terça-feira, 20 de maio de 2014

O Nobel da Paz para Barack Obama. A ótica de Jeremy Scahill.

Guerras Sujas - O mundo é um campo de batalha, é um volumoso livro escrito pelo jornalista americano Jeremy Scahill, junto com uma equipe de jornalistas. O livro é uma áspera denúncia dos governos Bush e Obama, na condução da política externa americana de segurança aos cidadãos americanos, após os ataques às torres gêmeas, naquele fatídico 11 de setembro. As denúncias são graves, o que está muito claro no título, elas são sujas e também no sub título, elas se estenderam por todo o mundo, por mais de cem países.
O volumoso livro de Jeremy Scahill, Guerras Sujas - O mundo é um campo de batalha. 830 páginas de denúncia e de indignação.

Estas guerras ganharam uma nova forma. Não mais movimentam grandes exércitos e nem mais ocorrem bombardeios espetaculares. Hoje são usados drones e são feitos assassinatos seletivos, que conforme denúncia do autor, centram-se no Iraque, no Afeganistão, no Iêmen e na Somália, mas que já atingem em torno de cem países. Scahill também denuncia que Obama intensificou este tipo de guerra, das áreas alvo e, em dez meses fez tanto quanto Bush em oito anos de governo. "Ele já autorizara, em dez meses, o mesmo número de ataques com drones que Bush autorizara em seus oito anos de governo" (p.335). No entanto, para surpresa geral, ou talvez nem tanto, Obama foi agraciado com a indicação para prêmio Nobel da Paz, em 2009.

Alfred Nobel ( 1833 - 1896), um químico sueco, que inventou a dinamite e fez fortuna fabricando canhões e outros armamentos, quis dissociar o seu nome com a origem de sua fortuna, empregando parte dela, laureando homenageados em algumas áreas do conhecimento ou pelo desenvolvimento de suas atividades. Originariamente foram instituídos cinco prêmios: o da paz, o de física, o de química, o de medicina e de literatura. Posteriormente também a área econômica foi incluída. Os prêmios vem sendo distribuídos desde 1901. O que causa maiores polêmicas sempre é o Nobel da Paz. Entre as homenagens mais contestadas estão as que agraciaram Henry Kissinger (1973), -Menachen Beguin (1978), junto com Anwar Sadat, -Yitzhak Rabin (1994), junto com Shimon Perez e Arafat e a União Europeia (2012).

Mas a Academia se superou em 2009. Existe uma expressão latina que diz Si vis pacem para bellum, Se queres paz, prepare a guerra. A frase é nitidamente belicista. Quando Obama foi indicado ao Nobel, ele não estava preparando a guerra, ele estava comandando, não uma, mas duas guerras: uma contra o Iraque e outra contra o Afeganistão. Ele estava em guerra. Na justificativa para a concessão da homenagem podia se ler: "por seus esforços extraordinários para reforçar a diplomacia e a cooperação internacionais entre os povos".
Obama recebendo o Nobel da Paz (2009). Duas guerras em andamento.

O constrangimento foi geral, desde a Casa Branca até o mundo diplomático, especialmente o da Organização das Nações Unidas. Obama recebeu o prêmio e discursou. Poderia fazer um discurso em favor da paz ou teria que, necessariamente, fazer um discurso belicista, justificando as guerras que comandava? E tinha um agravante. A Academia  aureolara outro cidadão americano, um ícone do pacifismo, Martin Luther King, em 1964. Também pairava sobre a Academia o espírito de outro pacifista, cinco vezes indicado mas nunca agraciado, Gandhi. Ele os nominou no discurso.

Jeremy Scahill, em seu livro, não deixa por menos esta premiação, citando os antecedentes à premiação, quando anunciava: "A luta contra o extremismo violento não acabará depressa e irá além do Afeganistão e do Paquistão" (397) e discursava na Academia militar de West Point: "Teremos de ser ágeis e precisos no uso da força militar. Onde quer que a Al Qaeda e seus aliados tentem estabelecer uma ponte - seja na Somália, no Iêmen ou noutro lugar -, devem ser enfrentados com pressões crescentes e parcerias fortes" (397). Quando recebeu o prêmio, os pacifistas levemente perturbaram o seu discurso, e o primeiro presidente negro dos Estados Unidos reuniu forças para para assim se justificar:
 Obama discursando, ao receber o contestado Prêmio Nobel da Paz.

"Como uma pessoa que está aqui em consequência direta do trabalho a que o dr. King dedicou a vida, sou um depoimento vivo da força moral  da não violência. Sei que não há fraqueza alguma, nenhuma passividade e nenhuma ingenuidade nas convicções e na vida de Gandhi e King [...] Mas como um chefe de Estado que jurou proteger e defender sua nação, não posso me guiar apenas pelo exemplo deles. Deparo com o mundo como ele é, e não posso ficar inerte diante das ameaças ao povo americano. Para que não restem dúvidas: o mal existe no mundo. Um movimento não poderia ter detido os exércitos de Hitler. A negociação não vai convencer os líderes da AlQaeda a depor suas armas. Dizer que às vezes o uso da força é necessário não é um apelo ao cinismo - é o reconhecimento da história, das imperfeições do homem e dos limites da razão" (397-8).

O discurso foi considerado excelente, firme e eficaz e recebeu os aplausos de republicanos e de democratas. Difícil fazer um julgamento. A Nação tem o direito e o dever de defender os seus cidadãos. A questão maior é a inoportunidade da indicação e, o que o autor contesta é a eficiência das políticas que Obama vem aplicando. Já ao final do livro existe uma frase de um dos ex assessores de Obama, sobre a não eficácia dessas políticas, pois os Estados Unidos estava "incentivando uma nova corrida armamentista com drones que fortalecerá rivais atuais e futuros, e lançará as bases de um sistema internacional cada vez mais violento" (666).

2 comentários:

  1. Parabéns pela matéria... Mestre.
    Excelente !!!

    Miro Vidal / Jaguapitã - PR

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  2. Muito obrigado, Miro. O mundo está meio perdido.

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