quarta-feira, 30 de março de 2016

Viagem ao Recife. 1. O Estado de Pernambuco.

Há muito eu desejava conhecer o estado de Pernambuco e, mais precisamente, Recife, a sua capital. A perspectiva histórica é a que mais alimentava o meu desejo. Já conhecia a paradisíaca ilha de Fernando de Noronha, mas fui até lá, num voo que partiu de Natal. Desta vez tomei a decisão e para lá me mandei, por um período de oito dias, com direito a hotel na praia da Boa Viagem.
A primeira foto de Recife. Boa Viagem, a partir da janela do hotel.

Pernambuco é um dos berços históricos de nosso país. Conta-se, que até mesmo antes do nosso descobrimento oficial, por ali já teria passado o espanhol Vicente Iáñez Pinzón, no Cabo de Santo Agostinho, em janeiro do ano de 1500. Mas há controvérsias e questionamentos. As viagens exploratórias dos portugueses ocorreram já a partir de 1501 mas, o povoamento mesmo começou a partir de 1534, com Duarte Coelho e Pero Lopes de Souza. Dois povoados foram fundados em 1535, os de Igarassu e Olinda. A igreja de São Cosme e Damião de Igarassu, data de 1535 e é a mais antiga do Brasil, que está em funcionamento.
A igreja de São Cosme e Damião em Igarassu, a mais antiga do Brasil em funcionamento.

Recife tem a maior concentração urbana do nordeste, somando em torno de 4 milhões de habitantes, dos quais um pouco mais de 1,5 formam a população da cidade. Pernambuco possui 9.500.000 de habitantes. A riqueza histórica do estado, pela qual se iniciou a colonização, foi a cana de açúcar. Em torno desta riqueza se modelou toda a cultura da Casa Grande e da Senzala, do latifúndio e da escravidão, da qual resultaram os sobrados e mocambos, que são a nossa grande marca social ainda nos dias de hoje.

O sucesso econômico da cultura açucareira provocou a cobiça europeia. Aí ocorreu o mais longo período de domínio estrangeiro, a ocupação holandesa, entre 1630 e 1654. Esta ocupação tornou famoso o conde Maurício de Nassau, que trouxe grandes inovações para a região. Muito de seu trabalho pode ser visto, ainda hoje em dia. Esta ocupação provocou a insurreição pernambucana e por ela, a expulsão holandesa com a segunda Batalha de Guararapes. Até hoje muito se discute este momento de nossa história, opondo-se a colonização portuguesa com a holandesa.
Uma quadra de Amsterdam, do Brasil holandês, ainda presente em Recife.

A história de Pernambuco continua com a Revolução pernambucana de 1817, com a Confederação do Equador e a Revolução Praieira. Espírito forte de insurreição. O meu amigo Nestor, como bom pernambucano, sempre me contesta o verso do hino do Rio Grande do Sul, da Revolução Farroupilha, em que se afirma: "Como a aurora precursora. Do farol da Divindade. Foi o 20 de setembro (1835). O precursor da liberdade". A precedência teria sido pernambucana. Polêmicas em dias de festa.

Uma das marcas maiores de Pernambuco é a sua Faculdade de Direito, que junto com a de São Paulo, foram as primeiras, fundadas no famoso 11 de agosto de 1827. Me lembrei deste dado, quando passando pelo Mosteiro de São Bento, em Olinda, li a placa de que ali ela viveu os seus primeiros anos e permanecendo até 1854. Muitos grandes nomes da intelectualidade e da política brasileira por ali passaram. Lembro das polêmicas travadas entre Castro Alves e Tobias Barreto. Também se tornaram notáveis os alunos José Lins do Rego, Ariano Suassuna, Sílvio Romero, Graça Aranha e tantos outros.
O mosteiro de São Bento, que hospedou o primeiro curso de Direito do Brasil.

Pernambuco também forneceu grandes nomes para a intelectualidade brasileira. Vou citar apenas três, nomes de minha preferência. Joaquim Nabuco, não apenas por ter sido abolicionista, mas por ter elaborado um projeto de integração do negro liberto à sociedade e à economia brasileira, por um programa de educação e de reforma agrária. Um dos únicos pensadores liberais sérios que este país teve. Gilberto Freyre, pela beleza lírica e romântica de sua obra CasaGrande&Senzala. Apesar de todas as contradições e polêmicas que a sua obra suscita, é o seu pensamento um dos primeiros a conceber positivamente o Brasil e o seu povo. E o grande educador, patrono da educação brasileira, Paulo Freire, autor dos memoráveis Educação como Prática da Liberdade e Pedagogia do Oprimido. Já que falei em preferências, rendo também a minha homenagem ao grande bispo de Olinda e Recife, D. Hélder Câmara, que embora não fosse um cidadão pernambucano, foi um cidadão universal.
Homenagem a Joaquim Nabuco, o ilustre abolicionista pernambucano.

Por fim, algumas considerações sobre Pernambuco, que eu captei em conversas e observações feitas ao longo dos meus oito dias de permanência, sobre a economia do estado, nos dias atuais. Viajando para Porto de Galinhas passamos pela nova economia do estado, impulsionada pela refinaria Abreu e Lima e pelo complexo industrial e portuário de Suape. Estas obras reconfiguram toda a economia pernambucana. Também fiquei surpreso com o polo têxtil instalado no agreste, nas cidades de Caruaru, Toritama e Santa Cruz do Capibaribe. Ali as grandes lojas brasileiras buscam o seu abastecimento. Também é conhecido dos brasileiros o polo de vitivinicultura do rio São Francisco, na cidade de Petrolina e na baiana Juazeiro. E como Recife está perdendo a sua atividade portuária, ela terá que se reinventar, dedicando-se cada dia mais ao turismo e a prestação de serviços. A tradicional economia canavieira também continua com todo o vigor.
Riquezas naturais, históricas e culturais, o grande patrimônio de Pernambuco. Gonzagão e Gonzaguinha.

O turismo tem grande futuro. Poucos estados tem uma história e uma cultura tão ricas. E, em belezas naturais, nem se fala. Toda a sua costa litorânea, de norte a sul e de sul a norte formam um verdadeiro paraíso. Agora fiquei sem adjetivos para falar de Fernando de Noronha. Além disso tem os patrimônios imateriais do carnaval de Olinda e de Recife, do frevo, dos afoxés e maracatus e da ciranda.


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