quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Brasil: uma biografia. Lília M. Schwarcz e Heloísa M. Starling.

São 694 páginas. Destas, 508 formam o texto. As restantes páginas são dedicadas a notas (53), indicando a origem e as fontes utilizadas ou explicitações, outras (mais 35) são dedicadas às referências bibliográficas e outras 53 à cronologia, com uma coluna dedicada aos fatos ocorridos no Brasil e em Portugal e a outra para os acontecimentos mundiais. Acompanham ainda em torno de 60 páginas, estas não numeradas, de fotografias com detalhadas explicitações. Além da introdução e conclusão, o corpo do livro é formado por 18 capítulos, começando pelo descobrimento, ou invasão e terminando com o governo Collor. Este é o livro BRASIL: uma biografia, das historiadoras Lilia M. Schwarcz (USP) e Heloísa M. Starling (UFMG).
O maravilhoso livro Brasil: uma biografia. Denso, com conteúdo.

"Nenhum homem nesta terra é repúblico, nem zela, ou trata do bem comum, senão cada um do bem particular". A frase data de 1630 e é uma citação de Frei Vicente do Salvador, frade franciscano, em seu livro História do Brazil. Talvez esta frase, que faz parte da apresentação do livro, seja uma bela síntese de toda a nossa história.

 Por que, no título, aparece a opção por uma biografia e não uma história geral dos brasileiros? Esta é uma pergunta que as autoras fazem na apresentação do livro e, respondem "Para se concentrar na ideia de que a biografia talvez seja outro bom caminho para tentar compreender o Brasil em perspectiva histórica: conhecer os muitos eventos que afetaram  nossas vidas, e de tal modo, que continuam presentes na agenda atual". E continuam:
Cartaz de lançamento do livro, na Livraria Cultura. Autoras prestigiadas.

"Uma biografia é a evidência mais elementar da profunda conexão entre as esferas pública e privada: somente quando estão articuladas, essas esferas conseguem compor o tecido de uma vida, tornando-a real para sempre. Escrever sobre a vida do nosso país implica questionar os episódios que formam sua trajetória no tempo e ouvir o que eles têm a dizer sobre as coisas públicas, sobre o mundo e o Brasil em que vivemos - para compreendermos os brasileiros que somos e o que deveríamos ou poderíamos ter sido". O foco do livro está na construção da cidadania ou, lamentavelmente, na maior parte do tempo, na sua não construção.

A introdução começa com uma citação de Lima Barreto, em que ele, menino negro e pobre, descreve o relato da abolição, feito por sua professora, passando para os leitores a sua percepção de menino. É óbvio que houve frustração. A corrupção e a violência estão inscritas na história deste país. A corrupção pela indistinção entre o privado e o público, com o uso do público em favor do privado, e atestado, desde as suas mais remotas origens, na expressão "quem rouba pouco é ladrão e quem rouba muito é barão". Já a violência sempre foi praticada, tanto pela escravidão, quanto pelo extermínio das populações nativas. A escravidão foi abolida, mas continuou como prática e o extermínio dos indígenas continuava na mesma proporção em que se expandiam as nossas fronteiras agrícolas.
As autoras do livro. Lilia M. Schwarcz e Heloisa Starling.

As autoras usam ainda duas expressões, as de bovinismo (Madame Bovary) e familismo para marcar as nossas marcas mais características. O nosso "cordial" sempre foi avesso às racionalizações da modernidade. A nossa biografia já é longa e, ao mesmo tempo, recente. São 18 capítulos que fluem. Para mim, me chamou muita atenção a constante presença do trabalho da idealização do imaginário. Como se foram construindo símbolos agregadores e unificadores e como isso resultou na formação de uma cultura tipicamente brasileira. Lembraria Jorge Amado, em Tenda dos milagres e o seu fabuloso personagem Pedro Archanjo, um dos meus favoritos: "e há de nascer, de crescer e de se misturar".
Uma das imagens do livro. Feitor castigando escravo.


Não vou entrar na análise dos capítulos, que não caberiam num post, e dou uma rápida pincelada na conclusão, em que os principais momentos de nossa história são retomados. As autoras mostram as dificuldades na construção dos direitos ligados à cidadania e constatam, que ainda patinamos nos direitos civis,  exatamente por onde a história dos direitos começou. Temos dificuldades em lidar com as chamadas liberdades individuais, como nos atestam as reações na luta pelos direitos dos negros, das feministas, ambientalistas, grupos LGBT, entre outros. Quanto aos direitos políticos vivemos numa democracia formal relativamente estável, a partir da Constituição de 1988 e são registrados os enormes avanços sociais ocorridos nos governos do Partido dos Trabalhadores.
Outra imagem do livro. O petróleo vinculado com a independência do Brasil.


Mas, continuam as grandes questões abertas: a corrupção, a prática da tortura no cotidiano policial, a enorme violência urbana e a dúvida diante da possibilidade de um crescimento sustentável. Lembrando que vivemos o mais longo período de estabilidade democrática em nosso país e que ameaças golpistas rondam os nossos ares, quase que permanentemente (Não teria o STF desarticulado um golpe por estes dias?). Um livro maravilhoso. Se nossas autoridades estivessem efetivamente comprometidas com a qualidade do ensino, este seria um livro a ser largamente distribuído e estudado entre os professores de história e de toda a chamada área das disciplinas ligadas às humanidades. É o estudo da formação da nossa identidade.

2 comentários:

  1. a nossa constituição não foi aprovada pelo PT o LULA prometia reformala ele não a assinou mas nos 25 anos na comemoração ele estava lá para a condecoração a tal constituição sidadan como disse o ULISSES GUIMARAES é uma constituição cidadan para um pais que não existe cidadões, aqui começou errado as terras foi dadas a FALIDOS portugueses nos ESTADOS UNIDOS foi a CORRIDA as TERRAS O REI de PORTUGAL fujiu para o BRASIL e isso piorou em muito criou se uma elite fajuta os escravos teriam que ser indenisados hoje seria muito diferente.

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  2. Sr. Arnaldo, este é um belo livro. Eu gosto muito da frase do Darcy Ribeiro sobre o Brasil: "Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças, não consegui. Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei construir uma universidade séria, não consegui. Mas meus fracassos são minhas vitórias. Detestaria estar no lugar de quem venceu".

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