sábado, 3 de maio de 2014

Sobre a Greve dos Professores e funcionários - 2014 e a APP-Sindicato.

Depois de um longo tempo, professores e funcionários das escolas públicas do Paraná voltaram a fazer greve, por decisão de Assembleia Geral, convocada pela APP-Sindicato. Esta declaração de greve foi precedida por uma paralisação de advertência ao governo, de 24 horas e, por um movimento intitulado "hora atividade na prática". Esta mobilização não sensibilizou o governo, que simplesmente fez ouvidos moucos. Aí veio a Assembleia Geral, na qual não havia, nem mesmo a possibilidade de votar pela não deflagração da greve, tal o estado de indignação da categoria. Houve apenas uma pequena polêmica em torno da data do início da greve.

A concentração da "Passeata dos trinta mil". A maior da história da APP-Sindicato.

Como professor aposentado e não convivendo no cotidiano da escola, fui tentar entender os motivos da indignação dos professores para com o governo Beto Richa. Sei que a vida de professor não é fácil, mas também há que se admitir que nos tempos recentes houve melhoras, especialmente, no que se refere à legislação federal, mais especificamente às leis 11.394/ 2007, a lei que criou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação e a Lei 11.738/2008, que instituiu o Piso Salarial e que determinou, que 33% das atividades do professor se compõem de atividades realizadas fora da sala de aula. Acontece que, os governadores não cumpriram esta lei, ou a cumpriram, apenas, em partes.

Este é o motivo principal do impasse gerado entre professores e, no caso específico aqui do Paraná, com o governo Beto Richa. O governador pagava o piso, somente a partir do mês de maio, quando deveria ser a partir de janeiro, e pagava 30% da hora atividade e não 33%. Com isso a greve ganhou um componente muito forte junto à opinião pública, por se tratar de uma greve, para que a legislação educacional, já tão precária, fosse cumprida. Creio que houve muito má vontade do governo em atender os professores, já que faltava pouco para, ao menos cumprir a legislação. Óbvio que havia outros motivos. O que mais irritou os professores foi o fato de o governo ficar devendo aos professores. Simplesmente não pagou as progressões na carreira. Outro motivo primordial foi o descaso para com a assistência à saúde, e neste caso, todo o funcionalismo público foi atingido. 

Outros motivos também agravaram a relação, como a realização de um concurso que, muito mais do que um concurso, foi uma humilhação à categoria e também a absoluta precariedade com que contratava e contrata os professores temporários. Com relação aos funcionários das escolas, muitos deles estavam recebendo valores abaixo do salário mínimo regional. A greve começou com um ímpeto nunca visto e imaginado. Começou com índices de adesão nunca vistos, girando em torno dos 70% e chegando aos 90%, em seu terceiro dia. Diante desta avalanche, nunca esperada pelo próprio governo, acabou a conversa de meia boca e em cinco dias vieram duas propostas, com avanços significativos.
A maior assembleia de todos os tempos. Energia sobrando, inclusive para continuar a greve.

E veio a passeata, a maior de todos os tempos. Ela já recebeu a designação como a "Passeata dos 30 mil". Veio a Assembleia Geral, com a presença em torno de 8 mil participantes. Havia fôlego para continuar o movimento, mas numa avaliação prévia dos organismos diretivos do Sindicato, a direção encaminhou a proposta da suspensão da greve e da manutenção do estado de greve. A decisão pela suspensão teve maioria, mas não tão tranquila. Muitos ficaram indignados com a decisão, sendo que muitos desses que queriam a continuidade da greve votaram com cartões brancos, isto é, de professores não sindicalizados e que, portanto, não acompanham o cotidiano da vida sindical. A democracia pressupõe o acato às decisões tomadas pela maioria.

"A coragem nos falta quando estamos sozinhos e isolados, mas não quando mergulhamos na realidade dos outros de tal maneira que é impossível voltar atrás", nos diz Ernesto Sabato. A APP-Sindicato é hoje este grande mergulho na realidade dos outros, este grande congraçamento que nos retira do estarmos sozinhos e isolados e nos irmana em laços e vínculos profundos de solidariedade, que nos dá orgulho e energia para os enfrentamentos e para as conquistas. Isto nos faz vencer o maior de todos os medos, que é o medo do medo.
E uma frase tirada dos muros, do ano 1968, muito válida para os dias de hoje. Nós também fechamos as ruas para abrirmos caminhos.

Esta foi uma greve para que tão cedo não se faça mais greve, pois conhecendo a força desta categoria, os governantes terão mais respeito e busquem, nas negociações os entendimentos, sem que seja necessário o recurso à greve. Gosto de comparar a APP-Sindicato a uma planta, que cresce sob a forma de rizoma, que cresce e lança os seus brotos em cada uma das escolas do Paraná, em cada um dos locais do nosso trabalho, a partir da sua semente originária.

Os governantes já nos infligiram muitas dores e muitos desassossegos com a sua indiferença, mas guardamos ainda uma dor maior. Houve um governante que nos agrediu fisicamente, que quis domar a rebeldia e a ousadia da nossa coragem, em reivindicar uma educação melhor, com melhores condições de trabalho, com as patas de seus amestrados cavalos e asseclas. A tortura da memória deve ser uma dor atroz. Isso, se sobrou algo semelhante à consciência. O 30 de agosto não sai de nossa memória e, certamente, da dele, desse governante, também não.

4 comentários:

  1. Brilhante, eloquente e o mais verdadeiro texto escrito sobre a greve da Educação. Parabéns professor Eloi

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  2. Rosemary, muito obrigado pela sua referência elogiosa.

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  3. Parabéns, Professor, mas venha conosco, temos coletivos atuantes de aposentados /as e continuamos na luta sempre. APOSENTADOS SIM, INATIVOS NUNCA, EDUCADORES SEMPRE.

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  4. Muito obrigado, Maria Adelaide. Sempre estamos participando de alguma atividade.

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