Hoje, 2 de dezembro será lançado o livro "A Luta continua- Crônicas da resistência" na cidade de Curitiba. O livro tem apresentação da senadora uruguaia Lucía Topolansky, esposa do ex presidente José Mojica e um belo poema de Fernanda Takai. Depois seguem em torno de oitenta "crônicas da resistência". Compareço com um texto, buscando as raízes históricas do nosso processo de formação e o comportamento de nossas elites, pouco imbuídas de um espírito democrático e republicano. Segue o texto.
50 anos em 5 meses. Para trás.
Escrevo simultaneamente à votação do processo de impedimento
da presidente Dilma. Estou tomado por um profundo sentimento de indignação e
asco. Mais que uma análise, faço um registro para a história. 31 de agosto de
2016. Escrevo como um personagem vivo e consciente e esta é a razão da minha
indignação. Como a análise é inevitável, começo apresentando duas
características da elite brasileira: o seu caráter escravocrata e predador,
espírito bandeirante.
O livro foi lançado oficialmente em Salvador no dia 25 de novembro. Hoje, 2 de dezembro ocorrerá o seu lançamento em Curitiba.
Joaquim Nabuco nos alertava que não bastava abolir a
escravidão. Também a sua obra deveria acabar, porque ela corrompia todas as
instituições. O caráter predador, bandeirante, é aliado da escravidão,
inclusive a indígena.
Sob estas características não se constrói uma nação.
Pioneiros tem zelo e visão de futuro. Bandeirante pensa em rapina, em lucro
fácil. A ideia da sucessão das gerações não passa pela cabeça. Uma grande nação
se constroi com um mercado interno forte, com justiça nas relações sociais e
com sentimento de pertencimento.
Aliado ao caráter escravista-predador está o caráter
golpista. Cada vez que o poder político contraria os interesses desta elite, ela
recorre ao golpe de estado, em suas mais diferentes formas.
De 1930 a 1985, quando os alicerces da nação foram
construídos, vivemos duas longas ditaduras e uma tentativa de golpe a cada três
anos. Com a Constituição de 1988 vivemos a mais longa experiência democrática.
Uma Constituição generosa e cidadã, porém jovem e frágil.
As teorias do neoliberalismo encontraram na elite brasileira
terra fértil para germinar. A selvageria do livre mercado mata a ideia de
futuro. A obtenção do lucro é contada em minutos e segundos. É o império do
capitalismo financeiro, implantado no Brasil por FHC. Segundo ele o Brasil, não
mais era uma nação, mas um mercado emergente.
Os resultados sociais foram devastadores e em 2002 o povo
reverteu este quadro. Grandes avanços vieram: valorização do salário mínimo,
uma previdência possível, expansão das ofertas na educação e cor de povo dentro
da universidade. Políticas de complementação de renda riscaram o Brasil do mapa
da fome.
A democracia mexeu na base da pirâmide social e este
movimento gerou o ódio à própria democracia. Para a elite, ela deve apenas
garantir a ordem da propriedade e do lucro predador e não os direitos sociais.
Era uma democracia subversiva.
O limite de tolerância da elite foi estabelecido para as
eleições presidenciais de 2014. Para isso todo um clima foi preparado. Este
começou com a criminalização seletiva do mensalão,
e com a manipulação midiática do junho de 2013. O JN transmutou uma pauta
municipal em nacional e a popularidade da presidente despencou, mas não o
suficiente para derrotá-la.
A história se repete. Vence, mas não governa. A crise será o
grande cenário do golpe. Alianças se formam num tripé invencível, assim
definido por Jessé Souza, em Radiografia
do golpe: “É a articulação desses três elementos principais – mídia venal,
Congresso reacionário e comprado e a fração mais corporativa e mais moralista
de ocasião da casta jurídica – que municiou [...] o golpe. Esses três atores
trocam vazamentos ilegais e todo tipo de ilegalidade antidemocrática com tanta
habilidade como o time do Barcelona troca passes”.
Ainda de acordo com Souza, Lula - o campeão das políticas de
combate à desigualdade rivaliza em popularidade com Sérgio Moro - o campeão da
moralidade seletiva de ocasião.
Os golpistas venceram. "Mais uma vez, as forças e
os interesses contra o povo [...] se desencadeiam sobre mim”. Venceram para
quê? Para que o lucro imediato prevaleça sobre o trabalho como instrumento de
cidadania e de nacionalidade para instaurar novas formas de trabalho escravo
pela sua precarização.
Venceram para que as riquezas
brasileiras sejam drenadas em favor dos interesses do grande capital, a começar
pelo petróleo. O pré-sal, cujos royalties financiariam a educação brasileira,
será integralmente destinado aos apetites do capital internacional. Venceram
para acabar com as políticas de estado na construção da cidadania, para em nome
da austeridade, todo o dinheiro arrecadado pelos impostos, seja destinado
apenas para a pequena elite do topo da pirâmide social.
Com a vitória os golpistas já se
apropriaram do lema 50 em 5 - de JK. Voltamos 50 anos atrás em apenas cinco
meses de governo interino. E o que acontecerá com a efetivação desta malta
golpista no poder? Substituirão
um governo voltado para políticas públicas de construção cidadã, pela
instituição de um estado de repressão social, uma vez que novas formas de trabalho
escravo, aliadas ao lucro predador do capitalismo financeiro, são absolutamente
incompatíveis com a ordem democrática.
Resta-nos a memória. Assim como a Alemanha se reconstruiu e
se tornou mais democrática do que era, ao não esquecer os inomináveis crimes do
nazismo assim devemos nós, pela nossa organização coletiva, perpetuar na
memória os golpistas de plantão deste final de agosto de 2016.
Dias após a escrita do texto vi estes números significativos
fornecidos pelo IPEA, que mostram a perversidade desta elite. Querem ganhar
tudo, apenas eles. Entre 2003 e 2011, as classes D e E diminuíram de 96,2
milhões para 63,5 milhões. As classes A e B cresceram de 13,3 milhões para 22,5
milhões e a classe C saltou de 65,8 milhões para 105,4 milhões. Confirmou-se
assim a expressão de Márcio Pochmann, que os pobres subiram pela escada, mas os
ricos ascenderam pelo elevador.
O único que resiste é o Maduro!!!
ResponderExcluirRespeito sua opinião, meu amigo. Muito obrigado pela sua manifestação.
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