximo dos interesses nacionais"? 


Termino com o teor da carta testamento. http://www.blogdopedroeloi.com.br/2013/08/a-carta-testamento-de-getulio-vargas.html











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